Processo Civil

Agravo de Instrumento. Ação Cautelar de Busca e Apreensão de Coisa Certa. Decisão que deferiu liminarmente a busca e apreensão. Preliminar de prescrição. Ônus probandi.

Agravo de Instrumento. Ação Cautelar de Busca e Apreensão de Coisa Certa. Decisão que deferiu liminarmente a busca e apreensão. Preliminar de prescrição. Ônus probandi. 

 

 

Fernando Machado da Silva Lima*

 

 

EGRÉGIA XXXXXXX CÂMARA CÍVEL ISOLADA

 

                    PROCESSO :  XXXXXXXXX

 

RECURSO:       AGRAVO        

 

AGRAVANTE: XXXXXXXXXXXXXXXXX

 

                    AGRAVADO: XXXXXXXXXXXXX

 

                    RELATORA:  EXMA.  DESA. XXXXXXXXX

 

PROCURADORA DE JUSTIÇA: XXXXXXXXXXXXXX

 

 

 

Ilustre Desembargadora  Relatora:

 

 

 

Trata o presente do Agravo de Instrumento interposto por XXXXXXXXXXXX, nos Autos da Ação Cautelar de Busca e Apreensão de Coisa Certa ajuizada por XXXXXXXXX. e XXXXXXXXXXXXX.

 

 

Em síntese, os autos informam que:

 

 

1. A XXXXXXXXX, ora Agravada, ajuizou (fls. 16-20), Ação Cautelar de Busca e Apreensão de Coisa Certa, contra XXXXXXXXX. e contra a ora Agravante. Disse que diversas madeireiras têm invadido a Fazenda Paranoá, de sua propriedade, para extrair madeira. Disse que houve inquérito policial e fiscalização pelo IBAMA, conforme documentos. Disse que foi apreendido maquinário da madeireira XXXXXXXX, bem como 377 toras de madeira. Afirmou ainda que a madeira e as máquinas sumiram misteriosamente e que foram posteriormente encontradas no pátio daquela empresa. Disse que a Madeireira XXXXXXXX também foi autuada, conforme documentos que anexa e que deveria devolver à Requerente 860m3 de madeira. Alegou que existe o fumus boni juris, juntando ainda escritura pública comprobatória da propriedade. Pediu a concessão da medida liminar inaudita altera pars, para que seja realizada a busca e apreensão,  porque existe o periculum in mora, haja vista que já ocorreu o dano e porque as Requeridas podem vender a madeira a terceiros.

 

         2. A MMa. Juíza determinou (fls. 24) que fosse emendada a Inicial, para esclarecer se a madeira, no total de 860m3, chegou a ser retirada da Fazenda Paranoá.   

 

          3. A XXXXXXXX, ora Agravada, juntou documento (fls. 26-27), informando que no dia 20.12.90 uma equipe do IBAMA autuou a XXXXXXXXX e apreendeu as máquinas e a madeira, mas a Requerida, na calada da noite, retornou ao local e retirou os 800m3 de madeira apreendida, depositando-a em seus pátios.

 

4. A MMa. Juíza despachou (fls. 28), deferindo liminarmente a busca e apreensão.

 

5. A XXXXXXXXXXXXX interpôs Agravo (fls. 2-13). Disse que a Agravada não apresentou qualquer documento que possa confirmar sua alegação. Disse que a petição inicial não deveria nem ter sido despachada. Alegou que o direito da Agravada estava prescrito, porque o pretenso ato ilícito da Agravante teria ocorrido em 20.12.90. Citou o art. 178, § 10, IX do Código Civil Brasileiro. Citou jurisprudência e doutrina. Disse ainda que não existe nos Autos qualquer prova de que a madeira apreendida pelo IBAMA teria sido retirada pela Agravante do imóvel da Agravada. Disse que somente agora, decorridos cinco anos e onze meses, a Agravada veio alegar que a Agravante retirou a madeira da Fazenda Paranoá. Comprovou que o Agravo é tempestivo. Disse que cabe a atribuição do efeito suspensivo ao Agravo, porque existem o fumus boni juris e o periculum in mora. Pediu o provimento do Recurso e a extinção da Ação em relação à ora Agravante.

 

6. O Ilustre Desembargador Relator, XXXXXXXXXX, indeferiu (fls. 32) o pedido de concessão de medida liminar.

 

7. A Agravante requereu (fls. 33-35) reconsideração desse Despacho. Disse que ocorreu a prescrição qüinqüenal. Disse que não existem provas do ato a ela atribuído e que corre o risco de ter madeira de propriedade de terceiros apreendida. Disse que se a ação for julgada procedente, se traduzirá em indenização, no valor estipulado pela Agravada, ou seja,  R$43.000,00.

 

8. O Ilustre Desembargador Relator reconsiderou (fls. 36) sua Decisão, exigindo porém que a Agravante prestasse uma caução, a ser arbitrada pelo Juízo a quo.

 

 9. O MM. Juiz de Direito da Xª Vara da Comarca de Paragominas, Dr. XXXXXXXXXX, informou (fls. 39-40). Historiou os acontecimentos e disse que a XXXXXXXXX deveria devolver à Requerente 860m3 de madeira, no valor total de R$43.000,00, o que não foi feito. Disse que concedeu a liminar porque entendeu suficientemente provados com a Inicial os pressupostos para a sua concessão. Disse que o Oficial de Justiça certificou que o Mandado de Busca e Apreensão não foi cumprido, por não ter sido encontrada a madeira. Juntou documentos (fls. 41-74).

 

10. Não foram apresentadas Contra-Razões, conforme Certidão de fls. 81. Redistribuído o Processo, veio a esta Procuradoria, para exame e parecer.

 

 

 

É o relatório. Esta Procuradoria passa a opinar:

 

 

         Insurge-se a Agravante contra a respeitável Decisão de fls. 28 dos Autos, pelo qual a MMa. Juíza deferiu liminarmente a busca e apreensão, mandando depositar os bens com a Requerente ou com quem fosse por ela indicado. Alega a Agravante, principalmente, que o que ficou provado nos Autos foi que o IBAMA apreendeu a madeira e a depositou nos pátios da Agravada, isso em 20.12.90, conforme realmente se verifica pelos documentos de fls. 21 (Auto de Infração do IBAMA) e fls. 22-23 (Relatório). Alega ainda  que não existe qualquer documento nos Autos que comprove que a Agravante ficou com os 860m3 de madeira pertencentes à Agravada. Diz ainda que

 

 

Se a ofensa ou o dano praticado pela agravante na propriedade da agravada se deu em 20.12.90, conforme atestam os documentos juntados pela própria agravada, o direito de ação extinguiu-se em 19.12.95. O direito de ação está prescrito.

 

 

Assim, à semelhança da proteção constitucional dos direitos adquiridos, destinada a garantir a segurança jurídica, trata-se aqui, preliminarmente, de uma hipótese de prescrição, ou seja, da extinção de uma ação ajuizável, em virtude da inércia de seu titular, durante um certo lapso de tempo, na ausência de causas preclusivas de seu curso, visando o legislador evitar a indefinida perpetuação das incertezas, que resultaria da inexistência de prazos prescricionais ou decadenciais.

 

O Patrono da ora Agravante alegou a prescrição especial (Código Civil,  art. 178, § 10, IX).

 

 Esta Procuradoria entende ser evidente que a prescrição realmente ocorreu em cinco anos, nos termos desse artigo, porque se trata de ação por ofensa ou dano causados ao direito de propriedade, devendo o prazo ser contado a partir da data em que se deu essa ofensa ou dano.

 

A prescrição extingue não apenas a ação, mas, indiretamente, o direito, de modo que após o decurso do prazo fixado pelo legislador para a duração da possibilidade de que seja o ato realizado com eficácia jurídica, se o titular do direito se manteve inerte, a lei tranca a ação judicial de que poderia ele se ter valido tempestivamente para exercê-lo.

 

Por essa razão, a inércia torna presumível o desinteresse da ora Agravada, conforme o brocardo latino: dormientibus non succurrit jus, não podendo ela assim  pretender acionar a ora Agravante,  após decorridos  quase seis anos da ocorrência do dano que alega.

 

No dizer de Orlando Gomes, a aplicação do instituto da prescrição se destina a consolidar pelo decurso do tempo as situações jurídicas que, ao contrário, permaneceriam indefinidamente incertas e sujeitas a dúvidas e controvérsias.

 

         Afirma ainda a Agravante que, mesmo superada a preliminar de prescrição e mesmo que se entendesse que a Agravada ainda poderia pleitear a apreensão ou a indenização da madeira, seria preciso comprovar o alegado, porque

 

não existe nos Autos qualquer prova de que a ora agravante tenha se apropriado e retirado do imóvel da agravada a madeira apreendida pelo IBAMA. Após a apreensão pelo IBAMA a ora agravante se retirou do local da extração, e não mais retornou. A madeira apreendida foi deixada no local da extração. Já decorreram mais de cinco anos do fato imputado à agravante. Não sabe a  mesma que fim levaram as toras cortadas. O certo é que não foram retiradas pela agravante.

 

         Impende ressaltar que o onus probandi incumbe à XXXXXXXXXXX, ora Agravada, porque é certo que pelo princípio do ônus da prova, quando alguém possui uma pretensão, e deseja que a mesma seja reconhecida através da via jurisdicional, deve em  regra provar o fato constitutivo da relação litigiosa. Sobre isso fala o mestre Moacyr Amaral dos Santos:

 

Ambas as regras impõem ao autor a prova do fato em que se fundamenta o pedido, ou seja, do fato constitutivo da relação jurídica litigiosa. A conseqüência é que, não provado pelo autor o fato constitutivo, o réu será absolvido.

(Moacyr Amaral dos Santos – Primeiras Linhas de Direito Processual Civil)

 

                 Corroborando o entendimento, ensina Ernane Fidelis dos Santos:

 

Um dos mais relevantes princípios subsidiários da verdade real é o da distribuição do ônus da prova. De acordo com tal distribuição, o fato deve ser provado por essa ou aquela parte, de tal forma que ao juiz não deixe nenhuma dúvida, que se interpreta sempre contra quem tem o encargo probatório. (Ernane Fidelis dos Santos – Manual de Direito Processual Civil) (o grifo é nosso)

 

          Tal princípio foi acolhido pelo inciso I do art. 333 do CPC, que por sua vez reza:

 

      Art. 133. O ônus da prova incumbe:

 

I – ao autor, quando ao fato constitutivo do seu direito;

 

 O que se observa pelas declarações da Agravada, constantes da Exordial, é que em relação à primeira Requerida, XXXXXXXXXXXX, em data de 19.12.95, foram apreendidas máquinas e 377 toras de madeira, que apesar de apreendidas, teriam sido retiradas na calada da noite, para os pátios da madeireira autuada (fls. 17-18); enquanto que em relação à segunda Requerida, ora Agravante, foi lavrado Auto de Infração e Termo de Apreensão e deveria devolver (?) à Requerente 860m3 de madeiras de essências diversas, fato este não consumado, tudo comprovado por farta documentação anexada a esta (fls. 18). Às fls. 27, em atenção à Decisão da MMa. Juíza que ordenou fosse emendada a Inicial,  a Agravada afirmou ainda que

 

Apesar de ter sido a Requerida autuada em flagrante pelos agentes do IBAMA, fez pouco caso dos mesmos e das leis e normas que regem este País, e na calada da noite, retornou ao local de exploração e retirou os 800 m3 de madeira apreendida, depositando-a em seus pátios como se agindo corretamente.(aqui, já afirma que são 800, em vez de 860m3)

 

         Realmente, essa alegação não foi provada nos Autos, não podendo assim levar ao entendimento de que a Agravada tem direito a ser ressarcida pelo que apenas alega, como se estivesse amparada pelo fumus boni juris. Ao contrário, esta Procuradoria entende que todas as razões jurídicas militam a favor da Agravante, porque não se compreende que a Agravada, tendo sido retirada a madeira pela Agravante em 1.990, somente em 1.996 tenha se lembrado de pedir à Justiça sua busca e apreensão. O que parece ter ocorrido é que, tendo sido apreendidas as máquinas e a madeira extraída pela XXXXXXXXXX, em dezembro de 1.995, a Agravada contratou advogado, para requerer a busca e apreensão, e decidiram acionar também a XXXXXXXX, ora Agravante, com referência a um fato ocorrido em dezembro de 1.990, esquecendo que, nos termos do art. 178, § 10, inciso IX, do Código Civil Brasileiro, essa ação prescreve em cinco anos.

 

         O Bom Direito está com a Agravante, além do periculum in mora, porque se concretizada a busca e apreensão, a Agravante poderia realmente sofrer prejuízos de difícil reparação, assim como terceiros de boa fé, conforme demonstrado na Exordial, às fls. 11.

 

Por todo o exposto, esta  Procuradoria de Justiça opina pelo conhecimento do Agravo e pelo seu provimento, para que seja reformada a respeitável decisão hostilizada.

 

 

 

                   É o parecer.

 

                      Belém,     dezembro   de 1999

 

 

                    Procuradora de Justiça

 

 

* Professor de Direito Constitucional da Unama

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Como citar e referenciar este artigo:
LIMA, Fernando Machado da Silva. Agravo de Instrumento. Ação Cautelar de Busca e Apreensão de Coisa Certa. Decisão que deferiu liminarmente a busca e apreensão. Preliminar de prescrição. Ônus probandi.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/estudodecaso/processo-civil-estudodecaso/agravo-de-instrumento-acao-cautelar-de-busca-e-apreensao-de-coisa-certa-decisao-que-deferiu-liminarmente-a-busca-e-apreensao-preliminar-de-prescricao-onus-probandi/ Acesso em: 22 dez. 2024