Filosofia do Direito

Ética para o Novo Milênio

 

 

E aquele pecador decidido a purificar-se do quanto fizera, queda-se penitente diante do confessor e diz: “só não matei, nem roubei, o resto fiz tudo”.

 

Julgamo-nos absolutamente éticos, porque somos discretos no falar e no agir, só dizemos a palavra certa, na hora certa, não melindramos ninguém. Na vida profissional, situamo-nos no nosso espaço ou nos limites das nossas atribuições.

 

A busca do lucro quanto mais alto possível, cortar aquela árvore só porque diminui um determinado espaço, deixar de apagar uma luz desnecessariamente acesa, não fechar uma torneira que está pingando, jogar lixo a esmo, enfim, não poupar qualquer gasto desnecessário, ou apenas, não evitar um esforço maior da parte de quem quer que seja, o de quem varre a via pública e outros tantos,  admitimos como comportamentos aéticos?

 

Em outros tempos foi possível a famílias viverem isoladas em uma extensão de terra, plantavam para comer o que colhessem. Hoje, a interdependência faz parte dos indivíduos, passa pelas comunidades,  alcança o mundo.

 

Não há nada que afete um dos homens que não repercuta entre todos. Projeta-se na longevidade dos anos e irá atingir as futuras gerações. Os dados e os fatos o atestam. Não basta não ser homicida ou ladrão para não ser pecador, não basta ter-se criado uma redoma e nela ter-se enclausurado, para se poder dizer: sou ético.

 

Nosso conceito de ética há de ser revisto, acrescentemos-lhe pressupostos nos quais antes não se tinha pensado, dilatemos-lhe os confins, se é que ética os tem.

 

A onda de violência já não pode ser debitada apenas a fatores sociais ou às causas que determinam a pobreza. A perda de valores é dramática. Por que tenho que falar português e não tupi-guarani?

 

Um vírus infectou as máquinas que somos, destruiu princípios morais que detínhamos, impede que aflorem os que se encontravam latentes e mantém muitos amordaçados.

 

A configuração em que se mira a sociedade carece de esforço conjunto que destrua o que impede nossa marcha rumo ao sol. É impossível ser feliz sozinho. Não nos console a certeza da brevidade da vida, os netos dos nossos netos carecerão de um mundo mais vivível.

 

Um ponto de partida pode ser cooperar na preservação do meio, “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público (mas também a toda) coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. (CF art 225).

 

No mundo empresarial, já estão cientes de que sustentabilidade não se separa do desenvolvimento com erradicação da pobreza. “…é preciso garantir as necessidades do presente sem comprometer as habilidades das futuras gerações em encontrar suas próprias necessidades”. (Agenda 21).

 

Quem entender isto, admitirá a necessidade de se reconceituar ética, tal qual dela, carece o novo milênio.

 

 

 

* Marlusse Pestana Daher, Promotora de Justiça, Ex-Dirigente do Centro de Apoio do Meio Ambiente do Ministério Público do ES; membro da Academia Feminina Espírito-santense de Letras, Conselheira da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Vitória – ES, Produtora e apresentadora do Programa “Cinco Minutos com Maria” na Rádio América de Vitória – ES; escritora e poetisa, Especialista em Direito Penal e Processual Penal, em Direito Civil e Processual Civil, Mestra em Direitos e Garantias Fundamentais.

Como citar e referenciar este artigo:
DAHER, Marlusse Pestana. Ética para o Novo Milênio. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/filosofiadodireito/etica-para-o-novo-milenio/ Acesso em: 28 jul. 2025