Considerações sobre a sentença que decretou a falência da Boi Gordo
J. A. Almeida Paiva *
Várias têm sido as críticas à r. Sentença da MM. Juíza Dra. Márcia Cardoso, que decretou a falência das FRBG. No nosso modesto entendimento, S. Exa. decidiu corretamente. Ainda que possa ter havido algum deslize na referência à questão de estar ou não as FRBG sujeita à liquidação pelo Banco Central, fundamento com o qual não concordamos, no mérito ao decretar a Falência da Boi Gordo a MM. Juíza fez JUSTIÇA, pois não se poderia aguardar mais tempo para decretar a quebra de uma empresa que requereu sua Concordata Preventiva a 15-10-2001, longe de sua sede Administrativa, com o velado propósito de prejudicar seus credores, como expressamente afirmou o Plenário do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, ao conceder o Mandado de Segurança nº 2.607 requerido pelo Dr. J. A. ALMEIDA PAIVA, com o propósito de trazer a Concordata para São Paulo, onde fatalmente haveria a quebra; diz o V. Acórdão do TJMT: “Somente o fato da litisconsorte se homiziar – este é o termo correto para sua atitude – no sertão de Mato Grosso, aforando uma Concordata Preventiva a milhares de quilômetros de sua sede administrativa, e longe, muito longe do alcance de seus infelizes investidores, e encontrando refúgio num despacho judicial fervorosamente defendido nas informações deste MS pelo doutor juiz sob o pálido “argumento” de a maior fazenda da concordatária estar localizada naquela Comarca, portanto lá seria a sede real do grupo concordatário, é mais do que óbvio que há uma conjugação de atitudes altamente danosa, perniciosa, de claríssimo potencial de dano a recomendar o uso do instrumento processual de que se valarem alguns investidores ao impetrarem este mandado de segurança” (cf. fls. 1175 e 1176 do MS 2.607= Acórdão/ TJMT).
A Concordata JAMAIS poderia ter tido seu processamento deferido pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de Comodoro-MT; o correto seria indeferir o pedido e decretar a quebra, o que não ocorreu em Comodoro-MT, mas sabia, correta e oportunamente a MM. Juíza Dra. Márcia Cardoso o fez 2 (dois anos) e meio depois do requerimento da Concordata Preventiva. A QUESTÃO DA CVM. Uma coisa é a “EMISSÃO DE CICs” outra é a ‘DISTRIBUIÇÃO DE AÇÕES. Na realidade a CVM autorizou as FRBG emitir os “Contratos de Investimento Coletivo-CIC” em Gado Bovino num montante de 7.041.969 @ (arrobas) correspondentes a R$260.552.853,00; isto foi feito em 4( quatro) séries, sendo que a última depois de autorizada foi revogada. A operação era feita mediante a venda de boi magro (10@) pelos corretores com a promessa de engorda e venda futura ao peso de 16@, pelo preço do dia e promessa de um ganho mínimo de 42% em 18 (dezoito meses) ou a média de 2,8% ao mês; os investidores recebiam diretamente das FRBG como comprovante da aquisição das arrobas, os CICs; NUNCA houve distribuição em bolsa deste CICs. Por outro lado, a “Distribuição Pública de Ações Preferenciais”, não obstante haja um prospecto das FRBG sobre a coordenação desta pelo Corretor PREVIBANK CCVM Ltda, num montante de R$315.000,000,00, nunca chegou a acontecer.
Segundo consta, as FRBG já em estado falimentar, quando venciam os CICs em mãos dos investidores, propunha aos credores (estado falimentar) a troca de seus créditos por ações das FRBG, que nunca foram negociadas em BOLSA. Aliás, na AGE de 17-08-01, de re-ratificação da AGE de 20-4-2001, foi alterada a redação do seu item 7, para constar que “As ações da Companhia serão negociadas no mercado de balcão não organizado”. O que quer dizer isto, que as ações das FRBG seriam negociadas no “Mercado de Balcão não organizado”?
Temos no mercado de ações o seguinte: As empresas de CAPITAL ABERTO que têm suas ações registradas na CVM e que são distribuídas aos acionistas podem ser negociadas na bolsa de valores. Por outro lado – aqui é o caso das FRBG, – as suas ações não podiam ser negociadas na Bolsa de Valores, mas sim e tão somente no denominado “MERCADO DE BALCÃO”, que é um mercado de títulos sem lugar físico determinado para as transações, por não serem registrados nas Bolsas de Valores, geralmente por falta de autorização legal ou por não serem efetivamente normatizados pela CVM. Nestas condições as FRBG, como Sociedade Anônima está sujeita à falência pela Justiça Comum.
A QUESTÃO DA NOVA LEI DE FALÊNCIA. Tanto a falida Boi Gordo, com algumas Associações (ALBG etc), antes da decretação da falência pediram à MM. Juíza que suspendesse o processo para que fossem aplicadas normas que ainda estão em discussão no Congresso Nacional. A MM. Juíza rejeitou os pedidos das FRBG e da ALBG, por falta de amparo legal. Com efeito, a lei que está em vigor hoje, quer queira, quer não queira a falida e aqueles que se opõem à falência, é a 7.661/45; fora dela, (estamos afirmando isto desde 2001), não há solução para o caso Boi Gordo. Querer esperar a aprovação de uma lei é utopia, sonho, é como soltar um papagaio e cortar a linha e esperar para ver onde vai parar!.
É bom que se diga bem claro para que não haja dúvida e nem exploração inócua, que o PL 4.376/93 (Projeto da Nova Lei de Recuperação de Empresa e Falência), relatado pelo Deputado OSWALDO BIOLCHI, aprovado na Câmara dos Deputados e atualmente em tramitação no Senado Federal, cujo Relator é o Senador Ramez Tebet, ainda que venha a ser aprovado com o atual texto, não será aplicado à falência da Boi Gordo. O Art. 221 tem a seguinte redação: “As disposições do Decreto-Lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945, continuarão em vigor para aplicação, exclusivamente:
I) – aos processos de concordata e falência em curso no dia anterior ao do início da vigência desta Lei;
II – subsidiariamente, aos processos de liquidação extrajudicial de instituições financeiras, consoante o disposto no art. 34 da Lei nº 6.024, de 13 de março de 1974, até a publicação das leis específicas de que trata o art. 2º”. Assim sendo o artigo 221 da futura Lei de Recuperação de Empresa e Falência, se aprovada com o atual texto, JAMAIS será aplicada ao caso Boi Gordo, cuja Concordata Preventiva foi requerida a 15-10-2001.
Leva-se em consideração ainda, que se for alterada a lei para retornar o texto excluído na Câmara dos Deputados, o art. 222 norma uma “vacatio legis” de 180 (cento e oitenta) dias para entrar em vigor. Consideramos estes esclarecimentos necessários para defender a r. sentença da MM. Juíza contra críticas, algumas até contundentes, mas despiciendas, pois S. Exa. foi clara ao afirmar que decretava a falência com base no art. 162 da LF, que permite ao Magistrado decretar a falência a qualquer momento do processo, quando verificar que o pedido da impetrante encontra impedimento de ordem legal, como no caso Boi Gordo.
Disse ainda S. Exa. que a falência deve ser decretada quando o juiz reconhecer a inexistência de pressupostos legais ou o estado de insolvência, tal como ocorre com a Boi Gordo. Está documentado na Concordata requerida em Mato Grosso e na r. sentença de MM. Juíza, que a própria FRBG ao requerer sua Concordata a 15-10-2001, em Comodoro-MT já teria afirmado que “não tem mais condições financeiras de continuar a operar”. Ora se a Concordatária confessa que não tem condição financeira de continuar a operar ela reconhece seu estado falimentar, razão pela qual, como o Juiz de Comodoro-MT não decretou a Falência de plano, a MM. Juíza da 1ª Vara Cível de São Paulo o fez, corretamente na primeira oportunidade que teve de apreciar os autos. Resta-nos agora esperar que o TJSP tenha a mesma serenidade e o mesmo entendimento que esposamos, reconheça a aflição, a longa espera e ansiedade de quase 30 mil investidores e mantenha o decreto de falência, como única solução para o “Caso Boi Gordo”, pondo fim a uma série de recursos procrastinadores da falida, que retardou injustificadamente que os investidores recebam pelo menos parte do rombo de 1,5 bilhões causado no mercado.
São Paulo, 17 de abril de 2004.
* Advogado
Website: http://www.almeidapaiva.adv.br
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