HERCULANO PIRES, no seu livro Os Sonhos de Liberdade, Paidéia, 2005, p. 45, afirma:
O homem é liberdade por se constituir no único ser da Terra que dispõe da liberdade possível em grau consciencial. Sua consciência é livre mesmo quando submetida a todos os graus possíveis de restrição da liberdade. A manifestação de sua liberdade pose ser impedida, mas na sua realidade íntima ela continua pura e inciolável. Só cederá às influências de um ambiente asfixiante da liberdade se o quiser. Essa é a sua tentação para a queda e a sua maior possibilidade de manter-se acima do nível de evolução moral do seu tempo. Basta-lhe, para isso, aceitar a cicuta, como Sócrates, o martírio e a cruz, como Cristo, ou preferir o isolamento social (exílio voluntário no meio social) como Croce, em meio ao Fascismo, esperando que o féretro do regime liberticida passasse pela frente de sua casa.
Todo ser humano é livre, seja ele um luminar do Progresso ou o homem ou mulher menos imbuídos de ideais sociais ou até mais nocivos à sociedade…
Essa liberdade independe de qualquer fator ou circunstância.
Mesmo nas épocas em que se legitimaou a escravidão (como a dos negros no Brasil) ou, atualmente, no caso de condenados à prisão, somente perde a liberdade interior quem abdica da sua independência de pensar (apesar de a de ação estar cerceada).
Conforme HERCULANO PIRES, aqueles luminares da Liberdade jamais abdicaram do seu direito de ser livres. Ensinaram que devemos seguir rumo à Verdade, ao Progresso, à Perfeição individual e coletiva, mesmo que enfrentando a incompreensão e até a condenação da Justiça da época…
Mais adiante (p. 55), HERCULANO PIRES fala em JEAN-PAUL SARTRE:
A importância da filosofia de Sartre está na razão direta da sua compreensão da importância da liberdade. Suas contradições são a marca da liberdade de pensar em sua trajetória filosófica e em seu comportamento individual.
Isso é o que gostaria de trazer à reflexão sobre a Liberdade e aqueles que viveram ou vivem a Liberdade.
Quanto a nós, membros do Judiciário, aqueles que o Estado incumbiu de interferir decisivamente na liberdade das pessoas, a reflexão sobre essas questões é imprescindível.
1) Sobre a legitimidade dessa interferência:
JEAN-JACQUES ROUSSEAU, através do seu Contrato Social, afirmou que o poder do Estado somente se faz real se cada membro da coletividade concorda em renunciar a uma parcela de sua liberdade em benefício da coletividade.
Essa afirmativa não é gratuita, nem representa uma ficção.
A nossa interferência na liberdade dos membros da coletividade existe em função da concordância deles, que compreendem ser essa situação útil para a sobrevivência individual e coletiva.
Assim, nosso poder de julgar existe em função da concordância das pessoas que julgamos.
2) Sobre nossa postura enquanto julgadores:
Não há quem negue que somos seres falíveis, tanto quanto aqueles a quem julgamos.
O que nos permite errar pouco são a consciência da nossa falibilidade e a intenção sincera de acertar.
A consciência da nossa falibilidade representa a humildade, que é o contrário da empáfia, da arrogância, da supervalorização de nós mesmos.
A intenção sincera de acertar espanta o conluio e a corrupção (mesmo aqueles sutis).
Para resumir, depois de vivenciar profissionalmente a realidade do foro estes anos todos, acabei preferindo mais o diálogo com as partes e seus advogados a julgar suas demandas dando razão a umas em detrimento de outras….
* Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).