Direito Tributário

Certidão negativa de tributos. Aspectos práticos

Certidão negativa de tributos. Aspectos práticos

 

 

Kiyoshi Harada*

 

 

Dispõe o art. 205 do CTN que a prova de quitação de determinado tributo, quando exigível, seja feita por certidão negativa à vista do requerimento do interessado. O prazo para expedição dessa certidão é de dez dias, conforme preceituado no parágrafo único do citado dispositivo legal.

 

     As três esferas políticas adotaram a certidão negativa como única forma de comprovar a quitação de tributos, nas mais diversas situações em que se faz necessária a prova de inexistência de débitos tributários.

 

Dessa forma, a certidão negativa de tributos passou a ser uma condição indispensável, em âmbito nacional , para a prática de inúmeros atos como concessão de concordata, extinção de obrigações do falido, desembaraço aduaneiro, participação em certame licitatório, transferência de domicílio para o exterior etc.

 

     A certidão positiva em que constem créditos tributários vincendos ou com exigibilidade suspensa , ou, ainda, sob execução mas, com o juízo garantido pela penhora, surte o mesmo efeito de uma certidão negativa , nos termos do art. 206 do CTN.

 

     A ressalva contida no art. 207 do CTN, no sentido de dispensar a certidão negativa para execução de ato indispensável para evitar a caducidade do direito , na prática, é uma letra morta , pois, ninguém se dispõe a assumir a responsabilidade solidária por eventual tributo devido.

 

     Daí a necessidade de impetração do mandado de segurança para obtenção da liminar, sem a qual a ação mandamental restará prejudicada.

 

     Atualmente, a existência de débito sob o regime de parcelamento não mais impede a expedição de certidão, pois, a Lei Complementar nº 104/01 veio incluir o parcelamento e a moratória entre as hipóteses de suspensão de exigibilidade do crédito tributário, previstas no art. 151 do CTN.

 

     Importante lembrar, ainda, que a consumação dos prazos decadencial e prescricional remove o empecilho à expedição da certidão negativa, pois em ambas as hipóteses opera-se a extinção do crédito tributário , à luz do art. 156, V do CTN. Eventual recusa da autoridade administrativa tributária, nessas duas hipóteses, ensejará o ajuizamento do mandado de segurança pelo contribuinte.

 

     Entretanto, na prática diária, o advogado pode se defrontar com situações não previstas na lei, como por exemplo, a greve dos servidores da Fazenda. Já tivemos caso em que foi preciso impetrar mandado de segurança para obtenção de certidão negativa no período de greve, quer porque o princípio da continuidade do serviço público obriga o órgão fazendário a manter um serviço mínimo de atendimento de questões urgentes, quer porque o contribuinte não pode sofrer uma lesão irreparável por conta da greve. O difícil foi fazer cumprir a liminar concedida.

 

     Uma outra situação de difícil solução é a hipótese de crédito tributário definitivamente confirmado na esfera administrativa, porém, não inscrito na dívida ativa, e se inscrito na dívida ativa, ainda, sem ajuizamento da execução fiscal.

 

     Nesses casos, não há como oferecer bens à penhora para garantir o juízo de execução e obter a certidão. Se o tributo for indevido, a juízo do contribuinte, também, não seria o caso de requerer o parcelamento do débito.

 

     Como proceder, se a omissão da Fazenda de ajuizar a execução perdurar por longo tempo? Seria o caso de impetrar o mandamus por omissão?

 

     Aqui é preciso criatividade do advogado. É necessária uma construção teórico-doutrinária. Se o crédito tributário sob execução não impede a expedição de certidão, desde que assegurado o juízo da execução, segue-se que o crédito tributário não inscrito, ou inscrito, porém, não executado, também, não deve obstar a expedição de certidão, desde que oferecida garantia suficiente para sua liqüidação, se for o caso.

 

     Assim, nessa hipótese em que antecede o ajuizamento da execução fiscal, cabível é a medida cautelar de prestação de caução real ou fidejussória, com pedido de liminar, visando a obtenção de certidão positiva com efeito de negativa, com fundamento no art. 804 do CPC. Deferida a liminar, caberá ao interessado propor a ação principal no prazo de 30 dias (art. 806 da CPC). E essa ação, só pode ser a declaratória. Lamentavelmente, a lei não prevê, nem a jurisprudência admite medida cautelar de natureza autônoma , obrigando o interessado duplicar a demanda, desnecessariamente.

 

     Outra alternativa, seria o ajuizamento de uma ação ordinária, com pedido de tutela antecipatória, para efeito de expedição de certidão, com fundamento no art. 461 do CPC. Só que, neste tipo de ação, indispensável a abordagem do mérito , ao passo que, na cautelar só se discute o direito à certidão mediante caução , sem indagar quanto a procedência ou improcedência do crédito tributário.

 

     Efetivada a caução, não há como impedir que o juiz exerça o seu poder-dever de cautela, que é inerente à função jurisdicional, pois a Carta Política prescreve em seu art. 5º, XXXV que ‘a lei não poderá excluir de apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito’.

 

     Por isso, tivemos a oportunidade de escrever: ‘Segue-se que, se o poder de cautela geral integra a jurisdição, qualquer lei infraconstitucional que limita ou condiciona o exercício desse poder pelo juiz há de ser examinada em consonância com o princípio da independência e harmonia dos Poderes, tendo em vista que a atividade jurisdicional é monopólio do Poder Judiciário’. (Cf. nosso Da liminar em matéria tributária , 2ª edição. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003, p. 18).

 

     Em perfeita harmonia com todo o exposto, o conhecido tributarista Eduardo Marcial Ferreira Jardim, em excelente monografia, insurgindo-se contra a exigência de depósito em dinheiro, previsto no art. 38 da Lei nº 6830/80, para discussão judicial da dívida ativa, assim se manifesta: ‘Verativamente, os artigos 9º, 11 e 38 da Lei nº 6.830/80, retrilhados pelo artigo 655 do Código de Processo Civil, possibilitam ao executado uma gama de direitos mais amplos que ao demandante, conspirando, minimamente, contra o postulado da igualdade. Por conseguinte, se os referidos comandos permitem ao executado assegurar o juízo mediante penhora de bens em geral, com a finalidade de insurgir-se contra débito inscrito na dívida ativa, a fortiori não se pode negar ao demandante a mesma possibilidade, sob pena de profanar o primado da igualdade que, sobranceiro, haverá de repugnar qualquer coartação concernente ao exercício de direitos e garantias’ . E finaliza: ‘Ante o exposto, impende deduzir que o procedimento cautelar nominado consubstanciado na caução configura-se legítimo para garantir o juízo em ação de matiz tributário…’ ( Caução na Seara Tributária: Bens Móveis, Imóveis, TDAs e Apólices do Tesouro. Revista Dialética do Direito nº 47, p. 18 e 30).

 

     Positivamente, na fase administrativa de cobrança de crédito tributário, que se situa entre o trânsito em julgado da decisão administrativa e o ajuizamento da execução fiscal, é perfeitamente possível a obtenção de certidão positiva com efeito de negativa, mediante caução idônea por via de medida cautelar, seguida de ação principal, ou, por meio de ação ordinária, com pedido de tutela antecipatória.

 

SP, 07.12.04..

 

 

* Professor de Direito Administrativo, Financeiro e Tributário. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

kiyoshi@haradaadvogados.com.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
HARADA, Kiyoshi. Certidão negativa de tributos. Aspectos práticos. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-tributario/certidao-negativa-de-tributos-aspectos-praticos/ Acesso em: 17 mar. 2025