A desaposentação é definida como a reversão da aposentadoria obtida no Regime Geral de Previdência Social, ou
Esse instituto pode existir em qualquer regime previdenciário desde que tenha como objetivo a melhoria da condição econômica do associado. O intuito da desaposentação é liberar o tempo de contribuição utilizado para a aquisição da aposentadoria, que modo que esse tempo fique livre e desimpedido para averbação em outro regime ou mesmo para o mesmo benefício no mesmo regime, o que ocorre quando o segurado após aposentar-se continua laborando.
Havendo mudança de regime previdenciário, a contagem recíproca entre regimes distintos é garantida pela Constituição Federal, artigo 201, § 9º, que estabelece:
Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na Administração Pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei.
A desaposentação no mesmo regime previdenciário, geralmente o RGPS, é requerida pelo segurado que após aposentar-se continua trabalhando por vários anos, mantendo a contribuição prevista no artigo 12, § 4º, Lei nº 8.213/91, sem, contudo, nenhum acréscimo em seu benefício.
Entretanto, a desaposentação não possui previsão legal, motivo pela qual é negada pelos órgãos administrativos, que fundamentam suas decisões no Decreto 3.048/99, que veda a renúncia da aposentadoria. Os regimes próprios de previdência são também omissos quanto a questão, no máximo tratando da reversão, que é um instituto distinto, pois visa o retorno ao labor remunerado no cargo público com a perda do benfício previdenciário, no interesse da Administração pública, mero ato discricionário da mesma.
A desaposentação, como o próprio nome esclarece, restringue-se ao desfazimento dos benefícios da aposentadoria, excluindo outros benefícios. Afastando também o benefício da aposentadoria por invalidez, por motivos óbivios.
As aposentadorias por idade, por tempo de contribuição e especial podem ser objeto da desaposentação. Sendo a renúncia mais comum nos caos de aposentadoria por tempo e contribuição, pois é o benefício onde os segurados geralmente aposentam-se mais novos, e geralmente retornam ao mercado de trabalho, pois devido a sua idade e a aplicação do fator previdenciário, seus benefícios são reduzidos, e consequentemente há uma diminuição no padrão de vida dos segurados, o que os obrigam a retornar ao mercado de trabalho.
Não há nenhum entrave quanto a renúncia dos benefícios de aposentaoria por idade, uma vez que a idade avançada não é óbice, podendo o requerente continuar a trabalhar, e consequentemente voltar a contribuir e se quiser renunciar a benefício com a intenção de conseguir novo benefício mais vantajoso.
Quanto ao benefício de aposentadoria especial, o segurado pode retornar ao mercado de trabalho, desde que não exerça atividade que o exponha a agentes nocivos, poderá computar este tempo ao tempo da aposentadoria especia e obter benefício mais vantajoso.
No RPPS tais condições também se aplicam, podendo ser aplicadas no desfazimento do seu benefício visando a obtenção de seu tempo de contribuição, o que poserá ser feito tanto nas aposentadorias voluntárias como na aposentaoria compulsória, visando aposentadoria mais vantajosa no RGPS.
1- A DESAPOSENTAÇÃO E SUAS DIVERGÊNCIAS NO SISTEMA DE SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRO.
Muito já se discutiu acerca do cabimento ou não da desaposentação no sistema de seguridade social brasileiro. A corrente contrária, adotada pelo Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS), argumenta que a aposentadoria figura como um ato jurídico perfeito e não há previsão legal expressa para o seu desfazimento, de modo que a desaposentação compromete a segurança jurídica. Por outro lado, a corrente favorável à desaposentação, que tem prevalecido, entende que a aposentadoria consiste em direito patrimonial disponível e, portanto, renunciável. Ademais, ante o silêncio da lei, a omissão deve ser interpretada a favor dos segurados, não contra[iii].
Atualmente, todavia, a discussão mais acirrada centraliza-se na necessidade ou não da devolução dos valores percebidos durante o gozo do benefício de aposentadoria. Nesse ponto, há quem entenda ser necessária a devolução dos valores, sob o argumento de que isso traria o segurado ao status quo ante para a percepção de novo benefício, bem como preservaria o equilíbrio financeiro da Previdência Social. Nesse sentido, já se manifestou a Turma Nacional dos Juizados Especiais Federais[iv].
Por outro lado, outros defendem que a desaposentação prescinde da devolução dos valores recebidos durante a vigência do benefício, porquanto o ato de renúncia tem efeito ex nunc e, enquanto aposentado, o segurado teve direito legítimo aos proventos. Além disso, o benefício previdenciário de aposentadoria apresenta natureza alimentar, de sorte que não faria sentido que o segurado, ao renunciar a ele por motivos posteriores, tivesse de assumir dívida exorbitante e injusta. Esse entendimento, adotado inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça[v], parece-nos mais o acertado, posto que não ofende o direito adquirido do segurado às prestações por ele percebidas validamente enquanto se encontrava no gozo do benefício.
2- DA PREVISÃO LEGAL EXPRESSA
A desaposentação não possui previsão legal expressa, sendo este o principal argumento da Administração Pública para negar a aplicação do instituto. Entretanto, também não há previsão legal proibindo a utilização de tal instituto.
O Poder Público distorce a correta aplicação do Princípio da Legalidade, uma vez que o administrado pode fazer tudo, desde que não proibido por lei; entretanto, a Administração Pública só fará aquilo que estiver previsto em lei, não podendo a Administração Pública impor ditames legais aos administrados, podendo somente impor suas restrições através de lei.
DI PIETRO é um dos autores partidários de tal posição, dizendo resumidamente que a Administração Pública não pode, por simples ato administrativo (como um regulamento), conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto, ela depende de lei.( DI PIETRO, Maria Sylvia. Direito Admiistrativo. 13ª ed. São Paulo; Atlas, 1999, p. 68).
A ausência de previsão legal para o exercício das prerrogativas inerentes à liberdade da pessoa humana, não pode ser alegada pela Administração Pública como entrave à desaposentação, visto que cabe à pessoa, desde que perfeitamente capaz, julgar a condição mais adequada para sua vida, aposentado ou não.
Portanto, como a desaposentação visa interesse exclusivo do aposentado, seja pelo RGPS ou mesmo algum regime próprio de previdência, a Administração Pública não pode negar a aplicação de tal instituto, pelo simples fato do mesmo não estar previsto expressamente em lei.
3- QUESTÕES PROCESSUAIS.
A competência para julgamento da ações relativas a desaposentação, conforme artigo 109, I da CF/88, é privativa da Justiça Federal, figurando no pólo passivo da presente demanda o Instituto Nacional do Seguro Social, isso no caso de renúncia a benefício do RGPS.
No caso da desaposentação onde o regime de origem seja o próprio de qualquer dos entes federados, dependerá justamente de qual ente federado o servidor estiver vinculado. No caso do servidor vinculado a regime de previdência dos estados ou dos municípios, a competência será da Justiça Estadual, enquanto que o servidor federal será a justiça federal.
Quando o domicílio dos segurados não for sede da Justiça Federal, a ações poderão ser processadas e julgadas perante a Justiça Estadual, ou no foro da Justiça Federal na capital do respectivo estado da federação.
A desaposentação, conforme Lei 10.259/01, pode ser proposta perante o Juizado Espeial Federal, nas causas em que o valor não exceda sua competência, ou seja, 60 salários mínimos. Não havendo Vara Federal a caus pode ser julgada no Juizado Especial Federal mais próximo do foro definido no artigo 4 da Lei 9.099/95.
Por outro lado, o requerimento administrativo continua a ser item obrigado para o ajuizamento de praticamente todas as ações previdenciárias, sob pena de falta de interesse de agir, sendo julgado carecedor de ação, devido a ausência de conflito de interesse.
Entretanto, a simples comprovação do requerimento administrativo, sem resposta no tempo hábil, já é documento comprobatório da recusa do INSS. O requerimento administrativo torna-se desnecessário, quando comprova-se que a autarquia já tem possicionamento pacífico acerca da questão, como é o caso da desaposentação.
A desaposentação pode ser objeto de tutela antecipada, conforme estabelece o artigo 273 do Código de Processo Civil, desde que comprovados todos os seus requisitos.
4- CONCLUSÃO
Depois de analisar os principais aspectos da desaposentação, não resta dúvida de que a mesma é constitucional, inexistindo qualquer vedação expressa à opção do segurado em renunciar ao benefício de origem, desde que tenha como intuito a obtenção de benefício mais vantajoso.
O Princípio da Legalidade não deixa dúvidas acerca da possibilidade do segurado optar pela renúncia do benefício para a obtenção de outro mais vantajoso, uma que o administrado/segurado pode fazer tudo, desde que não proibido por lei, ao contrário da Administração Pública, que somente fará aquilo que estiver previsto em lei, não podendo a Administração Pública impor ditames legais aos administrados, podendo somente impor suas restrições através de lei.
Ficou demonstrado, também, que o instituto da desaposentação não causa nenhum tipo de prejuízo ao equilíbrio atuarial do sistema, pois as contribuições posteriores ao benefício não estavam previstas, não havendo nenhum obstáculo para a revisão atuarial. O mesmo acontece quando o segurado deseja ingressar em novo regime previdenciário. O regime previdenciário de origem, geralmente o RGPS, não sofrerá prejuízos, pois irá deixar de efetuar os pagamentos ao segurado, vertendo recursos acumulados ao regime próprio, mediante compensação financeira, devendo-se levar em consideração o fato de que o montante arrecado será utilizado em período temporal menor, já que a expectativa de vida do segurado será reduzida.
Entretanto, deve-se fazer outra ponderação acerca o equilíbrio atuarial e a necessidade de devolução dos valores percebidos a título de aposentadoria, pois, conforme já mencionado, os regimes previdenciários públicos brasileiros não são regimes de capitalização individual, ou seja, de acumulação de capitais em conta individual, variando o benefício conforme o valor e o tempo de acumulação. Assim, não há o que se falar em restituição, uma vez que o custeio é realizado dentro do sistema de pacto intergeracional, com a população atualmente ativa sustentando os benefícios dos hoje inativos, ou seja, o Poder Público não aplica os recursos advindos das contribuições dos segurados visando o futuro, ao contrário do sistema de capitalização, mas utiliza-os no momento de seu efetivo pagamento; portanto, não há o que se falar em restituição, nem em desequilíbrio atuarial.
Enfim, não se pode negar que a desaposentação visa uma melhora no bem estar do segurado, garantindo a ele uma aposentadoria mais vantajosa do que anteriormente recebia, melhorando sua qualidade de vida e de seus dependentes, indo ao encontro do que estabelece a Constituição Federal, ao garantir o direito a vida, a dignidade, ao trabalho.
Portanto, o instituto da desaposentação está totalmente sintonizado com os preceitos constitucionais mais nobres, desde que requerido com o intuito de benefício mais vantajoso, no RGPS ou em qualquer outro regime previdenciário.
BIBLIOGRAFIA:
— BRAMANTE, Ivani Contini. Desaposentação e Nova Aposentadoria. Revista de Previdência Social, nº 244, março/2001.
— www.direitonet.com.br