Direito Penal

Escola superior de Delinquência

Escola superior de Delinquência

 

 

Lélio Braga Calhau*

 

 

É uma vergonha o sistema penitenciário brasileiro. Quais são as condições às quais os presos estão submetidos hoje, instalados em penitenciárias e de forma alvitante espalhados pelas cadeias do país ? As cadeias de hoje lembram muito as masmorras da Idade Média. Onde estão a tecnologia, o progresso e as conquistas sociais ?

 

As prisões hoje não servem para o que dizem servir, neutralizam a formação ou o desenvolvimento de valores, estigmatizam o ser humano, funcionam como uma máquina de reprodução da carreira no crime, introduz na personalidade a prisionalização da nefasta cultura carcerária, legitima o desrespeito aos direitos humanos, dentre outros fatores.

 

A Lei de Execuções Penais (LEP) 7.210/84, em seu artigo 3. diz ” Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei “. É fácil também comprovar que o preso não tem direito, é espancado, humilhado, violentado, tudo agravado pelo péssimo ambiente prisional, pela falta de atividades, como o trabalho e a super lotação carcerária. Cumprida a pena, vem, talvez, a pior parte, a rejeição da comunidade com o egresso. As fugas das cadeias e penitenciárias eclodem pelo país afora.

 

No Brasil, os distritos das capitais e as cadeias em cidades do interior revelam excesso da população carcerária. A maioria das instituições abriga o dobro da capacidade permitida. As cadeias públicas são uma afronta à dignidade do ser humano. Mas o que podemos fazer ? Cumprir a Lei é um bom começo.

 

É fácil jogar a culpa no Estado e na sociedade, mas não nos esqueçamos que somos nós mesmos que escolhemos nossos representantes. Onde estão eles ? Acabou a eleição e todos desapareceram. Mas para votar a reeleição, o país quase parou, como se o assunto fosse uma prioridade para o povo. E a votação do Código Nacional de Trânsito ? Morrem 50 mil por ano devido aos acidentes de trânsito. Mas a reeleição teve prioridade.

 

E a questão penitenciária? Essa pode esperar. Não dá voto. Construir uma penitenciária também não dá voto. Enquanto isso os presos são amontoados como animais, o Estado incompetente revela a falta de verbas, mas os impostos são cobrados impiedosamente e volta e meia vemos escândalos na utilização dos recursos. Exige-se uma mudança de postura da sociedade e do Estado. Essa mudança vai da hora do voto à cobrança dos resultados, fiscalização maior das verbas, investimentos maiores na educação, a fim de preparar melhor o povo, melhores condições de saúde, assistência social e moradia, além da mudança de atitude da comunidade. É preciso que essa seja conscientizada do papel que lhe cabe de assistir àquele que, tendo infringido a lei penal, está resgatando o débito criado com a prática do crime. O preso deve ser reeducado, não aniquilado.

 

O preso não tem só deveres, tem direitos também, que devem ser cumpridos devidamente na forma da Lei. A Lei de Execuções Penais trata da criação dos Conselhos de Comunidade, que têm objetivo definidos como visitar, pelo menos mensalmente, os estabelecimentos penais existentes na comarca, entrevistar presos, apresentar relatórios e diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência ao preso. Temos certeza que muitos municípios do país, sequer montaram os seus Conselhos ou se os têm, não fazem nada, servindo apenas como enfeite. Mais uma vez, vergonhosamente, a própria comunidade não quer se preocupar com seus presos. Júlio Fabbrini Mirabette, in EXECUÇÃO PENAL, Editora Atlas, 1.996, Página 205, lembra bem o ensinamento de Renê Ariel Dotti: “A abertura do cárcere para a sociedade através do Conselho da Comunidade, instituído como órgão da execução para colaborar com o juiz e a Administração, visa a neutralizar os efeitos danosos da marginalização.

 

É louvável a escolha do tema “A Fraternidade e os Encarcerados” da Campanha da Fraternidade da Igreja Católica para 1.997. A temática do sistema carcerário no Brasil merece reflexão e mudanças urgentes. Esse exemplo deveria ser seguido por outros grupos sociais. É uma boa chance de refletirmos sobre o iníquo sistema carcerário do Brasil. Hoje, não reeducamos os presos, nós os tornamos mais marginais ainda. Infelizmente, o Direito Penal moderno não consegue resolver o problema com resultados satisfatórios.

 

Hoje, o preso reincidente e o primário são colocados juntos nas cadeias, os marginais de periculosidade diversas são misturados, aumentando a violência entre os mesmos e aumentando a revolta, dificultando ou impossibilitando a recuperação do indivíduo, tamanhas as sevícias, violências e horrores que o preso tem de suportar na prisão. Ficando poucos dias ou muito tempo, o indivíduo de pouca periculosidade nunca mais será o mesmo. A prisão tornou-se mais uma vez uma Escola. Infelizmente, a Escola Superior de Delinqüência Brasil.

 

 

* Criminólogo. Professor de Direito Penal da UNIVALE – Universidade do Vale do Rio Doce. Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Pós-Graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha). Mestre em Direito do Estado e Cidadania pela Universidade Gama Filho (RJ).

 

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Como citar e referenciar este artigo:
CALHAU, Lélio Braga. Escola superior de Delinquência. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/escola-superior-de-delinquencia/ Acesso em: 11 mai. 2025