Direito Previdenciário

O pedido de pensão por morte e auxilio-reclusão e a união homoafetiva

 

1.1          Resumo

O presente estudo tem por objetivo fazer uma breve análise sobre os direitos da união homoafetivas no âmbito da previdência social, quanto a pensão por morte e auxilio reclusão.

 

Para isto serão comentados os princípios existentes na Constituição Federal de 1988, e a legislação previdenciária, considerando ainda a noção atual de família.

 

1.2          Da Proteção Social

 

Com o advento da Constituição Federal de 1988 uma nova gama de valores pautada no Bem Estar Social e na dignidade da pessoa humana foram elevados como diretrizes para construção política de um Estado Democrático de Direito.

 

Assim, os direitos sociais foram salvaguardados como direitos e garantias fundamentais, previstos no art. 5° da CF, tendo em vista, uma postura de proteção social e obrigação quanto ao cumprimento dessa nova ordem social, compreendida ainda, no art. 193 da Carta Maior, de que “A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais”.

 

 

1.3   Da Seguridade Social

 

A Seguridade Social é um meio encontrado pelo legislador constitucional para efetivar a proteção social mínima diante dos riscos eleitos,[1] como fatores necessários ao atendimento daqueles que terão direito ao amparo legal, conforme estabelecidos no art. 194 da CF, assim:

 

A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I – universalidade da cobertura e do atendimento;

II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III – seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;

IV – irredutibilidade do valor dos benefícios;

V – eqüidade na forma de participação no custeio;

VI – diversidade da base de financiamento;

VII – caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

 

Assim, o sistema da Seguridade Social encontra-se estruturada com base na saúde, na previdência social e na assistência social, devendo o Estado implementar as ações políticas e conjuntamente a sociedade solidarizar com o custeio e manutenção dos benefícios.

 

Além disso, contém a seguridade social princípios próprios, que são colocações genéricas das quais derivam as demais normas. Sendo que, no direito da seguridade social não existe apenas um conjunto de princípios e normas, mas também, de instituições, de entidades, que criam e aplicam o referido ramo do direito, por intermédio de um conjunto integrado de ações integradas entre o Estado e a Sociedade.[2]

A natureza jurídica da Seguridade Social é publicista, decorrente da lei (ex lege) e não da vontade das partes (ex voluntates), envolvendo o contribuinte, o beneficiário e o Estado, que arrecada as contribuições, paga os benefícios e presta serviços, administrando o sistema.

 

É, portanto, bastante ampla a Seguridade Social, podendo até mesmo confundir-se com um programa de governo, um programa de política social, é gênero do qual são espécies a Previdência Social, a Assistência Social e a Saúde. 

 

 

1.4               Previdência social

 

1.4. 1 Conceito

 

A previdência social em sua concepção possui um aspecto de seguro sui generis, pois sua finalidade é proteger o beneficiário de determinados riscos pré-estabelecidos para serem cobertos pela proteção social.

 

No entanto, diversamente do seguro privado, alguns eventos podem surgir pela vontade do próprio segurado, como, por exemplo, o nascimento de um filho, em que o casal planeja a concepção do resultado gravidez; o que não se é admitido na esfera privada, sob pena de caracterizar fraude.

 

Ademais, a filiação é compulsória para o Regime Geral da Previdência Social e Regime Próprios da Previdência Social, além de coletivo, contributivo e de organização estatal, conforme previsão do art. 201 da CF.

 

A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

II – proteção à maternidade, especialmente à gestante; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

 

É a previdência social continuidade da Seguridade Social, composta de um conjunto de princípios, de regras e instituições destinado a estabelecer um sistema de proteção social, mediante contribuição, que tem por objetivo proporcionar meios indispensáveis de subsistência ao segurado e sua família.[3]

 

Os meios indispensáveis seriam os previstos no artigo 7º, inciso IV da Constituição Federal de 1988 tais como: moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte. O benefício deve garantir também pelo menos um salário mínimo ao segurado (§ 2º do art. 201 da Constituição Federal de 1988). 

 

Assim, o regime previdenciário depende de contribuição por parte do próprio segurado, ao contrário do regime de assistência social, em que o segurado não precisa ter contribuído para ter direito ao benefício.  

 

A previdência social consiste, portanto, em uma forma de assegurar ao trabalhador, com base no princípio da solidariedade, benefícios ou serviços quando seja atingido por uma contingência social. Entende-se, assim, que o sistema é baseado na solidariedade humana. [4]

 

 

1.4.2 Regime Geral da Previdência Social – RGPS e o Regime Próprio de Previdência Social – RPPS.

 

O RGPS[5] permite que qualquer pessoa nacional ou não, que exerça atividade remunerada em território nacional possa participar, desde que contribua mensalmente para o sistema, de forma que somente terão direito as prestações quem tenha feito os devidos recolhimentos.

 

O RPPS é o regime aplicado aos servidores públicos e militares mantidos pela União, pelos Estados e por alguns Municípios, e sua previsão está prevista no art. 40 da CF.

 

Assim, os regimes básicos da previdência serão mantidos pelo Poder Público, sendo o órgão gestor a autarquia federal o Instituto Nacional do Seguro Social, vinculado ao Ministério da Previdência Social.

De modo que, os riscos sociais cobertos pelo sistema previdenciário estão previstos no art. 201, da CF dentre eles os seguintes eventos[6]: doença, invalidez, morte, idade avançada, proteção à maternidade, especialmente à gestante, ao desempregado involuntário, família, reclusão por morte.

 

A estrutura legal infraconstitucional está determinada na Lei n° 8.212 de 1.991 que dispõe sobre a Organização da Seguridade Social e Plano de Custeio, enquanto que a Lei n° 8.213 de 1.991, disciplina o Plano de Beneficio da Previdência Social, e por fim decreto 3.048 de 1999 que prevê o Regulamento da Previdência Social.

 

 

2. Da Pensão por morte

 

A pensão por morte é um beneficio destinado a manutenção da família, no caso de morte do segurado aposentado ou não, observando que a classe mais próxima exclui a classe mais distante, nos termos do art. 74 a 79 da Lei 8.213 de 1.991, assim o beneficio será pago da data “do óbito, quando requerido até trinta dias; após da data do pedido do requerimento, não retroagindo a data do óbito; da decisão judicial, no caso de morte presumida.”

 

O artigo 75 da referida lei, dispõe que sobre o salário de benefício incide percentual único de 100%, do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data do falecimento.

 

Quanto a carência o beneficio não exige cumprimento de período para que faça jus, a prestação previdenciária, bastando somente que o segurado no momento da morte tenha qualidade de segurado mesmo no período de graça.

 

Assim, segundo exemplo, citado na obra de Nilson Martins Lopes[7]:

 

[…] o trabalhador que tenha firmado um contrato de trabalho com determinada empresa no dia 10 de maio, iniciando ai suas atividades como empregado, caso venha a falecer no dia seguinte, independentemente da causa de sua morte, deixará aos seus dependentes o direito ao benefício previdenciário decorrente de seu óbito.

 

 

Ademais cumpre salientar que a pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação ou outro possível dependente, e qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão do dependente só produzirão efeito a contar da data da inscrição ou habilitação, de acordo com o artigo 76 da Lei 8.213 de 1991.

 

Por último, é importante destacar que a pensão por morte cessa pela morte do pensionista; para o pensionista menor de idade, pela emancipação ou ao completar 21 anos, salvo se for inválido; para o pensionista inválido, pela cessação da invalidez, verificada em exame médico-pericial, não se extinguindo a respectiva cota se confirmada a invalidez.[8] 

 

 

3. Auxilio-reclusão

 

De igual modo, o auxilio-reclusão é um benefício que tem a finalidade de atender os dependentes do segurado, no caso de prisão, com previsão no art. 80 da Lei 8.213 de 1.991.

 

As mesmas condições aplicadas aos dependentes por pensão por morte, também serão concedidas aos dependentes do segurado pelo auxilio-reclusão, independente de carência, somente exigindo do segurado a qualidade de segurado.

 

Com o advento da Emenda Constitucional n°20, que alterou a redação do art. 201 da CF; o beneficio somente será devido aos dependentes de baixa renda, ficando condicionado ainda, que o segurado ao tempo da privação da liberdade não tenha recebido qualquer remuneração da empresa para o qual trabalhava, não podendo inclusive, estar usufruindo dos benefícios do auxílio-doença ou qualquer outro tipo de aposentadoria.

 

Cumpre ressaltar, que o beneficio será pago enquanto, o segurado permanecer preso ou recluso. E sobrevindo fuga, o pagamento sé suspenso, voltando a receber se for recapturado, sendo necessário a cada 3 (três) meses apresentar atestado, demonstrando a condição de preso.

 

No entanto, se o fugitivo vier a ser recapturado após o período de graça, quando perde a qualidade de segurado, cessa o direito ao benefício, exceto se o fugitivo exercer atividade remunerada durante o período, hipótese que seria segurado obrigatório.

 

Assim, a idéia do benefício é o fato de que o preso deixa de ter uma renda e, para que a família deste não fique desamparada é o benefício à esta família.

 

Porém, este benefício infelizmente, na maioria dos casos, não é pago à família do preso por falta de informação ou pelo fato de o segurado nunca ter contribuído para o sistema já que para fazer jus a este benefício é necessário anexar a solicitação a certidão do efetivo recolhimento a prisão, firmada pela autoridade competente. Sendo, a prisão, portanto, o requisito para se obter esse benefício, pouco importa o tipo de prisão.

 

Neste benefício não há período de carência e a renda mensal será de 100% do valor do salário benefício. O próprio cônjuge será considerado como dependente, se houver.

 

Por fim, no caso de falecimento do segurado detento ou recluso, o auxílio-reclusão será automaticamente convertido em pensão por morte, tendo o dependente direito a 100% do salário de benefício.

 

 

4. Da União Homoafetiva

 

A família é o núcleo fundamental em que se baseia a organização social, por isso a Constituição da República Federativa do Brasil contempla a sua estrutura, sem, no entanto, estabelecer uma definição do termo família, dada à complexidade de conceitos.

 

Assim, o vocábulo família, segundo DINIZ[9] compreende três conceitos fundamentais, quanto a sua extensão, são eles:

 

Sentido amplo – […] Abrange todos os indivíduos que estiverem ligados pelo vínculo da consangüinidade ou da afinidade, chegando a incluir estranhos, como no caso do art. 1.412, §2°, do Código Civil, em que as necessidade da família do usuário compreendem também as das pessoas de seu serviço doméstico.

 

                                                                                        Sentido lato – além dos cônjuges ou companheiros, e de seus filhos, abrange os parentes da linha reta ou colateral, bem como os afins (os parentes do outro cônjuge ou companheiro)[…]

 

Sentido restrito – […] o conjunto de pessoas unidas pelos laços de matrimonio e da filiação, ou seja, unicamente os cônjuges e a prole […], e entidade familiar a comunidade formada pelos pais, que vivem em união estável, ou por qualquer dos pais e descendentes de existir o vínculo conjugal, que a originou.

 

 

Sob aspecto político a família recebe especial proteção do Estado, pelo menos no aspecto formal, isto em função da sua relevância na formação da população, base celular da sociedade brasileira.

 

Para atender sua finalidade é natural a intervenção do Estado no sentido de fortalecer e proteger, determinando normas de ordem pública, as quais não podem ser modificadas e nem substituídas pelos indivíduos.

 

Desse modo, a Constituição Federal elege a família, a base da sociedade nos, termos do art. 226 e seus parágrafos:

 

Art. 226. A família, base da sociedade tem especial proteção do Estado.

 

§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

 

Assim, a Constituição Federal de 1988 trouxe disposições significativas, como a proteção assegurada não só ao casamento, como também à família o que é um avanço considerável no conceito de família, estabelecendo como entidades familiares a instituída pelo casamento, pela união estável e a família monoparental, esta constituída por apenas um dos pais mais a prole.

 

No entanto, a doutrina e a jurisprudência vêm aumentando o rol de modalidades de família, já sendo aceito por alguns juristas nesse contexto a união homoafetiva.[10]

 

 

Princípios do direito de família

 

Ainda, em sede de matéria constitucional, o direito de família, tendo em vista o elevado interesse da sociedade, foi construído com fundamento nos seguintes princípios: Princípio da dignidade da pessoa humana[11]:, previsto no art. 1º, inciso III da CRFB, trata-se de um valor espiritual e moral, manifestado por cada um, quanto a capacidade de compreender de modo consciente os próprios atos e extensão das conseqüências gerados por eles, e em relação as demais pessoas na sociedade.

 

Isto requer que cada um possa manifestar sua vontade, sem menosprezar a existência dos demais indivíduos na vida. Cada qual, respeitando seu espaço, sem precisar transgredir a liberdade do outro, que também é limitada. Por isso, Alexandre de Moraes, entende que esse princípio[12].

 

“[A]presenta-se em uma dupla concepção. […] um direito individual protetivo, seja em relação ao próprio Estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em segundo lugar, estabelece verdadeiro dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes.

 

Com o advento da Constituição Federal uma nova ordem de valores foi adotada, ressaltando, a dignidade da pessoa humana sob o enfoque da pluralidade da entidade familiar, proibição de designações discriminatórias da filiação e a igualdade de direitos entre homens e mulheres.

 

O legislador também amparou a título de família a união estável, regularizando situações pretéritas, de pessoas que constituíram família, porém, sem o aspecto civil e formal do casamento legal.

 

Outra bandeira, que se tem levantado, e inclusive adotado pela Argentina é a união entre pessoas do mesmo sexo. Enquanto, nova ordem democrática em breve, terá a mesma previsão no ordenamento jurídico brasileiro, segundo Daniel Borrillo[13] a união homossexual, é:

 

A reivindicação do casamento pelas lésbicas e pelos gays é um passo a mais nesse processo de democratização. A reivindicação jurídica dos gays e lésbicas inscreve-se, assim, no seio da influência política que os ultrapassa, e da qual outros grupos já participaram. A negação do casamento aos casais de mesmo sexo baseia-se em uma idéia monolítica e essencialista da união, mais próxima do sacramento que do contrato civil. Não existem argumentos jurídicos para proibir o casamento homossexual. Por isso apelamos à ordem moral, natural ou religiosa, da mesma maneira que o fizemos para condenar a união dos infiéis, para proibir casamentos mistos ou para justificar a dominação das mulheres pelos homens. Esses atores sociais, fora da norma antigamente, conceberam o casamento dando-lhe contornos mais democráticos.

 

 

Segundo Jacinta Gomes Fernandes:

 

“A homossexualidade acompanha a história do homem. Não é crime nem pecado; não é uma doença nem um vício. Também não é um mal contagioso, nada justificando a dificuldade que as pessoas têm de ser amigas de homossexuais. É simplesmente uma outra forma de viver. A origem não se conhece. Aliás, nem interessa. […] Nos tempos atuais, o preconceito perdura, porém o fato social é mais tolerado e aceito, sendo a condição assumida publicamente por seus adeptos, como se observa nas famosas paradas gays, constituídas por centenas de participantes, incluindo-se, entre os de fato assumidos (gays e lésbicas), um grupo de simpatizantes, formando os chamados GLSs – hoje acrescidos pelos bissexuais, tornando-se a sigla BGLSs. Contemporaneamente, a homossexualidade passa por uma fase de maior abertura, isto é, há uma tendência maior à sua aceitação pelas sociedades modernas, especialmente no Ocidente. Hoje é comum observar a existência de entidades e organizações criadas para defender os interesses dos homossexuais (CORREIA, Jadson Dias apud BEZERRA, 2000, p. 52). O preconceito contra os homossexuais começa pela própria família, passando pelos amigos e colegas de trabalho até esbarrar em determinados segmentos da sociedade, que, em pleno século XXI, ainda insistem em discriminar seus adeptos, como grupos religiosos e políticos, ostentando a mídia, vez por outra, reportagens sobre ocorrências de violência física e moral contra os seguidores dessa forma de vida. O legislador, com medo da reprovação de seu eleitorado, prefere não aprovar leis que concedam direitos às minorias alvo de discriminação. Assim, restam as uniões homossexuais marginalizadas e excluídas do sistema jurídico. No entanto, a ausência de lei não significa a inexistência de direito. Tal omissão não quer dizer que são relações que não mereçam a tutela jurídica (DIAS, 2006, p.174/175). Como bem destaca ÉRIKA BEZERRA, tais manifestações “ferem princípios constitucionais, tais como o direito à igualdade, e os demais direitos da personalidade, da privacidade, da intimidade, previstos no art. 5º e seus incisos” (2000, p. 52).”[14]

 

 

Assim, mesmo que a CF prestigie a união estável, entre sexos diferentes, o companheiro homoafetivo também é contemplado na primeira categoria de casse de dependentes, tendo em vista, que o tema encontra-se regulado pela Instrução Normativa INSS/PR n° 20 de 2007, com fundamento na decisão proferida nos autos da Ação Civil Pública n° 2000.71.00.009347-0, pertencente a 3ª Vara Federal Previdenciária de Porto Alegre- RS. Para tanto, somente será concedido o beneficio se comprovada a vida em comum, conforme dispões o artigo 25 da Instrução normativa INSS/PR nº 45 de 2010, in verbis:

 

 

Art. 25 Por força da decisão judicial proferida na Ação Civil Pública nº 2000.71.00.009347-0, o companheiro ou a companheira do mesmo sexo de segurado inscrito no RGPS integra o rol dos dependentes e, desde que comprovada a vida em comum, concorre, para fins de pensão por morte e de auxílio-reclusão, com os dependentes preferenciais de que trata o inciso I do art. 16 da Lei nº 8.213, de 1991, para óbito ou reclusão ocorridos a partir de 5 de abril de 1991, conforme o disposto no art. 145 do mesmo diploma legal, revogado pela MP nº 2.187-13, de 2001.”

 

 

Em outro julgado proferido pelo STJ, foi admitida a legitimidade do Ministério Público na questão, tendo destacado que o conceito de entidade familiar contempla a união estável, e sem excluir as relações homoafetivas as relações homoafetivas [REsp. 395904, Rel. Min. Hélio Quaglia, julgado em 15/12/2005][15].

 

 

Portanto, no que diz respeito à chamada família homoafetiva, já se constatou que hoje é um fato social consolidado ao longo dos anos, não mais podendo o Judiciário ignorar a sua existência e tampouco lhe negar a tutela jurisdicional. Embora não se enquadrem no tradicional modelo de família, tais uniões se fundam no amor, afeto, respeito, dignidade. Sendo estes valores intrínsecos e inerentes a todo ser humano, de modo que a sua marginalização e desrespeito constituem afronta aos direitos humanos e, conseqüentemente, aos princípios do respeito à dignidade humana e da igualdade.

Nesse sentido tem-se firmado o entendimento jurisprudencial, in verbis:

 

 

“RELAÇÃO HOMOERÓTICA. UNIÃO ESTÁVEL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE HUMANA E DA IGUALDADE. ANALOGIA. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO. VISÃO ABRANGENTE DAS ENTIDADES FAMILIARES. REGRAS DE INCLUSÃO. PARTILHA DE BENS. REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 1.723, 1.725 E 1.658 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. Constitui união estável a relação fática entre duas mulheres, configurada na convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir verdadeira família, observados os

deveres de lealdade, respeito e mútua assistência. Superados os preconceitos que afetam ditas realidades, aplicam-se os princípios constitucionais da dignidade da pessoa, da igualdade, além da analogia e dos princípios gerais do direito, além da contemporânea modelagem das entidades familiares em sistema aberto argamassado em regras de inclusão. Assim, definida a natureza do convívio, opera-se a partilha dos bens segundo o regime da comunhão parcial. Apelações desprovidas (Apel. Cív. nº 70005488812, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 7ª Câm. Cível, Rel. Des. José Carlos Teixeira Giorgis, julg. Em 25/06/2003).”[16]

 

 

 

Conclusão

 

Assim, conclui-se que embora a Constituição Federal tenha privilegiado a união entre pessoas de sexo diferentes, não se pode olvidar que a dignidade da pessoa humana, norteia o direito no sentido de coagir qualquer violação ao direito que o homem tem de poder viver e se desenvolver em sociedade.

 

Não se admitindo que a discriminação inviabilize uma condição amparada no respeito e na afetividade mesmo entre pessoas do mesmo sexo, além disso, a previdência possui um caráter protegido de amparar quem dela necessite e tenha preenchidos os requisitos dos benefícios.

 

No atual estagio de conscientização da sociedade, a família clássica e nem sempre estruturada se tornou relativizada na sua formação, não tendo nenhum argumento plausível e legal que veda o reconhecimento de união estável entre as pessoas do mesmo sexo, sendo perfeitamente admitido e justo a concessão do beneficio no presente caso.

 

Sendo assegurado a todos o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.

 

Portanto, a nossa Constituição Federal que se diz democrática e consagra como princípio fundamental o respeito à dignidade da pessoa humana, deve tutelar sem distinção, aos cidadãos, direito individual à liberdade, igualdade, direito social a uma proteção positiva do Estado e, sobretudo, direito humano à felicidade.

 

 

Bibliografia

 

BORILLO, Daniel. O indivíduo homossexual, o casal de mesmo sexo e as famílias homoparentais: análise da realidade jurídica francesa no contexto internacional. Disponível em: < http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=179>. Acesso em 06 nov. 2010

 

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, 25 ed. , São Paulo: Saraiva, 2010, v. 5.

 

FERANADES, Jacinta Gomes. União homoafetiva como entidade familiar: Reconhecimento no ordenamento jurídico Brasileiro. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br/institucional/dir_gerais/dgcon/pdf/artigos/direi_famil/uniao_homoafetiva_como_entidade_familiar.pdf > Acesso em: 29 nov. 2010

 

IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de direito previdenciário, 15 ed. rev. ampl.e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.

 

LOPES JUNIOR, Nilson Martins. Direito previdenciário: custeio e benefícios, 3 ed. São Paulo: Rideel, 2010.

 

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.

 

MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. Teoria Geral; Comentários aos arts. 1° a 5° da Constituição da República a Federativa do Brasil. Doutrina e Jurisprudência, 8 ed. São Paulo: Atlas, 2007

 

 

* Adriana Souza Ribeiro e Fernanda Cristina Rodrigues de Moraes, estudantes de direito, cursando a 9ªetapa na Universidade de Ribeirão Preto/SP



[1] LOPES JUNIOR, Nilson Martins. Direito previdenciário: custeio e benefícios, 3 ed. São Paulo: Rideel, 2010 p. 62.

[2] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 43. 

[3] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. op. cit. p. 300. 

[4] Id ibid. p. 301.

[5] IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de direito previdenciário, 15 ed. rev. ampl.e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. p. 32.

[6] LOPES JUNIOR, Nilson Martins, Op. cit. p. 52.

[7] LOPES JUNIOR, Nilson Martins, Op. Cit. p. 344

[8] MARTINS. Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. Op. cit. p. 383.

[9] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, 25 ed. , São Paulo: Saraiva, 2010, v. 5, p. 9-10

[10] FERANADES, Jacinta Gomes. União homoafetiva como entidade familiar : Reconhecimento no ordenamento jurídico Brasileiro. Disponível em: < http://www.tj.rj.gov.br/institucional/dir_gerais/dgcon/pdf/artigos/direi_famil/uniao_homoafetiva_como_entidade_familiar.pdf >  Acesso em: 29 nov. 2010

[11] MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. Teoria Geral; Comentários aos arts. 1° a 5° da Constituição da República a Federativa do Brasil. Doutrina e Jurisprudência, 8 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.45-46.

[12] Id., ibid. p. 46

[13] BORILLO, Daniel. O indivíduo homossexual, o casal de mesmo sexo e as famílias homoparentais: análise da realidade jurídica francesa no contexto internacional. Disponível em: < http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=179 >. Acesso em 06 nov. 2010.

[14] FERANADES, Jacinta Gomes. União homoafetiva como entidade familiar : Reconhecimento no ordenamento jurídico Brasileiro. Op. cit. p. 13.

[15] IBRAHIM, Fabio Zambitte. Op. cit. p.560.

 

[16] Disponível em:  < http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris >. Acesso em : 29 nov. 2010.

Como citar e referenciar este artigo:
MORAES, Adriana Souza Ribeiro e Fernanda Cristina Rodrigues de. O pedido de pensão por morte e auxilio-reclusão e a união homoafetiva. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/previdenciario/o-pedido-de-pensao-por-morte-e-auxilio-reclusao-e-a-uniao-homoafetiva/ Acesso em: 06 jul. 2025