A inadequação da legislação processual civil para a solução de vários casos do dia-a-dia faz-me lembrar duas coisas cômicas: uma roda quadrada e o leito de Procusto.
Imagine-se o esforço que representa empurrar, fazendo rodar, todos os dias uma roda quadrada.
Quanto ao leito de Procusto o DICIONÁRIO AURÉLIO ELETRÔNICO explica o que seja:
1. Leito de ferro onde, segundo a mitologia grega, este famigerado salteador estendia aqueles que capturava, cortando-lhes os pés quando o ultrapassavam e estirando-os quando não lhe alcançavam o tamanho.
2. P. ext. Situação independente da vontade do indivíduo em que este peca e sofre as conseqüências, quer por excesso, quer for falta.
Como se sabe, nossa estrutura jurídica vincula-se “oficialmente” à civil law, ou seja, tem como referencial mais importante a Lei.
Outro sistema importante sabidamente é a common law, em que a Jurisprudência é a fonte mais importante do Direito.
Pois bem, a comunidade jurídica brasileira necessita de que o Congresso Nacional vote rapidamente vários projetos de leis modernizadoras do CPC.
No entanto, o Legislativo Federal não parece ter entendido a urgência da situação, o que faz com que os operadores do Direito tenham todos os dias que empurrar a tal roda quadrada e cortar pés de gigantes ou esticar pernas de anões no leito de Procusto.
Como o Judiciário pode cumprir seu trabalho de resolver conflitos entre as partes através de leis antiqüadas, verdadeiras rodas quadradas?
CLÓVIS dá a solução, indiretamente.
Na época de BEVILACQUA a realidade jurídica do país era muito diferente quanto ao número de processos, mas era parecida pela falta de interesse do Legislativo em modernizar as leis.
Por isso, num momento de sublime rebeldia, o grande jurista propugnou por esta solução drástica:
Todavia, se o legislador for imprevidente em desenvolver a legislação nacional de harmonia com as transformações econômicas, intelectuais e morais operadas no país, casos excepcionais haverá em que, apesar da declaração peremptória da ineficácia ab-rogatória do costume, este prevaleça contra legem, porque a desídia ou a incapacidade do poder legislativo determinou um regresso parcial da sociedade à época, em que o costume exercia, em sua plenitude, a função de revelar o direito, e porque as forças vivas da nação se divorciam, nesse caso, das normas estabelecidas nas leis escritas. (Teoria Geral do Direito Civil, Red Livros, 2001, p. 76)
Atualmente, em termos de Processo Civil, na certa, não aplicaremos regras costumeiras aos processos (pois pouca coisa há nesse sentido), mas temos a Jurisprudência como remédio. Não havendo nenhum precedente como referência, os juízes mais arrojados criarão regras para solucionar os casos ocorrentes.
A regra mais importante que deve sempre ser lembrada é o da instrumentalidade do processo.
É necessário que se priorizem as decisões de mérito, no sentido de que quem tem razão conforme o Direito material seja vencedor na demanda.
Os juízes muitas vezes têm de fazer uma opção entre a adoção estrita das regras processuais ou a criação de caminhos novos para que a Justiça se faça… e rapidamente.
Dessa forma, enquanto o Legislador se omite, deixando de elaborar leis adequadas e permanecendo em vigor umas tantas peças de museu de boa ou de má qualidade, vão os juízes mais modernos resolvendo os problemas cotidianos dos processos através de uma mini mas satisfatória common law artesanal, que podemos apelidar de civilmmon law.
O importante é que os processos se resolvam com justiça, com civil law, common law ou até a cimmon law.
* Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).