Dos Efeitos das Normas de Constituição, Alteração e Extinção das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte na Lei Complementar N° 128/08.
Edilson Pereira de Godoy*
Não chega a ser novidade o calvário daqueles que pretendem abrir uma empresa no Brasil. Em todas as pesquisas de organismos internacionais, somos condecorados com as primeiras colocações em termos de burocracia.
No final de 2007, o governo federal editou a Lei n° 11.598 com a seguinte abrangência: Estabelece diretrizes e procedimentos para a simplificação e integração do processo de registro e legalização de empresários e de pessoas jurídicas, cria a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios – REDESIM; altera a Lei no 8.934, de 18 de novembro de 1994; revoga dispositivos do Decreto-Lei no 1.715, de 22 de novembro de 1979, e das Leis nos 7.711, de 22 de dezembro de 1988, 8.036, de 11 de maio de 1990, 8.212, de 24 de julho de 1991, e 8.906, de 4 de julho de 1994; e dá outras providências.
Além de seu conteúdo normativo, a Lei procedeu a alterações na Lei n° 8.934/94, que dispõe sobre o Registro Público da Empresas Mercantis, o Departamento Nacional de Registro do Comércio e das Juntas Comerciais, reduzindo os prazos decisões sobre os atos de registro, alteração e baixa, passiveis de exame e julgamento.
Os vetos aos dispositivos (inciso V do artigo 7° e artigo 19) que revogariam a exigibilidade da Certidão Negativa de Débitos para abertura, alteração e extinção (baixa) de empresas mercantis, entre outras situações, não causaram qualquer prejuízo jurídico em razão da decisão tomada no julgamento de duas ações diretas de inconstitucionalidade apresentadas pela Confederação Nacional da Indústria e pelo Conselho Federal da OAB logo após a edição da Lei n° 7.711/88.
O Pretório Excelso havia concedido liminar para suspender os dispositivos da norma, dois anos após a sua propositura das ADINs.
A decisão foi proferida em 25 de setembro de 2.008 e segundo o relator das ações, ministro Joaquim Barbosa, “as normas impugnadas operam inequivocamente como sanções políticas”. Disse ainda o Ministro que, “historicamente”, o STF reafirma a impossibilidade de o Estado impor esse tipo de sanção ao contribuinte como forma de coagi-lo a quitar débitos fiscais.
A Lei Federal tem por objetivo tornar mais célere e racional a sistemática de abertura e regularização de empresas nacionais. Neste sentido o disposto em seu artigo 2°, in verbis:
“Art. 2o Fica criada a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios – REDESIM, com a finalidade de propor ações e normas aos seus integrantes, cuja participação na sua composição será obrigatória para os órgãos federais e voluntária, por adesão mediante consórcio, para os órgãos, autoridades e entidades não federais com competências e atribuições vinculadas aos assuntos de interesse da Redesim.
Parágrafo único. A Redesim será administrada por um Comitê Gestor presidido pelo Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, e sua composição, estrutura e funcionamento serão definidos em regulamento.”
A norma vincula a administração federal e abre possibilidade para os demais órgãos e entidades dos governos estaduais e municipais para participarem da denominada REDESIM.
Transcorrido mais de um ano da edição da Lei, os efeitos tão desejados pela classe empresarial não apareceram no volume desejado. Alguns órgãos estaduais e outros municipais iniciaram os procedimentos para simplificação do sistema, mas não passaram de iniciativas isoladas.
Considerando a dificuldade do setor privado em obter as autorizações dos mais variados órgãos de fiscalização e controle, que por vezes, não têm noção clara de sua competência, a Lei Complementar n° 128/08 inseriu no Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte dispositivos constantes na Lei Federal n° 11.598, que eram facultativos aos estados e municípios, vejamos as disposições:
“Art. 2o O tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte de que trata o art. 1o desta Lei Complementar será gerido pelas instâncias a seguir especificadas:
I – Comitê Gestor do Simples Nacional, vinculado ao Ministério da Fazenda, composto por 4 (quatro) representantes da Secretaria da Receita Federal do Brasil, como representantes da União, 2 (dois) dos Estados e do Distrito Federal e 2 (dois) dos Municípios, para tratar dos aspectos tributários; e (Redação dada pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
II – Fórum Permanente das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, com a participação dos órgãos federais competentes e das entidades vinculadas ao setor, para tratar dos demais aspectos, ressalvado o disposto no inciso III do caput deste artigo; (Redação dada pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
III – Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, composto por representantes da União, dos Estados e do Distrito Federal, dos Municípios e demais órgãos de apoio e de registro empresarial, na forma definida pelo Poder Executivo, para tratar do processo de registro e de legalização de empresários e de pessoas jurídicas. (Incluído pela Lei Complementar nº 128, de 2008)”.
Como se verifica na norma supra, o tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado as empresas constituídas sob a forma de Microempresa ou Empresa de Pequeno Porte passa a dispor de três instâncias distintas, a saber:
O Comitê Gestor do Simples Nacional que tem a atribuição de regulamentar a opção, exclusão, tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança, dívida ativa, recolhimento e demais itens relativos ao Simples Nacional. Portanto o Comitê Gestor trata apenas e tão somente de assuntos tributários contidos ou conexos com o sistema de arrecadação simplificado. Sua coordenação cabe ao Ministério da Fazenda.
A seu turno o Fórum Permanente tem por finalidade orientar e assessorar a formulação e coordenação da política nacional de desenvolvimento das microempresas e empresas de pequeno porte, bem como acompanhar e avaliar a sua implantação. O Fórum é presidido e coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Portanto, o dispositivo também está dentro do âmbito do Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte.
Por fim, a inovação trazida pela Lei Complementar n° 128/08 diz respeito ao Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (REDESIM, disciplinada pela Lei n° 11.658/07). vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, composto por representantes da União, dos Estados e do Distrito Federal, dos Municípios e demais órgãos de apoio e de registro empresarial, na forma definida pelo Poder Executivo, para tratar do processo de registro e de legalização de empresários e de pessoas jurídicas.
O âmbito de atuação deste comitê não está adstrito ao Estatuto da Microempresa e das Empresas de Pequeno Porte, mas ao sistema de legalização e registro, que a partir de então passa a ser obrigatório, e não mais facultativo, como consta na lei da REDESIM.
Para que não se tenha dúvida, veja-se o disposto no § 7° do artigo 2° da Lei Complementar n° 123, inserido pela Lei Complementar n° 128:
“§ 7o Ao Comitê de que trata o inciso III do caput deste artigo compete, na forma da lei, regulamentar a inscrição, cadastro, abertura, alvará, arquivamento, licenças, permissão, autorização, registros e demais itens relativos à abertura, legalização e funcionamento de empresários e de pessoas jurídicas de qualquer porte, atividade econômica ou composição societária.” Grifo nosso.
O prazo para a regulamentação dos assuntos veiculados na norma supra citada foi estabelecido em 180 (cento e oitenta) dias, praticamente coincidindo com a entrada em vigor da nova modalidade de empresário denominado Microempreendedor Individual.
Em abril próximo passado tivemos as primeiras reuniões no âmbito do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior para discutir os temas elencados pela LC 128/08, que são de grande complexidade e abrangência.
Sem entrar no mérito da colocação de matéria alienígena as microempresas e as empresas de pequeno porte no seu estatuto (Lei Complementar n° 123 e alterações posteriores), o prazo para a adaptação dos estados e municípios é demasiado pequeno, e com certeza, mais uma vez, o empresariado sofrerá com os atrasos e omissões dos órgãos públicos responsáveis pela concessão de autorizações, alvarás e licenças.
Especificamente para as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte existe a necessidade de definição e regulamentação dos seguintes temas:
1 – Unicidade do processo de registro e de legalização de empresários e de pessoas jurídicas, que está sendo desenvolvido em âmbito estadual, com possibilidade de financiamento através do BNDES, devendo, nos moldes estabelecidos artigo 12 da Lei n° 11.658/07, conceber a ”CENTRAL DE ATENDIMENTO EMPRESARIAL – FÁCIL.
Estas centrais serão instaladas preferencialmente nas capitais e funcionarão como centros integrados para a orientação, registro e a legalização de empresários e pessoas jurídicas, com o fim de promover a integração, em um mesmo espaço físico, dos serviços prestados pelos órgãos que integrem, localmente, a REDESIM.
2 – Integração através de meio eletrônico dos órgãos dos entes federados e das juntas comerciais, para aqueles poderem receber os documentos de constituição de pessoa jurídica e encaminhados a estas para fins de registro, alteração ou extinção.
O local mais apropriado para a instalação destes “Postos de recepção e encaminhamento” é a Prefeitura, dada sua proximidade junto ao empresário. O problema é a parte financeira, que deveria ser suportada pelo governo federal ou mesmo pelos governos estaduais.
3 – Implantação de pesquisa prévia, para que o empreendedor não seja surpreendido, após ter iniciado seu processo de constituição da pessoa jurídica, por proibições ou por requisitos impossíveis de serem cumpridos.
4 – Lista nacional (com CNAE) das atividades que possuam grau de risco alto e não tenham direito ao alvará provisório e nem ao início de atividade, antes de vistorias prévias em suas instalações.
5 – Forma de autorização para o exercício de atividade econômica em residência, ou local sem regularização fundiária. São incontáveis os imóveis localizados em área não regularizadas, e a autorização para exercício de atividade econômica precisa vir acompanhada de um prazo para regularização da situação, sob pena de instituição do caos.
6 – Consolidação do cadastro sincronizado, projeto que teve início em 2004 e é coordenado pela Receita Federal, já operando em diversos estados e municípios, permitindo assim, a entrada única de dados cadastrais, ressalvada a peculiaridade de cada órgão.
7 – No mesmo sentido das decisões do Supremo Tribunal Federal a desvinculação da regularidade fiscal como requisito para a realização de abertura, alteração ou extinção de empresa.
O Objetivo é permitir que o empresário faça as alterações necessárias na pessoa jurídica, podendo, posteriormente, regularizar sua situação fiscal, ou discuti-la em juízo.
Por todo o exposto, fica claro que os efeitos das regras trazidas pela Lei n° 11.658/07 e pela Lei Complementar n° 128/08 ainda vão demorar para gerar os benefícios idealizados por seus mentores.
Aguardamos com ansiedade as primeiras resoluções sobre o tema a serem baixadas pelo Comitê Gestor da REDESIM.
Por fim, a simplificação da aberta, alteração e extinção de empresa, deve tornar estes atos menos burocráticos e custosos, aumentando a possibilidade de que empresários se aventurem a novas empreitadas mercantis, pela via formal, e por conseqüência, gerando mais renda, emprego, bem estar.
* Advogado tributarista, economista, contabilista, com pós-graduação em administração financeira e especialização em gestão da qualidade total. Empresário, consultor de empresas e de escritórios de contabilidade, professor e consultor da área tributária do Instituto Brasileiro de Administração Pública, professor de graduação, pós-graduação e MBA das áreas de tributária e finanças das Faculdades Anhanguera. Autor do Livro Manual Prático de Tributos Municipais e do Curso de Fiscalização Municipal à Distância.