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AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 862.600 – SP
(2006/0086316-5)
R E L ATO R : MINISTRO LUIZ FUX
AGRAVANTE : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
– INSS
REPR. POR : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA
NACIONAL
AGRAVADO : BRADESCO SEGUROS S/A E OUTRO(S)
ADVOGADO : ROGERIO BORGES DE CASTRO E OUTRO
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL.
PRESCRIÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA.
ADMINISTRADORES, AUTÔNOMOS E AVULSOS. LEIS
7.787/89 E 8.212/91. COMPENSAÇÃO. LIMITAÇÃO INSTITUÍ-
DA PELAS LEIS 9.032/95 E 9.129/95. INAPLICABILIDADE.
IPC. CORREÇÃO MONETÁRIA.PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO.
TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO/COMPENSAÇÃO.
ARTIGO 3º, DA LEI COMPLEMENTAR 118/2005. PRESCRIÇÃO.
TERMO INICIAL. PAGAMENTO INDEVIDO. ARTIGO
4º, DA LC 118/2005. DETERMINAÇÃO DE APLICAÇÃO
RETROATIVA. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE.
CONTROLE DIFUSO. CORTE ESPECIAL. RESERVA
DE PLENÁRIO.
1. O prazo prescricional das ações de compensação/repetição de indébito,
do ponto de vista prático, deve ser contado da seguinte forma:
relativamente aos pagamentos efetuados a partir da vigência da Lei
Complementar 118/2005 (09.06.05), o prazo para se pleitear a restituição
é de cinco anos a contar da data do recolhimento indevido; e
relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao
regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo
de cinco anos a contar da vigência da novel lei complement
ar.
2. Isto porque a Corte Especial declarou a inconstitucionalidade da
expressão “observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da
Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”,
constante do artigo 4º, segunda parte, da Lei Complementar
118/2005 (AI nos ERESP 644736/PE, Relator Ministro Teori Albino
Zavascki, julgado em 06.06.2007).
3. Deveras, a norma inserta no artigo 3º, da lei complementar em tela,
indubitavelmente, cria direito novo, não configurando lei meramente
interpretativa, cuja retroação é permitida, consoante apregoa doutrina
abalizada:
“Denominam-se leis interpretativas as que têm por objeto determinar,
em caso de dúvida, o sentido das leis existentes, sem introduzir
disposições novas. {nota: A questão da caracterização da lei interpretativa
tem sido objeto de não pequenas divergências, na doutrina.
Há a corrente que exige uma declaração expressa do próprio
legislador (ou do órgão de que emana a norma interpretativa), afirmando
ter a lei (ou a norma jurídica, que não se apresente como lei)
caráter interpretativo. Tal é o entendimento da AFFOLTER (Das
intertemporale Recht, vol. 22, System des deutschen bürgerlichen
Uebergangsrechts, 1903, pág. 185), julgando necessária uma Auslegungsklausel,
ao qual GABBA, que cita, nesse sentido, decisão de
tribunal de Parma, (…) Compreensão também de VESCOVI (Intorno
alla misura dello stipendio dovuto alle maestre insegnanti nelle scuole
elementari maschili, in Giurisprudenza italiana, 1904, I,I, cols.
1191, 1204) e a que adere DUGUIT, para quem nunca se deve
presumir ter a lei caráter interpretativo – “os tribunais não podem
reconhecer esse caráter a uma disposição legal, senão nos casos em
que o legislador lho atribua expressamente” (Traité de droit constitutionnel,
3a ed., vol. 2o, 1928, pág. 280). Com o mesmo ponto de
vista, o jurista pátrio PAULO DE LACERDA concede, entretanto,
que seria egero exigir que a declaração seja inseri da no corpo da
própria lei não vendo motivo para desprezá-la se lançada no preâmbulo,
ou feita noutra lei.
Encarada a questão, do ponto de vista da lei interpretativa por
determinação legal, outra indagação, que se apresenta, é saber se,
manifestada a explícita declaração do legislador, dando caráter interpretativo,
à lei, esta se deve reputar, por isso, interpretativa, sem
possibilidade de análise, por ver se reúne requisitos intrínsecos, autorizando
uma tal consideração.
(…)
… SAVIGNY coloca a questão nos seus precisos termos, ensinando:
“trata-se unicamente de saber se o legislador fez, ou quis fazer uma
lei interpretativa, e, não, se na opinião do juiz essa interpretação está
conforme com a verdade” (System des heutigen romischen Rechts,
vol. 8o, 1849, pág. 513). Mas, não é possível dar coerência a coisas,
que são de si incoerentes, não se consegue conciliar o que é inconciliável.
E, desde que a chamada interpretação autêntica é realmente
incompatível com o conceito, com os requisitos da verdadeira
interpretação (v., supra, a nota 55 ao n° 67), não admira que se
procurem torcer as conseqüências inevitáveis, fatais de tese forçada,
evitando-se-lhes os perigos. Compreende-se, pois, que muitos autores
não aceitem o rigor dos efeitos da imprópria interpretação. Há quem,
como GABBA (Teoria delta retroattività delle leggi, 3a ed., vol. 1o,
1891, pág. 29), que invoca MAILHER DE CHASSAT (Traité de la
rétroactivité des lois, vol. 1o, 1845, págs. 131 e 154), sendo seguido
por LANDUCCI (Trattato storico-teorico-pratico di diritto civile
francese ed italiano, versione ampliata del Corso di diritto civile
francese, secondo il metodo dello Zachariæ, di Aubry e Rau, vol. 1o
e único, 1900, pág. 675) e DEGNI (Linterpretazione della legge, 2a
ed., 1909, pág. 101), entenda que é de distinguir quando uma lei é
declarada interpretativa, mas encerra, ao lado de artigos que apenas
esclarecem, outros introduzido novidade, ou modificando dispositivos
da lei interpretada. PAULO DE LACERDA (loc. cit.) reconhece ao
juiz competência para verificar se a lei é, na verdade, interpretativa,
mas somente quando ela própria afirme que o é. LANDUCCI (nota
7 à pág. 674 do vol. cit.) é de prudência manifesta: “Se o legislador
declarou interpretativa uma lei, deve-se, certo, negar tal caráter
somente em casos extremos, quando seja absurdo ligá-la com a lei
i n t e r p re t a d a , quando nem mesmo se possa considerar a mais errada
interpretação imaginável. A lei interpretativa, pois, permanece tal,
ainda que errônea, mas, se de modo insuperável, que suplante a mais
aguda conciliação, contrastar com a lei interpretada, desmente a
própria declaração legislativa.” Ademais, a doutrina do tema é pacífica
no sentido de que: “Pouco importa que o legislador, para
cobrir o atentado ao direito, que comete, dê à sua lei o caráter
interpretativo. É um ato de hipocrisia, que não pode cobrir uma
violação flagrante do direito” (Traité de droit constitutionnel, 3ª ed.,
vol. 2º, 1928, págs. 274-275).” (Eduardo Espínola e Eduardo Espínola
Filho, in A Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, Vol. I, 3a
ed., págs. 294 a 296).
4. Consectariamente, em se tratando de pagamentos indevidos efetuados
antes da entrada em vigor da LC 118/05 (09.06.2005), o prazo
prescricional para o contribuinte pleitear a restituição do indébito, nos
casos dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, continua
observando a cognominada tese dos cinco mais cinco, desde que, na
data da vigência da novel lei complementar, sobejem, no máximo,
cinco anos da contagem do lapso temporal (regra que se coaduna com
o disposto no artigo 2.028, do Código Civil de 2002, segundo o qual:
“Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código,
e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido
mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.”).
5. Por outro lado, ocorrido o pagamento antecipado do tributo após a
vigência da aludida norma jurídica, o dies a quo do prazo prescricional
para a repetição/compensação é a data do recolhimento
indevido.
6. Declarada a inconstitucionalidade da contribuição previdenciária a
cargo da empresa sobre os pagamentos a administradores, autônomos
e empregados avulsos, os valores a esse título recolhidos anteriormente
à edição das Leis 9.032/95 e 9.129/95, ao serem compensados,
não estão sujeitos às limitações percentuais por elas impostas, em
face do princípio constitucional do direito adquirido.
7. É cediço no Eg. STJ que “Diante de uma situação de normalidade,
ou seja, tendo em vista eção válida perante o ordenamento jurídico,
a lei aplicável, em matéria de compensação tributária, será
aquela vigente na data do encontro de créditos e débitos, pois neste
momento é que surge efetivamente o direito à compensação, de acordo
com os cânones traçados pelo Direito Privado a tal instituto, que
devem ser respeitados pela lei tributária, ex vi do art. 110 do Código
Tributário Nacional. Diversa será, no entanto, a situação quando
houver declaração de inconstitucionalidade do tributo, tendo em vista
que tal declaração expunge do mundo jurídico a norma, que será
considerada inexistente ab initio. Sua nulidade contamina, ab ovo, a
eção por ela criada, que será considerada, a partir da declaração
de inconstitucionalidade, devido aos seus efeitos erga omnes, como se
nunca tivesse existido. O direito à restituição do indébito que emana
deste ato de pagar tributo inexistente dar-se-á, na espécie, por meio
de compensação tributária, não podendo, em hipótese alguma, ser
limitado, sob pena de ofensa ao primado da supremacia da Constituição.
E isso porque, o limite à compensação, seja de 25% ou 30%,
torna parte do pagamento válido, concedendo, assim, eficácia parcial
a lei nula de pleno direito.” (ERESP nº 189052/SP, Relator Ministro
Paulo Medina, DJ de 03.11.2003).
8. O Superior Tribunal de Justiça preconiza que, na compensação ou
restituição de indébito tributário, os expurgos inflacionários devem
ser aplicados, utilizando-se: a) no mês de janeiro de 1989, o IPC no
percentual de 42,72%; b) no mês de fevereiro de 1989, o IPC no
percentual de 10,14%; c) no período de março de 1990 a janeiro de
1991, o IPC; d) a partir de fevereiro de 1991, com a promulgação
da Lei nº 8.177/91, vigora o INPC, a ser adotado até dezembro de
1991; e e) a partir de janeiro de 1992, a UFIR, na forma preconizada
pela Lei nº 8.383/91, até 31.12.1995, com o advento da Lei
nº 9.250/95, época em que o índice foi substituído pela ta SELIC,
que compreende ta de juros reais e ta de inflação a ser considerada
a partir de 1º de janeiro de 1996, inacumulável com qualquer
outro índice de correção monetária ou com juros de mora (Precedentes:
EREsp 195819/SP, Relator Ministro Francisco Peçanha
Martins, Corte Especial, DJ de 03.11.2003; EREsp 165463/CE, Relator
Ministro Demócrito Reinaldo, Primeira Seção, DJ de
21.06.1999; EDcl no REsp 728642/SP, Relator Ministro José Delgado,
Primeira Turma, DJ de 17.10.2005; AgRg nos EDcl nos EDcl
no REsp 658859/RS, desta relatoria, Primeira Turma, DJ de
26.09.2005; REsp 773215/SE, Relator Ministro Teori Albino Zavascki,
Primeira Turma, DJ de 26.09.2005; REsp 608734/SP, Relator
Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 03.11.2004).
9. Agravo regimental desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA
TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade
dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar
provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Denise Arruda e
José Delgado votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.
Brasília (DF), 27 de novembro de 2007(Data do Julgamento)