Sociedade

Solidariedade 2008

Solidariedade 2008

 

  

Ives Gandra da Silva Martins*

 

 

Evutchenko, poeta russo, visitou, quando jovem, uma vila de seu país, sendo recebido pelos maiores da cidade. Quando passava em frente a um cemitério, entrou para visitá-lo e ficou impressionado ao constatar que, nas lápides, não havia data de nascimento ou de morte, mas apenas a observação “viveu 3 anos”, viveu 5 anos” – a indicar que muitas daquelas pessoas haviam morrido muito jovens. Julgando tratar-se de um cemitério de crianças, manifestou interesse de conhecer onde eram enterrados os adultos, porém foi informado que aquele era o único cemitério da cidade. Espantado com a resposta, perguntou por que, então, aquelas pessoas haviam morrido tão jovens, ao que seu cicerone respondeu: “Nesta cidade, os anos só se contam a partir do momento em que a pessoa compreende que está no mundo para servir, e não para ser servido, aprendizado que, muitas vezes, dura até a velhice”.

 

Neste início de 2008, parece valer a pena refletir sobre a lição que Evutchenko aprendeu naquela visita e perguntar-nos se aprendemos a ser solidários, a criar uma sociedade solidária, a viver os valores familiares, profissionais e sociais?

 

Como o Brasil avançaria se os nossos governantes estivessem mais preocupados em dedicar-se exclusivamente a servir e não a se manterem no poder, a qualquer custo, lembrando a triste constatação do saudoso Roberto Campos: “Na política brasileira, há dois tipos de pessoas, os incapazes e os capazes de tudo”.

 

À evidência, não acompanho o pensamento de meu querido amigo, cujo brilhantismo e raciocínio tanta falta faz ao país, pois sei que a sua observação, embora válida para parcela considerável de nossos políticos, não é válida para um núcleo de brasileiros idealistas, que vive a política como forma de servir à nação e está disposta a tudo para criar uma nação melhor. Entre estes, poderia citar, a título apenas exemplificativo, Marco Maciel, Pedro Simon, Eduardo Suplicy, Patrus Ananias, Jefferson Peres. As divergências que mantenho com alguns não modifica o profundo respeito pela sua busca do bem comum, cujos caminhos nem sempre convergem para as mesmas soluções.

 

Gostaria, neste início de 2008, que, efetivamente, a lição apreendida pelo renomado poeta russo valesse também para todos aqueles que, pertencendo à sociedade “não governamental”, têm-se esquivado de participar da vida comunitária, quando poderiam fazê-lo engajando-se em organizações sociais do terceiro setor e contribuindo, assim, para reduzir os desníveis sociais existentes no Brasil.

 

Não apenas aos políticos, mas à sociedade cabe a tarefa de lutar por um mundo solidariamente mais justo. Em palestra de Clinton, a que assisti, a convite de Fernando Henrique, por ocasião da inauguração do instituto cultural do ex-presidente, dizia ele que a fortaleza da democracia americana encontrava-se mais na força das ONGs, do que na dos partidos, pois são elas que levam o povo a participar do fortalecimento da nação americana.

 

Se cada brasileiro dedicasse parcela de seu tempo a servir ao próximo, como voluntário, protestando menos e agindo mais, o país seria melhor.

 

Que aprendamos, todos, neste 2008, a exercer a cidadania. É o que este velho articulista deseja a todos os brasileiros.

 

 

 

* Professor Emérito das Universidade Mackenzie e UNIFMU e da Escola de Comando e Estado maior do Exército. Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, da Academia Paulista de Letras e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: http://www.gandramartins.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
AMPAS,. Solidariedade 2008. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/solidariedade-2008/ Acesso em: 06 out. 2024