INTRODUÇÃO
A vida em sociedade é algo dinâmico, que depende de inúmeros e diferentes fatores ligados às dimensões em que vivem os indivíduos inseridos na
sociedade. Perante isso, foi criado o Direito Positivo, com leis e normas que vigoram para regular a vida em sociedade. Junto às leis, surgiram as
sanções, que são as punições aplicadas pelo Estado mediante as transgressões das leis. Denominamos estas sanções aflitivas de penas.
Quando um sujeito pratica um crime surge a relação jurídico-punitiva: de um lado, aparece o Estado com o jus piniendi; de outro, o réu, com a
obrigação de não obstacularizar o direito de o Estado impor a sanção penal. Com a prática do crime, o direito de punir do Estado, que era abstrato,
torna-se concreto, surgindo a punibilidade, que é a possibilidade jurídica de o Estado impor a ação.
Com a evolução do Direito, foram criados diferentes regimes de cumprimento das penas, mas na maioria das vezes os apenados têm de passar um determinado
período de tempo na cadeia.
Logo, se a punição é aplicada pelo Estado, a responsabilidade de manter as cadeias, conseqüentemente, também é do Estado. E é em torno deste contexto
que este trabalho foi elaborado: Na ineficácia do Estado em manter, organizar e fiscalizar o sistema carcerário brasileiro. Mescla-se este problema
com os demais que circundam a realidade brasileira, especialmente dois: Tráfico de drogas e de armas. Assim temos uma situação extremamente grave a ser
estudada e resolvida.
1 FRAGMENTOS HISTÓRICOS
É muito antiga a origem da pena, pois, muitos agrupamentos já utilizavam deste subterfúgio para disciplinar o que em seu meio causava desconforto aos
demais.
Com o passar dos tempos, chega-se aos dias atuais em que a prisão apresenta-se como pena por um crime praticado, tendo, teoricamente,
caráter ressocializador, preventivo e retributivo.
Prisão é a privação de liberdade daquele que responde a um fato considerado infração penal ou a pena imposta em razão de uma sentença
condenatória. O vocábulo prisão do latim, prehensio, de prehendere, que significa prender, segurar, agarrar. O significado jurídico do
vocábulo exprime o ato pelo qual a pessoa fica privada de sua liberdade de locomoção, isto é, de ir e vir, recolhendo-se a um local fechado e seguro,
de onde não poderá sair.
Prisão, assim, tem o significado de local para encarceramento e com a característica de retirada de liberdade.
A evolução histórica das penas foi observada inicialmente com as violações de regras sagradas, acarretando na perda da paz e com os
conflitos familiares, que por sua vez trazia consigo a vingança de sangue, surgindo a necessidade da busca pela repressão, já que o convivo social não
podia admitir que cada um exercesse sua vontade com o detrimento do direito do outro. Posteriormente, surgiram na Grécia e no Império Romano, penas
mais severas, que iam de sanções de desterro (afastamento da terra natal) a castigos corporais, entre outros. Dentro da evolução as penas passaram a
ter uma conotação mais pedagógica, buscando na prisão, um meio de ressocialização do individuo. Por fim, nos dias atuais, surgem muitos estudos
envolvendo a sociedade com um todo, com a finalidade de amenizar os problemas que envolvem o aumento da criminalidade, do seu surgimento , e os meios
de punição. Os meios de prevenção visam desestimular a prática de crimes e buscam a recuperação do condenado, procurando fazer com que ele não volte a
praticar novos crimes. Para a recuperação foram criados espaços específicos, os presídios, casas de detenção, penitenciárias e ou cadeias.
2 PROBLEMAS NO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO
A segurança pública e a criminalidade são hoje as maiores preocupações da sociedade brasileira, basta assistir aos noticiários e ler os jornais para
constatar que de hora em hora, minuto a minuto pessoas são vítimas da criminalidade.
A concentração de renda nas mãos de poucos, o desemprego, a falta de políticas públicas de habitação, saúde, educação, transporte, saneamento, a
especulação imobiliária e a concentração da terra contribuíram para surgir no entorno dos centros urbanos expressivos contingentes populacionais em
favelas, palafitas e mocambos, desprovidos de direitos e de esperanças. Incluindo aí a corrupção desenfreada, a ausência do estado em extensas áreas da
periferia, a falta de participação popular nos assuntos públicos e a quase total impunidade da elite política e econômica, que contribuíram para o
clima de insegurança hoje existente , elevando cada vez mais as diferenças sociais e os índices de criminalidade, em conseqüência, o Estado, tentando
punir a criminalidade, empurra os sujeitos da mesma para as prisões.
As prisões no Brasil podem ser classificadas como depósitos de seres humanos, onde os os detentos são deixados e esquecidos. Sem dúvida, a superlotação
dos presídios, penitenciárias e distritos policiais agravam todos os problemas do sistema penitenciário. Em celas construídas para acomodar 4 detentos,
“vivem” o dobro de pessoas. Os detentos tiveram de adotar uma prática chamada por eles de “valete”; A expressão é usada pelos detentos para explicar
que dois são obrigados a dormir na mesma cama de solteiro, um dorme com a cabeça para o encosto da cama, e o outro, ao contrário, parecendo a carta do
valete no baralho, com uma figura em posição normal e a outra de ponta-cabeça. Tal posição também é chamada de “69”. Acarretando dessa superlotação, o
aparecimento de doenças graves e outras mazelas, no meio dos detentos.
A insalubridade das instituições também é um fator muito importante a ser analisado. O ambiente penitenciário além de superlotado, é úmido e sujo,
características essas, propícias para a proliferação de diversas doenças. Isto somado a má alimentação e ao sedentarismo dos presos é o auge para
doenças, torna-se uma pena de adoecer além da pena privação de liberdade.
O tráfico de drogas e de armas também é fator crucial agravante do sistema penitenciário brasileiro. É comum acompanharmos a mídia veiculando casos de
bandidos que comandam fortes esquemas de tráfico de dentro das prisões através de telefones celular. Mas, quem convive na esfera penitenciária, sabe
que este tipo de controle não é novidade. E da mesma forma que entram estes telefones, entram também drogas e armas nas prisões. O que permite que os
que são bandidos, continuem a praticar crimes, mesmo que “presos”, e os que não são bandidos – estão presos a espera de julgamento, ou por crimes leves
– ingressem na criminalidade de forma mais grave. Impera dentro das prisões a lei do mais forte, ou seja, quem tem força ou poder subordina os mais
fracos.
Ora, se um preso usa um telefone celular, se serve das visitas para atuar externamente, tal não se deve ao principio da progressividade das penas e o
respeito pelos direitos do preso, mundialmente reconhecidos, mas pelo tráfico que é a tônica no sistema carcerário brasileiro. De que vale determinar
o isolamento de um criminoso por anos, se ele vai contar com a corrupção do pessoal penitenciário para permanecer em contato com o mundo exterior?
Sabe-se que existem presídios onde há apenas um agente penitenciário para tomar conta de cerca de 100 a 200 detentos, profissionais esses, mal
remunerados, acabam encontrando na corrupção de favorecimento a certos detentos, um rendimento que chega a ser superior a seus proventos o que é o
portal de entrada e saída de objetos, às vezes até pessoas das prisões.
A pena deve ser usada como profilaxia social, não só para intimidar o cidadão, mas também para recuperar o delinqüente. As penas nos moldes que estão
sendo aplicadas, no atual sistema prisional brasileiro, longe estão de ser ressocializadoras. Busca-se dar uma satisfação a sociedade que se sente
desprotegida, assim sendo apresenta-se apenas a finalidade retributiva. Não busca ela a recuperação do delinqüente, não busca reintegra-lo no seio da
sociedade. Dentre os graves problemas que isso acarreta, gera um falso entendimento que com penas mais severas pode-se coibir os delinqüentes.
Enganam-se os que assim pensam, pois o crime é reflexo de muitas outras causas.
As penitenciárias brasileiras, com raras exceções, não dão assistência ao preso, deveriam objetivar a prevenção dos crimes e a orientação ao retorno à
convivência em sociedade. A maioria dos estabelecimentos penais necessitam de ampla reforma, a fim de permitir o adequado alojamento dos presos.
O Estado não garante assistência à saúde, médica, farmacêutica, odontológica, psicológica, jurídica e social. Se faz necessário que, no mínimo se
cumpra a legislação tangível ao sistema penitenciário.
Após estas considerações, apresenta-se abaixo garantias não respeitadas pelo Estado, em teoria asseguradas pela legislação.
Aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em cujo preâmbulo está escrito
que devemos todos, indivíduos e comunidades, nos empenhar para que os direitos nela inscritos se tornem uma realidade, mediante a adoção de medidas
progressivas de caráter nacional e internacional.
E para reforçar ainda mais a Declaração dos Direitos Humanos, a Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984, Lei de Execuções Penais.
Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica
integração social do condenado e do internado.
Art. 38 O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física
e moral.
A Lei de Execução Penal é transparente quando afirma que:
Art. 40 Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios.
Art. 45 Não haverá falta nem sanção disciplinar sem expressa e anterior previsão legal ou regulamentar.
§ 1º As sanções não poderão colocar em perigo a integridade física e moral do condenado.
A Lei de Execução Penal deve ser aplicada igualmente ao preso provisório, e à ele devem ser assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença
ou lei (arts. 2º e 3º da LEP).
3 PERSPECTIVAS DE MUDANÇA
As penas privativas de liberdade contribuíram para eliminar as penas aflitivas, os castigos corporais, as mutilações entre tantas outras formas de
penas torturantes, sabe-se que hoje esta pena não tem correspondido ao seu objeto de recuperação do delinqüente. É impossível a ressocialização do
homem que se encontra preso, quando vive em uma comunidade cujos valores são totalmente opostos daqueles a que, em liberdade deverá obedecer.
Mesmo diante de todos os aspectos negativos aqui já apresentados, não se pode, entretanto, questionar que a pena privativa de liberdade é o único
recurso aplicável para os delinquentes de alta periculosidade. Mesmo Michel Foucault, grande crítico do sistema prisional, reconhece que na hipótese
acima não há possibilidade de mudança, sendo a pena de prisão detestável solução de que não se pode abrir mão.
Não é obstáculo, porém, para que se inicie a experiência de evitar o máximo possível o confinamento dos condenados a penas de curta duração.
É necessário humanizar o mais rápido possível o sistema penitenciário. Os presídios precisam de reformas de infra-estrutura urgentes (instalações de
luz, água, alimentação adequada, etc.), além disso, novas unidades precisam ser construídas, para que seja minimizada a superlotação. O Estado precisa
investir em pessoal qualificado, dando assistência médica, à saúde, farmacêutica, odontológica, psicológica, jurídica, educacional e social.
Outra corrente traz como solução para o sistema carcerário a privatização dos presídios tendo como argumento que grandes empresas poderiam
administrá-los, com a possibilidade de contratação e formatação de mão-de-obra e a real indenização à sociedade pelo delito cometido, além de recuperar
os presidiários, que teriam uma formação ao término da pena.
Talvez uma das soluções para um melhor resultado das sanções aplicadas seria colocar em prática o que já está previsto em Lei Nº 7.210, de 11 de julho
de 1984, em seu art. 28: O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva. Este
trabalho recebe o nome de laborterapia, que se trata do trabalho na prisão, é a ocupação do tempo fazendo uma atividade profissional. Com isso o preso
ocupa seu tempo, diminui sua pena, gera lucros para si e para o Estado. O Brasil possui presídios com esta atividade, mas que normalmente oferecem aos
detentos o trabalho de costurar bolas, artesanatos, manutenção do presídio, panificação, cozinha, faxina ou fazer pregadores de roupa, ofícios que não
ocupam ao recuperar a liberdade. A eficiência seria maior, se o apenado tivesse na prisão um ofício que, ao reconquistar a liberdade, poderia ser
exercido na sociedade e que a ele seria lucrativo.
As penas alternativas podem ser a solução para o problema carcerário, já que a pena alternativa visa a dificultar, evitar, substituir ou restringir a
aplicação da pena de prisão e possui significativa redução de custos ao Estado. É uma medida punitiva, de caráter educativo e socialmente útil, imposta
ao autor da infração penal. Estas penas são destinadas aos criminosos não perigosos e às infrações de menor gravidade, visando substituir as penas
detentivas de curta duração. Na verdade, com a pena alternativa não é necessário afastar o indivíduo da sociedade nem excluí-lo do convívio social e
familiar e, principalmente, evita-se expor o sentenciado aos males do sistema carcerário.
Com o advento da Lei 9.714/98, Penas Alternativas, criou-se uma maior abrangência para a aplicação das penas alternativas. Mirabete nos diz que o
sucesso da inovação dependerá, e muito do apoio que a comunidade der às autoridades judiciais, possibilitando a oportunidade para o trabalho do
sentenciado, o que já demonstra as dificuldades do sistema adotado diante da reserva com que o condenado é encarado no meio social. Trata-se, porém, de
medida de grande alcance e, aplicada com critério, poderá produzir efeitos salutares, despertando a sensibilidade popular.
O êxito da pena alternativa é claro ao analisarmos a reincidência no estado de São Paulo, no sistema penitenciário é de 47% nas penas alternativas
restringe-se a 2%. O Estado de São Paulo gasta cerca de R$ 775,00 ao mês para manter um preso em uma penitenciária, enquanto um condenado à prestação
de serviços à comunidade custa em média R$ 26,00. Isso sem computar o valor do trabalho que realiza em órgãos públicos e entidades filantrópicas.
Segundo a avaliação de especialistas na área, 20% a 25% da atual população carcerária poderia cumprir pena em liberdade, prestando serviços à
comunidade. Apenas 35% dos atuais presos deveriam estar em presídios de alta segurança. O restante poderia estar em prisões de menor segurança ou em
unidades de regime aberto ou semi-aberto.
O doutrinador Damásio de Jesus entende como penas alternativas: prestação pecuniária; perda de bens e valores pertencentes ao condenado em favor do
Fundo Penitenciário Nacional; prestação de serviço à comunidade ou a entidade pública; proibição de exercício de cargo, função ou atividade pública,
bem como de mandato eletivo; proibição de exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação oficial, de licença ou autorização do
Poder Público; suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo; proibição de freqüentar determinados lugares; limitação de fim de semana;
multa e prestação inominada.
Segundo o promotor de justiça da Bahia Sr. Geder Luiz Rocha Gomes, “os instrumentos que nós temos para a contenção da criminalidade são: família,
escola, emprego, toda a parte ética e moral do indivíduo. O fortalecimento de seus valores sociais, para que ele os cultive e não venha a agir contra
eles. No momento em que essas barreiras falham, sobra para o sistema penal a solução de um problema que não é dele. Ele não consegue corresponder, de
forma satisfatória, sequer aos problemas que são dele, sistema penal, quiçá panacéia para cura de todos esses males”.
É preciso lembrar que antes de apontar o que ser feito no sistema carcerário, é preciso que o Estado se preocupe na formação educacional e social das
crianças e jovens.
CONCLUSÃO
Ao término deste trabalho, concluimos que a a sociedade é omissa e não participa das discussões atinentes ao sistema penitenciário. O Estado que
sonegou direitos elementares ao preso, sonega a estes os mesmos direito no interior dos estabelecimentos. Dessa forma, após anos no cárcere,
aquele que cumpriu sua obrigação legal é posto na rua sem instrução, sem capacitação, com idade avançada e o que é pior: com o atestado de preso. O
resultado dessa combinação de omissões e ações irresponsáveis é a reincidência expressa em novos crimes. A LEP também disciplina a atuação das
ouvidorias, corregedorias e conselhos disciplinares nos estabelecimentos penais. Em muitas instituições, esses órgãos inexistem e em outras atuam de
forma precária, o que contribui, até certo ponto, para a eclosão de motins e rebeliões de toda sorte. O direito fundamental do preso ao devido processo
legal, quando da prática de infração disciplinar, é ampla e rotineiramente violado.
Somente a reintegração do preso à sociedade, também chamada de ressocialização, de forma efetiva, é capaz de reduzir os índices de reincidência penal.
BIBLIOGRAFIA
BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisões. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
DAMASIO, de Jesus. Direito penal. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
FOUCOULT, Michel. Vigiar e punir. 31 ed. Petrópoles: Vozes, 2006.
GOMES, Luiz Flávio. Penas e medidas alternativas à prisão. 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
MARTINS, Jorge H. Sschaefer. Penas alternativas. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2001.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal, 16 ed. São Paulo: Atlas, 2000.
Relatório Final da Comissão parlamentar de inquérito do Sistema Carcerário.
* Alexandre Schappo e Suzana Moraes, discentes do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
Nota de rodapé:
[1] ANTOLISEI, Manual de derecho penal, trad. Juan Del Rosal e Angel Tório, Buenos Aires, UTEHA, 1960, p.531.