Reflexões sobre a Crise Econômica
Ives Gandra da Silva Martins*
Apesar das sucessivas manifestações do Presidente Lula e das autoridades econômicas no sentido de que o Brasil está blindado contra a crise americana, por força de suas
reservas, de sua economia estar voltada fundamentalmente para o mercado interno e de termos menos de 20% de nossas exportações destinadas ao mercado dos Estados Unidos, pessoalmente, entendo que não podemos nos considerar inatingíveis. É certo que em virtude de todo o trabalho realizado desde o governo Itamar, para dar melhores
fundamentos à economia brasileira, o Brasil está hoje em melhores condições de enfrentar a crise econômica internacional do que no passado. Estamos, entretanto, longe de nos considerar imunes aos reflexos de crise americana, que poderá ser mais longa e mais aguda do que os áulicos da nação apregoam.
De início, há dois elementos preocupantes, a saber: de um lado, a fuga de 21 bilhões de dólares de investimentos estrangeiros em 2007, que podem crescer se a crise continuar
e, de outro lado, a projeção do governo de um crescimento para o Brasil superior ao do ano passado, com orçamento preparado, em nível de receitas e despesas, a partir daquelas projeções otimistas.
Se a fuga de investimentos estrangeiros continuar aumentando – em busca mais da segurança propiciada pelas nações desenvolvidas, que de rendimentos – e se a economia desenvolver-se menos que o esperado, as despesas públicas previstas para outro cenário terminarão pressionando a Receita para que obtenha mais recursos tributários, o Banco Central para que consiga mais empréstimos, afim de que se
cubra o possível diferencial sem emissão de moeda e inflação. Vale dizer, teremos uma carga tributária maior e juros crescentes.
Não estou, pois, convencido de que a sugestão do atual diretor-geral do FMI, professor Strauss-Khan, de flexibilização da política fiscal, seja uma boa solução. Se os países emergentes a adotarem, tenderão a retomar o debilitado processo inflacionário e os países desenvolvidos terão que lutar para conter um acréscimo de demanda que,
fatalmente, pressionará os preços finais.
Por outro lado, a redução dos juros nos Estados Unidos, se, de um lado, diminui o impacto da dívida dos consumidores e estimulam o consumo, de outro lado, fragilizam a possibilidade de os bancos em dificuldade recomporem seus prejuízos com juros mais elevados. O próprio impacto do aumento do consumo não permitirá que a cobertura dos
prejuízos tenha a mesma velocidade. Irving Fischer, no seu clássico “Teoria do Juro”, formula conceito suficientemente auto-esclarecedor, ao observar que a taxa de juros é
“determinada pela impaciência de gastar (consumir) e a oportunidade de investir (poupança)”.
Enfim, o cenário não é claro e, pessoalmente, não sou otimista quanto à blindagem alegada, motivo pelo qual gostaria de maior prudência do governo, principalmente na
sua incrível capacidade de aumentar, todos os anos, as despesas de custeio e de forma não tão transparente quanto a sociedade deseja.
Roberto Campos, em prefácio para livro meu, escreveu que “a melhor forma de evitar a fatalidade é conhecer os fatos”. É o que deve o governo procurar, na crise atual.
* Professor Emérito das Universidade Mackenzie e UNIFMU e da Escola de Comando e Estado maior do Exército. Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, da Academia Paulista de Letras e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: http://www.gandramartins.adv.br
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