Feminista, eu?
Maria Berenice Dias*
Ninguém duvida que a maior revolução do século passado foi a revolução feminista. Ainda assim, se questionadas, as mulheres, em sua grande maioria, negam esta condição. Não têm coragem de dizer: eu sou feminista. Afinal, as feministas sempre foram identificadas como mulheres que odiavam homens, feias, mal amadas.
Também, ao se referir a elas não podia faltar o adjetivo “sapatão”. O interessante é que somente para rotular as ativistas do movimento de mulheres é que foi lembrada a orientação homossexual feminina, pois a maneira de agredir uma mulher sempre foi outra.
Para os homens terem certeza de sua ascendência, ou seja, que os filhos da sua mulher efetivamente são seus, a sociedade impôs a virgindade às mulheres. A preservação da integralidade de seu hímen tornou-se o símbolo da pureza feminina. Esta passou a ser a qualidade mais apreciada e valorizada em uma jovem que, para casar, precisa manter-se virgem. Casar vestida de branco e de véu tem esta simbologia e até bem pouco tempo atrás era possível o marido pedir a anulação do casamento se desconhecia o desvirginamento da esposa.
Com toda esta áurea de recato imposto à mulher, seus atributos sempre foram decantados sob esse viés: honesta, decente, séria, pura eram os seus predicados mais prestigiados. Por isso a forma de agredir uma mulher era exatamente atribuir-lhe atitude oposta. Era, não, ainda é, basta ir a um jogo de futebol e ver como os torcedores se referem à mãe do juiz…
Portanto causa estranheza que, no momento em que se pretendeu desprestigiar o movimento de mulheres, ninguém chamou as feministas de prostitutas, mas de lésbicas. Não parece, mas este é um dado significativo.
Claramente mostra o temor das profundas mudanças que a revolução feminista causaria, e a desesperada tentativa de impedir sua expansão foi denegrir suas líderes. Assim, por medo, ninguém se identificaria com elas e o movimento tenderia a arrefecer.
No entanto, com o surgimento dos métodos contraceptivos e a própria liberação feminina, a mulher assumiu o livre exercício de sua sexualidade e seus atributos deixaram de ser mensurados exclusivamente por uma aparente vida celibatária.
De outro lado, em face da discriminação de que sempre foi alvo a homossexualidade, principalmente masculina, mais uma vez encontrou a sociedade uma forma de agredir o sexo forte, cuja virilidade e livre exercício da sexualidade sempre foi um atributo altamente incentivado.
Felizmente, como o preconceito está diminuindo, vem deixando de ter caráter ofensivo chamar os homens de homossexuais. Também, o movimento pela livre orientação sexual está inibindo manifestações de caráter discriminatório.
Agora estamos vivendo um novo momento. As mulheres têm orgulho de se identificarem como feministas, ninguém mais têm medo de assumir sua identidade sexual e se está vendo uma salutar soma de esforços dos mais variados segmentos sociais buscando resgatar a cidadania não só dos iguais, mas de todos. Afinal é isso que se chama democracia, liberdade, igualdade, coisas que todos anseiam para si, mas que temos que aprender a respeitar perante os outros.
* Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM
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