Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção. (PAULO FREIRE)
A Lei nº 9.394 de 20 de Dezembro de 1996, estabeleceu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em que o Estado Democrático de Direito se compromete em
seus Artigos: 1º; 2º e 3º a aplicar os Princípios previstos na Constituição Federal de 1988, principalmente, no que concerne a uma educação voltada á
prática social, tendo como fim, “o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. As
normas estabelecidas se inscrevem dentro dos parâmetros norteadores do Art. 5º da Lei Maior que trata dos direitos e deveres individuais e coletivos que
são objeto dos incisos I ao LXXVIII e parágrafos. Estes são, em suma, os princípios fundamentais hoje genericamente denominados Direitos Humanos.
A Educação não pode se resumir as aventuras dos tecnocratas, quando pensada e discutida; fruto da conclusão prematura daquilo que o mundo moderno apresenta
como reações noticiosas, assimiladas pela explosão midiática. O pensamento sistêmico nos ensina, que mais do que ensinar e ser ensinado; deve-se
compreender o ‘núcleo gerador’, que induziu as propostas nascentes.
O exímio educador Paulo Freire nos ensina que: … “Esta é a razão pela qual nem sempre é viável a quem realmente opta pelas transformações fazê-las como
gostaria e no momento em que gostaria. Além do desejo de fazê-las, há um viável ou um inviável histórico do fazer” [1] ·
Quando falamos na ‘Arte de Ensinar’, devemos nos ater aos princípios gerais que norteiam a produção e a construção das bases do ensino, levando em
consideração o histórico de cada país e, a forma como foi conduzida toda a construção do conhecimento. São públicos e notórios as estatísticas educacionais
no Brasil; que na sua formação sócio-tecnocrática-educacional, desprezou os alicerces que sustentam a formação de docentes. Sempre relegado ao “banco do
regra-três”, os professores não receberam o status quo, para que arcassem com um conhecimento transdisciplinar ou interdisciplinar, para que; no
atual momento de dinâmica de mundo (tecnológico), pudesse estar preparado para assumir as responsabilidades de transferir conhecimento seguro ao corpo
discente, abarcando em seus ombros uma proposta de “fusão das ciências”, rompendo com a compartimentalização, simplesmente, pelo “fato de que os
professores não precisarão mais ficar pulando de escola em escola para dar aulas de física, química, geografia e história. Eles poderão cumprir sua carga
horária num mesmo colégio, ministrando disciplinas mais genéricas como ciências da natureza e ciências humanas” [2] (grifo nosso),
conforme posição de um colega, que avaliou a possibilidade de tais mudanças. A questão merece maior profundidade na reflexão, se nos ativerem as
estatísticas históricas na formação da sociedade brasileira, conforme preceitua Sérgio Buarque de Holanda “Para estudar o passado de um povo, de uma
instituição, de uma classe, não basta aceitar ao pé da letra tudo quanto nos deixou a simples tradição escrita. É preciso fazer falar a multidão imensa dos
figurantes mudos que enchem o panorama da história e são muitas vezes mais interessantes e mais importantes do que os outros, os que apenas escrevem a
história” [3].
O que estamos tentando trazer á tona da reflexão crítica, é que certas práticas de mudança, pode não estar totalmente maduro para as transformações
positivas a que se propõe. Se não foi realizado a ‘tarefa de casa’, ou seja, se o Estado em sua trajetória histórica não ofereceu subsídios necessários
para que o corpo docente se especializasse suficientemente para receber num dado ‘momento da história’ tais responsabilidades, não há como impô-las,
simplesmente para atender uma demanda da modernidade, levando em consideração a dinâmica de mundo, para se traçar um processo de mudança.
Vêem-se claramente os atalhos deficientes da iniciativa, de se interconectarem as Ciências, tendo o Estado-Tecnocrata, se omitido em investimento, e como
justificativas inócuas, de que isso melhoraria o sistema de avaliação do Ensino no Brasil, em termos qualitativos, vez que, as questões quantitativas no
que concerne aos fatores históricos, não seguem par e passo, os níveis adequados para tais mudanças no panorama educacional brasileiro, quando se fala; em
‘Reforma Curricular’. “O perigo da iniciativa, além do professor menos especializado, é que é mais difícil estruturar um roteiro de atividades quando o
currículo é muito aberto do que quando é mais fechado. E um dos principais problemas de nosso ensino, como sugeriu trabalho de Martin Carnoy (Stanford), que filmou e comparou aulas dadas no Brasil, em Cuba e no Chile, é que boa parte dos professores não consegue
organizar-se para aproveitar o tempo de que dispõe” [4].
Conforme nos ensina Paulo Freire:
… “Esta é a razão pela qual nem sempre é viável a quem realmente opta pelas transformações fazê-las como gostaria e no momento em que gostaria. Além do
desejo de fazê-las, há um viável ou um inviável histórico do fazer. Qualquer que seja o momento histórico em que esteja a sociedade, seja o do viável ou do
inviável histórico, o papel do trabalhador social que optou pela mudança não pode ser outro senão o de atuar e refletir com os indivíduos com quem trabalha
para conscientizar-se junto com eles das reais dificuldades da sua sociedade. Isto implica a necessidade constante do trabalhador social de ampliar cada
vez mais seus conhecimentos, não só do ponto de vista de seus métodos e técnicas de ação, mas também dos limites objetivos com os quais se enfrenta no seu
quefazer”…[5]
Infelizmente, se o sistema educacional brasileiro seguiu historicamente um rito cartesiano, fica difícil a aceitação de uma mudança drástica para um método
sistêmico e holístico, como forma de ruptura de adequação cultural; com aquilo que os sistemas educacionais de países desenvolvidos, encaram como
Parâmetros Curriculares, alocados no Século 19 em pleno Século 21.
O professor, senador da República e Ex- Ministro de Educação do Brasil Cristovam Buarque, assim se expressa: … “Além dos salários elevados, os
professores só poderão exercer suas funções se cada escola dispuser de equipamentos modernos. Da mesma forma que desde o século XIX não se pode imaginar
uma escola sem quadro-negro, não se pode, no século XXI, imaginar uma escola sem um sofisticado conjunto de equipamentos de teleinformática à disposição do
professor. Para que isso seja possível,
os órgãos de administração da educação precisam necessariamente manter um sistema permanente de formação para os professores, para atualizar tanto o
conteúdo de suas disciplinas quanto as novas técnicas pedagógicas .
A formação deve ser permanente, continuada, diária; é preciso criar sistemas de sabáticas para que os professores disponham de tempo integral, por
algumas semanas ou meses, a cada ano, para sua dupla atualização: na disciplina que ensinam e nas técnicas de ensino . No caso específico do Brasil, isso vai exigir mudanças substanciais na administração da escola pública. Primeiro, será necessário criar um Ministério da
Educação Básica. Enquanto o MEC cuidar simultaneamente do ensino básico e do ensino superior, essa última área dominará totalmente o uso de recursos e as
preocupações dos dirigentes nacionais. Em tais condições, o governo federal continuará cuidando do ensino superior e relegando o ensino básico aos
municípios e estados. O resultado será uma educação pobre e desigual. Pobre porque os estados e municípios têm poucos recursos. E desigual porque no Brasil
a diferença de renda entre os municípios chega a ser de quase 40 vezes. Além do Ministério da Educação Básica, será preciso criar junto à Presidência da
República uma Agência Nacional de Proteção da Criança, que coordene as ações de todos os ministérios e monitore, apóie e invista no desenvolvimento das
crianças, desde seu nascimento até o final do ensino médio” [6]. (grifo nosso).
Para se construir uma casa é necessária iniciar-se pelos alicerces: Especializar e treinar professores, dando-lhes suporte necessário para exercerem o
Magistério de forma digna. Em outras palavras, fica claro que as nossas justificativas contrárias a tais mudanças devem-se, principalmente pelo não
investimento do Estado-Juiz na formação de professores para que tais reformas fossem implementadas num dado momento histórico, que não justificaria e nem
seria viável agora, dado o paradigma, de que, a construção de uma casa, não pode ser iniciada pelo telhado.
Creio que está havendo um erro por parte dos tecnocratas do MEC – Ministério de Educação do Brasil; na interpretação do pensamento futurista dos grandes
educadores que valorizam o pensamento sistêmico e holístico: Interconectar ciências; não quer dizer, resumi-las em duas matérias: Ciências da Natureza e Ciências Humanas, conforme a interpretação que está sendo dada pelos tecnocratas e uma classe de educadores.
O que se tem que pesar é a forma adequada de interpretação das Ciências: Matemática, História, Geografia, Biologia, Informática, Ecologia, Química e
Física, congregando num pensamento em que o Todo está nas Partes e as Partes compõem o Todo. Ou seja, mudar o ciclo do pensar cartesiano; para o pensamento
sistêmico, holístico, humano-global. Isto é, interconexão de ciências; que se bifurcarão num entendimento maior da compreensão da Natureza Humana. Não é
simplificar as Ciências, é inseri-las integralmente na compreensão do humano e sua atuação no mundo.
Edgard Morin coloca de forma clara as novas tendências e uma forma viável de o Estado fazer sua tarefa de casa, na compreensão dos Sete Saberes da Educação
do Futuro:
“… Seremos capazes de civilizar a terra e fazer com que ela se torne uma verdadeira pátria? Estes são os sete saberes necessários ao ensino. E não digo
isso para modificar programas. Em minha opinião, não temos que destruir disciplinas, mas sim integrá-las, reuni-las em uma ciência como,
por exemplo, as ciências da terra (a sismologia, a vulcanologia, a meteorologia), todas elas articuladas em uma concepção sistêmica da terra. Penso que tudo deva estar integrado para permitir uma mudança de pensamento;
para que se transforme a concepção fragmentada e dividida do mundo, que impede a visão total da realidade. Essa visão fragmentada faz com que os problemas permaneçam invisíveis para muitos, principalmente para muitos governantes. E hoje que o
planeta já está, ao mesmo tempo, unido e fragmentado, começa a se desenvolver uma ética do gênero humano, para que possamos superar esse
estado de caos e começar, talvez, a civilizar a terra” [7]. (grifo nosso).
Se a casa não começa pelo telhado, não há como se reformar as bases curriculares, sem que o Estado crie condições necessárias, para que o professor se
prepare e entenda as mudanças, antes que ele possa se transformar num agente educacional transformador, elevando o nível educacional brasileiro.
* Joaquim José Marques Mattar, é professor universitário, escritor, Mestre em Direito Ambiental especializado em empreendimentos econômicos,
desenvolvimento e mudança social pela UNIMAR – Universidade de Marília-SP. MBA de Marketing Estratégico e de Negócios. Jornalista especializado em Crítica
de Cultura (FENAJ – Federação dos Jornalistas Profissionais). Autor de “O Agente Construtivo – como liderar e ser liderado sem perder a liderança”, (REGES
Editora Universitária, 2005). Autor de livros paradidáticos para o Ensino Fundamental pela INDIE – Editora & Livraria (Coleção Escola Urgente).
www.editoraindie.com.br . Roteirista de Televisão e Cinema e produtor executivo do curta-metragem “Lusófono & Lúcifer – O Filme (2012).
Notas:
[1] FREIRE, Paulo, Educação e Mudança, Paz e Terra. Rio de Janeiro, 1979, pg. 55.
[2] http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=83819
[3] http://pensador.uol.com.br/autor/sergio_buarque_de_holanda/
[4] http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=83819
[5] FREIRE, Paulo, Educação e Mudança, Paz e Terra. Rio de Janeiro, 1979, pg. 56.
[6] BUARQUE, Cristovam. Reescrevendo a Educação, Formação e invenção do professor no século XXI. São Paulo. Scipione, 2006.
http://oei.es/pdfs/reescrevendo.pdf .
[7] http://www2.ufpa.br/ensinofts/artigo3/setesaberes.pdf