Direito Penal

Da Prática da Discriminação e do Preconceito como Crime

Da Prática da Discriminação e do Preconceito como Crime*

A conduta que contrariar a norma, incidindo no tipo penal definido em lei, será denomina como ato antijurídico, ou seja, um comportamento contrário ao que prescreve o Direito. Deve o infrator responder pela respon¬sabilidade penal, se a conduta praticada estiver expressamente proibida em dispositivo penal como um delito ou um crime. Citemos como exemplo, o fato de um pessoa que dispara uma arma de fogo contra alguém, vindo este a falecer. Na esfera penal o infrator estará sujeito a um processo criminal porque sua conduta incidiu no tipo penal (matar alguém), contrariando a norma que estabelecia como dever legal “não matar”. Será julgado pelo fato imputado, definido como crime no Art. 121 do Código Penal, sujeito às penas cominadas, se for condenado, de reclusão de seis a vinte anos.

Para o direito penal brasileiro, a prática da discriminação e do preconceito por raça, etnia, cor, religião ou procedência nacional consiste em um delito previsto na lei 7.716/89, alterada pela lei 9.459/97. As referidas legislações foram promulgadas em consonância com o Art. 5º, inciso XLI, que estabeleceu, em foro Constitucional, a prática do racismo como crime inafiançável e im¬prescritível, sujeito à pena de reclusão.

A lei 9.459, de 13.05.1997, corrigiu a Lei 7.716, de 15.01.1989, modificando os arts. 1º e 20º, e revogando o art. 1º da Lei 8.081 e a Lei 8.882, de 03.06.1994. Além de punir, com penas de até cinco anos de reclusão, e multas, os cri¬mes resultantes de discriminação ou precon¬ceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência na¬cional, introduziu no Art.140 do Código Penal o parágrafo terceiro, tipificando a injúria com utilização de elementos relacionados a raça, cor, etnia, religião ou origem, com penas de reclusão de um a três anos, mais multas.

a) Condutas definidas como crime de prática de discriminação e preconceito de raça, cor, etnia, ou procedência nacional.

Lei nº 7.716, de 05 de Janeiro de 1989, alterada pela Lei 9. 459, de Maio de 1997.

Art. 1º

Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação e de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Acrescentado pela Lei 9.459, de 13 de maio de 1997.

Comentários: O Artigo primeiro estabelece que as condutas abaixo descritas são consideradas crimes de discriminação ou de preconceito. Portanto estão proibidas sob pena do infrator estar sujeito a um processo criminal que será movido pelo Ministério Público. O bem jurídico protegido pela lei é o direito ao tratamento igualitário. Neste sentido a lei reforça o dispositivo do Art. 5º ”caput” e regulamenta o inciso XLII.

Art. 2º (vetado)

Art. 3º

Impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da Administração Direta ou Indireta, bem como das concessionárias de serviços públicos.

Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

Comentários: Impedir é criar obstáculo, proibir, obstruir, estorvar, embaraçar, de qualquer maneira, o acesso de alguém, que esteja habilitado, a qualquer cargo, nas entidades descritas. Obstar é opor-se, causar embaraço. Ambos os verbos são sinônimos. O dispositivo visa proteger o tratamento igualitário entre os postulantes devidamente capacitados a cargos no serviço público.

Art. 4º

Negar ou obstar emprego em empresa privada.

Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

Comentários: Basta a negativa ou impedimento para que se materialize o crime. São figuras semelhantes (esta e a hipótese infra) tratadas de forma diversa. O dispositivo visa proteger o tratamento igualitário ao acesso a vagas de trabalho oferecidas pelas empresa da iniciativa privada.

Art. 5º

Recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador:

Pena: reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos.

Comentários: Permitir o ingresso mas não o atender, servir, ou receber, calcado em preconceito ou discriminação, também caracteriza o crime. Cometerá o crime o preposto, o dono ou o empregado do estabelecimento. O dispositivo visa proteger o tratamento igualitário nos estabelecimentos comerciais.

Art. 6º

Recusar, negar, ou impedir a inscrição ou ingresso de aluno em estabe¬lecimento de ensino público de qualquer grau.

Pena: reclusão de 3 (três) a 5 (cinco) anos.

Comentários: Recusar e negar têm o mesmo sentido: opor-se, rejeitar. É bastante a recusa de inscrever ou impedir o ingresso de aluno em estabelecimento de ensino, não importa se público ou privado, nem o grau em questão. O dispositivo visa proteger o tratamento igualitário no acesso aos estabelecimentos de ensino.

Parágrafo Único – Se o crime for praticado contra menor de 18 (dezoito) anos a pena é agravada de 1/3 (um terço).

Art. 7º

Impedir o acesso ou recusar hospedagem em hotel, pensão, estalagem, ou qualquer estabelecimento similar.

Pena: reclusão de 3 (três) a 5 (cinco) anos.

Comentários: Hotel, estalagem, pensão ou qualquer estabelecimento similar: quando impedido o acesso ou negada a hospedagem. Não importa onde estejam localizados esses estabelecimentos. O simples obstáculo ou a oposição à hospedagem é indicativo do crime. Permitir o ingresso mas recusar hospedagem configurará o crime, porque de nada adiantará o ingresso nesses locais se houver recusa em hospedar a pessoa. O dispositivo visa proteger o tratamento igualitário no acesso aos serviços acima mencionados.

Art. 8º

Impedir o acesso ou recusar atendimento em restaurantes, bares, confei¬tarias, ou locais semelhantes, abertos ao público.

Pena: reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos.

Comentários: vide anterior

Art. 9º

Impedir o acesso ou recusar atendimento em estabelecimentos esportivos, casas de diversões, ou clubes sociais abertos ao público:

Pena: reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos.

Comentários: vide anterior

Art. 10º

Impedir o acesso ou recusar atendimento em salões de cabeleireiros, bares, termas ou casas de massagem ou estabelecimentos com as mesmas finalidades:

Pena: reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos.

Comentários: vide anterior

Art. 11º

Impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou escada de acesso aos mesmos:

Pena: reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos.

Comentários: Consuma-se o crime ao se impedir qualquer pessoa de ter acesso a esses locais, determinando-lhe uma entrada específica e causando-lhe constran¬gimento e vergonha. O dispositivo visa proteger o tratamento igualitário no acesso às entradas sociais em edifícios públicos e privados.

Art. 12º

Impedir o acesso ou uso de transportes públicos, como aviões, navios, barcos, ônibus, trens, metrô, ou qualquer outro meio de transporte concedido:

Pena: reclusão de 1(um) a 3 (três) anos.

Comentários: Incide também o tipo penal em restrições ao acesso ou uso de heli¬cóptero, táxi aéreo, charrete, táxi, motocicleta-táxi. O dispositivo visa proteger o tratamento igualitário no acesso aos meios de transportes.

Art. 13º

Impedir ou obstar o acesso de alguém ao serviço em qualquer ramo das Forças Armadas:

Pena: reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.

Comentários: As forças Armadas constituem-se da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. As polícias militares e os corpos de bombeiros, como forças auxiliares e reserva do Exército, não escapam a essa norma, assim como, também é crime obstar ou impedir o acesso ao serviço dessas coorporações. O dispositivo visa proteger o tratamento igualitário dos postulantes, devidamente capacitados, no acesso ao serviço das Forças Armadas.

Art. 14º

Impedir ou obstar, por qualquer meio ou forma, o casamento ou convivência familiar ou social:

Pena: reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.

Comentários: Meio é o recurso empregado para atingir um objetivo. Forma é a maneira, o jeito, o modo. O dispositivo visa proteger o convívio familiar e social e a liberdade para contrair núpcias entre os indivíduos.

Art. 15º (vetado)

Art. 16º

Constitui efeito da condenação a perda do cargo ou função pública, para servidor público, e a suspensão do funcionamento do estabelecimento particular por prazo não superior 3 (três) meses.

Art. 17º (vetado)

Art. 18º

Os efeitos de que tratam os arts. 16 e 17 desta Lei não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença.

Art. 19º (vetado)

Art. 20

Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

Acrescentado pela Lei 9.459, de 13 de maio de 1997.

Pena: reclusão de um a três anos e multa

Comentários: Praticar o crime é realizá-lo com esforço próprio. O próprio agente o comete. Induzir é persuadir, aconselhar, argumentar. Pressupõe a iniciativa à prática, que pode ocorrer por qualquer meio. Incitar é instigar, provocar a prática do crime, por qualquer meio ou de qualquer forma, sem necessidade de que isso aconteça através de meios de comunicação social ou publicação. O dispositivo penal visa proteger o tratamento igualitário que todos os cidadãos possuem como direito subjetivo independente de raça, cor, etnia ou procedência nacional.

§ 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo.

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação ou publicação de qualquer natureza.

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

§ 3º No caso do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar que seja ouvido o Ministério Público, ou que, a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de desobediência:

I – o recolhimento imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material respectivo;

II – a cassação das respectivas transmissões radiofônicas ou televisivas.

§ 4º Na hipótese do § 2º, constitui efeito de condenação, após o trânsito em julgado da decisão, a destruição do material apreendido.

b) conduta definida como crime contra honra utilizando-se de elementos referentes à raça, cor, acr

escentado pela Lei 9.459, de 13 de maio de 1997.

Código Penal

Art. 140

Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou decoro:

Pena: detenção, de 1 (um) a 6(seis) meses, ou multa.

§ 3º Se a injúria consiste da utilização de elementos relacionados à raça, cor, etnia, religião ou origem:

Pena: reclusão, de 1( um )a 3 ( três) anos e multa.

Comentário: De acordo com a intenção da lei nova, chamar alguém de “negro”, “preto”, “pretão”, “negão”, “turco”, “africano”, “judeu”, “baiano”, “japa”, etc. desde que com vontade de lhe ofender a honra subjetiva relacionada com a cor, religião, raça ou etnia, sujeita o autor a uma pena mínima de 1 (um) ano de reclusão, além de multa.

* Texto enviado de forma anônima.

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Como citar e referenciar este artigo:
ANÔNIMO,. Da Prática da Discriminação e do Preconceito como Crime. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/doutrina/direitopenal/da-pratica-da-discriminacao-e-do-preconceito-como-crime/ Acesso em: 07 dez. 2024