Será que ainda há juízes em Berlim?
Moacir Leopoldo Haeser*
O Judiciário gaúcho sempre se notabilizou pela qualidade, preparo e independência de seus julgadores. Acórdãos do Tribunal gaúcho há muito tempo são citados em artigos de doutrina e julgados de outros Tribunais, servindo de paradigma em decisões corajosas e inovadoras. Pode-se afirmar que a jurisprudência da Corte estadual está sempre na vanguarda. Nossos juízes nunca tiveram receio de adotar posições de independência e até confronto, quando necessário, à realização da boa justiça. Nunca o Judiciário gaúcho se curvou à prepotência e ao arbítrio, nem nos períodos mais duros de nosso história. Ainda estão vivos na memória os famosos casos das “mãos amarradas” e do “seqüestro dos uruguaios”. O exemplo de juízes probos e independentes é parte da história e do presente de nosso Judiciário.
Passado o primeiro impacto da decisão inusitada do STJ, vozes se levantam aqui e ali, de entidades de classe, e não só dos advogados, congregados em exemplar movimento de resistência, mas de contadores, estarrecidos com a possibilidade de recalcular preço de emissão de ações, 17 anos depois, por um balancete, contra todas as normas técnicas de contabilidade e de direito comercial.
No Judiciário vozes altivas se levantam e gritam contra a usurpação da jurisdição do Tribunal. Resistem à invasão da competência e apontam desafiadoramente a ilegalidade e inconstitucionalidade da decisão. Indeferem pedidos e dão provimento a recursos contra decisões que violam a coisa julgada. Restabelecem a segurança jurídica que uma decisão precipitada causou. Repõe o império da lei aos caos jurídico que o acatamento, sem meditar, de uma decisão ilegal causava aos processos em curso. Já se inicia, no STJ, movimento pela extinção de Câmaras Especiais de Juízes de 1° Grau convocados, que se revelaram perigosas à estabilidade da jurisprudência do Tribunal. Embargos de Declaração opostos a decisões invocando balancetes são recebidos e determinado o contraditório, com ouvida da parte adversa, a denotar a possibilidade do efeito infringente, modificativo da decisão.
Não se poderia esperar outra coisa do Judiciário gaúcho. Certamente também o STJ haverá de reexaminar sua posição pela qualidade e sensibilidade de seus Ministros. Tal como no conto do francês Guillaume Andreux (século XVIII), quando o moleiro de Saint-Souci resistiu à ordem do rei Frederico II da Prússia para destruir o moinho que enfeiava a vista de seu palácio, podemos afirmar: SIM, AINDA HÁ JUÍZES EM BERLIM !
* Desembargador aposentado e advogado
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