Os meios de comunicação noticiaram largamente o caso de Elza, aquela que foi acusada de racismo em confronto de um motorista de ônibus com quem se desentendeu, por ter reclamado que o coletivo já estava demasiado cheio e que ele, no entanto, continuava a parar em todos os pontos permitindo a entrada de mais gente.
Do “bate boca” teria resultado alusão à cor da pele do referido senhor, a mesma da dela, negra. Em consequência, é conduzida à Delegacia onde acabou presa em flagrante delito “por este crime hediondo” e imediatamente conduzida para o “presídio de Tucum”, onde bem 600 mulheres estão de forma alheia à lei de execuções penais, segregadas.
Quem conhece o que significa usar transporte coletivo pode avaliar muito bem que se trata de um verdadeiro acinte tudo que acontece. Em “horários de pico”, estão sempre lotados – no caso, confirmado pela própria suposta vítima – acrescido de que homens e mulheres se vêm amontoados, onde desrespeitos de toda sorte acontecem, o que também representa autêntica violação aos direitos fundamentais da pessoa humana. É o descaso dos governantes e a pobreza que faz as pessoas às vezes sequer saberem que têm direitos.
A Constituição Federal no seu art. 4º assegura que a República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais entre outros relevantes, pelo princípio do repúdio ao terrorismo e ao racismo (inc. VIII). E consigna entre os direitos e garantias fundamentais que: a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei (art. 5º, XLII).
Para Miguel Reale, o racismo consiste em uma atitude cultural, fruto de construções ideológicas e programas políticos visando à dominação de um povo sobre outro ou de uma parte da população sobre outra. Esta afirmação encontra base na distinção entre racialismo e racismo: o primeiro pensa o mundo em termos de raça, enquanto o racismo é uma teoria e prática política, um programa político que pretende alcançar um objetivo de exclusão e segregação.[1]
Ante o que noticiaram os jornais, era impossível se imaginar que com o que Elza tenha dito, o que tiver dito, como disse, teria cometido crime de racismo, uma vez que pelo preceito constitucional (não comporta fiança, não prescreve) trata-se de crime doloso, aquele que é cometido com toda a vontade de causar o dano no mesmo comportado.
Depois, as cores (ou raça) de um e de outro era a mesma, ainda que não a mesma a condição. Ela mal paga, sem nenhuma segurança, ele com ao menos todas aquelas que sua profissão já conseguiu. Postos nos dois lados da balança, ele leva vantagem.
É temeroso ouvir-se falar tantas vezes em cometimento de crime de racismo. Crime é uma conduta tipificada no Código Penal Brasileiro que se reveste de muitos detalhes e que deve ser perquirido a fundo, avaliado em toda profundidade para que se for o caso de resultar em uma condenação, seja realmente justa.
Neste sentido o método fenomenológico se afigura sempre mais necessário no direito. É a filosofia dizendo que é preciso pensar.
Pode-se cometer um crime, ao condenar precipitadamente alguém. Neste caso, um hábeas corpus onde foram arguídas as razões aqui esposadas, foi de plano concedido pelo Juiz e ainda que só no terceiro dia, Elza voltou para o convívio dos seus.
* Marlusse Pestana Daher, Promotora de Justiça
[1]REALE Jr. Miguel. Racismo tem um significado histórico-cultural, não só antropológico. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2003-set-25/stf_certo_condenar_editor_nazista_racismo. Acesso em 13.03.2009.
14Racismo. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Racismo. Acesso em 13.03.2009.