Filosofia do Direito

O Mito da Caverna de Platão e o Paradigma da Representatividade

Marcel Damato Belli*

 

1 O Mito da Caverna – Extraído de “A República”, de Platão

Imaginemos uma caverna subterrânea onde, desde a infância, geração após geração, seres humanos estão aprisionados: suas pernas e seus pescoços estão algemados de tal modo que são forçados a permanecer sempre no mesmo lugar e a olhar apenas à frente, não podendo girar a cabaça nem para trás nem para os lados. A entrada da caverna permite que alguma luz exterior ali penetre, de modo que se possa, na semi-obscuridade, enxergar o que se passa no interior.

A luz, que ali entra, provém de uma imensa a alta fogueira externa. Entre ela e os prisioneiros – no exterior, portanto – há um caminho ascendente ao longo do qual foi erguida uma mureta, como se fosse a parte fronteira de um palco de marionetes. Ao longo dessa mureta-palco, homens transportam estatuetas de todo tipo, com figuras de seres humanos, animais e todas as coisas.

Por causa da luz da fogueira e da posição ocupada por ela os prisioneiros enxergam na parede no fundo da caverna as sombras das estatuetas transportadas, mas sem poderem ver as próprias estatuetas, nem os homens que as transportam.

Como jamais viram outra coisa, os prisioneiros imaginavam que as sombras vistas são as próprias coisas. Ou seja, não podem saber que são sombras, nem podem saber que são imagens (estatuetas de coisas), nem que há outros seres humanos reais fora da caverna. Também não podem saber que enxergam porque há a fogueira e a luz no exterior e imaginam que toda a luminosidade possível é a que reina na caverna.

Que aconteceria, indaga Platão, se alguém libertasse os prisioneiros? Que faria um prisioneiro libertado? Em primeiro lugar, olharia toda a caverna, veria os outros seres humanos, a mureta, as estatuetas e a fogueira. Embora dolorido pelos anos de imobilidade, começaria a caminhar, dirigindo-se à entrada da caverna e, deparando com o caminho ascendente, nele adentraria.

Num primeiro momento ficaria completamente cego, pois a fogueira na verdade é a luz do sol e ele ficaria inteiramente ofuscado por ela. Depois, acostumando-se com a claridade, veria os homens que transportam as estatuetas e, prosseguindo no caminho, enxergaria as próprias coisas, descobrindo que, durante toda a sua vida, não vira senão sombra de imagens (as sombras das estatuetas projetadas no fundo da caverna) e que somente agora está contemplando a própria realidade.

Libertado e conhecedor do mundo, o prisioneiro regressaria à caverna, ficaria desnorteado pela escuridão, contaria aos outros o que viu e tentaria libertá-los.

Que lhe aconteceria nesse retorno? Os demais prisioneiros zombariam dele, não acreditariam em suas palavras e, se não conseguissem silenciá-lo com suas caçoadas, tentariam fazê-lo espancando-o e, se mesmo assim, ele teimasse em afirmar o que viu e os convidasse a sair da caverna, certamente acabariam por matá-lo. Mas, quem sabe alguns poderiam ouvi-lo e, contra a vontade dos demais, também decidissem sair da caverna rumo à realidade.

(fonte: http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=796 )

1.1 Discurso sobre a caverna

O Mito da Caverna narrado por Platão no livro VII do Republica é, talvez, uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela filosofia, em qualquer tempo, para descrever a situação geral em que se encontra a humanidade. Essa poderosa crítica à condição dos homens, escrita há quase 2500 anos, inspirou e ainda inspira inúmeras reflexões pelos tempos afora, sendo a mais recente delas o livro de José Saramago: A Caverna.

(fonte: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/caverna.htm )

Há reflexos deste mito em vários momentos da história e até mesmo em variados aspectos da sociedade moderna.

1.1.1 A religião

Não se pode deixar de pensar que uma religião é um modo de acorrentamento em uma caverna: ser forçado por algo que você não sabe exatamente o que é a crer ser verdadeiro um certo algo que você não sabe se é ou não realidade.

Para falar a verdade, olhando a religião como um modo de acorrentamento da caverna de Platão, não se pode deixar de pensar que a humanidade como um todo tem uma certa tendência a gostar de ser mantida acorrentada na ignorância. No primeiro filme da trilogia Matrix, dirigida pelos irmãos Wachowski, o personagem Cypher pronuncia algo que, para muitas pessas, é como um mandamento: “A ignorância é sublime”.

Através de toda a história do Homo Sapiens Sapiens, neste planeta, a religião esteve tão presente quanto a própria existência destes seres: era o que mantinha os homens sãos em um mundo de tanto sofrimento e caos pseudo-organizacional. Civilizações Mesopotâmicas, Egito, Roma, Grécia, Persas, Chineses, Japoneses, Indus, dentre muitos outros braços civilizatórios da humanidade, estiveram sempre intrinsecamente ligados às suas religiões, como crianças às suas mães. Historiadores podem, com certa exatidão, determinar o tipo de civilização, vários dos seus costumes e características apenas com uma boa olhada na religião.

A Idade Média européia, compreendida entre os anos de 476 – queda do Império Romano Ocidental – e 1453 – tomada de Constantinopla, capital do Império Bizantino, ou Império Romano Oriental, pelos Turcos Otomanos – teve como característica principal o sistema social conhecido por Feudalismo, apoiado integralmente pela Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR).

Durante esta era, a ação da ICAR cresceu cada vez mais, até o ponto de uma verdadeira escravidão dos povos europeus – que, posteriormente, durante a formação das monarquias nacionais, vieram a formar muito do que conhecemos hoje por Europa Ocidental – sob seus dogmas insipientizantes. Esta seria mais uma vez a manifestação da prisão dos homens dentro da caverna, voltados à parede em que as sombras se projetavam.

Como mencionado anteriormente, parece que a humanidade mantém uma singular relação com a ignorância, pois o apoio do povo feudal à esta instituição ignorante – no sentido de tornar o povo ignorante – foi singular. A própria investida da ICAR sobre os hereges, a conhecida Santa Inquisição, uma das maiores violências de toda a história, foi amplamente apoiada pelo povo, já idiotizado. O endeusamento de uma instituição que dizia promover a ajuda ao próximo – todos os princípios do “bom cristão” – mas na verdade usurpava tudo por que o povo tão arduamente trabalhava indica a relação de amor que o homem tem com tudo que o oprime e o mantém ignorante.

O processo de idiotização não limitou-se apenas ao plano espiritual: o impedimento do crescimento da cientificidade, dos estudos e do processo de esclarecimento da humanidade eram um dos principais mandamentos internos da ICAR, pois sabiam que quanto mais o povo soubesse, mais crítico se tornaria, e mais tentaria se livrar das correntes que a instituição havia colocado neles.

O braço cientificista conhecido como Iluminismo foi um fortíssimo opositor do sistema anti-evolucionista da ICAR, pois pregava que somente a luz do conhecimento, o esclarecimento da verdade poderiam tirar o homem da escuridão da ignorância. Somente a ciência traria o que o mundo realmente oferece; a química e a biologia trariam os remédios e os meios para aumentar a qualidade de vida; somente a física e a engenharia trariam os bons confortos que a vida moderna oferece, resumindo: somente a ciência tiraria o homem do seu ponto de estagnação e o levaria ao limiar de uma nova era.

Entretanto, esqueceu-se a humanidade que, somente o advento da tecnologia não seria o suficiente para trazer a qualidade de vida e o bem-estar para todos no mundo. A situação em que a Terra se encontra hoje, com quase sete milhões de habitantes e não somente extrema, como absurda desigualdade e má-distribuição de tudo, não somente riquezas, como alimentos, são o veneno que corroem o mundo moderno, pois a má-evolução das ciências humanas, conseqüentemente uma má-evolução da consciência do bicho-homem, em si, sem saber usar o que tem diante de si, está a destruir o único mundo que tem.

1.1.2 A natural inclinação

Não passa de natureza, para alguns autores, a inclinação do homem à ignorância.

A capacidade de o homem sobrepujar o instinto, natural de qualquer animal, advém de seu intelecto, resultado da evolução do encéfalo desenvolvido, exclusividade frente a todos os outros seres de nosso mundo: todas as invenções, adventos científicos, acontecimentos evolucionistas da história são resultado desta central mega-processante.

Entretanto, a capacidade que o homem possui de imediatamente “desligar” a central raciocinante, o que o mantém dentro dos eixos do bom-costume, fundamento social, para Hans Kelsen, é tão grande que diariamente nos vemos nesses momentos, pois a linha que divide o comportamento humano “racional” do animal “irracional” é tão tênue quanto um suspiro.

Uma multidão, expectadores de um jogo de futebol, que invadem um campo e partem para a agressão física, estão num momento onde a adrenalina da ocasião conseguiu essa “desativação”, momento anterior à transformação do homem em uma besta tão irracional quanto qualquer outro animal enfurecido.

Essa desativação, que leva o homem ao seu estado de natureza (descrito muito bem por Hobbes), intimamente ligado à ignorância, pode ser conseguida artificialmente: o álcool, as drogas, quimiotransmissores, são um caminho fácil à “desativação” da central do cérebro que mantém o homem dentro dos eixos da unidade axiológica de referência comportamental.

Imaginemos um mendigo, que já tem uma tendência natural à agressividade, que esteja bebendo até perder a consciência de seus atos. Imaginemos agora este mesmo mendigo, perambulando à noite por uma rua da cidade, quando passa por ele uma mulher atraente e com roupas provocantes; deste momento, que deixa tentado qualquer homem, mesmo os mais centrado, para um estupro, não se precisa de muitos mais estímulos. O que mantém os homens de cometerem estupros é os bons-costumes, as leis sociais, pois, naturalmente, agressões, estupros, assassinatos e todos os outros atos condenáveis pelos homens estão presentes no ambiente destituído desta unicade axiológica de referência comportamental.

Esta natural inclinação do homem à ignorância talvez possa ser a razão de Platão não ter dito, em seu mito da caverna, por que os homens simplesmente estão aprisionados, geração após geração, na caverna, sem mencionar, em momento algum, quem ou o que os está mantendo cativos lá; quem pega os bebês que nascem e os colocam dentro deste antro de ignorância e os acorrentam, mantendo-os de buscarem a luz do conhecimento e o prazer da verdade.

1.1.3 Saindo da caverna: o pontapé inicial iluminista

Quando o homem se liberta das correntes, imediatamente olha em volta, coisa que nunca conseguiu fazer; em seguida, ao ver seus companheiros, ter uma melhor visão da caverna, das sombras e do local à sua volta, já começa a reestruturar os conceitos que sempre teve para si; quando vê a saída da caverna com a luz cegante, vê que há talvez uma realidade diferente da sua e, ao tomar a decisão de seguir nessa direção, já tem para si a necessidade de continuar sua ampliação; quando chega fora da caverna, ao ver um mundo completamente diferente, pessoas diferentes, o sol, a grama, o muro, o céu e a terra, vê que tudo em que sempre creu estava errado, ou, no mínimo, extremamente limitado.

Essa saída da caverna, a liberdade, a exploração e a mudança de conceitos é exatamente o que acontece com o gomem quando tem para si uma realidade absoluta e vê que seus conceitos na realidade estão tão limitados quanto poderiam estar e que devem ser mudados.

O corpo de uma universidade, na verdade, é uma tentativa de ajudar o homem na caminhada para fora da caverna, na incorporação da necessidade de mudança e de acepção de uma nova realidade.

O movimento iluminista, com seu cunho evolucionista, foi como se uma pessoa de fora da caverna a adentrasse e libertasse forçosamente os homens, carregando-os para fora de lá, praticamente os forçando a engolir a nova realidade.

Novamente citando a obra cinematográfica dos Wachowski, quando o personagem Morpheu (deus grego do sono) entrega os dois comprimidos para Neo (palavra que significa “novo”), há aquele que o libertará. Ele o toma e é levado à realidade, que cai sobre ele como uma pedra. Toda a saga do primeiro filme da trilogia é sobre a saída de Neo da caverna platônica, como ele vai se adaptar na nova realidade e lutar para libertar os outros homens da caverna.

A reação default humana, a priori, seria de raiva de seu libertador. Naturalmente o homem tem uma tendência conservadora, de manter o presente como está, de apreciar o que a realidade em que está inserido tem a lhe oferecer, pois a insegurança da mudança pode lhe custar tudo o que tem. A raiva de seu libertador seria uma reação naturalmente humana, embora, no momento, acredito que, por resultado de outra reação ainda mais humana, o homem logo perderia a raiva e começaria a examinar, exacerbado, tudo à sua volta – a curiosidade toma as rédeas.

1.1.4 A criação de um tabu

Conta-se que um grupo de cientistas pesquisadores, formado por psicólogos, psiquiatras, neurologistas e engenheiros, colocou cinco macacos numa jaula redonda, grande e alta. No centro da jaula penduraram um cacho de bananas e, bem debaixo do cacho, abriram uma escada que permitia alcançar as bananas.

Quando o primeiro macaco descobriu as bananas e subiu a escada para pegar algumas, os pesquisadores ligaram uma mangueira e jogaram água estupidamente gelada nos outros quatro macacos que estavam no chão. Depois de certo tempo, os macacos descobriram que, quando um deles pegava uma banana, os outros levavam um tremendo banho de água gelada. Assim, quando um macaco ia subir a escada, os outros enchiam o coitado de pancada. Passado mais algum tempo, nenhum macaco subia mais a escada, apesar da tentação das bananas, porque sabia que iria apanhar feio dos outros quatro.

Neste momento, os pesquisadores substituíram um dos cinco macacos, colocando em seu lugar um novato que não sabia de nada. A primeira coisa que o novato fez foi tentar subir a escada, mas não conseguiu. Os veteranos rapidamente retiraram o novato da escada e deram uma boa surra nele. Depois de algumas surras, o novo integrante do grupo não mais subia a escada, passando então a ser um veterano também.

Chegado novamente a este estágio de calmaria, os pesquisadores substituíram um dos outros quatro veteranos, deixando o ex-novato por lá. A mesma história então aconteceu, o novato tentou pegar uma banana e levou pancadas de todos os lados. O macaco recentemente promovido a veterano foi o mais entusiasmado na surra ao novato.

Serenada a pancadaria mais uma vez, um terceiro macaco foi trocado, e repetiu-se o fato. Na seqüência, mais um novato entrou no lugar do quarto macaco e, finalmente, o último dos veteranos foi substituído.

Os pesquisadores ficaram, então, com um grupo de cinco macacos que, mesmo nunca tendo tomado um banho gelado, continuavam batendo naquele que tentasse chegar às bananas. Se fosse possível perguntar ao líder deles porque batiam tanto em quem tentasse subir a escada, a resposta poderia ser: “Comer banana faz mal”. Ou então seria: “Quem come banana é radical ou extremista ou ingênuo ou marginal, ou tudo isto junto. A elite macacal sabe que não se pode comer banana”. Mais tecnicamente, talvez o líder dissesse que banana engorda e ficar gordo faz mal. Ficou assim criada a fé no princípio de que comer banana faz mal, e o líder assumiu o posto de vigilante da fé bananal.

Essa pequena história é uma das mais tristes manifestações do comportamento humano: se examinarmos com cuidado veremos que, na verdade, o que aconteceria se alguém tentasse libertar um dos cativos da caverna o mais provável acontecimento seria uma revolta de todos que estão dentro da caverna e o expulsariam, talvez mesmo o matariam.

Talvez a maior realidade seja, entretanto, que mesmo quando a curiosidade assume a pessoa que foi libertada, a preguiça é a próxima a tomar conta do recém liberto. Essa preguiça é, talvez, o que mais impede a humanidade de sair da caverna: estamos a dois passos do paraíso mas não cruzamos a porta.

2 A representatividade

Desde o princípio da formação dos estados, seja em que parte da história seja, discutiu-se a forma em que ele deveria ser administrado.

Inicialmente as comunidades pequenas poderiam ser administradas pela verdadeira democracia. Os povos pré-colobianos que viviam no Brasil eram um perfeito exemplo disso.

Posteriormente, com o crescimento das populações, utilizou-se a aristocracia, “monocracia” e, depois disso, foram dadas várias voltas nesses sistemas de governo.

No mundo do século XXI, com quase 7bilhões de habitantes e alguns estados possuindo mais de 1bilhão deles, fica impossível esperar que todos os cidadãos destes estados exerçam um papel na política nacional.

A representatividade, há muito tempo idealizada, vigente mesmo durante a criação do mito da caverna, foi o método de manipulação dos instrumentos governamentais com intuito de manter o estado em perfeito funcionamento burocrático e pragmático, sem manter a totalidade do “terceiro estado” (expressão utilizada pela primeira vez por Sieyès) de fora das manifestações estatais.

A partir do momento em que os homens começam a ter uma confluência de opiniões, torna-se possível se ter uma pessoa representar a opinião de todos aqueles que a possuem, podendo ser dois, dez ou milhares.

Na verdade, representar a “vontade de todos” (na acepção do termo de Rousseau) seria impossível, porém a “vontade geral” é o intuito de todo e qualquer governo, porém tem-se uma crise quando aqueles que são mantidos pelo povo para respeitarem a vontade destes não cumprem o seu intuito.

2.1 A crise na representatividade

A crise na representatividade começa quando aqueles que deveriam representar a vontade de todos (não mais o termo de Rousseau, mas literal) não mais o fazem.

A corrupção, palavra que surge sempre que se fala de “estado”, “governo” ou “representatividade” é o que corrói o sistema político-social do mundo, em qualquer momento da história sempre foi e sempre será o veneno dos estados.

A partir do momento em que nossos representantes começam a dizer que apóiam a segurança nacional, mas que, enquanto milhares de pessoas cruzam as fronteiras do país com drogas, contrabando e todo outro tipo de bens ilícitos, nós chegamos no aeroporto do nosso próprio país, depois de ter tirado férias e ficamos numa fila com dezenas de pessoas esperando e, eventualmente, chegamos, depois de algumas horas, a um agente, por trás de um vidro a prova de balas.

Ele olha pra foto do seu passaporte, olha de volta pra você; olha para a foto no seu passaporte e olha novamente para você. Ele pergunta “por que você cortou o cabelo?” e você responde “não sei, eu achei que me sentiria melhor”; depois ele pega uma câmera, tira uma foto de você e compara com uma foto anterior da sua pessoa. Extremamente metodológicos, eles começam a perguntar “por que você saiu do país? Por que você foi para onde foi?” e você começa a se questionar “eu esqueci por que estava lá, eu não sei; achei que era por prazer, achei que estava de férias… DESCULPE, EU ESTAVA DE FÉRIAS, não sei por quê!”. Nossos representantes deveriam nos dar verdadeira segurança, não somente a ilusão dela.

Novamente, entramos em uma crise na representatividade quando nossos representantes dizem que vão apoiar o desenvolvimento dos programas de eficiência de combustíveis, o hidrogênio combustível, por exemplo, mas têm como patrocinadores e apoiadores empresas petroquímicas. Obviamente eles dizem que apoiam esses projetos porque levarão décadas para serem desenvolvidos em um nível utilizável.

Isso sem mesmo citar o problema de quando eles começam a desviar os recursos que dispendiosamente mandamos para nossos representantes poderem pagar os profissionais pela execução de algo que irá beneficiar a sociedade para os seus próprios bolsos, como se o que nós já pagamos não fosse o suficiente.

Os representantes do povo não são deuses ou qualquer outro tipo de ser divino; são seres humanos e profissionais – talvez não muito profissionalísticos – como quaisquer outros e, condizente a um trabalho administrativo como qualquer outro, deveriam ganhar como qualquer pessoa profissional da sociedade, não o absurdo que ganham para fazerem festas regadas a Jhonny Walker Blue Label e acompanhados por caríssimas Executive Escort, tudo regado a dinheiro público.

A inutilidade do que os nossos representantes querem fazer também é notável. Nós não elegemos nossos representantes para fazer, por exemplo, um projeto de lei que proibirá o desacato à bandeira, enquanto é simples entrar na internet e encontrar lingeries em verde e amarelo e formatos da bandeira, ou mesmo panos de louça que tenham a bandeira nacional impressa.

Há também o ridículo de coisas como a NASA gastar cerca de 28milhões de dólares em um projeto de uma caneta tinteiro que escreverá de cabeça para baixo mesmo em gravidade zero, enquanto os russos resolveram o problema com um lápis, que custa cinco centavos.

A ofensa a todos aqueles que os elegem e os mantêm lá é não somente um ultrage mas vai completamente contra tudo que eles deveriam estar fazendo por aqueles que os mantêm vivos e fazendo o que fazem – ou o que deveriam estar fazendo.

O sistema representativo é criado, como antes dito, para facilitar a administração do público e do que diz respeito a todos, pois o crescimento populacional impede que todos dêem sua contribuição pessoal. O nosso problema se inicia quando corrope-se o fulcro desse sistema e a ambição dele.

2.2 A metodologia representativa

Referente a qual modo de representatividade adotar, vários pensadores já se manifestaram:

Hobbes defende a monarquia totalitarista; Locke defende a representatividade monárquica não-totalitarista constitucional; Marx defende a ditadura do proletariado, o que é um misto de totalitarismo com aristocracia; Bodin também tem uma inclinação à monarquia; Políbio insere um pensamento dialético decrescente de capacidade governatória das formas de governo alternadas com suas formas degeneradas, de monarquia, para aristocracia e democracia, cada forma degenerada decrescente, também, em capacidade.

É notável a crença dos filósofos e cientistas políticos na incapacidade do povo de se auto-determinar, regada, talvez, pela sua ignorância. No entando esses autores estiveram sempre rodeados pela teoria dos governos mistos, uma auto-regulação entre um monarca, uma aristocracia e uma consulta ao “terceiro estado” (manifestação democrática) exercendo um cabo-de-guerra na manipulação da máquina do estado.

Montesquieu é o introdutor da teoria da divisão dos poderes nos três já conhecidos executivo, legislativo e judiciário, mutado, depois, por D. Pedro I, incluidor do poder moderador, atualmente sendo estudado como forma constitucional de atalho ao estado de exceção.

Com efeito, a incapacidade do povo, tanto de fato legislativo quanto de auto-governo coletivo é provada, mas, qual seria a melhor forma de representatividade, eficaz para conduzir a humanidade à realização, fica ainda um mistério a ser desvendado por muitos estudiosos ainda por vir.

 

* Acadêmico de Direito da UFSC

 

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Como citar e referenciar este artigo:
BELLI, Marcel. O Mito da Caverna de Platão e o Paradigma da Representatividade. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/filosofiadodireito/o-mito-da-caverna-de-platao-e-o-paradigma-da-representatividade/ Acesso em: 06 out. 2024