Prescrição dos crimes no Brasil: sinônimo de impunidade
Lélio Braga Calhau*
A reforma processual penal tão prometida pelo Congresso Nacional tramita em ritmo demasiadamente lento. Também por esse motivo a impunidade ocorre diariamente nos tribunais causada pelo excesso de normas pouco razoáveis que existem ainda em nossa legislação criminal. A reforma visa acabar, em parte, com esses gargalos processuais.
Na prática, o pobre é julgado pelo juiz de primeiro grau e tem uma apelação analisada uma vez. Para o rico, o caminho é bem diferente. Além dos recursos ordinários (que no seu caso são sempre manejados, até para protelar a decisão), o réu que detém um advogado criminal competente e caro vai à Brasília onde, por força de uma jurisprudência complacente, ações de impugnação como habeas corpus e mandados de segurança são impetrados sem limites, ora caindo nas mãos de relatores plantonistas em fins de semana, ora repetidos diversas vezes num mesmo processo, muitas vezes com o intuito mero de postergar a sentença penal transitada em julgado.
Os recursos protelatórios têm um objetivo único: alcançar algumas das diversas modalidades de prescrição penal existente no Brasil. Descritas e reguladas nos artigos
Por outro lado, o crime de homicídio deveria prescrever no mínimo em trinta anos. São comuns os casos de homicidas que ainda se evadem do distrito da culpa e fogem para os estados longínquos ou mesmo para Portugal ou Estados Unidos. Impedir o Estado de levá-los a julgamento por um prazo maior é profundamente injusto para as famílias das vítimas.
É como se o autor do homicídio fosse coroado pela sua astúcia em mudar de país com o intuito de impedir a aplicação da lei penal. O artigo 115 do Código Penal prevê que são reduzidos de metade os prazos prescricionais quando o acusado era, ao tempo do crime, menor de 21 anos, ou, na data da sentença, maior de 70 anos.
A manutenção da redução da idade para os menores de 21 anos é razoável. Coaduna com uma Política Criminal onde a tolerância deve ser aplicada ás infrações praticadas pelos jovens que estejam nessa faixa etária. Todavia, a mesma redução pela metade da prescrição para as pessoas que tenham mais de 70 anos na data da sentença é profundamente injusta. Em maio deste ano, o ex-prefeito de São Paulo, Sr. Paulo Salim Maluf, foi beneficiado com essa modalidade de redução da prescrição em uma acusação penal.
A mesma regra será utilizada nos atuais processos que estão sendo ajuizado contra o mesmo. Essa modalidade de redução do prazo prescricional também é um prêmio para a impunidade. A prescrição é a consagração da pacificação do conflito criminal pelo tempo, mas não é justo para as vítimas e para a sociedade civil, que num sistema onde as partes utilizam os recursos processuais para conseguir a prescrição, nada seja feito.
É um direito das vítimas e de seus familiares que as pessoas que lhes tenham prejudicado sejam levados a um julgamento pelo Estado. É um direito das vítimas que isso ocorra.
Cabe ao Congresso Nacional rever esses prazos e permitir que o Estado possa processar e julgar os acusados em um tempo mais razoável. Não defendo aqui a criação de mais crimes imprescritíveis, mas a possibilidade do Estado poder levar a julgamento criminosos em prazos mais justos para as vítimas e suas famílias.
* Criminólogo. Professor de Direito Penal da UNIVALE – Universidade do Vale do Rio Doce. Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Pós-Graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha). Mestre em Direito do Estado e Cidadania pela Universidade Gama Filho (RJ).
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