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00010 APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.71.01.000486-7/RS
RELATOR : Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ
APELANTE : FUNDACAO UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE – FURG
ADVOGADO : Joaquim Paulo Garcia Godinho
APELADO : WILLIAN FREITAS GARCIA
ADVOGADO : Mara Alaides Modernel Mendes
REMETENTE : JUÍZO SUBSTITUTO DA 01A VF DE RIO GRANDE
EMENTA
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º, CRFB/88. INDENIZAÇÃO. FALHA NO
SERVIÇO. UTILIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO INCORRETO.
1. A partir de 1946, adotou-se, no Brasil, no que concerne às entidades de direito público, a responsabilidade objetiva, com fulcro na
teoria do risco administrativo, sem, no entanto, adotar a posição extremada dos adeptos da do risco integral, em que a Fazenda
Pública responderia sempre, mesmo presentes as eludentes da obrigação de indenizar (CF de 1946, art. 194 e seu § único; CF de
1967 , art. 105 e seu § único; CF de 1969, art. 107 e seu § único e CF de 1988, art. 37, § 6º).
A Suprema Corte, em mais de uma oportunidade, fixou o eto alcance do comentado dispositivo constitucional. Assim o fez no RE
nº 68.107-SP, julgado pela 2ª Turma, verbis:
“(…)
II. A responsabilidade objetiva, insculpida no art. 194 e seu parágrafo único, da CF de 1946, cujo texto foi repetido pelas Cartas de
1967 e 1969, arts. 105-7, respectivamente, não importa no reconhecimento do risco integral, mas temperado.
(…)” (In RTJ 55/50).
Em seu voto, o relator, o eminente Ministro THOMPSON FLORES, ex-Presidente da Elsa Corte, salientou, verbis:
“… embora tenha a Constituição admitido a responsabilidade objetiva, aceitando mesmo a teoria do risco administrativo, fê-lo com
temperamentos, para prevenir essos e a própria injustiça.
Não obrigou, é certo, à vitima e aos seus beneficiários, em caso de morte, a prova de culpa ou dolo do funcionário para alcançar
indenização. Não privou, todavia, o Estado do propósito de eximir-se da reparação, que o dano defluíra do comportamento doloso
ou culposo da vítima.
Ao contrário senso, seria admitir a teoria do risco integral, forma radical que obrigaria a Administração a indenizar sempre, e que,
pelo absurdo levaria Jean Defroidmont (La Seience du Droit Positif, p. 339) a cognominar de brutal. (…)” (In RTJ 55/52-3).
Outro não foi o entendimento adotado por um dos mais conceituados administrativistas do país, o eminente e saudoso Ministro
THEMÍSTOCLES CAVALCANTI, ao votar no julgamento do RE nº 61.387-SP, verbis:
“(…)
Partindo da teoria da igualdade dos encargos e das finalidades essenciais do Estado, o clássico Tirard chegava à responsabilidade
do Estado pela falta verificada no serviço (De la responsabilité du service publique, 1906).
Neste particular, a variedade na aplicação dos casos é muito grande. Principalmente a jurisprudência francesa se detém no eme
das hipóteses. É assim que são mencionados casos de responsabilidade, ou por não se ter evitado um perigo por meio de obras
necessárias, como a construção de um parapeito na estrada; de não se ter impedido a circulação em um trecho perigoso; de não se
ter retirado um obstáculo em um rio canalizado etc. ou por omissão material, por falta de sinalização, de abandono de trecho da
estrada, abertura de trincheira em uma estrada etc.
Essa teoria não é talvez suficiente para prever todas as hipóteses de responsabilidade do Estado, mas a sua aplicação deve ser
casuística para não envolver a responsabilidade do Estado em todos os casos em que age dentro de sua finalidade própria.
Assim, nem sempre se verifica essa responsabilidade, de acordo com a boa doutrina, quando há escassez de abastecimento de água, interrupção de energia elétrica, o mal calçamento de uma estrada. Depende sempre das circunstâncias.
(…) (In RTJ 47/381. No mesmo sentido, RTJ 71/99, bem como julgado do extinto Tribunal Federal de Recursos no julgamento da
Ap. Cív. nº 33.552, rel. Ministro CARLOS MÁRIO VELLOSO, in RDA 137/233 ).
Na doutrina nacional, a jurisprudência do Pretório Elso é respaldada, como se verifica, entre outros, dos seguintes autores: HELY
LOPES MEIRELLES, in Direito Administrativo Brasileiro. 14. ed., Rev. dos Tribs., 1989. p. 551; CAIO MÁRIO DA SILVA
PEREIRA, in Responsabilidade Civil. 1. ed., Forense, 1989. p. 143. n. 105.
Da mesma forma, a idêntica solução é adotada na França, como leciona o clássico LAUBADÈRE, verbis:
“La jurisprudence a consacré, au-delá de la responsabilitè pour faute, une responsabilitè de ladministration pour risque; elle admet
que, dans certains cas, les collectivités publiques sont tenues de réparer les dommages entrainés par leur activité même non fautive.
La responsabilité pour risque est, rappelons-le, celle qui est engagée dès lors qu est établie une relation de cause a effet entre
lactivité de lauteur du dommage et ce dommage lui même” (In ANDRÉ DE LAUBADÈRE, Traité Élémentaire de Droit
Administratif. Libr. Générale, Paris, 1953. p. 490, nº 892. Igualmente, JEAN RIVERO, in Droit Administratif. Huitième édition,
Dalloz, Paris, 1977. p. 274, nº 284).
Assim, como restou demonstrado, a teoria do risco administrativo, adotada pelas Constituições brasileiras, a partir de 1946, não
implica no reconhecimento de que a Administração Pública tenha que indenizar sempre, mesmo quando presentes as eludentes
dessa responsabilidade.
In casu, cosoante bem assinalado na r. sentença, encontram-se presentes os pressupostos do art. 37, § 6º, da CF/88.
2. Improvimento da apelação e da remessa oficial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de dezembro de 2007.