Direito Penal

Criminalidade, insegurança e o papel da União

Criminalidade, insegurança e o papel da União

 

 

Lélio Braga Calhau*

 

 

A criminalidade urbana tem sido um problema já incorporado no cotidiano dos habitantes das grandes cidades brasileiras. Alguns fingem não se importar, outros transformam seus hábitos, há os que se trancam em suas residências e o governo se esforça em convencer a população que os índices de violência não são tão elevados, como apresentados pela mídia.

 

O Estado afirma, como regra geral, que vivemos uma insegurança subjetiva (ou seja, a sensação de insegurança não é real e existe apenas no íntimo das pessoas), causada mais pelo bombardeamento de notícias de crimes violentos todos os dias na imprensa, do que pela probabilidade no caso concreto de alguém ser vítima de um crime em sua cidade. O discurso da insegurança subjetiva não tem vez quando o Poder Público não apresenta de forma segura os índices reais da criminalidade. Há verdade na diferenciação dos dois conceitos. O problema é que existe uma desconfiança que na situação atual os dois índices estejam muito próximos, o que não assustaria quem lida diariamente com o crime nas grandes cidades.

 

Não podemos descartar que existe diferença entre o sentimento de insegurança que cada um tem e a probabilidade real de ser vítima em caso de um crime. O que lamentavelmente o Estado também não faz é comprovar que esses índices estão distantes. Ao compararmos os índices oficiais de criminalidade no Brasil e as poucas pesquisas de vitimização já realizadas, notamos que há uma discrepância exagerada no índice de criminalidade noticiado pelo Poder Público e o vivido no dia-a-dia pela população. Ensina o criminólogo espanhol Antonio García-Pablos de Molina (RT, 2002, p.99) que das pesquisas de vitimização podem se extrair alguns dados relevantes sobre o perfil e as tendências da criminalidade do nosso tempo, que rompem com convicções sociais muito arraigadas.

 

Outro problema, que vem sendo pouco estudado é o avanço das chamadas cifras negras para os crimes médios e violentos em Minas Gerais. Segundo a Criminologia, a cifra negra é o conjunto de crimes que não chegam ao conhecimento oficial do Estado. Geralmente, esse grupo é formado pelos crimes pequenos (furtos, ameaças, lesões corporais simples e culposas etc). A pesquisa de vitimização realizada pelo Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (CRISP), em Belo Horizonte no ano de 2002, em cerca de 4.000 domicílios da capital, obteve a resposta que 9,2% da população foi vítima de roubo (2,6% mais de uma vez), e que destes, 73% não acionaram a Polícia.

 

Isso é bastante grave, pois, há uma certa expectativa no meio criminológico que essas cifras negras existam em números elevados somente nos pequenos delitos. Isso é encontrado em diversos países e a sua ocorrência por si só no Brasil ou em Minas Gerais não é caso de alarme. Porém, a partir do momento que a própria sociedade não aciona o Estado nos crimes médios e violentos, como o roubo, há um alerta implícito de que alguma coisa vai muito mal. O Poder Público Estadual vem demonstrado estar preocupado com a situação, que tende a ser equacionada de forma mais efetiva apenas em médio prazo.

 

Não há fórmula mágica para reduzir a violência em curto prazo. Em geral, essas atitudes que apresentam resultados rápidos são “ações cosméticas”, que atacam mais o resultado do que as verdadeiras causas da violência. O fato de a União não repassar para Minas Gerais os valores já prometidos do Fundo Nacional de Segurança Pública e do Fundo Penitenciário coloca em risco toda o trabalho que vem sendo planejado e executado pelos três poderes estaduais. Esperamos maior atenção da União com o povo mineiro quando lidamos com a Política Criminal, pois o fracasso das diversas políticas sociais federais contribuiu de forma substancial para o crescimento da criminalidade em nosso Estado, devendo a União participar ativamente dos recursos necessários para que os índices de criminalidade em Minas Gerais retornem aos níveis toleráveis da década de oitenta.

 

Nesse sentido, é sempre interessante relembrar a lição de Mezger de que uma boa política social ainda é a melhor política criminal para um país.   

 

 

* Criminólogo. Professor de Direito Penal da UNIVALE – Universidade do Vale do Rio Doce. Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Pós-Graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha). Mestre em Direito do Estado e Cidadania pela Universidade Gama Filho (RJ).

 

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Como citar e referenciar este artigo:
CALHAU, Lélio Braga. Criminalidade, insegurança e o papel da União. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/criminalidade-inseguranca-e-o-papel-da-uniao-2/ Acesso em: 20 mai. 2025