Sem reforma tributária
Ives Gandra da Silva Martins*
O Presidente Lula, em um de seus primeiros pronunciamentos deste ano, declarou que não pretende mais enviar qualquer projeto de reforma constitucional ao Congresso Nacional até o final de seu governo.
O argumento é de que não possui, no Senado Federal, uma base estável que lhe permita aprová-lo.
À evidência, aqueles que esperavam alteração constitucional no sistema tributário, sentem-se frustrados com a declaração do presidente.
Pessoalmente, estou convencido de que, no momento, qualquer projeto de reforma constitucional tributária seria ruim para o contribuinte, pois abriria fantástico flanco para que Estados e municípios obtivessem maior receita, sobre não querer, o governo federal, perder os 60% do bolo fiscal, que já tem.
Quanto mais eu ouço que, sem reforma tributária constitucional, o país não evolui, mais me lembro das audiências públicas, na Câmara dos Deputados, no curso destes últimos anos. Não senti nos parlamentares qualquer sensibilidade em relação à situação do contribuinte, mas apenas campo aberto para as entidades federativas aumentarem seu arsenal impositivo, na ausência de qualquer esforço para reduzir as despesas administrativas.
Parece-me que o Presidente Lula rendeu-se à realidade. Se abrir uma discussão ampla para uma reforma nesta área, poderá perder receita para os Estados e municípios, como ocorreu na Constituinte (a partilha de IPI e I.Renda foi de 33% para 47%), obrigando-o a um esforço hercúleo para reequilibrar receitas, no caso de efetiva perda.
Por outro lado, todas as emendas constitucionais, de 1988 até o presente, sobre matéria tributária foram para piorar o sistema, que vive, hoje, uma desfiguração conceitual.
Creio que a situação do contribuinte, qualquer que ele seja, irá piorar, porque, certamente, como Estados e Municípios querem ganhar mais e a União não quer perder, quem perderá será o pagador de tributos.
É de se acrescentar que o governo poderia fazer, em nível de legislação infraconstitucional, alterações para simplificar a vida do contribuinte. Nada impediria que o PIS, a Cofins e as CIDEs, se tornassem uma única incidência, apenas determinando a legislação o percentual de destinação de sua receita para cada finalidade atual. Poder-se-ia dizer que as CIDEs, embora previstas no art. 149 da C.F., não são contribuições sociais, mas interventivas. Ora, pela destinação de seu percentual poderiam, nitidamente, manter tal característica.
Uma legislação complementar mais abrangente facilitaria o equacionamento das profundas divergências entre Estados em torno do ICMS, não havendo, pois, necessidade de reforma constitucional, o mesmo se podendo dizer em relação à guerra fiscal dos Municípios ao redor do ISS.
Everardo Maciel realizou uma autêntica revolução tributária, com o alargamento da tributação do imposto sobre a renda nas empresas sujeitas ao lucro presumido – embora com a alteração da conceituação pacificada de renda, visto que receita pode não se transformar em renda, que é a diferença entre receita e despesa. Como é o contribuinte, que opta pelo sistema que melhor lhe convier, passou a ser legal.
Há, pois, múltiplas formas de melhorar o sistema tributário, em nível infraconstitucional, razão pela qual julgo prudente a declaração presidencial de que não pretende qualquer reforma constitucional sobre o sistema tributário.
* Professor Emérito das Universidade Mackenzie e UNIFMU e da Escola de Comando e Estado maior do Exército. Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, da Academia Paulista de Letras e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: http://www.gandramartins.adv.br
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