“Já passado mais de um mês da censura judicial imposta a este jornal e sem previsão de quando poderá ser efetivamente revogada, acumulam-se as manifestações de protesto e indignação contra esse atentado à liberdade de expressão, em pleno Estado Democrático de Direito. Essas manifestações, que ocorrem desde o início do cerceamento, agora vêm acrescidas de uma profunda estranheza sobre o tempo excessivo que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal está levando para decidir sobre questão tão grave e urgente, consubstanciada em mandado de segurança impetrado há muitos dias.
“Não me parece normal esse atraso”, avalia Carlos Velloso, ex-ministro presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). “Essa morosidade excessiva é incomum para medidas desse tipo. O mandado de segurança deve obedecer a uma tramitação rápida porque é preferencial”, observou. Recorde-se que contra a sentença judicial que o proíbe de divulgar reportagens sobre o processo em que está envolvido Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o Estado ingressou com duas exceções de suspeição do desembargador Dácio Vieira – pelas estreitas relações de amizade que o magistrado tem mantido com a família Sarney – e um mandado de segurança, todos apresentadas na primeira semana de agosto. Mas até agora o Tribunal de Justiça do Distrito Federal não decidiu sobre os pedidos.
Daí o experiente ex-presidente do Supremo afirmar: “Sem conhecer os autos, estou achando que essa lentidão está, realmente, excessiva. Isso não costuma ser comum.” E o ex-ministro do Supremo alerta para o fato de que “o mandado é um remédio constitucional, assim como o habeas corpus, porque trata de garantias previstas na Carta. Deve receber tramitação mais rápida, preferencial a outros processos. Mandados entram em pauta em primeiro lugar. Os regimentos dos tribunais e os códigos consagram a preferência para o julgamento dessas ações constitucionais”.
Se usado para reverter lesão a uma garantia individual o mandado de segurança “tem sempre preferência”, como diz o ex-presidente do Supremo, é claro que tal preferência se torna mais patente em se tratando de profunda lesão a um direito coletivo, como é o de a sociedade ser informada quanto a tudo o que diga respeito, direta ou indiretamente, ao interesse público. E este, certamente, é o caso, pois a censura prévia se refere a fatos ligados a investigações da Polícia Federal, a indícios de nepotismo, de tráfico de influência e de uso indevido de recursos públicos, a atos do poder público eivados de flagrante inconstitucionalidade (os “atos secretos”) – tudo embasado em escutas telefônicas altamente comprometedoras, devidamente autorizadas pela Justiça.
A demora no julgamento levou o advogado criminalista Mario de Oliveira Filho a observar: “Não estamos cuidando aqui da liberdade individual de alguém, de uma única pessoa, estamos tratando da liberdade de todo o povo brasileiro que a liberdade de imprensa alcança.” E complementa: “O Estadão não está buscando algo em benefício próprio, não pede concessão de privilégio. Procura, simplesmente, resguardar o interesse público da população, que tem pleno direito de saber aquilo que acontece de bom e de podre no País.”
Para o presidente nacional da OAB, Cezar Britto, “a morosidade do Judiciário (no caso) significa a perpetuação da violação de um preceito constitucional fundamental para a democracia que é a liberdade de imprensa”.
Já o presidente da Associação Juízes para a Democracia, Luis Fernando Camargo de Barros Vidal, considera que a delonga no julgamento de liminar que restringe valor constitucional tão importante, como a liberdade de imprensa, “gera sentimento de orfandade da norma jurídica”.
Por sua vez, o presidente da Associação dos Juízes Federais em São Paulo, Ricardo de Castro Nascimento, salienta que “o Judiciário tem que ter a sensibilidade de perceber a repercussão na sociedade de um determinado caso e dar a agilidade necessária para tomada final e decisão, qualquer que seja ela”.
O fato é que a repercussão, no Brasil e no Exterior, que está tendo a censura prévia imposta judicialmente ao Estado – de que é exemplo o destaque com que o New York Times tem tratado a questão nos últimos dias – compromete a imagem do Poder Judiciário”.
Fonte: OAB