No último dia 07 de Setembro tivemos um relativamente vigoroso movimento contra a corrupção no Estado, especificamente aquela envolvendo o dinheiro
público (há outras, muitas outras. Quem lida com fiscais do Estado sabe do que eu estou falando). Vi que entusiasmou muita gente, mas não a mim. O
movimento na verdade me levou a meditar sobre a importância do combate à corrupção estatal. O mínimo que posso dizer é que manifestações dessa natureza
são inócuas, pois as multidões em marcha não têm como mobilizar o aparelho repressivo do Estado para além do que ele se mobiliza automaticamente. E o
faz seletivamente: os alvos são sempre ou adversários políticos do partido governante ou a parte da base aliada que costuma se rebelar contra os
caprichos da presidente.
O primeiro ponto é que a corrupção estatal é sintoma de uma doença maior, que se encontra latente em toda gente, em cada indivíduo. O Estado será mais
corrupto quanto mais a população escolher gente corrupta para governar e é isso que tem sido feito. O PT e seus aliados são os piores no poder, a gente
mais degenerada que poderia ser escolhida enquanto governante. A população eleitora vota nos piores para o poder alegremente, na expectativa não de que
venham a fazer um bom governo – intuitivamente os eleitores sabem não ser possível ter bom governo com gente no naipe de Lula e de Dilma Rousseff – mas
porque sempre almeja um benefício pessoal, mais das vezes descasado do bem comum. É o caso típico dos funcionários públicos, que sabem que o PT vai
gerar mais vagas de emprego público e vai dar mais aumentos de salário, enquanto um governante sério faria precisamente o oposto.
O mesmo pode ser dito dos aposentados, vastas legiões de eleitores que sabem que o PT não mexerá na sua renda, quando o tempo exige que sua renda seja
minorada. Assim também os portadores de bolsa-qualquer-coisa. E mais ainda os recebedores de salário mínimo, com aumento cavalar já previsto para 2012,
ano eleitoral. Essa corrupção miúda, salário mínimo, não mobiliza e não sensibiliza ninguém.
Vemos então que a corrupção que explode com o Tesouro público nasce muito antes no coração dos anseios particularistas das ambições miúdas. Por um
punhado de dinheiro vende-se não apenas o voto, o apoio político, a mobilização: vende-se a alma. Foi isso que levou Lula ao poder, que levou Hitler ao
poder. O discurso populista encontra terreno fértil na alma de cada eleitor corrompido. Não é possível que o bem comum seja perseguido pelo Estado sem
que ele contrarie frontalmente os interesses particularistas que os eleitores dos piores no poder desejam manter. Portanto, é inútil mobilizações de
marcha contra a corrupção, pois muitos dos marchadores não passam de hipócritas que acreditam que seja possível construir um governo sadio sem que os
egoísmos particularistas sejam abandonados. O maior de todos os egoísmos é a politização de tudo, que peleja para que benefícios particularistas sejam
sacramentados na forma de lei. O sistema jurídico brasileiro hoje foi transformado numa gigantesca fábrica de privilégios. É a quintessência da
corrupção. Tudo legal, tudo “direito” conquistado.
Eu até escrevi um artigo quando apareceu o movimento “Cansei” (Idiotas cansados), que desapareceu sem deixar vestígios. Obviamente que o movimento
atual é da mesma natureza e desaparecerá como o carnaval em uma quarta feira de cinzas.
Há ainda uma razão pela qual eu descreio dessas marchas contra a corrupção, como descri das marchas pela paz e outras assemelhadas. Teve gente que
andou propondo até que atos de corrupção sejam tidos como crime hediondo, elevando-o acima de crimes muito mais graves. Ora, eu considero o roubo de
uma galinha no quintal de um vizinho um crime mais severo do que o desfalque milionário no Tesouro. Porque a galinha é de alguém mais pobre e do nome
do proprietário eu sei. O Tesouro é um coletivo anônimo e dinheiro do Tesouro não é de ninguém, ou melhor, é da burocracia estatal e da classe
política. Analisado melhor, roubar a burocracia e a classe política, mormente quanto o ladrão é um deles, é irrelevante para a população em geral,
embora enraiveça aqueles da “categoria” que se queixam não do crime, mas do fato de terem ficado de fora do seu butim.
Não reconheço no Estado sacralidade alguma que torne os crimes contra ele mais sérios do que crimes contra pessoas. Isso é estrabismo existencial. O
Estado não é o substituto de Deus. É, propriamente, o seu oposto, o representante das forças demoníacas. Aqueles que julgam diferente disso não sabem o
que é o Estado. De minha parte, penso que o melhor que faríamos é lutar, até mesmo com passeatas, para reduzir o Estado, sua tributação, seu
funcionalismo, seus clientes. Essa é minha luta, para isso labuto noite e dia. Infelizmente, vejo-me sozinho como um Dom Quixote. Aliás, bom lembrar
aqui do herói manchego: Dom Quixote lutou para libertar os galeotes, pois El Rey não deveria aprisionar criaturas que Deus pôs no mundo para a
liberdade, muito ao contrário. A hipertrofia do Estado tem tido como conseqüência apavorante – terrificante – a hipertrofia das prisões. Se alguém
rouba o Estado está ajudando a enfraquecê-lo, o que é algo de bom em si. Minha luta é por melhorar os eleitores, que essa gente da política e da
burocracia já vendeu a alma ao diabo há muito tempo.
* José Nivaldo Cordeiro, Executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias
coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor
da ANL – Associação Nacional de Livrarias.