O Encontro dos Cavalcantes (ou “O Nepotismo na Visão da OAB/PA”)
Fernando Machado da Silva Lima*
15.05.2005
Sob os holofotes da mídia, o Presidente de nossa Seccional, Ophir Cavalcante Júnior, entregou, ao Presidente da Câmara dos Deputados, um manifesto contra o nepotismo. Em resposta, Severino Cavalcante disse que recebia com muito carinho aquele documento e que aproveitava a oportunidade para pedir que, também na OAB, “os dirigentes não botem mais nenhum parente para trabalhar”. Em resposta, em meio aos risos dos circunstantes, Ophir Cavalcante retrucou que, desde
Pode até ser verdade, no provimento do Conselho Federal e no tocante às contratações diretas de parentes, exclusivamente no âmbito interno da OAB, mas a questão não é assim tão simples, porque o problema não se resume, apenas, à contratação direta de parentes, para desempenharem suas atividades sob as ordens de quem os indica, mas também às indicações, para importantes cargos e sinecuras, tão afastados de quem os indica, que somente uma verificação mais detalhada e minuciosa poderia atestar os verdadeiros motivos dessas contratações, que são, muito freqüentemente, bem diversos das ligações familiares, e do nepotismo, que a OAB e o Presidente de nossa Seccional, equivocada e hipocritamente, elegeram, para a sua campanha nacional.
Assim, não é possível negar que, em certos casos, a nomeação de um parente decorre, exclusivamente, do prestígio de alguém, tão afastado do cargo provido, que se torna bastante difícil constatar os reais motivos daquela nomeação. Da mesma forma, em outros casos, o nomeado não é parente da autoridade, mas existem outros interesses, que podem ser muito mais espúrios do que a simples contratação de um parente, que precise de um emprego.
A presente campanha da OAB, contra o nepotismo, iniciada por sugestão do Dr. Ophir Cavalcante Júnior, resultou das recentes declarações do Presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcante, que tentou justificar a nomeação de seu filho, para uma superintendência em Pernambuco, dizendo que ele tem universidade e é, portanto, muito competente para o exercício desse cargo. Essas declarações despertaram, evidentemente, no Dr. Ophir, a vontade de ampliar, mais ainda, a influência de nossa corporação, na mídia e nos meios políticos. No entanto, talvez a memória do Presidente de nossa Seccional não lhe esteja permitindo recordar que, há pouco mais de três anos, quando a coluna de Cláudio Humberto noticiou a prática do nepotismo na OAB/PA, através da escolha de uma de suas irmãs para o Tribunal Regional do Trabalho, ele também tentou justificar essa escolha, dizendo que a sua irmã é doutora, e muito competente – o que não se pretende negar, absolutamente. Até hoje, essa justificativa do Dr. Ophir pode ser lida, na coluna de Cláudio Humberto, em: http://www.claudiohumberto.com.br/Colunasanteriores/tabid/297/articleType/ArchiveView/month/1/year/2002/day/9/Default.aspx.
Não se duvida, portanto, da competência de sua irmã, que deve ter chegado ao Tribunal por seus próprios méritos e também porque é doutora, como afirmou o Dr. Ophir Júnior, que agora se revoltou, não se sabe como, com as declarações do Deputado Severino, a respeito da nomeação de seu filho, em Pernambuco. Não se duvida, também, que a irmã do Dr. Ophir Júnior tenha chegado ao Tribunal do Trabalho sem a sua ajuda e sem contar, também, com o prestígio de seu pai, que é Conselheiro Federal da OAB e importante servidor do Governo do Estado do Pará. Não se duvida, também, que o próprio Dr. Ophir tenha chegado à Presidência da OAB/PA sem a ajuda de seu pai, ou que a sua outra irmã tenha sido nomeada, também, por seus próprios méritos, sem a ajuda dele, ou do pai, para uma assessoria da Procuradoria-Geral do Ministério Público do Estado do Pará.
O problema não são os parentes, exclusivamente. O problema é o uso da máquina estatal e do dinheiro público em benefício de interesses particulares, ou corporativos. O pescador ensina o filho a pescar. As pessoas honestas e trabalhadoras orientam os seus filhos, mesmo sabendo das dificuldades que existem, mas os desonestos e os espertos preferem utilizar as inúmeras artimanhas, que lhes permitem aparentar o que não são, ocultar o que são, na realidade, e obter o que não merecem.
O problema não são apenas os parentes. A campanha da OAB está inteiramente equivocada, porque se preocupa apenas com as relações de parentesco, esquecendo completamente outros interesses, que também podem levar à nomeação para cargos de confiança na administração pública, como os interesses políticos, econômicos, partidários, as amizades antigas, etc.
Dessa forma, independentemente de qualquer relação de parentesco, os cargos de confiança costumam ser preenchidos, também, por pessoas incompetentes, ou que não possuem o mínimo de condições para o exercício desses cargos, pelo simples fato de que a nomeação dessas pessoas possa atender aos interesses do partido político, ou de uma Igreja, ou de uma corporação, ou de que ela possa garantir, até mesmo, a quem as nomeia, o indispensável apoio da mídia.
A este respeito, cabe lembrar que o Presidente de nossa Seccional nomeou, para a Coordenação da Comissão de Defesa a (sic) Liberdade de Imprensa, o advogado Ronaldo Maiorana, que não é seu parente, mas é um dos donos das Organizações Rômulo Maiorana – ORM, que publicam o jornal O Liberal. Essa escolha parecia, no mínimo, estranha, pelo simples fato de que o escolhido, como dono de um jornal, não teria a necessária isenção para atuar, na OAB/PA, em defesa da liberdade de imprensa, porque, na sua posição, existem, certamente, muitos outros interesses, como o do lucro do empreendimento, que poderiam prevalecer, em detrimento do correto desempenho de suas funções, na dita Comissão.
Não era, aquela, já, uma boa escolha, ao que parece, para a defesa da liberdade de imprensa. Talvez pudesse render dividendos, para obter o apoio da mídia, que pode servir, até mesmo, para calar os “inimigos”, os críticos inconvenientes, e para defender os interesses pessoais e corporativos. A mídia, dizia Malcom X, é a mais poderosa de todas as entidades. Ela pode transformar o inocente em culpado e absolver os verdadeiros culpados, porque ela controla as nossas mentes. Assim, ficarão ainda mais fortalecidos, certamente, os poderosos e os prepotentes, sem o “zumbido da crítica”, de que nos fala o grande jornalista americano, Jack Anderson: “a máquina da democracia não pode funcionar tão azeitada que não se ouça o zumbido da crítica”.
No entanto, depois que o Dr. Ronaldo Maiorana agrediu o jornalista Lúcio Flávio Pinto, pelo simples fato de que este publicou um artigo que não lhe agradou, e depois que a OAB/PA decidiu, por unanimidade, que o agressor seria mantido naquela Comissão, porque se tratava de “uma rixa antiga”, ficou muito claro, finalmente, que aquela era, com certeza, uma péssima escolha, porque, a partir de agora, vai ficar muito mais difícil escutar o zumbido da crítica, porque todas as engrenagens estão bem ajustadas e bem azeitadas, com o azeite da compra e venda de consciências.
A partir de agora, com a jurisprudência firmada pelos nossos Conselheiros, a liberdade de imprensa deverá ser defendida com todo o rigor, aos tapas e safanões, e as agressões, cometidas pelos advogados, contra quem quer que seja, não mais constituirão falta ética, nem merecerão qualquer reprimenda, desde que o agressor possa alegar, em sua defesa, que já existia, entre ele e o agredido, uma rixa antiga. Talvez uma briga entre moleques, em disputa de algumas petecas, ou, quem sabe, uma briga no recreio, do jardim de infância. Salve-se quem puder!
* Professor de Direito Constitucional da Unama
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