A lei que mete medo nos políticos
Augusto Sampaio Angelim*
A edição de hoje, 02/5/04 da FOLHA DE SÃO PAULO destaque como uma matéria capa que a Lei n. 9.840/99 foi responsável pelo afastamento de 75 prefeitos eleitos em 2000, inclusive citando nominalmente tais políticos. Essa lei, resultado de iniciativa popular, foi levada ao Congresso Nacional pela CNBB, Conferência Nacional dos Bispos, que, como se sabe, é uma entidade da Igreja Católica de reconhecida atuação social e política.
A lei em comento representou um avanço no ordenamento jurídico nacional, deixando de lado a nossa tradição da suspensão dos efeitos das decisões judiciais passíveis de recursos e, neste aspecto, satisfaz o sentimento popular e da mídia, uma vez que esses protagonistas da política vêem suas esperanças (ou desejos, interesses) frustrados nos inúmeros processos judiciais que não cominam, de imediato, com o afastamento dos condenados.
Diz a reportagem que, agora, há uma articulação no Senado Federal para alterar substancialmente essa lei, fazendo com que seus efeitos somente sejam concretizados quando do trânsito em julgado da respectiva sentença de afastamento.
Quero chamar a atenção dos leitores para o fato de que essa pretendida alteração somente beneficiará aqueles que vivem à margem da moralidade administrativa nas eleições, comprando voto e desvirtuando a vontade popular. Ora, tal alteração somente se justificaria do ponto de vista político acaso essa lei estivesse sendo utilizado de forma precipitada pela Justiça Eleitoral, mas, seguramente, essa não é a situação de fato, tanto assim que, apesar da milhares de denúncias de imoralidades administrativa que circulam no Brasil inteiro, somente 75 prefeitos foram afastados desde 2000 até a presente data o que prova que a Justiça Eleitoral vem agindo de forma serena e não ao sabor das conveniências ou pressões políticas, nestes casos.
Mais de um milhão de eleitores assinaram o projeto que terminou por se concretizar em lei, através da chamada iniciativa popular, num dos raros e bem sucedidos movimentos dessa natureza. Essa lei sendo mantida será o instrumento mais eficaz para combater a corrupção eleitoral.
O engraçado, ou melhor, lastimável, é que o próprio Congresso sinta-se incomodado com tal lei, pois até que é discutível sua constitucionalidade – já que a regra jurídica é da suspensão dos efeitos das decisões não transitadas em julgado. O prudente seria alguns dos partidos políticos questionar a constitucionalidade da lei.
Com essa Lei ocorreram duas inovações importantíssimas, a primeira é no sentido de que o candidato que de qualquer forma ou usando de qualquer artifício estiver comprando votos, além de receber a pena já prevista no código, com a tramitação do processo penal tradicional, terá mediante um procedimento sumário, seu registro cassado e ainda pagará uma multa. A outra, inibe o uso da máquina administrativa em favor da própria candidatura o que vai suceder com prefeitos candidatos à reeleição principalmente, pelo fato de poderem concorrer, sem ter que deixar o cargo.
Veja-se, abaixo, o texto da lei que mete medo nos políticos:
LEI No 9.840, DE 28 DE SETEMBRO DE 1999.
Altera dispositivos da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997, e da Lei no 4.737, de 15 de 0 julho de 1965 – Código Eleitoral.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o A Lei 9.504, de 30 de setembro de 1997, passa a vigorar acrescida do seguinte artigo: “Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.”
Art. 2o O § 5o do art. 73 da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 73…………………………………………………………………. ……………………………………………………………………………” “§ 5o Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos I, II, III, IV e VI do caput, sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma.” (NR) “…………………………………………………………………………….”
Art. 3o O inciso IV do art. 262 da Lei no 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 262………………………………………………………………….. ……………………………………………………………………………..” “IV – concessão ou denegação do diploma em manifesta contradição com a prova dos autos, nas hipóteses do art. 222 desta Lei, e do art. 41-A da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997.” (NR) Art. 4o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5o Revoga-se o § 6o do art. 96 da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997.
Brasília, 28 de setembro de 1999; 178o da Independência e 111o da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO José Carlos Dias
Espero que seja mantida essa lei, sem alteração e que a Justiça Eleitoral, quando invocada, faça valer os objetivos da lei.
* Juiz de Direito, ex Diretor Regional da Escola da Magistratura em Caruaru e lecionou na Faculdade de Direito de Caruaru na Cadeira de Direito Constitucional. Foi, também, Promotor de Justiça.
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