Direito Previdenciário

A desvinculação de receitas da receita da União: uma análise econômica do déficit orçamentário da Seguridade Social

fig1

Lorena Regina de Oliveira[1]

Rodrigo Fagundes Noceti[2]

 Resumo

O presente trabalho possui como objetivo principal mostrar a Desvinculação de Receitas da União e seus impactos causados no orçamento Seguridade Social, através de uma pesquisa sobre a concepção de alguns autores sobre o tema e confirmar a ideia de que a arrecadação feita pela Seguridade Social e o valor de benefícios concedidos não explicam o atual déficit. Através uma Regressão Simples econometrica foi possível verificar que a arrecadação explica os benefícios concedidos, mas comparando a mesma em relação à DRU os dados se mostram inconsistentes, confirmando que a o equilíbrio entre arrecadação e benefícios concedidos são suficientes para equilibrar a balança orçamentária da seguridade social, o que desequilibra são os desvios de recursos feitos para União.

Palavras Chaves: Seguridade Social, DRU, Déficit, Regressão Simples.

Introdução

A Desvinculação de Receitas da União (DRU) foi aprovada em 1994 desde a implementação do Plano Real, pelo fato de que a crescente taxa de inflação impedia o estado de fechar a meta orçamentária proposta. Acabando os efeitos da crescente inflação a DRU contribuiu para que as contas públicas melhorassem possibilitando a implantação de reformas constitucionais.

Porém o que era algo emergencial e passageiro tornou-se o fator que constantemente resolve o problema das contas públicas no vermelho e as leva ao superávit primário proposto pela União. Através de emendas constitucionais e PEC a desvinculação de receitas vem sendo prorrogada desde então, iniciando com o Fundo de Estabilização Fiscal até a mais recente prorrogação da DRU ate 2023.

E com as prorrogações é retomada a polemica de que a desvinculação de receitas da Seguridade Social impacta diretamente no déficit orçamentário em que a mesma se encontra, dificultando a concessões de benefícios destinados a áreas de saúde, previdência e assistencialismo, que durante muito tempo foi dificilmente conquistada.

A presente pesquisa pretende confirmar através de uma Regressão Múltipla o fato que vários autores já vêm analisando, qual a relação que as arrecadações possuem com os benefícios concedidos e a desvinculação de receitas. Com isso será feito um breve histórico sobre a Seguridade Social no Brasil e suas conquistas, posteriormente a análise feita será sobre as receitas e o orçamento da seguridade social, assim levando a entender a evolução da desvinculação de receitas. Assim, será possível levantar os dados e apresentar a metodologia, e então finalizar a pesquisa com o resultado da Regressão Simples e considerações finais.

1. Breve Histórico da Seguridade Social no Brasil

Promovida através da aprovação pública, as políticas de proteção social onde integra saúde, assistência social e a previdência são resultados da demanda histórica dos riscos sociais e luta do trabalhador assalariado. Seja qual for o objetivo para intervenção, o intuito da seguridade vai depender do grau de socialização de políticas adquiridas pela classe trabalhadora, bem como as estratégias do capital quando incorporado às necessidades do trabalho (Mota, 2002).

Nos Países capitalistas da America Latina e Europa Ocidental, a estrutura da Seguridade Social possui como referência a forma de organização do trabalho, mesmo sendo constituída de diferentes formas em cada país ela decorre de diversos fatores estruturais, níveis de desenvolvimento do capitalismo e como a classe de trabalhadores se organiza. Definir a entidade seguridade social como um centro do Estado social foi após a Segunda Guerra Mundial, sendo um fator determinante no que diz respeito às relações sociais e econômicas no perfil keynesiano-fordista (BOSCHETTI, 2003).

As iniciativas do beneficio previdenciário que constituem a seguridade social do século XX atribui como berço a Alemanha, que ao final do século XIX, precisamente em 1883, onde governava o Chanceler Otto Von Bismarck que atendia aos pedidos revoltosos e pressionados com greves, resultando no modelo bismarckiano que se assemelha aos de seguros privados, atendendo principalmente aos trabalhadores que contribuem com um montante e no final das prestações são pagos valores proporcionalmente. Voltado à contribuição direta, esta é pautada na folha de salários. A gestão dos benefícios é sistematizada em Caixas que são administradas pelo estado, onde os contribuintes possuem participações (BOSCHETTI, 2003). Modelo este que amparam vários benefícios da seguridade social, entre eles os previdenciários.

Em meados da Segunda Guerra Mundial, onde a conjuntura econômica e política eram diferentes do período citado anteriormente, mas precisamente em 1942 na Inglaterra, formulou-se o plano Beveridge que apresentava criticas ao modelo bismarckiano válido ate o momento. Neste, o direito apresentava caráter universal, beneficiando incondicionalmente todos os cidadãos garantindo o mínimo de condições necessárias, dado que seu financiamento era feito através de recolhimento de impostos fiscais, gestão pública e de estatais. Fundamentava-se nos conceitos de unificação institucional e uniformização dos benefícios (BEVERIDGE, 1943).  

Os modelos de seguridade social possuem como preceito os direitos do trabalho, sejam eles modelos baseados no alemão bismarckiano, como aqueles motivados pelo beveridigano inglês. Dado a sua origem, apropriam-se de garantir as prerrogativas que advém da execução do trabalho para trabalhadores que deixaram permanentemente ou momentaneamente a capacidade de executar suas atividades laborais (BOSCHETTI, 2003).

Estas mudanças foram necessárias para coordenar o modo como uma cultura de proteção social leva a ao desenvolvimento de estratégias compostas da supremacia da classe dominante, que para exercer o papel de liderança necessitava fazer a real reforma moral e social que transformasse seu projeto de classe em um projeto de todas as classes (MOTA, 2002). 

Dessa forma, em razão do movimento de redemocratização do Brasil a Constituição Federal de 1988, analisando do ponto de vista normativo, transcende a visão de seguridade social e inicia a perspectiva de seguridade social, esta entendida como “um conjunto de ações integradas de iniciativa do poder público e da sociedade, no qual assegura os direitos voltados à saúde, assistência social e a previdência social” (Brasil, 2002, art. 194). A introdução da Seguridade Social no Brasil acarretou nas mudanças das dimensões das três políticas que se inter-relacionam. Voltando à previdência social, na qual manteve a congruência contributiva, requerendo uma lógica atuarial que garantia ser sustentável, apresentou um relaxamento da união contribuindo para que o princípio que estrutura o sistema legitimaria os programas de transferência de renda, principalmente do porte de aposentadoria rural (FLEURY, 2006).

A disseminação da previdência social é regida por duas regras iniciais: o critério de inserir o mercado formal de trabalho como mecanismo substancial na deliberação de direitos sociais, e a ordem cronológica de sua instituição nas diferentes porções assalariadas em sintonia com a importância dos setores econômicos em que os segmentos estavam instalados, reivindicando e mobilizando por melhores condições de trabalho e vida (COHN, 1995).

Se em algum momento a seguridade social se confundiu com o conceito de previdência social, atualmente esse contexto foi superado pelo significado da Seguridade Social, que se entende como um amplo e complexo sistema de medidas e organismos que tendem não somente em combater as questões protegidas pelo sistema de seguro social, mas também outros não protegidos por ele como elevar o padrão de vida do cidadão (ANFIP, 2016).

Portanto a seguridade social se propõe a melhorar a vida do cidadão e as situações das classes sociais, principalmente das mais necessitadas, não apenas isso, mas também um conjunto de ações prospectivas, convertendo em um vasto organismo de política social a serviço da justiça social.

A fim de que se cumpram esses objetivos de proteção social, a seguridade social deve ser compreendida numa perspectiva integral colaborativa com a Previdência social, Assistência Social e também a saúde. Especificamente no campo previdenciário, as eventualidades sociais se relacionam com a questão produtiva e são conduzidas em substituição ao salário ou a remuneração, a partir dos “riscos sociais clássicos” que podem ser sintetizados através das hipóteses de contingencias sociais previstas no art. 201 da Constituição Federal de 1988. A previdência Social é um complemento e integrada pela assistência social, destinada aos mais desamparados pela sociedade independente de contribuições ou recolhimentos (ANFIP, 2016).

2. Modelo de Orçamento e Receitas da Seguridade Social

O orçamento da Seguridade Social chegou a ser elaborado no inicio dos anos 1990 após regulamentar as leis de custeio e dos benefícios da seguridade social. Entre 1993 e 1994 surgiu como recomendação do Conselho de Seguridade social, mas esta não prevaleceu e o Conselho que tinha o objetivo de promover e sintetizar um orçamento com um debate prévio com os responsáveis pela previdência social, assistência social e saúde, que com o tempo foi perdendo suas atribuições e deixou de existir pela MP 1.799-5 de 1999. (Delgado, 2002).

Previsto na Constituição Federal, a principal finalidade do orçamento da Seguridade Social era de se constituir em um próprio espaço integrado com as ações da previdência, assistência social e saúde, o que iria assegurar apossar-se dos recursos do orçamento fiscal. Contudo, isso na prática não vigorou, a área da assistência social foi eliminada, a saúde imprensada de um lado pelo Orçamento Geral da União e de outro pelo Ministério da Previdência (ANFIP, 2016).    

Segundo Vianna (2003), a ideia de orçamento da Seguridade Social foi desconstruída na década de 1990, logo que a legislação regulou a seguridade traçando vertentes separadas para as três políticas, com leis distintas para a saúde, previdência e assistência social. Analisando do ponto de vista do aporte, as políticas do âmbito da seguridade social brasileira foram gradativamente isoladas.  

Dessa forma, como não se possui uma peça orçamentária autônoma, constitucionalmente dizendo, segundo o IPEA (2003) um provável Orçamento da Seguridade social pode ser tirado do Orçamento fiscal e da Seguridade Social da União. Dessa maneira, duas instituições nacionais vêm pesquisando e divulgando a organização orçamentária da seguridade social: a Associação Nacional dos Fiscais de Contribuições Previdenciários (ANFIP) e o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA)  

A ANFIP considera em sua avaliação por um lado, todas as receitas da seguridade social criadas pela constituição e instauradas posteriormente para seu financiamento, dentre elas a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido da Pessoa Jurídica – CSLL e a CPMF, e ainda conta com a receita previdenciária líquida que se equipara basicamente às contribuições de empregados e empregadores sobre a folha de salários e mais o Simples Nacional. Em contrapartida as despesas consideram o pagamento dos benefícios previdenciários urbanos e rurais, benefícios assistenciais e ações de saúde do Sistema único de Saúde (SUS), saneamento e subsídios ao Ministério da Saúde. Continuando, dados da ANFIP em 2005 mostraram que o saldo primário do orçamento da seguridade social para o ano de 2004, foi positivo em R$42,5 bilhões (BOSCHETTI, 2005).

Já o IPEA vem mostrando por meio do seu Boletim de Políticas Sociais (BPS) a Estrutura Orçamentária da Seguridade Social. Metodologia na qual foi publicada por Delgado (2002), que mostra a hierarquia de critérios sobre os direitos sociais que a constituição e a legislação infraconstitucional corroboraram. Destacando no que diz respeito às despesas, os gastos referentes às políticas: Previdenciária, Assistência Social, Saúde, do Trabalho (seguro-desemprego) e da Previdência de Inativos e Pensionistas da União. Na área das receitas, além das citadas pela ANFIP incluem-se a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) que financiam o seguro-desemprego, a Contribuição sobre a produção rural e a Contribuição para Seguridade do Servidor Público (CSSP). Do ponto de vista desta metodologia o resultado do orçamento da Seguridade Social nos últimos anos foi superavitário (BOSCHETTI, 2005).       

Com este levantamento é possível analisar que independente da metodologia utilizada pelas instituições descritas acima para analisar as receitas obtidas confrontando com as despesas, o orçamento da Seguridade Social, conforme apresentado pela CF/1988 apresenta superávit e não é apenas suficiente para pagar as despesas dentro dos direitos previstos bem como permite ampliar suas atuações. Se este fato não esta ocorrendo é devido pelo fato do orçamento da Seguridade Social é um esteio que sustenta a política econômica, que acaba absorvendo os recursos adquiridos para tratamentos sociais e aplicam no abatimento da dívida pública.

Atualmente, mesmo integrando um orçamento que constantemente se apresenta superavitário, o palavrório dos que procuram desconstruir as conquistas justas dos trabalhadores brasileiros é que a Previdência Social brasileira é deficitária. Para que a conclusão sobre fato seja feita, é que a mesma não é sustentada pela verdade, podendo partir da simples análise do que é arrecadado com somente com contribuições que atinge as folhas de pagamento dos trabalhadores e o total gasto com benefícios previdenciários concedidos, sejam eles rurais ou urbanos. Como já citado acima por outro autor em 2004 os dados já foram superavitários, porem os dados requerem análise mais detalhadas dos fatos, por exemplo, no ano de 2015 noticiou-se que o rombo orçamentário da Previdência Social foi de R$85,8 bilhões, sem mencionar ou excluir as renuncias que correspondem a 50% dos valores do pseudo déficit orçamentário e que são indevidamente extraídos do Caixa da Previdência Social (ANFIP, 2016).         

Somente para janeiro de 2016, como pode ser observado na Tabela (1), o déficit orçamentário permanece conforme o esperado, mostrando que a lógica criada de que empresa, empregada e estado financia a previdência social, o que somente a pequena parcela referente ao estado contribuir, sabendo que nos demais países as necessidades de financiamento da Previdência Social são cobertas por recursos da Própria Seguridade Social (ANFIP, 2016).    

Tabela (1): Resultado do RPGS – Em R$ milhões de Janeiro de 2016

fig1

Fonte: Fluxo de Caixa INSS; Informar/DATAPREV. Elaboração: SPPS/MPS.

Retirando as renúncias a situação orçamentária atual mostram superavitárias, não garantindo que a mesma seja no futuro. Os investimentos necessários na área da saúde, Previdência Social e Assistência Social estão em constante crescimento e quando se fala exclusivamente da Previdência Social é preciso entender que se trata de um contrato de longo prazo, que esta constantemente suscetível a mudanças e variáveis como a demografia e expectativa de vida da população. É preciso garantir recursos atuais e futuros devido ao problema de “mão grande” que insiste em roubar, entre os diversos casos estão às perdas com a desoneração da folha de pagamento e com a Desvinculação dos Recursos da União – DRU, fato este que será tratado com mais atenção neste trabalho (ANFIP, 2016).    

3. Desvinculação dos Recursos da União (DRU)

Para que a compreensão seja ampla referente ao orçamento da seguridade social, é passível de consideração o quadro tributário e fiscal que constituiu o país nas últimas décadas. Na questão macroeconômica que foram base do plano real, as políticas fiscais foram determinantes e seguiu as recomendações de organismos multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) (SALVADOR, 2007).

No ano de 1993, os economistas que participaram da formulação do Plano Real, que estavam vivendo um intenso desequilíbrio econômico acabaram por criar um Fundo Social de Emergência (FSE), instituindo por meio de uma Emenda Constitucional da Revisão 01, do ano de 1994, que foi sucedido pelo Fundo de Estabilização Fiscal (FEF – EC no 10 e EC no 17) e como sucessora das anteriores a DRU,  o que permite à desvinculação de 20% dos recursos que são destinados as políticas da seguridade social para este fundo. Sob a alegação de que a economia brasileira requer cuidados a DRU foi prorrogado para o governo do presidente Lula, mantendo em âmbito da Emenda Constitucional 42 (reforma tributária) a levando até 2007(DIAS, 2011).

Dessa forma em 2009, foi garantida a sua continuação até o ano de 2016 através da EC no 59/2009. Recentemente em 24 de agosto de 2017, o Senado Federal encerrou a PEC 31/2016 que altera o ato das Disposições Constitucionais Transitórias para prorrogar a DRU até 2023, para que a União possa utilizar ao que convier parte de sua arrecadação, e ainda ampliou o percentual de 20% para 30% de todos os impostos sociais e contribuições federais (DIAS, 2011).

Estimativas mostraram que somente em 2012 foram destinados a DRU aproximadamente R$58,1 bilhões do orçamento da seguridade social, o que reduz o seu financiamento e seu superávit. Nessa nova atualização é previsto que a medida libere R$117,7 bilhões para o uso do Executivo apenas referente ao ano de 2016, destes R$110,9 bilhões de contribuições sociais, R$4,6 bilhões da Cide e R$2,2 bilhões de taxas. Esse valor está destinado a cobrir a meta de resultado primário do ano de 2017, que havia previsto um déficit de R$170,5 bilhões e para redução da dívida pública da União (DIAS, 2011).

Analisando uma sequência de instrumentos utilizados para desvincular parte das receitas, constitucional ou legal rígida pode ser vista na Tabela 02, que de forma cronológica consegue mostrar os desvios.

Tabela 02: Desvinculação das Receitas da União – 1994/2017

Designação

Dispositivo

Vigor

Fundo Social de Emergência (FSE)

ECR no 1/1994

1994 e 1995

Fundo de Estabilização Fiscal (FEF)

ECR no 10/1996

1996 E 1º sem. de 1997

FEF – Prorrogação

ECR no 17/1997

2º sem. de 1997 a 1999

Desvinculação das Receitas da União (DRU)

ECR no27/2000

2000 a 2003

DRU – Prorrogação 1

ECR no 42/2003

2003 a 2007

DRU – Prorrogação 2

ECR no 56/2007

2008 a 2011

DRU – Prorrogação 4

ECR no 59/2009

2012 ao 1º sem. de 2017

DRU – Prorrogação 3

PEC no 31/2016

2º sem. de 2017 a 2023

Fonte: Elaborado pelo autor.

A principal diferença entre a FSE e FEF ao DRU é preservar as principais transferências constitucionais aos estados e municípios, o que poderia acarretar em perda de recursos para os entes subnacionais. Juntamente com a exclusão do salário poupança, essa preservação foi fundamental para a provação no Congresso no ano 2000 bem como suas prorrogações, e ainda as parcelas da CPMF que são destinadas ao fundo de combate e erradicação da pobreza e das contribuições previdenciárias (DIAS, 2011).

Com as deduções levantadas a DRU passou de R$ 755,6 bilhões para R$526,6 bilhões, em 2010, e o valor desvinculado foi de R$105,3 bilhões, o que representa 14% das receitas referente a impostos e contribuições, valor inferior aos 20% antes de realizar as exclusões (BITTENCOURT e NUNES, 2013).

Dentro das leis de diretrizes orçamentárias têm reservado da desvinculação as contribuições sociais do trabalhador e do empregador ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e ao Plano de Seguridade Social dos Servidores públicos, o que está disposto no inciso XI do artigo 167 da Constituição Federal (DIAS, 2011).

Além do mais, são alocados aos encargos dos provimentos da Seguridade Social outros gastos que deveriam ser responsabilidade do Orçamento Fiscal, uma vez que estes não correspondem aos ditames constitucionais que se referem às políticas de previdência, assistência e saúde e assistência social, a exemplo destes gastos são os pagamentos da previdência de servidores públicos federais e custos de saúde dos militares (ANFIP, 2014)

4. Déficit da Seguridade Social, Dados e Metodologia

No Brasil, diversos governos apresentam a conta da seguridade social deficitária e em textos de diversas leis orçamentárias, há recursos que apontam as transferências do Orçamento Fiscal para o Orçamento da Seguridade Social, o que se desconhece são as crescentes transferências do Orçamento da seguridade para o Fiscal, destacando o já mencionado DRU.

Segundo Sader (2006), a desvinculação afeta intensivamente o financiamento das políticas sociais como um todo, principalmente as políticas de seguridade social, uma vez que o objetivo é gerar superávits primários, liberando recursos para pagar os juros referentes a divida nacional.

Salvador (2007) comparou dados de quatro órgãos que analisam o financiamento da seguridade social, constatando que o seja qual for o critério usado por cada órgão para comparação, quando são descontados os recursos desviados para a DRU o saldo da seguridade social aparece superavitário, sendo exemplificado na Tabela 3.

Tabela 3: Orçamento da Seguridade Social X DRU (R$ bilhões).

Órgão

2004

2005

 

Saldo com DRU

Saldo sem DRU

Saldo com DRU

Saldo sem DRU

ANFIP

17,63

42,53

24,7

56,8

IPEA

0,27

27,73

0,49

13,79

TCU

-18,3

12,2

-14,1

19,1

Tesouro Nacional

-14,4

17,6

Fonte: Elaborado pelo autor baseado em Salvador (2007, p. 83).

Quando tirado o montante da DRU, o orçamento da seguridade social torna-se positivos. Em dados mais recentes, foram constatados desvios de aproximadamente de R$ 63 bilhões de reais no ano de 2015, não deixando desaparecer a construção do déficit orçamentário que vem sendo pregada desde a década de 1990, ou seja, desde a implantação dos primeiros mecanismos de desvios de recursos (ANFIP, 2016).

O real interesse da União em manter a DRU não está em resolver os problemas financeiros, mas em potencializar os discursos referentes a possíveis reformas ou até mesmo a suspensão de direitos financiados pela Seguridade social (FOLMANN, 2012).

A receita das Contribuições sociais representa mais da metade da receita Tributária da União e ainda é disputada pelo tesouro, envolvendo formas de financiamento do Sistema Único de Saúde, dos pagamentos de encargos previdenciários da união, custeio e pessoal do Ministério da Previdência, dos benefícios assistenciais e não contributivos, como pensões rurais e a renda mensal vitalícia. A escassez de recursos públicos para Seguridade Social é artificial, pois é analisada que os recursos seriam insuficientes determinadas por escolhas políticas equivocadas ou desvios inconstitucionais (FOLMANN, 2012).

Analisando as arrecadações da Seguridade Social desde 1994 até 2015, se pode notar um crescente e significante aumento, podendo ser visualizado no gráfico 1, fazendo uma comparação com os valores de benefícios concedidos para o mesmo período, este se mostra imperceptível frente a quantidade de arrecadação. Desde a instauração do Plano real é notável o crescimento da carga tributária decorrente da criação de projetos sociais. Ora, portanto é factível dizer que se há um aumento na carga tributária e nas arrecadações da Seguridade Social e comprando com a quantidade de benefícios concedidos sendo irrisório, o discurso de que a mesma está deficitária segue pela contramão dos dados.

Gráfico 1: Valor Arrecadado X Valor de Benefícios concedidos no período de 1994 a 2015.

fig2

Fonte: Elaborado pelo autor, com dados da Previdência Social.

Levantando os dados do período acima mencionado, é passível a análise dos mesmos através de uma Regressão Múltipla, que conforme mencionado por Gujarati (2011) o modelo econométrico pesquisa qual a relação que as arrecadações da Seguridade Social (Yi), possui com os benefícios concedidos (X1i) e com as desvinculações através da DRU (X2i), que será representada ela equação 1. Dessa forma as arrecadações serão a variável dependente e os benefícios concedidos juntamente com as desvinculações da DRU serão as variáveis explanatórias. O objetivo será analisar a relação linear entre as variáveis e se são significativas para explicar o modelo, para a relação linear utiliza-se a equação 2.

Yi = ?1 + ?2 X1i + ?3 X2i + ?                                                                         (2)

Ln Yi = Ln ?1 + ?2 Ln X1i + ?3 Ln X2i + ?                                                      (3)

Nas equações o ? é o como distúrbio ou termo de erro, que representa uma variável aleatória e que possui propriedades probabilísticas conhecidas. O ?1 é o intercepto ou constante, conforme a prática fornece a média sobre a variável dependente em relação as demais variáveis do modelo. Como sua interpretação pode ser automática o valor médio da variável dependente (Yi) quando os valores das vaiáveis independentes (X1i) e (X2i) forem igualadas a zero. Gujarati (2011) supõe que essa relação linear seja exata ou determinística, mas as relações entre as variáveis econômicas são inexatas, estando sujeita a mudanças individuais.

Dessa forma os dados foram retirados da base de dados da seguridade social, referente ao valor desvinculado o autor da pesquisa calculou os 20% determinados para o período referente ao valor total arrecadado. O período pesquisado compreende desde o inicio da instituição das desvinculações até o valor mais recente disponibilizado pela base de dados da Seguridade Social, totalizando 22 amostras, que segundo Gujarati (2011) um Modelo de Regressão Linear determina vinte amostras como suficiente para que o modelo não apresente problemas de correlação entre as variáveis.

O Objetivo da Regressão Simples é analisar duas hipóteses, a hipótese nula (H0) de que as variáveis não apresentam influência sobre as arrecadações, ou a hipótese alternativa (Ha) de que as variáveis influenciam nas arrecadações.

5. Análise dos resultados e Considerações finais

Ao averiguar o levantamento teórico, foi constatado que existe uma relação entre o que é arrecadado pela Seguridade Social em relação aos valores concedidos de benefícios e os valores que são destinados a DRU. Assim o valor do déficit orçamentário em que a economia atual vem discutida é passível de controvérsias, pois se o valor arrecadado fosse destinado apenas a benefícios sociais não haveria escassez de recursos, dessa forma o pesquisador plotou os dados disponibilizados na base de dados da Seguridade Social em uma Regressão Simples.  

Explorando os dados a Regressão Simples apresenta o resultado de vários testes que vão explicar a relação entre as variáveis analisadas. Dentre os testes será apresentado o Coeficiente de Determinação Múltiplo (R2) que conforme proposto por Gujarati (2011) mostra o quanto a variável dependente explica as explanatórias. O teste t apresentará significância quando o resultado estiver situado na região crítica, onde se rejeita a hipótese nula e aceita a alternativa. O teste F corrobora os resultados referentes ao teste t, confirmando a hipótese aceita.

Dessa forma os resultados dos testes mostraram que: o R2 apresentou um valor de 98,95%, um valor significativo ao explicar que o valor arrecadado explica os valores dos benefícios concedidos e os desviados pela DRU; o teste t apresentou que as arrecadações explicam os valores de benefícios concedidos, mas não explica as desvinculações, apresentando um resultado inconsistente. E o teste F confirmou o resultado encontrado no teste t, aceitando a hipótese alternativa para as arrecadações e a nula para a DRU. O resultado do teste pode ser confirmado na tabela 4.

Tabela 4: Resultado da Regressão Múltipla.

 

Coeficientes

Stat t

95% infer.

95% sup.

F

F Sig

Interseção

-9492993441

-1,4775

-2,29E+10

3,91E+09

938,365

1,0216E-19

Vlr. de Benef. Conc.

69,08322164

30,6327

64,3789397

73,7875

   

Vlr. desvinculado

0

65535

0

     

R múltiplo

0,989510549

         

Fonte: Elaborado pelo Autor.

Com o resultado da Regressão Simples é possível confirmar o que foi levantado por autores durante a pesquisa do presente trabalho, com a quantidade arrecadada pela Seguridade Social e os valores concedidos através de benefícios destinados às áreas de saúde, seguridade e assistencial não explicam o déficit orçamentário, pois o teste confirma a relação entre ambas. Porém não é possível dizer o mesmo das desvinculações feitas através dos anos, ou seja, o valor que é arrecadado e benefícios concedidos se confirmam, porém desvincular 20% para a união não apresenta dados consistentes.

A preocupação é de que a economia atual se encontra em dificuldades devido a problemas políticos, excesso de incentivo ao consumo por parte do estado, má administração dos recursos disponíveis e arrecadados, sem contar os valores incontáveis desviados pela corrupção e, contudo, foi prorrogado a DRU até 2023 com um aumento de 30% do valor.

A DRU tem um papel fundamental para que a meta de superávit primário seja alcançada, mas caso a desvinculação não fosse feita, o destino legal dos valores seriam mantidos e os gastos seriam aplicados na previdência, saúde ou assistência social. Mesmo que não houvesse aumento das despesas para este setor o recurso não deveria ser aplicado à dívida publica federal, com a DRU o déficit orçamentário ocorre para que o superávit primário das contas da união seja exaltado.

Sem contar o fato de que Direito Penal Econômico, segmento do Direito Penal onde podem ser inseridos crimes referente a Seguridade Social, vincula um modelo adotado pela Constituição Federal, bem como com o nível de intervenção econômica permitida pelo estado. Dessa forma, a ordem econômica deve ser protegida e possui como finalidade assegurar a todos uma existência digna e conforme os ditos da justiça social, se entrelaçando com os objetivos da Seguridade Social, que estão previstos nos artigos 193 e 194 da Constituição Federal (FOLMANN, 2012).

O presente trabalho abre caminhos para que novas comparações e analises econômica sejam feitas através de testes que comprovam e vinculam a problemas identificados pelo direito previdenciário, para que além de levantamentos teóricos possam ser confirmados com os dados disponíveis.

Nesse contexto, a política econômica do Estado deve apresentar um equilíbrio comum na circulação e distribuição da riqueza entre os grupos sociais, não buscando a proteção de apenas um bem individual, mas o de toda sociedade. Assim eventuais problemas de insuficiência de recursos não deveram ser apenas do sistema previdenciário escolhido, mas das práticas ineficientes do estado e a costumeira má administração pública.

Referências

ANFIP, Fundação de Estudos da Seguridade Social e Tributário; Equipe Técnica Décio Bruno Lopes. Previdência Social: contribuição ao debate. Brasília: Fundação ANFIP, 2016.

Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil. Análise da Seguridade Social 2015. Brasília: Anfip, 2016.

BEVERIDGE, Sir W. O Plano Beveridge: relatório sobre o seguro social e serviços afins. Rio de Janeiro: José Olympio, 1943.

BITTENCOURT, Kelly Francine da Costa; NUNES, Josiane Borghetti Antonelo. Análise do Futuro da Previdência Social no Brasil frente às Experiências de Privatizações Ocorridas na América Latina. Universidade de Santa Catarina: Amostra Nacional de Trabalhos Científicos, 2013.       

BOSCHETTI, I. Assistência Social no Brasil: um direito entre originalidade e conservadorismo. Brasília: GESST/SER/UnB, 2. ed. 2003.

BOSCHETTI, I; SALVADOR, E. O Financiamento da Seguridade Social no Brasil no Período de 1999 a 2004: Quem paga a conta? Brasília: Revista Serviço Social e Saúde: Formação de trabalho e profissional, 2005.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2002.

COHN, Amélia. A reforma da Previdência Social: virando a página da história. São Paulo: São Paulo em perspectiva, P. 54-59, 1995.

DELGADO, Guilherme. O orçamento da seguridade social precisa ser recuperado. Brasília: Políticas Sociais, IPEA, Nº 05, p. 111-114. Agosto de 2002.

DIAS, Fernando Álvares Correia. Desvinculação das Receitas da União, ainda é necessária. Brasília: Texto de discussão 103, Senado Federal, 2011.

FLEURY, S. A Seguridade Social inconclusa. 2006. Disponível em:  http://www.fgv.rj.br/. Acesso em 26 de Agosto de 2017.

FOLMANN, Melissa. Economia e Seguridade Social. Análise Econômica do Direito da Seguridade Social. Curitiba: Ed, Juruá, 2ª Edição, 2012.

GUJARATI, Domodar N. Econometria Básica. São Paulo, Ed.. Mac Gral Hill, 2011.

IPEA. Boletim de políticas sociais. Brasília: Ipea,  n. 06 fev. 2003.

MOTA, Ana Elisabete. Seguridade Social Brasileira: Desenvolvimento Histórico e tendências recentes. Pernambuco: UFPE, 2002. P.

SADER, D. A contrarreforma do Estado e o financiamento da Seguridade Social – 1995 a 2002. Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, 2006 (Dissertação de mestrado de Política Social). 

SALVADOR, Evilásio. Quem financia e qual os destinos dos recursos da seguridade social do Brasil. Brasília: Observatório da cidadania, 2007.

VIANNA, Maria Lucia Teixeira Werneck. Reforma da previdência: missão ou oportunidade perdida? In: Morhy Lauro. (Org.). Reforma da previdência em questão. Brasília: UnB, p. 317-336, 2003.

 http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/08/24/senado-aprova-proposta-que-prorroga-a-dru-ate-2023 Publicado em 24 de Agosto de 2017 Acesso em 06 de Setembro de 2017.



[1] Mestranda de Economia Regional pela UEL (2018). Especialista em Economia e Finanças pela UENP (2016) e Especialista em Economia Empresarial pela UEL (2014).

[2] Mestrando em Direito Previdenciário pela PUC-SP. Especialista em direito Previdenciário pelo Damásio Educacional (2014). Advogado.

Como citar e referenciar este artigo:
OLIVEIRA, Lorena Regina de; NOCETI, Rodrigo Fagundes. A desvinculação de receitas da receita da União: uma análise econômica do déficit orçamentário da Seguridade Social. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2017. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/previdenciario/a-desvinculacao-de-receitas-da-receita-da-uniao-uma-analise-economica-do-deficit-orcamentario-da-seguridade-social/ Acesso em: 07 jul. 2025