Política

O “Fico” do Sarney

 

 

05 de agosto de 2009

 

Quando o senador Pedro Simon subiu à tribuna, na segunda feira, para fazer seu teatrinho mal ensaiado de pedido de renúncia do presidente do Senado, José Sarney, não imaginava que acionaria um bumerangue contra si e as demais forças alinhadas com a campanha do Estadão e a falange do ministro da Justiça, Tarso Genro, de desacreditar a Instituição. O tiro saiu pela culatra em virtude do grande erro de cálculo, que foi protagonizar o bate-boca com o Renan Calheiros, citando o ex-presidente Collor, agora também senador, que partiu imediatamente para arena de luta. Collor como que ouviu o clarim tocar. O que deveria ser o réquiem para Sarney, a oração simonista, tornou-se o motivo da afirmação do Senado em torno de seu líder, em defesa da Instituição. Foi um fato histórico.

 

A réplica de Collor foi um rugido de leão que se fez ouvir e chamou todos os pares à ordem. Daí é que podemos compreender o que se sucedeu: o comando do Planalto para a bancada do PT e aliados para aliviar a pressão, a fala de Renan Calheiros, de ontem, afirmando que Sarney não renunciaria e, hoje, finalmente, o “Fico” de Sarney, em discurso na tribuna da Casa. Nas suas palavras: “Na coerência do meu passado, não tendo cometido nenhum ato que desabone minha vida, não tenho senão que resistir. Todos aqui somos iguais. Nenhum Senador é maior do que outro e por isso não pode exigir de mim que cumpra sua vontade política de renunciar. Permaneço pelo Senado, para que ele saiba que me fez Presidente para cumprir meu mandato”.

 

Sua peça de oratória é pobre e, ao enumerar suas “realizações”, quase matou os que se alinham com a filosofia do liberalismo político e econômico. Sarney é um estatista de quatro costados, como todos sabem. E, evidentemente, Sarney negou a procedência de todas as acusações de nepotismo e tráfico de influência, que outra coisa dele não se poderia esperar. O fundamental é que é uma peça política, seu discurso, feita para um recinto que respira política. Sob medida para a ocasião. O importante é que Sarney calcou sua fala, na mesma linha de Fernando Collor de Mello, na defesa da instituição do Senado Federal. Acertou em cheio.

 

O resumo é que a febre artificial fabricada desde a campanha midiática plantada pelo jornal Estadão esgotou-se. Creio que aquele jornal deverá agora abaixar o facho, esquecer o assunto. Foi derrotado, juntamente com aqueles que lhe serviam de fonte. Creio que esse poderá ser o último grande espasmo preparatório para a eleição presidencial que se avizinha. Se tudo correr bem, o calendário será cumprido e as regras estabelecidas respeitadas. Não tenho dúvida de que foi uma grande vitória para as instituições que ancoram a democracia representativa em nosso país.

 

A correlação real de forças, que parece estar posta no momento, é que o PT não tem como, nesta legislatura, mudar o perfil das instituições. Mais ainda, mostrou o limite que a mobilização artificial da opinião pública tem como motor dos acontecimentos. A ordem do Lula para o PT recolher as armas pode ser uma demonstração de realismo político. Sabem que perderam o round, mas também sabem que o tempo pode correr a seu favor. Na ocasião apropriada tentarão tudo de novo, pelos mesmos métodos. Os profissionais da revolução jamais descansam.

 

 

* José Nivaldo Cordeiro, Executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor da ANL – Associação Nacional de Livrarias.

 

 

Como citar e referenciar este artigo:
CORDEIRO, José Nivaldo. O “Fico” do Sarney. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/o-fico-do-sarney/ Acesso em: 19 jan. 2025