Sociedade

De quem é a culpa afinal?

De quem é a culpa afinal?

 

 

Antonio de Jesus Trovão*

 

 

Artigos veiculados recentemente pela imprensa especializada, dão conta de uma onda de denúncias contra o sistema de ensino adotado pelas escolas brasileiras, com especial ênfase àquelas tidas como escolas de ponta, cujo projeto pedagógico tem-se mostrado inovador no sentido de trazer para a realidade os problemas as serem analisados pelo seu corpo discente, através de uma constatação entre o teórico e o real, na busca de resultados mais efetivos na formação das gerações futuras deste país integrante do grupo chamado de “emergentes”, pela definição dada àqueles que encontram-se entre as nações que apresentam elevados índices de crescimento social e econômico.

 

Tais denúncias referem-se incessantemente ao fato de o sistema adotado, seja por estas instituições inovadoras, sejam por aqueles mantidas pelo Poder Público possuírem resquícios na formação de seus alunos voltadas para uma realidade desatualizada do mundo em que vivemos permeando os raciocínios dos jovens com frases de efeito ou conceitos absolutamente ultrapassados não apenas em sua essência, mas também em sua superfície. Ou seja, reclama-se que as informações transmitidas aos estudantes, além de ultrapassadas são repisadas com um forte toque emocional e sinestésico por parte do educador que, de seu lado, possui uma inclinação que, jamais, em momento algum, deveria integrar o arcabouço de informações e dados que devam ser transmitidos aos seus interlocutores.

 

Em que pese que a formação acadêmica deste comentarista não verseje pelo universo da ciência pedagógica, anos de experiência destinados ao aprimoramento de sua formação, servem mais do que cátedra suficiente para ousar tecer alguns comentários a respeito do tema, sem qualquer pretensão de invadir seara pertencentes à especialistas muito mais gabaritados no assunto e que, certamente, poderão torcer seus narizes acadêmicos com algumas da linhas que irão abaixo seguir-se nas considerações desenvolvidas neste texto.

 

Senão vejamos. Em primeiro plano, devemos salientar que recentemente foi ouvido nos bancos de uma sala de aulas de um cursinho preparatório para a magistratura federal, uma observação no mínimo chocante, proferida por uma autorizadissíma professora atuante neste segmento.

 

Afirmou ela, textualmente, que a motivação do aluno integrante de um seleto grupo de candidatos à magistratura federal que “o termo de posse e o demonstrativo de pagamento devem ser os fatores motivacionais daquele que pretenda obter uma classificação suficiente para que possa ele tornar-se um magistrado”.

 

Ora, qualquer estudante, acadêmico ou profissional da Ciência da Administração sabe com muita propriedade que salário não é fator de motivação para ninguém, até mesmo porque desde os anos setenta, isto para não ser mais apurado na pesquisa, sabe-se muito bem que salário é fator de insatisfação quando de sua ausência, mas a sua existência e permanência não significam motivação para ninguém. Ou seja, não se motiva alguém apenas pelo salário oferecido, pois, inclusive, se assim o fosse, certas profissões e atividades necessárias para a existência da civilização simplesmente deixariam de existir ante o ínfimo valor pago em termos de salários.

 

Cabe destacar que alguém que busque uma colocação profissional, seja no setor público ou no setor dos empreendimentos privados, aspira uma melhor qualificação, cujo resultado a médio ou longo prazo signifique uma expansão de seus horizontes, planejando seu futuro, sua estabilidade física, econômica, emocional e social – não necessariamente nesta ordem – desenhando em sua mente um caminho bem definido a partir de onde está até o ponto onde almeja chegar.

 

A partir desta análise, conclui-se de plano que a afirmação acima transcrita encontra-se em absoluta dissonância com a realidade transmitida aos acadêmicos de Administração desde o início do curso, demonstrando que a motivação é um elemento de ordem interna de cada indivíduo e funciona como verdadeiro “motor” que faz com que a pessoa seja puxada e não empurrada na direção de seus objetivos.

 

Veja-se que a utilização do verbo “puxar”, também originário de estudos da Ciência da Administração dos anos oitenta, possui uma carga enfática muito mais significativa que o verbo “empurrar”. Puxar tem o pleno sentido de forçar que o indivíduo inicie sua trajetória a partir de um elemento motivante qualquer que, ao longo de tempo não perderá energia, mas apenas será introjetado pelo agente como combustível capacitador de suas ações e movimentos na direção de seus objetivos.

 

Diferentemente do verbo “empurrar”, que possui em seu bojo uma carga de forçar alguém na direção de algo que ele mesmo não sabe se é o melhor para o seu futuro, mas que certamente perseguirá, porém sem a mesma energia desprendida por aquele que está sendo puxado.

 

Outra alegação também originária dos bancos escolares, dita também por outro especialista em ensino rápido (verdadeiro fast food educacional), diz respeito ao fato por ele comprovado de que o número de horas destinadas ao estudo preparatório possui direta relação com o aumento da possibilidade de alcançar o objetivo desejado.

 

Sem qualquer menosprezo à capacidade daquele que proferiu esta expressão, bem como sabedores que somos de que é fato mais que notório que esta afirmação possui certo grau de razoabilidade, tenhamos em mente uma máxima atribuída ao cientista alemão ALBERT EISTEIN pela qual ele assevera que “sucesso em ciência é um por cento inspiração e cem por cento transpiração”, demonstrando que é mais que uma evidência que aqueles que possuem certo grau de dificuldade devem se dedicar mais, instrução de caráter histórico que têm-se mostrado como fato comprovado ao longo da história do ser humano e da civilização.

 

Única contestação a este fato diz respeito à necessidade do educador em fornecer ao educando instrumentos, métodos e técnicas que lhe sejam úteis no seu desenvolvimento e na busca de seus objetivos, sem incutir-lhe na mente certas limitações – mesmo que estas possuam plena comprovação estatística – já que estas limitações poderão funcionar de modo negativo ao longo do trabalho do estudante que, muitas das vezes, está com a mente repleta de incertezas, dúvidas e alto grau de insegurança.

 

De outro lado, temos a imensa experiência anterior, pela qual ficou patente que o ensino deve ser livre de dogmas, livre de quaisquer posicionamentos ideológicos que seja por si mesmos, capazes de, logo de saída, incutir nas mentes férteis e maleáveis dos jovens estudantes – e até mesmo nos mais calejados em freqüentar salas de aula – pré-concepções estáticas e reconhecidamente inúteis ou cujo resultado tenham se mostrados pífios ou até mesmo decepcionantes para a evolução da história humana sob qualquer aspecto que seja considerado.

 

Sob este prisma ora analisado, gostaríamos de nos concentrar nos cursos preparatórios que, em tempos recentes, têm mostrado um significativo crescimento desenvolvendo um nicho próprio e extremamente rentável para quem nele ingressa, mesmo com a diversidade de empresas instituídas com o intuito de ativar-se neste segmento.

 

Parece uma verdadeira “onda” voltada para o mesmo evento antes pertencente apenas aos cursos preparatórios para o vestibular, que até o fim dos anos noventa representou uma fonte cuja lucratividade e crescimento mostrara-se quase que “esplendoroso”, para dizer o mínimo a respeito. E, a bem da verdade, estes cursos preparatórios apenas e tão somente aproveitaram-se de uma situação estabelecida pelos governantes da época, cuja preocupação com o ensino superior continua sendo a mesma dos dias atuais – ou seja, nenhuma, ou quase nenhuma.

 

Críticas a parte, ressalve-se que muitos deles já não mais existem e aqueles que resistiram, apenas conseguiram êxito porque também buscaram explorar o segmento seguinte – os cursos de nível superior – logrando subsistir e até mesmo crescer também de forma “esplendorosa”.  Consigne-se aqui que isto não se trata de um protesto ou mesmo demérito a estas instituições, apenas evidencia e caracteriza o fato de que empreendimentos educacionais deste porte nasceram como fruto de uma falha sistêmica dos administradores públicos responsáveis pela gestão do meio educacional brasileiro, adotando um modelo, digamos, maniqueísta, cujas raízes profundas não foram extirpadas até o presente momento.

De qualquer forma o “hit” do momento refere-se aos cursos preparatórios para ingresso em carreira pública, sendo certo que boa parte deles, através de convênios celebrados com escolas superiores também oferece aos alunos a oportunidade de cursar de forma complementar um pós-graduação latu sensu, com o objetivo de propiciar-lhe dois produtos por um único preço, (algo a ver com algum dos fundamentos do marketing moderno?), ou seja, além de preparar o candidato para competir em um concurso público, lhe dá como “brinde” uma pós-graduação com a finalidade de somar pontos quando da apresentação de títulos.

 

Em que pesem possíveis alegações de postura indômita, deixamos aqui nosso registro de que inexistência contrariedade em face ao acima exposto, porém, não pode-se deixar de comparar tal comportamento com o mesmo oferecido por concessionária de veículos que, na oferta de vendas de um modelo zero kilometro de alto custo, dá-se ao comprador uma linda televisão de LCD de quarenta e duas polegadas. A única diferença está na sua essência e não na superfície – certo é que ambos possuem a mesma finalidade: vender um produto.

 

Parece-nos que a máxima ditada por Keynes no início do século XX possui forte e perfeita adequação ao momento presente: “Cabe ao Estado investir em infra-estrutura, em obras e sistemas nos quais a iniciativa privada não o faria por não ver qualquer possibilidade de lucro”. Esta assertiva não se perdeu nas brumas do tempo, posto que continue válida, apenas complementada pelas ações levadas a cabo pelo terceiro setor, com a ajuda da iniciativa privada que apenas o faz com vistas a duas espécies de retorno: o primeiro de ordem econômica e que versa sobre a evidente possibilidade de gerar, capacitar, reciclar e reavaliar suas fontes de recursos humanos, sem as quais seus empreendimentos estariam fadados ao infortúnio.

 

Já a segunda refere-se a uma lógica capitalista, posto que diz respeito à retro-alimentação do sistema que precisa fornecer subsídios para a sociedade em que se encontra inserida para, em seguida, extrair-lhe os recursos possíveis dentre aqueles disponíveis. Não se trata, portanto, de uma lei selvagem e sanguinária, apenas uma lógica sistêmica de sobrevivência de ciclos sociais e econômicos.

 

Consideremos a esta altura a clareza com que ocorre esta catálise de necessidades e disponibilidades que se interagem com a finalidade de buscar incessantemente a sua própria sobrevivência enquanto sistema sócio-econômico, permeando todas as espécies das relações humanas, fato este que também deveria estar sob os olhos atentos dos administradores públicos, deixando de preocupar-se exclusivamente com regras burocráticas e maximização de suas rendas, esquecendo-se de que as principais funções da administração moderna são: planejar, organizar, dirigir e controlar.

 

Melhor explicando: administradores públicos alegam, via-de-regra, que suas preocupações são de ordem de grandeza maiores que os pequenos detalhes que se encontram escondidos sobre as arestas de um sistema paquidérmico, retrógrado e perdido em suas funções, deles exigindo uma visão acima do todo sem preocupar-se com qualquer profundidade. Destinação de verbas, orientações administrativas, diretrizes e bases para que o meio educacional público seja organizado e, principalmente apuração de resultados com base em lógicas apenas estatísticas (aquela mesma lógica em que se o indivíduo está com os pés no forno e a cabeça na geladeira a temperatura de seu corpo está próxima da ambiente), são apenas algumas das enormes preocupações dos administradores públicos, esquecendo-se do provérbio árabe que diz: “o diabo está nos detalhes”.

 

Ledo engano para quem acha que detalhes são apenas meros detalhes, olvidando-se das evidências e fatos que demonstram às escâncaras uma falência recorrente que não é percebida, ou ainda desprezada por muitos ante a evidência lamentável de que tais procedimentos não redundam em resultados a serem colhidos nas urnas.

 

Provocante postura de quem sabe que está olhando sobre o problema e não nele mergulhando, deixando-se quedar pela soberba de que sua autoridade está acima de qualquer crítica ou suspeita. Dá-se margem, desta forma, ao crescimento de oportunidades, ou melhor, de situações que proporcionam aos oportunistas de plantão aproveitar-se desta ignomia para dela extrair lucro oferecendo algo pífio, mas relevante no contexto em que se insere.

 

Voltemos a uma das frases comentadas acima, bem no início de nosso opúsculo: a de que “o termo de posse e o demonstrativo de pagamento devem ser os fatores motivacionais daquele que pretenda obter uma classificação suficiente para que possa ele tornar-se um magistrado”. Inserida de forma implícita em seu conteúdo reiteramos que salário além de não ser fator de satisfação do trabalhador, não opera os efeitos para a motivação e, principalmente, porque ninguém motiva ninguém. Pessoas são incentivadas a motivarem-se, criarem interesses, paixões e necessidades a serem satisfeitas.

 

A infelicidade e, ao mesmo tempo, a ironia contida neste raciocínio põe na mesa a triste constatação de que motivar a partir do salário é a única forma disponível para que os cursos preparatórios possam ser capazes de atrair interessados, cobrindo uma brecha gerada pela administração pública em seu sistema educacional.

 

Na mesma vertente, este fenômeno pode ser aferido junto aos preparatórios destinados ao exame da Ordem dos Advogados do Brasil, apenas invertendo-se a ferocidade desta lógica: oferece-se algo necessário para a prestação de um exame que admitirá o profissional a capacitar-se para o exercício da sua profissão, e sem o qual estará ele impedido de ativar-se na função para a qual dedicou parte de sua formação em nível superior.

Vamos considerar o seguinte excerto noticioso extraído do JB ONLINE:

 

Educação: Brasil só tem 25 excelentes universidades

Luciana Abade, Jornal do Brasil

 

 

BRASÍLIA – Entre 3.239 cursos superiores avaliados pelo Ministério da Educação em 2007, apenas 25 conseguiram a nota máxima (5) no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), no Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado (IDD) e no Conceito Preliminar de Cursos (CPC).

Apenas uma instituição do Estado do Rio de Janeiro está entre as que atingiram nível de excelência. Nenhuma instituição particular figura entre elas.

As 508 escolas que tiraram notas 1 e 2 no Enade receberão, obrigatoriamente, a visita de uma comissão do MEC para firmar um protocolo de compromisso. A partir daí elas terão um ano para sanar as falhas detectadas, caso contrário, poderão não ser recredenciadas. Cerca de 25 % dos cursos encontram-se nessa situação. [23:44] – 06/08/2008.

 

Aí está claramente demonstrada a ineficiência e ineficácia do Sistema que olha para o seu próprio umbigo, deixando de fora todas as demais evidências de que a realidade demonstra uma falência sistemática da forma com que a educação é administrada pelas autoridades governamentais, com excesso de planejamento, pouca organização, nenhuma direção e inexistência de qualquer tipo de controle.

 

Senão vejamos. Recentemente o Ministério de Educação e Cultura – órgão administrativo ligado ao Poder Executivo Federal – publicou uma lista resultado do ENADE – Exame Nacional de Avaliação do Ensino Superior – na qual condenou por meio de pontuação, diversas universidades por inadequação de sua estrutura disponível com a finalidade de atender aos alunos por esta apresentar alguma espécie de deficiência insanável, como podemos constatar a partir do seguinte excerto:

 

O MEC (Ministério da Educação) cortou 24.380 vagas –de um total de 45.042– de 81 cursos de direito de faculdades que haviam sido notificadas por registrarem conceitos inferiores a três no Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes) e no IDD (Indicador de Diferença entre os Desempenhos). O corte representa 54% das vagas oferecidas nessas instituições.

Os cursos também registravam baixo índice de aprovação de estudantes nos exames da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), segundo o ministério.

As instituições que ofereciam os cursos passaram a ser supervisionadas em outubro de 2007. Entre janeiro e maio deste ano 51 faculdades assinaram um termo de compromisso para saneamento de deficiências e eliminaram cerca de 20.500 cursos. As 30 restantes assinaram o documento em julho e cortaram aproximadamente 3.600 vagas.

 

Veja bem, o termo citado no excerto acima declara expressamente que as faculdades assinaram termo de compromisso para “sanear as deficiências”, o que comprova que, de fato, elas são deficitárias na sua infra-estrutura de ensino. Aliás, cabe aqui destacarmos quais os papéis devidos ao sistema de ensino (público e privado), pais de alunos, cidadãos e autoridades governamentais. Vamos aqui nos deter, de forma bastante resumida, em cada um destes personagens e seus aspectos mais relevantes.

 

O PAPEL DOS PAIS NO ENSINO E NA FORMAÇÃO DA GERAÇÃO DO AMANHÃ.

 

Parece mais que normal que, nos dias atuais, com as exigências cada vez mais ferozes e cenários excessivamente competitivos nos diversos segmentos empresariais, pais que trabalhem muito sejam obrigados a impor de forma prematura e impiedosa aos seus filhos um ritmo muito parecido com aquele nos quais eles próprios encontrem-se inseridos.

 

Desta forma, filhos que mal chegaram a conhecer de forma mais ou menos íntima seus pais e familiares mais próximos, vejam-se inseridos na rotina de pré-escolas e escolas onde os espaços não são mais individualizados e imersos do necessário carinho e apoio na sua formação inicial, passando a dividi-los com outros na mesma situação que, desconhecendo o mundo que os cerca apóiam-se nas “tias” e “vovós” todas postiças e cujo vínculo com eles refere-se apenas e tão somente àquele pequeno mundo que os cerca e os engole.

 

Nada demais no descrito no parágrafo acima, não fosse o evidente, insistente e desleixado modo com que estes mesmos pais, preocupados com suas carreiras e com seus futuros (leia-se, futuros de seus filhos também), acabam por “delegar” de forma forçada e quase impositiva a responsabilidade na formação de seus filhos a professoras, educadoras, assistentes e demais integrantes do corpo de pessoas responsáveis pela gestão daquele núcleo de ensino. É como se, aos olhos destes pais de primeira viagem, toda e qualquer responsabilidade decorrente da formação daqueles jovens (seus filhos) não fosse mais algo a ser compartilhado entre eles e os educadores, posto que apenas aos professores cabe responsabilizar-se integralmente por todos os eventos (fortuitos ou nem tanto), pelos quais as crianças sujeitam-se no cotidiano de suas novas existências limitadas pelo interesse de terceiros.

 

É muito comum ouvirmos pais reclamando que a responsabilidade pelos cuidados de seus filhos são dos professores e demais integrantes da escola. E, frise-se, que, de fato, estão com razão. Porém, apenas de forma parcial, na exata medida em que não se pode exigir que professores sejam responsáveis pela formação moral, intelectual, sentimental e emocional de seus alunos, até mesmo porque, caso isto pudesse ser aplicado, o resultado provavelmente não seria muito bom, para não nos esquecermos dos efeitos desta carga sobre os próprios professores.

 

Criar e educar são verbos que sintetizam um outro verbo de maior complexidade: significam formar um indivíduo, dar-lhes as necessárias características que lhe permitam integrar-se ao meio em que vivem e socializar-se com seus semelhantes e extrair de sua mente o potencial capaz de contribuir para melhorias coletivas que resultem em avanços no bem-estar da coletividade.

 

A semântica de “indivíduo” remete-nos a algo que não divisível, uno, único, ou seja, cada um de nós é um indivíduo em sua essência, nossa substância é própria, somente nos pertence e não pode ser fracionado em partes. E por esta natureza, sabemos que cada um deve ser assim tratado: uma pessoa que possui características, qualidades, defeitos e potenciais que devem ser devidamente explorados com a finalidade única de dar a eles próprios a capacidade de crescer, desenvolver-se e, por via de conseqüência, contribuir para o desenvolvimento de outros que lhe rodeiam.

 

Assim o papel dos pais não e não deve ser substituído por pessoa que, mesmo por mais capacitada seja, não se encontra imbuída do instinto familiar de desenvolvimento da célula a partir de seu núcleo. Quase como uma perfeita imitação da microbiologia, o núcleo familiar é a responsável pelo desenvolvimento de novas células reproduzindo-se de forma a criar uma estrutura que somar-se-á a outras que também carecem deste compartilhamento para sobreviverem.

 

O PAPEL DA SOCIEDADE NA FORMAÇÃO DO INDIVÍDUO.

 

Quando se utiliza a expressão “sociedade”, estamos nos referindo à estrutura organizada não governamental, constituída por diversos núcleos que, necessariamente, terão, em maior ou menor grau, certa interatividade com o jovem desde seu nascimento até a sua velhice, e, por esta interface encontrar-se-ão intimamente ligados ao futuro das habilidades, capacidades e pequenos atributos de ordem psicológica que comporão o futuro indivíduo e a forma com que este se interrelacionar-se-á com aqueles que o cercam.

 

Em educação percebe-se de forma bastante nítida que esta integração com o meio social constituirá um elemento crucial na formação do indivíduo, vez que este convive com seus colegas de clube, de igreja, de escola e outras instituições com as quais construirá laços de fraternidade que por sua própria natureza serão decisivos na formação de seu caráter e de seus comportamentos para com o mundo exterior.

 

Daí a importância quase que fundamental na forma com que esta sociedade organizada cria laços de influência para com o novo indivíduo que deseja de modo extremamente ansioso a ela integrar-se, dela fazer parte e dela extrair a sua identidade. Razão mais que suficiente para entendermos a significância do papel exercido pela sociedade na educação do indivíduo,  na colaboração que deve surgir de forma natural e despretensiosa na direção da edificação de mais um membro capaz, hábil e preparado para contribuir não apenas para o desenvolvimento social próprio, mas também para a construção de uma sociedade mais justa, mais equilibrada e dotada dos requisitos necessários para guindar a humanidade ao patamar evolutivo mais integrado, mais repleto da paz, compreensão e fraternidade.

 

O PAPEL DA ESCOLA E DO ESTADO.

 

Citamos neste momento dois vértices de suma importância para a formação – ou melhor edificação – do novo indivíduo que surge para o meio em que conviverá. E deve sopesar a importância do papel de ambos, seja de forma isolada ou considerados enquanto uma única entidade capaz de criar as condições necessárias para a formação, desenvolvimento e manutenção de um novo indivíduo que através deles, por eles e para eles, expandirá suas fronteiras e as possibilidades sobre as quais além de não possuir conhecimento antecipado, desconhece a forma com que extraiu habilidades capazes de ajudá-lo a chegar nas metas por ele próprio estabelecidas.

 

Quando deitamos nosso olhar sobre a escola – seja ela de ciclo básico ou superior – percebemos a importância do papel do educador, aquele indivíduo responsável pela construção de novos indivíduos que não sejam apenas espelho do meio em que vivem, mas que também saibam que possuem em seu interior características próprias, potenciais inexplorados e sensações ainda não experimentadas que lhe trarão um imenso sentimento de satisfação, de realização pessoal e ao mesmo tempo grupal, na medida em que qualquer coisa que seja sua incumbência, proporcionará a ele, quando da sua realização, não apenas mais uma satisfação de ordem pessoal, mas o sentimento pleno de contribuição, de participação em algo maior, na construção de um edifício que ele não conhece plenamente, mas que está inserido em sua alma, fazendo parte de sua essência.

 

Este é, acreditamos, o maior desafio do educador moderno: fornecer ao indivíduo o ferramental necessário, demonstrar as características do meio, alertar-lhe sobre os perigos e as iminentes ameaças que o rondam, enfim, suprir-lhe de informações que sejam úteis, necessárias e funcionais para a sua interação com seus semelhantes. E não se trata de uma tarefa fácil, posto que o educador também é um indivíduo com as mesmas limitações daquele pelo qual é responsável e precisa policiar-se a fim de não impregnar sua missão e seu comprometimento com suas próprias sensações, temores e inseguranças.

 

A tarefa é algo de hercúleo, de tal enormidade que o próprio educador não procura se preocupar com tal carga. Afinal, deve haver um foco, uma concentração constante considerado como uma missão a ser cumprida não a todo o custo, mas com certo grau de cuidado, esmero e preocupação não com o resultado final, mas com a qualidade deste resultado, uma qualidade que deve ser avaliada de forma parcimoniosa, com bom-senso, com equilíbrio suficiente para compreender que o resultado depende de uma combinação entre aquele que almeja educar e aquele que deseja fervorosamente apreender do educador conhecimento, habilidades e apreensões que lhe dêem uma estrutura própria que lhe torne capaz de andar com seus próprios pés, dirigindo-se rumo ao futuro que se descortina não apenas para os seus anseios, esperanças e desejos, porém combinando também esperanças, anseios e desejos de todos aqueles que o cercam.

 

A tarefa do educador é dar aos seus educandos compreensão sobre esta necessidade premente do ser humano de conviver em grupo, de realizar interesses de ordem coletiva, pensando sempre no “nós” e muito pouco – ou apenas o necessário – no “eu”.

 

Aliado à esta propositura, cabe ainda ao educador agir como um facilitador, um conselheiro que não apenas ensina, educa, mas também orienta, demonstra a existência de possibilidades e fornece as ferramentas necessárias para que o educando exerça o seu livre-arbítrio, ciente de que, qualquer que seja sua escolha, certo ou errado, ele terá feito uma opção e terá aprendido com ela uma melhor forma de compreender o mundo que o cerca, as expectativas que se lhe apresentam, e, finalmente, torne-se um ser humano mais completo e cujas realizações, se não foram plenamente atingidas, pelo menos ter-lhe-ão conduzidos pelo caminho, pois trilhar o caminho de forma mais correta possível é o que importa.

 

 

* Graduação em Administração de Empresas pela Escola Superior de Administração de Negócios (ESAN), Campus de São Paulo (ano de 1995) – pós-graduação em Administração Estratégica pela mesma escola superior. graduado no curso de Direito na Universidade São Francisco – Campus de São Paulo (2006). Servidor público federal, lotado no Judiciário Trabalhista, junto ao Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região (primeira instância). ocupando atualmente o cargo de assistente de diretor.

 

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Como citar e referenciar este artigo:
TROVÃO, Antonio de Jesus. De quem é a culpa afinal?. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/de-quem-e-a-culpa-afinal/ Acesso em: 06 out. 2024