Trânsito

Lei Seca – Decisão Previsível

O artigo abaixo foi escrito um mês após a publicação da Lei Seca em 2008.  Nos últimos dias a decisão do STJ causou espanto em todo o país, porém
ficará fácil entender que a decisão era previsível desde então.  Reproduzimos para que o leitor tire suas conclusões e compreenda a decisão. 
Importante ressaltarmos que tal decisão traz implicações apenas na parte criminal e não na administrativa, portanto para que não restem dúvidas a
recusa a submissão ao exame legitima o agente de trânsito autuar pela recusa.

Nesses dez anos de Código de Trânsito o tratamento da ingestão de álcool e condução de veículos sofreu uma inversão conceitual de 180 graus, pois
havia a infração administrativa de excesso de alcoolemia e o crime de embriaguez, e atualmente há a infração de ingestão de álcool (qualquer
quantidade) e crime de excesso de alcoolemia.

O texto original do Código de Trânsito previa no Art.165 a infração de conduzir veículo com mais de 6 decigramas
de álcool por litro de sangue (0,3mg/l ar), portanto somente haveria infração se a pessoa fizesse o exame de bafômetro por ter critério objetivo. 
Já o crime do Art. 306 usava a expressão ‘sob influência de álcool’, sem necessariamente constar a quantidade, e outras provas tais como
testemunhal, filmagens, gravações, etc., poderiam caracterizar a ocorrência do crime.

Em 2006 a Lei 11.275 (Publ. 07/02/2006) promoveu uma mudança na infração administrativa, e legitimou a autuação
do Art. 165 também pela recusa, ou seja, a infração seria caracterizada ou porque o infrator fez o exame e o resultado superava os 6 decigramas por
litro de sangue ou porque, tendo sido oferecido o bafômetro, haveria recusa na submissão ao exame.  Não houve modificações no crime de embriaguez
do Art. 306.

Agora a Lei 11.705 (Publ. 20/06/2008) autoriza que a infração administrativa seja lavrada em três sitações: 1) o
infrator sujeitou-se ao exame e o resultado foi superior a 2 decigramas por litro de sangue (0,1mg/l ar) considerando a tolerância; 2) tendo sido
oferecido o exame o infrator recusa-se a realizá-lo; 3) o próprio agente, em face do estado que o infrator se apresenta, está legitimado a autuá-lo
pela infração administrativa, cuja conseqüência é a multa de R$ 957,70 e mais a suspensão do direito de dirigir por 12 meses.   Já o crime passou a
ser de excesso de alcoolemia, pois o Art. 306 passou a tipificar como crime a condução de veículo com valor igual ou superior a 6 decigramas por
litro de sangue, e se houver recusa ou por outro motivo não houver a determinação do exato valor de alcoolemia que se encontra a pessoa, não haverá
crime.  Casos que estão em curso, ocorridos antes da nova Lei,  de crimes do Art. 306 cujas provas tenham sido outras que não um exame que
objetivamente determinasse o valor de alcoolemia estarão prejudicados pois para enquadramento no tipo penal tornou-se indissociável o resultado
objetivo da alcoolemia.’

* Marcelo José Araújo – Secretário Municipal de Trânsito de Curitiba. Advogado e Professor de Direito de Trânsito

Como citar e referenciar este artigo:
ARAÚJO, Marcelo José. Lei Seca – Decisão Previsível. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2012. Disponível em: https://investidura.com.br/colunas/transito-colunas/lei-seca-decisao-previsivel/ Acesso em: 22 nov. 2024