Responsabilidade Civil

A Responsabilidade das Empresas de Seguro De Saúde

A Responsabilidade das Empresas de Seguro De Saúde

 

 

Sergio Wainstock*

 

 

Uma associada de uma conhecida empresa seguro saúde estava quites com o pagamento das mensalidades e certo dia amanheceu com problemas de saúde, tendo sido conduzida à uma clínica próxima de sua residência, a qual estava conveniada ao plano de saúde, de acordo com a listagem fornecida pela própria empresa; e, ao chegar ao setor de emergência, foi surpreendida com a recusa no atendimento e com a informação de que não teria, a referida clínica, mais convênio com a seguradora de saúde; e, após muitas ligações, muita irritabilidade e nervosismos, acabou se encaminhando a um outro hospital e teve ali o atendimento regular, sendo diagnosticada uma virose.

 

Deduziu, a associada em questão, após alguma investigação, que a referida clínica já havia sido descredenciada há tempos sem que, ao menos, a associada fosse avisada; e este fato deixou a associada em situação, além de perplexa e vexatória, também desesperada e angustiada durante algum tempo, até o diagnóstico feito no hospital indicado pela empresa de saúde.

 

Constatou-se que o não atendimento aos associados do plano de saúde, por parte da clínica, se deveu ao fato de a seguradora não concordar com um aumento no valor das consultas realizadas naquela clínica, a mais próxima de sua residência – fato este que caracteriza, por si só, evidentemente, um dano moral.

 

Certamente, poderia alegar, a companhia de seguro saúde, que não é responsável por eventuais danos morais sofridos pela sua associada, pois não seria responsável pelo não atendimento da clínica descrendenciada; que a solidariedade não se presume, haja vista que a empresa de seguro saúde não exerce a prestação de serviços médicos mas sim opera no seguro privado de assistência à saúde.

 

Mas, em nosso entendimento, a companhia de seguros saúde não tem razão, de acordo com a jurisprudência de nossos tribunais:

 

Tribunal de Justiça de Minas Gerais Número do Processo: 1.0188.05.035322-9/001(1) Data de Publicação: 23/10/2006 Ementa: PROCESSO CIVIL – ERRO MÉDICO – MORTE DO PACIENTE – LEGITIMIDADE ATIVA DO FILHO DA VÍTIMA – CÓDIGO CONSUMERISTA – INCIDÊNCIA – ART. 17 DO CDC – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL E DA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE – DENUNCIAÇÃO DA LIDE – VEDAÇÃO DO CDC – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – DISPOSIÇÃO ESPECÍFICA. A aferição da legitimidade para figurar no pólo passivo da ação, em exame abstrato, decorre do interesse que juridicamente pretende ver protegido, conforme a relação jurídica de direito material afirmada nos autos……. Em razão da cadeia formada na prestação do serviço médico pelo hospital em que se deu o atendimento do paciente e da operadora do plano de saúde a que ele se credencia, deve ser reconhecida a responsabilidade solidária de ambos para o pedido indenizatório de reparação de dano decorrente de erro médico. Por força do art. 88 do CDC, fundando-se a ação originária na obrigação de reparar, sob o ângulo objetivo decorrente da relação de consumo, é inadmissível a intervenção de terceiros através da denunciação da lide. Nos termos do artigo 27 do CDC, prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados em decorrência de falha na prestação do serviço médico. AGRAVO Nº 1.0188.05.035322-9/001

 

Tribunal de Justiça de Minas Gerais Número do Processo: 1.0024.05.627783-3/003(1) Ementa: Voto:…… Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva da fornecedora de plano de saúde, sob a fundamentação de que não há relação de subordinação entre o médico e a fornecedora do plano de saúde, também não lhe assiste razão. Esclareça-se que as fornecedoras de plano de saúde são partes legitimadas passivas para responder por erros médicos atribuídos a médicos vinculados a ela, mormente em ocorrendo a suposta conduta antijurídica no hospital por ela credenciado, tendo em vista a sua obrigação de zelar pela qualidade e eficiência dos serviços médicos contratados e colocados à disposição do paciente. Veja-se o entendimento desse eg. Tribunal: “EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – ERRO MÉDICO – COOPERATIVA DE ASSISTÊNCIA DE SAÚDE – LEGITIMIDADE PASSIVA – RESPONSABILIDADE CIVIL – ERRO MÉDICO – CONFIGURAÇÃO – CULPA DO PROFISSIONAL COMPROVADA – DANOS MATERIAIS E MORAIS – INDENIZAÇÃO DEVIDA – FIXAÇÃO – CRITÉRIOS.- A Cooperativa que mantém plano de assistência à saúde é parte legitimada passivamente para ação indenizatória movida por associada em face de erro médico originário de tratamento inadequado determinado por médico cooperativado.- Constatada a imperícia médica por parte do profissional credenciado, devem ser este e a cooperativa que o indicou, ser responsabilizados civilmente, de forma a reparar os danos de ordem material e moral causados ao paciente. (…)” (TJMG, Ap. Cív. 467.378-7, Rel. Des. Elias Camilo, j. 12.05.2005). (…) Acrescente-se que, devidamente comprovada a responsabilidade civil do médico e do hospital pelos danos causados a paciente, convém ressaltar que a instituição que fornece os planos de saúde, tal como a 2ª apelante, responde solidariamente pela deficiência do serviço custeado pelo plano. A fornecedora de plano de saúde responde pela má eleição que fez dos médicos e hospitais credenciados, que prestam serviços defeituosos , inclusive na hipótese em que o associado é obrigado a escolher dentre profissionais e hospitais que estão relacionados na lista da fornecedora. (…)”……Saliente-se que não há que se falar em aplicação do disposto no art. 1.460 do Código Civil/1916 ao presente caso, visto que a presente demanda não se trata de cobrança de indenização securitária, mas de ação para apuração da responsabilidade civil da operadora de plano de saúde, ora segunda embargante, e seu dever de indenizar.

 

Também não procede eventual alegação de que a atividade da empresa seguradora limita-se a prestar assistência médica hospitalar aos seus segurados por todos aqueles estabelecimentos que fazem parte de sua rede referenciada ou mediante reembolso; e que a seguradora não deixou de cumprir com as suas obrigações, ressaltando que a negativa ocorreu por parte do estabelecimento médico ao qual a associada se dirigiu. E, finalmente, com referência ao dano moral, propriamente, dito, também não tem qualquer procedência a argumentação de que apenas teria ocorrido mero aborrecimento e, como tal, não suporta a condenação em danos morais.

 

Ora, um dos motivos para a escolha de um determinado plano de saúde são os nomes dos hospitais e médicos colocados à disposição do consumidor; assim, a exclusão posterior de alguma entidade de saúde ou profissional de gabarito da rede credenciada certamente representa um prejuízo e risco à saúde do titular e seus dependentes do convênio médico. Mas a dura realidade é que, infelizmente, o descredenciamento ocorre até mesmo nos momentos mais dramáticos da vida do consumidor.

 

De fato, a Lei de Plano de Saúde (Lei nº 9.656/98) permite que a empresa de assistência médica faça o descredenciamento de hospitais, mas desde que comunique ao consumidor, por escrito, 30 dias antes de ocorrer o desligamento do estabelecimento credenciado.

 

Ademais, importante ressaltar que para descredenciar um hospital a empresa de saúde, além de comunicar previamente o consumidor, está obrigada a substituir o estabelecimento excluído por outro de equivalente qualidade. Mais: se o descredenciamento ocorrer durante a internação, a empresa de plano de saúde deve bancar o tratamento do consumidor até o seu final. E o descredenciamento do médico pelo plano de saúde foi proibido pela Resolução 1 616/2001 do Conselho Federal de Medicina.

 

Mas, observa-se que na hipótese nada disso ocorreu, ou seja, nem o associado foi avisado do credenciamento, nem ocorreu qualquer substituição.

 

Assim, os danos materiais se justificam plenamente, tanto quanto os danos morais, Caio Mário da Silva Pereira ressaltou: “é preciso entender que, a par do patrimônio, como ´complexo de relações jurídicas de uma pessoa, economicamente apreciáveis´ (Clóvis Beviláqua, Teoria Geral de Direito Civil, § 29), o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, o bom conceito de que desfruta na sociedade, os sentimentos que exornam a sua consciência, os valores afetivos, merecedores todos de igual proteção da ordem jurídica” (“Responsabilidade Civil”, pág. 66, ed. 1990).

 

Portanto, a dor representada pelos transtornos, pelos aborrecimentos, pelas humilhações e pelos constrangimentos, podem ser consubstanciadas num dano moral; dano este que, por sua vez, não pode deixar de ter uma resposta jurídica, em especial, do ponto de vista da reparação; dano este, por sua vez, que não carece de uma demonstração específica, porquanto ela é inerente ao próprio evento retratado nos fatos ora narrados.

 

 

* Consultor Jurídico

 

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Como citar e referenciar este artigo:
WAINSTOCK, Sergio. A Responsabilidade das Empresas de Seguro De Saúde. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/responsabilidade-civil/a-responsabilidade-das-empresas-de-seguro-de-saude/ Acesso em: 14 mai. 2025