Sociedade

Excesso de Cursos Jurídicos no Brasil e Cidadania

 

O número cada vez maior de Faculdades de Direito no nosso país tem sido objeto de muitas críticas sob o argumento da sua banalização, com a formação de bacharéis com mínimo conhecimento do Direito.

 

O Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), na sua edição de 05/08/2006, traz um texto de MAURÍCIO CARDOSO e PRISCYLA COSTA com o título PAÍS DOS BACHARÉIS, onde apontam dados estatísticos e tomam partido contra a multiplicação indiscriminada dessas Faculdades. Dizem os articulistas:

 

O Brasil já tem mais de mil faculdades de Direito

 

Um mil e três. Esse é o número de cursos de Direito em funcionamento no Brasil. O número, que consta em levantamento divulgado pela Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da OAB é um espanto e está diretamente relacionado ao espantoso número de advogados com carteira da Ordem, que é de 517 mil.

 

O número se relaciona também com a hiperinflação de acadêmicos de Direito que superlotam os bancos escolares. Segundo o último dado disponível do Inep, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas que faz as estatísticas do MEC, em 2004 matricularam-se nos cursos jurídicos pátrios 533 mil alunos. Esta torrente de estudantes resulta numa onda de 120 mil formandos a cada ano. A estimativa é da OAB.

 

De junho de 2005, quando foi produzida a última estatística, até julho deste ano, 45 novas faculdades foram autorizadas a funcionar pelo Ministério da Educação. Praticamente, a metade dos cursos jurídicos está localizada na região Sudeste. O estado de São Paulo segue como recordista em números de faculdade. Em junho de ano passado, eram 213 cursos em atividades. Hoje são 222. Ou seja de cada cinco novos cursos criados, um o foi em São Paulo. De acordo com a OAB, dificilmente qualquer outra unidade da federação alcançará este índice.

 

No final da lista estão o Acre e Roraima. Em cada um destes estados,, operam 3 faculdades. O Amapá tem o dobro — 6. Alagoas e Amazonas também seguem empatados, com 10 cada um.

 

Em todos os Estados Unidos, funcionam não mais do que 205 escolas de direito, menos portanto que em São Paulo. A Califórnia, estado mais rico e populoso dos Estados Unidos, tem apenas 23 cursos jurídicos, 10% do que tem o estado mais rico e populoso no Brasil.

 

Na avaliação do presidente do Conselho Federal da entidade, Roberto Busato, há um número exagerado de cursos jurídicos, muitos sem a mínima qualidade exigida, resultado que reflete nos percentuais de reprovação dos Exames de Ordem. Hoje, a média de reprovação é de 70%. Em São Paulo, apenas um entre dez bacharéis consegue se habilitar para receber a carteira de advogado da OAB.

 

“Não há condições da manutenção de uma advocacia organizada no país com essa quantidade de advogados. Não pelo seu número, mas pela sua má formação, pela má qualidade do ensino que os bacharéis em Direito vêm recebendo”, sustenta o presidente da OAB.

 

Carlos José Santos da Silva, o Cajé, sócio do Machado Meyer Sendacz Opice Advogados, concorda com o presidente nacional da Ordem. Para ele, o número de cursos jurídicos e o alto índice de reprovação no Exame de Ordem mostram como é preocupante o excesso de bacharéis no mercado.

 

“O reflexo de tudo isso é visto no Exame de Ordem. O Luiz Flávio Borges D´Urso, presidente da Ordem paulista, usa uma expressão interessante para classificar esses cursos de Direito. Ele diz que tudo isso é estelionato, porque existem pessoas que não têm a menor chance de pagar uma faculdade, mas ainda assim se sacrifica. Acontece que esse jovem nunca vai ter boas condições no mercado”, diz.

 

Cajé explica que na década de 90, São Paulo tinha 40 faculdades de Direto. Em 2000, quase 100. Hoje são mais de 200, “enquanto nos Estados Unidos esse é o número total de cursos em todo o país”, afirma o advogado. “No Machado Meyer, a grande maioria dos advogados são formados em faculdades de primeira linha”, afirma.

 

Nos estados

 

O estado de São Paulo segue como recordista em números de faculdades de Direito. Em segundo lugar aparece Minas Gerais, estado que se destaca no levantamento porque divide com a Bahia o maior crescimento em abertura de novos cursos no país. Em junho último, os mineiros contavam com 121 cursos em funcionamento. Hoje, contam com 125. A Bahia, que em junho exibia 43 cursos em atividade, possui agora 46, conforme o último estudo.

 

O Rio de Janeiro é o terceiro estado em quantidade total de cursos jurídicos: 97, o que representa 9,66% do total das faculdades da área jurídica. Paraná e Rio Grande do Sul ficam com o quarto e quinto lugares no ranking de mais cursos jurídicos em funcionamento, com 77 e 74 cursos autorizados pelo MEC a funcionar, respectivamente.

Com todo o respeito que merecem os ilustres articulistas e quem pense como eles, data maxima vênia, visualizo a questão sob um ângulo totalmente diferente, que me proponho apresentar à apreciação dos prezados Leitores.

 

Da minha observação, tenho concluído que a imensa maioria dos que ingressam nas Faculdades de Direito pretende, sim, preparar-se para concursos públicos na área jurídica. Pouquíssimos pretendem ingressar na advocacia. Os concursos são o caminho natural para aqueles (a maioria) que procuram a segurança dos cargos públicos.

 

Sinceramente, não vejo com estranheza o número aparentemente exagerado de Faculdades de Direito. E, digo mais, se seu número fosse maior, maiores ainda seriam as oportunidades para aqueles que querem estudar e não têm escolas à disposição.

 

A democratização da Cultura é uma das formas de cidadania.

 

Não se pode pensar em reserva de mercado para uns poucos privilegiados nem em dificultação do acesso ao Conhecimento sob que pretexto seja.

 

Que se multipliquem as Faculdades de Direito por todo o território nacional, como também se multipliquem as Faculdades das demais áreas, outras Escolas e outras fontes de Cultura, para nos transformarmos num país de pessoas bem-informadas, conscientes, sabedoras do que é melhor para nós e não meramente conduzidas cordeiramente pelas elites, que vêm lucrando com a falta de cultura do povo.

 

 

* Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).

Como citar e referenciar este artigo:
MARQUES, Luiz Guilherme. Excesso de Cursos Jurídicos no Brasil e Cidadania. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/excesso-de-cursos-juridicos-no-brasil-e-cidadania/ Acesso em: 26 jul. 2024