Quando da ocorrência de um acidente de trânsito, percebemos que, em algumas situações, os agentes policiais que comparecem para o atendimento lavram autuações por infrações administrativas que teriam ocorrido, sendo que algumas podem interferir no mérito e outras não. Algumas delas, tais como do excesso de álcool, podem comprometer inclusive o contrato de seguro do veículo.
Primeiramente nos cabe questionar a procedência da lavratura de autuações no caso de acidentes de trânsito. Partindo-se do princípio de que para haver uma autuação o agente da autoridade é quem deve verificar a ocorrência da infração, até porque é ele quem tem “presunção de veracidade”, não seria possível autuações com base em informações de testemunhas, mas tão-somente aquelas flagradas pelo agente. Partindo-se desse pressuposto, podemos separar as infrações naquelas que podem ser verificadas tanto antes quanto depois do acidente, e naquelas que somente quem viu o acidente pode ter certeza de sua ocorrência e quem as cometeu.
A falta de licenciamento, ou de equipamentos obrigatórios (salvo, logicamente, os danificados no acidente), são infrações que podem ser verificadas pelo agente em seu comparecimento, independente de ter ou não visto o acidente, e a autuação se dá no momento de sua verificação. Já a alcoolemia em excesso, ou a desobediência ao semáforo entendemos que somente se o agente foi uma das testemunhas é que pode haver autuação, jamais por informações de terceiros, mesmo que o condutor seja confesso. Exemplo: num acidente comparece a polícia e autua um dos condutores por não portar documentos de porte obrigatório (Carteira de Habilitação.p.ex. = infração leve). Dias depois, e após a seguradora ter ressarcido os envolvidos, descobre-se que o verdadeiro condutor estava alcoolizado e não tinha Carteira, e saiu do local, deixando o amigo como condutor, o qual apenas havia deixado a Carteira em casa. Tudo pode ser fruto, inclusive, de conivência entre os envolvidos. Quem garante que aquele que faz o bafômetro depois de um acidente realmente era o condutor se o policial (com presunção de veracidade, repetimos) não viu? Entendemos que tais fatos devam constar no Boletim de Ocorrência, mas jamais uma autuação que não foi flagrada por agente competente.
Em virtude disso é comum nos depararmos com uma irregularidade formal bastante comum em autuações ocorridas em acidentes, que é constar no Auto de Infração a HORA do comparecimento da polícia (ou até depois) como sendo a HORA da infração. Ora, se, conforme a Resolução 01/98 do Contran, a HORA é a da ocorrência da infração, a HORA que deveria constar seria a do último momento de condução do veículo, pois com o encerramento da condução (pelo acidente) encerrou-se a infração, diferentemente daquelas de equipamentos p.ex., cuja HORA será a da verificação, uma vez que o veículo ainda estaria na via pública, e para estar nela a documentação e os equipamentos deveriam estar em ordem. Entendemos que as infrações lavradas em acidentes, e que o flagrante por parte do agente era necessário mas foi com base em testemunhos ou confissão, são inconsistentes.
* MARCELO JOSÉ ARAÚJO – Advogado e Consultor de Trânsito. Professor de Direito de Trânsito da UNICURITIBA. Presidente da Comissão de Direito de Trânsito da OAB/PR
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