Brasil! País do Malboro
Ricardo Bergamini*
Não há dúvida de que optando pela dependência em relação aos dominadores, o Brasil se conformou com o subdesenvolvimento perpetuo, o desemprego e a divida eterna, conseqüências inevitáveis com o domínio atual de vastos setores estratégicos da economia nacional pelas empresas estrangeiras.
Se pudéssemos calcular os recursos despendidos pelo país, durante anos, no sentido de eliminar gradativamente sua alta dependência em quase todos os setores econômicos através de concessões de benefícios, incentivos fiscais e apoio financeiro, sem resultados substancialmente positivos. Não ocorreu o esperado, a fixação local de tecnologia, sem a qual continuaremos na dependência total de seu detentor, ainda que fabricando localmente o produto. Essa tecnologia se retirada por qualquer motivo, determina a suspensão total da fabricação do produto no Brasil, invalidando qualquer esforço governamental de incentivo à indústria respectiva.
O Brasil alicerçou seu projeto de desenvolvimento em corporações multinacionais cujo segredo foi o controle da tecnologia através dos “pools de patentes” e do controle aos possíveis concorrentes, assim como as antigas colônias, impedindo a formação de quadros que porventura pudessem futuramente dirigir nações emergentes como o Zaire, Angola e Moçambique e outras nações africanas, não possuindo atualmente um quadro mínimo de médicos, engenheiros e administradores, indispensáveis à organização de um ESTADO-NAÇÃO.
O know-how não se transfere por contrato de licença. Adquiri-se em trabalho árduo nas salas de aula de desenho e oficinas de trabalho, e os ingleses já em 1945 questionaram a sabedoria da indiscriminada busca de licenças da fabricação, alegando ser melhor forçar empresas britânicas a despenderem esforços próprios no desenvolvimento de tecnologia independente
Reconhecendo este problema, países como o Japão, os Estados Unidos e a França nunca permitiram que fossem alienadas as suas indústrias estratégicas, assim como o ex- chanceler alemão Helmut Schimid declarou, por ocasião da venda de algumas ações da Mercedes Benz ao Kuwait que a Alemanha toleraria a aquisição de cervejarias e indústrias de importância estratégicas reduzida, sabendo no entanto, impedir a venda de empresas de ponta, como a KWU Kraftwerkunion, produtora de usinas atômicas.
O esquema de divisão internacional do trabalho reservou ao Brasil até o presente momento a função de mercado regulador de oferta e produção e fornecedor de mão-de-obra barata. Onde se situaria o preço internacional do petróleo e das demais matérias-primas, se todos os países alcançassem o nível de desenvolvimento e consumo dos sete grandes (G7) Assim sendo, o Brasil dominado, exporta sapatos a salários de fome, a fim de poder pagar importações dos produtos de alta tecnologia de suas matrizes para as suas filiais.
E assim, com o objetivo de manter a mão-de-obra brasileira competitiva em relação a países de miséria perene, como a Índia, e assegurando ao mesmo tempo nível de renda e de vida condizentes, aos executivos brasileiros de corporações internacionais (Local White Help), verdadeiros marajás dos interesses alheios, para isso foi necessário aumentar a concentração de renda, a mortalidade infantil, a subnutrição, a doença e a miséria de vastos setores de nossa população.
A eliminação da iniciativa privada nacional criou uma classe abastada de burocratas (responsáveis pelo lastro legal, via congresso), outra de gerentes e executivos de empresas estatais (dilapidando patrimônio estatal para reduzir seu valor de venda) e finalmente, o Mercado Financeiro financiando, via meios de comunicação, colocações de forma maciça de mentiras, em tais proporções nos últimos anos, que se transformaram em verdades para os menos cuidadosos, os quais se aliam às corporações multinacionais, cujas aspirações se voltam ao acompanhamento do padrão de vida das nações ricas. Aos poucos empresários nacionais, espécie em extinção, que sobrevivem à discriminação tradicional, somente um conselho: “Vendam suas empresas, o mais rápido possível, pelo preço que ainda puderem obter, e tornem-se gerentes”. A outros setores da vida nacional, no entretanto, não se apresenta esta opção e os seus níveis de remuneração não acompanham a bonança salarial dos gerentes privilegiados dos interesses alheios, fato que se reflete nas origens cada vez mais humildes dos quadros das Forças Armadas, tendendo transformarem-se em “Escoteiros do Ar, do Mar e da Terra”.
Ao país atualmente poucas alternativas sobrariam, em caso de mudança de política. Caberia reduzir gradualmente a níveis compatíveis com a segurança nacional, o controle estrangeiro exercido em todos os níveis da vida nacional, passando pelo condicionamento ao consumo da mente infantil dos brasileiros através dos atrativos do “País do Malboro” apresentados diariamente pelos nos meios de comunicação, ao controle da tecnologia e das eventuais alavancas de desestabilização dos suprimentos, ou seja, de peças e materiais vitais à manutenção da vida econômica da nação. O país certamente pagaria um preço elevado por querer iniciar um desenvolvimento próprio, mas este preço seria inferior ao atualmente pago. Não caberia hostilizar o capital estrangeiro, que sempre será bem vindo, e que elevada contribuição ainda poderia trazer ao progresso do País, porém operando dentro do mercado de crédito, e não mais, no mercado financeiro. Urge, isto sim, colocar sua contribuição nos devidos termos, reduzir sua influência em todos os setores invertendo a situação atual, mediante favorecimento de iniciativas brasileiras, como simples medida de segurança nacional, certamente afetada no presente estágio terminal, no qual representantes de corporações multinacionais já controlam os mais vastos campos de nossa vida econômica e política.
O medo perante a situação irresponsável de corporações gigantes se alastra pelo mundo, alarmando até o Senado norte-americano. Algumas poucas corporações controlarão a vida econômica do mundo. Vastos setores da opinião mundial prevêem as corporações multinacionais com força de atuação econômica irresponsável, além do alcance das “leis nacionais”.
O controle da força incontida das corporações multinacionais e dos cartéis se impõe não só por razões do desenvolvimento econômico ou de justiça social, mas também pelo bem da liberdade individual de cada homem. Sem medidas concretas e urgentes de apoio à iniciativa e a produção local, somente resta uma pergunta a fazer. De quê e como viverão as gerações brasileiras futuras ?
Ao Brasil caberia adotar as armas das corporações multinacionais, organizadas em rígidos cartéis, alocando participação de mercado à empresa nacional (agreed upon market share). O mercado brasileiro deveria ser considerado patrimônio nacional.
Florianópolis, 23 de Junho de 2000
* Economista, formado em 1974 pela Faculdade Candido Mendes no Rio de Janeiro, com cursos de extensão em Engenharia Econômica pela UFRJ, no período de 1974/1976, e MBA Executivo em Finanças pelo IBMEC/RJ, no período de1988/1989. Membro da área internacional do Lloyds Bank (Rio de Janeiro e Citibank (Nova York e Rio de Janeiro). Exerceu diversos cargos executivos, na área financeira em empresas como Cosigua – Nuclebrás – Multifrabril – IESA Desde de 1996 reside em Florianópolis onde atua como consultor de empresas e palestrante, assessorando empresas da região sul.
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