Direito do Trabalho

O mercado de trabalho da mulher e as ações afirmativas atribuindo-lhes tratamento especial

O mercado de trabalho da mulher e as ações afirmativas atribuindo-lhes tratamento especial

 

 

Mirella Karen de Carvalho Bifano Muniz[1]

 

Resumo: O presente artigo pretende analisar o atual mercado de trabalho da mulher, bem como a discussão sobre a existência de ações afirmativas visando sua proteção,  e se esse tipo de ação poderia gerar alguma forma de discriminação contra seu trabalho ou sua contratação.

 

Palavras-chave: trabalho da mulher – mercado de trabalho – ações afirmativas – discriminação.

 

Súmario: 1. Introdução; 2. O mercado de trabalho feminino; 3. Negociação Coletiva; 4.  Ações afirmativas atribuindo tratamento especial às mulheres; 5. Acesso ao mercado de trabalho da mulher; 6. Conclusão; 7. Referências Bibliográficas.

 

 

1. Introdução

 

As desigualdades vividas no cotidiano da sociedade, no que se refere às relações de gênero, não se definiram a partir do econômico, mas, especialmente a partir do cultural e do social, formando daí as “representações sociais” sobre as funções da mulher e do homem dentro dos variados espaços de convivência, ou seja: na família, na escola, na igreja, na prática desportiva, nos movimentos sociais, enfim, na vida em sociedade.

 

Nos últimos cinqüenta anos um dos fatos mais marcantes ocorridos na sociedade brasileira foi a inserção crescente das mulheres na força de trabalho. Este contínuo crescimento da participação feminina é explicado por uma combinação de fatores econômicos e culturais. Primeiro, o avanço da industrialização transformou a estrutura produtiva, a continuidade do processo de urbanização, proporcionando um aumento das possibilidades das mulheres encontrarem postos de trabalho na sociedade. Segundo, a rebelião feminina do final dos anos 60, nos Estados Unidos e Europa, chegou como uma onda nas nossas terras, em plenos anos de chumbo; apesar disso, produziu o ressurgimento do movimento feminista nacional fazendo crescer a visibilidade política das mulheres na sociedade brasileira.

 

Não há dúvida de que as mulheres representam hoje no Brasil uma parcela significativa do mercado de trabalho.

 

Segundo Elisiana Probst[2], o mundo anda apostando em valores femininos, como a capacidade de trabalho em equipe contra o antigo individualismo, a persuasão em oposição ao autoritarismo, a cooperação no lugar da competição.

 

As mulheres ocupam postos nos tribunais superiores, nos ministérios, no topo de grandes empresas, em organizações de pesquisa de tecnologia de ponta. Pilotam jatos, comandam tropas, perfuram poços de petróleo.

 

É importante, no entanto, ressaltarmos que a inserção da mulher no mundo do trabalho vem sendo acompanhada, ao longo desses anos, por elevado grau de discriminação, não só no que tange à qualidade das ocupações que têm sido criadas tanto no setor formal como no informal do mercado de trabalho, mas principalmente no que se refere à desigualdade salarial entre homens e mulheres.

 

 

2. O mercado de trabalho feminino

 

A história da mulher no mercado de trabalho, no Brasil, está sendo escrita com base, fundamentalmente, em dois quesitos: a queda da taxa de fecundidade e o aumento no nível de instrução da população feminina. Estes fatores vêm acompanhando, passo a passo, a crescente inserção da mulher no mercado e a elevação de sua renda. A analista do Departamento de Rendimento do IBGE, Vandeli Guerra, defende que a velocidade com que isto se dá não é o mais relevante. O que estamos constatando é uma quebra de tabus em segmentos que não empregavam mulheres. Nas Forças Armadas, por exemplo, elas estão ingressando pelo oficialato.

 

Para consolidar sua posição no mercado, a mulher tem cada vez mais adiado projetos pessoais, como a maternidade. A redução no número de filhos é um dos fatores que tem contribuído para facilitar a presença da mão-de-obra feminina, embora isto não seja visto pelos técnicos do IBGE como uma das causas da maior participação da mulher no mercado.

           

Na primeira metade desta década, a incorporação de mulheres à força de trabalho das áreas metropolitanas cresceu intensamente e em ritmo superior ao observado para o contingente masculino. O avanço efetuado pelas brasileiras a passos firmes em direção ao mundo do trabalho fica expresso, principalmente, na elevação das taxas de participação femininas do Distrito Federal e das Regiões Metropolitanas de Belo Horizonte, São Paulo e Salvador, onde passaram de 55,2%, 48,1%, 53,1% e 52,0% de suas respectivas populações femininas com idade igual ou superior a 10 anos, em 1999, para os atuais 59,4%, 53,3%, 54,3% e 55,4%, respectivamente[3].

           

Entre 1999 e 2006, ocorreu importante e generalizada queda do desemprego, que, sem dúvida, revela melhora nas condições de inserção ocupacional das mulheres.

           

A busca feminina por uma inserção produtiva, porém, continuou sendo marcada pela desigualdade de oportunidades ocupacionais relativamente à enfrentada pela população masculina. A taxa de desemprego tem atingido mais fortemente às mulheres.

           

Em relação à remuneração percebida, é comum afirmar-se que as trabalhadoras recebem menos do que os homens porque se inserem profissionalmente em ocupações de menor qualificação, produtividade e prestígio social. Estas reflexões são verdadeiras, porém permanecerão incompletas se a elas não se agregar a evidência de que os chamados guetos ocupacionais femininos resultam de uma construção cultural, que designa o lugar das mulheres no mundo produtivo.

 

A inserção setorial das mulheres remete à dinâmica ocupacional do segmento dos serviços, no qual se encontram os subsetores de saúde e educação, além dos serviços pessoais, como cabeleireiras, manicures, mas o contingente feminino mais importante está concentrado no serviço doméstico remunerado, primeira ocupação das mulheres brasileiras. Embora fundamentais para a organização social e, portanto, garantidores dos processos de transformação produtiva e de circulação da riqueza, os segmentos que mais absorvem força de trabalho feminina são os mais desvalorizados no mercado de trabalho e os que tendem a propiciar remunerações mínimas reguladas pelo poder estatal.

 

Quando se busca retratar as relações existentes entre o padrão de remuneração das mulheres e o salário mínimo nacional, o emprego doméstico se destaca, uma vez que, as remunerações do segmento, em geral, beiram o mínimo constitucional.

 

O exame das formas de inserção no mercado de trabalho demonstra que a maior parte das mulheres, assim como o conjunto dos ocupados, tem contratação assalariada e de acordo com padrões previstos na legislação brasileira.

 

Entre as mulheres ocupadas que receberam menos de um salário mínimo em 2006, a maioria se concentra em inserções como diarista no emprego doméstico, como trabalhadora por conta própria e assalariadas contratadas à margem da modalidade padrão[4].

 

Uma conclusão corrente é a de que o cidadão ou a cidadã com maior nível de escolaridade tem mais oportunidade de incluir-se no mercado de trabalho. Além da inclusão no mercado, constata-se uma significativa melhora entre as diferenças salariais.

 

As mulheres concentram-se em ocupações fundamentais para a organização social que, no entanto, são pouco valorizadas e têm seu padrão de remuneração regulado pelo poder estatal. Tal situação fez com que as mulheres fossem relativamente mais beneficiadas com a política de valorização do salário mínimo, o que, por sua vez, explica a melhor sustentação das remunerações femininas diante do ajuste de renda empreendido no âmbito do mercado de trabalho nos últimos anos.

 

Entre as mulheres que recebem as menores remunerações, destaca-se a necessidade de sobrevivência e a escassez de alternativas, denunciadas pelo perfil etário mais elevado, pelas grandes responsabilidades familiares enfrentadas pelas chefes e cônjuges que contribuem com o orçamento doméstico e pelo estigma da baixa escolarização.

 

É clara a importância da valorização do salário mínimo na promoção de melhores condições de vida das brasileiras e, conseqüentemente, para uma sociedade mais justa, almejada por todos os trabalhadores.

 

 

3. Negociação Coletiva

 

Um dos espaços mais importantes para a conquista de garantias ao trabalho da mulher, sem discriminação de gênero, é a negociação coletiva de trabalho. É preciso aumentar a negociação de garantias relativas à equidade de gênero.

 

De acordo com Ana Francisca Sanden[5], é preciso investir na negociação coletiva para assegurar melhores condições de trabalho para todos e criar mecanismos para impedir a discriminação. Para isso, é de suma importância que as mulheres conheçam seus direitos, estejam presentes e atuantes nas organizações sindicais e se preparem para participar na negociação coletiva, desde os locais de trabalho até as mesas de negociação, não somente entre trabalhadores e empresários, mas também nos espaços institucionais para discussão das políticas públicas.

 

A negociação coletiva pode ser um meio de agir diretamente para melhoria das condições de trabalho e remuneração das mulheres. Pesquisa realizada pelo DIEESE no período de 1993 a 1995 identificou seis grupos de cláusulas negociadas, que teriam relação direta ou indireta com a questão da equidade de gênero: 1- garantias relativas à gestação; 2- à maternidade/paternidade; 3- às condições de trabalho; 4-ao exercício do trabalho; 5- à saúde; 6- à eqüidade de gênero. Constatou-se ainda que as condições de trabalho são tratadas de forma pontual e foram negociadas por poucas categorias. As cláusulas relativas à eqüidade de gênero repetem os textos legais e não definem formas de controle ou punição para as ações discriminatórias. Parece que algumas questões atinentes a formas positivas de ação para reversão das desigualdades já constam de pautas de reivindicação, embora ainda não tenham sido objeto de acordo.

 

É preciso que a negociação coletiva cubra a questão da igualdade de gênero prioritariamente (o que ainda não ocorre no nosso país), incluindo-a entre os temas da pauta de discussão. A negociação coletiva pode contribuir significativamente, principalmente quanto à implementação de ações afirmativas, definindo formas de controle e punição para as ações discriminatórias ao trabalho feminino. A negociação coletiva é uma forma de ação direta para a melhoria das condições de trabalho e remuneração da mulher. A negociação coletiva articulada favoreceria o tratamento da questão de gênero, permitindo explorar as várias possibilidades e os interesses em jogo, colocando-se em relação com as estratégias empresariais de concorrência e contemplando as peculiaridades de cada empresa e setor.

 

 

4. Ações afirmativas atribuindo tratamento especial às mulheres

 

A regra do inciso I do art. 5º da Carta Constitucional do Brasil de 1988 consagra com uma clareza solar o princípio da igualdade – reproduzido em praticamente todas as constituições editadas após a Revolução Francesa: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações nos termos desta Constituição”. Essa garantia encontra reforço no inciso XXX do seu art. 7º, que proíbe qualquer discriminação fundada em motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

           

Apesar de decantada a igualdade formal, o próprio texto da Lei Maior prevê normas que concedem tratamento diferenciado entre homens e mulheres. É outorgada proteção ao mercado de trabalho feminino, mediante incentivos específicos (inciso XX, art. 7º), bem como lhe é assegurada a aposentadoria com 60 anos, enquanto que, para os homens, a idade limite é de 65 (art. 202). Essas distinções não se prendem, à toda evidência, a diferenças fisiológicas, mas são decorrência de um elemento cultural, pois, em face das responsabilidades familiares, as mulheres prestam dupla jornada de trabalho. Assume a esposa a integralidade das tarefas domésticas e a mãe o cuidado com os filhos, a exigir-lhe um maior esforço, levando-a a um precoce envelhecimento.

 

A aparente incompatibilidade entre essas normas jurídicas solve-se ao se constatar que a igualdade formal – igualdade de todos perante a lei – não conflita com o princípio da igualdade material, que é o direito à equiparação através da redução das diferenças sociais. Nítida a intenção do legislador em consagrar a máxima aristotélica de que o princípio da igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida em que eles se desigualam.

 

Os fundamentos apontados pela doutrina para justificar a intervenção do Estado na defesa da mulher trabalhadora são:

 

a) Fundamento fisiológico: a mulher não é dotada da mesma resistência física do homem e sua constituição é mais frágil, de modo a exigir do direito uma atitude diferente e mais compatível com o seu estado.

 

b) Fundamento Social: interessa à sociedade a defesa da família, daí por que o trabalho da mulher deve ser especialmente protegido, de tal modo que a maternidade e as solicitações dela decorrentes sejam devidamente conciliadas com as ocupações profissionais.

 

            Leciona o professor Álvaro Ricardo de Souza Cruz[6]:

 

As ações afirmativas podem ser entendidas como medidas públicas e privadas, coercitivas ou voluntárias, implementadas na promoção/integração de indivíduos e grupos sociais tradicionalmente discriminados em função de sua origem, raça, sexo, opção sexual, idade, religião, patogenia física, psicológica, etc.

 

Consistindo em medidas que buscam eliminar desequilíbrios entre categorias sociais, as ações afirmativas realizam-se por meio de providências em favor daquelas que se encontram em nítida posição de desvantagem. Constituem, pois, mecanismo de combate às práticas discriminatórias que, em trazendo prejuízos a determinados segmentos da sociedade, ofendem os ideais igualitários do Estado Democrático de Direito.

 

As ações afirmativas surgiram nos Estados Unidos da América, tendo sido o presidente John Kennedy o primeiro a mencioná-las em texto oficial, quando, em 1961, propôs medidas que tinham por objetivo ampliar a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho. Observando que as mais importantes empreiteiras norte-americanas contratavam um reduzido número de empregados negros, Kennedy assinou a norma executiva 10.925, donde se extraía a referência pioneira à expressão affirmative action. Esta norma instruía as empresas a adotarem a ação afirmativa para evitar as discriminações por raça, cor, religião, sexo e nacionalidade quando da seleção de sua mão-de-obra ou sobre aqueles já pertencentes a seus quadros de trabalhadores.

 

As ações afirmativas recomendadas são programas adotados tanto no setor público como no setor privado, atribuindo um tratamento especial às mulheres, temporariamente, até que haja um equilíbrio entre os sexos no mercado de trabalho, tornando-o mais homogêneo.             Sua função consiste, portanto, em promover a igualdade de oportunidades, transformando a função estática do princípio igualitário inserido na lei em uma função ativa, com a utilização de meios capazes de alterar as regras do “jogo no mercado de trabalho”.

 

As ações afirmativas já não visam ao reconhecimento da igualdade de tratamento, mas aos meios necessários para torná-la efetiva.

 

O progresso a respeito dessa temática não é significativo, mesmo porque os planos são pouco divulgados e não estão bem inseridos nos sistemas jurídicos que os consagram.

 

As ações afirmativas congregam medidas que implicam supressão das desigualdades de fato, capazes de restringir as oportunidades de formação profissional das mulheres, com reflexos nas suas condições de trabalho.

 

Para que as ações afirmativas não traduzam mera declaração enfática do princípio da igualdade, é imprescindível que haja vontade política e se implantem programas de ação positiva, que aceleram a participação de mulheres nos órgãos responsáveis pela elaboração e fiscalização das leis sobre condições de trabalho. É importante que se exerçam pressões sobre o legislativo, o qual, por sua vez, também sofre as influências dos estereótipos socioculturais que devem ser combatidos.

 

No Brasil, as ações afirmativas têm guarida no texto constitucional vigente, conforme se depreende do artigo 3º, inciso IV:

 

Art. 3º – Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

 

Entretanto, observa-se uma falta de sintonia entre o texto normativo e a realidade. As ações afirmativas, que ainda não são prioridade em favor das minorias, também não o são quando o assunto é a mulher. Neste cenário, são apenas quatro as iniciativas públicas merecedoras de destaque, segundo o professor Álvaro Ricardo de Souza Cruz[7]:

 

A primeira delas é o projeto de lei estadual 26/95 com a finalidade de instituir o “Sistema Estadual de Habilitação de Interesse Social” no Estado do Rio Grande do Sul. O inciso I de seu artigo 2º, referente a prioridades para mulheres “chefes de família” em determinados programas habitacionais, foi lamentavelmente vetado pelo então governador Antônio Britto.

 

A segunda é a Lei 9.504/97, que estabelece normas gerais para as eleições. O parágrafo 3º de seu artigo 107 dispõe que cada partido ou coligação deverá reservar um mínimo de 30% (trinta por cento) e um máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo. A imposição de quotas em matéria eleitoral constitui-se num esforço de melhorar a participação feminina nos Parlamentos em todos os níveis da Federação.

 

Ocorrida em novembro de 2000 por ato do presidente Fernando Henrique Cardoso e como terceiro exemplo, cite-se a indicação de Ellen Gracie Northfleet, primeira mulher empossada ministra do Supremo Tribunal Federal.

 

O quarto exemplo diz respeito à segunda mulher empossada ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia Antunes Rocha, durante o mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006.

 

O Estado pode impor, pela via da intervenção legislativa no setor público, a obrigação de se elaborarem e de se aplicarem programas de ação positiva no setor privado, subvencionando-os, arcando total ou parcialmente com os gastos extras que advenham da contratação ou transferência de mulheres para funções tradicionalmente ocupadas por homens, como ocorre na Suécia e na França. Esses programas versam sobre alteração das mentalidades, distribuição mais justa das responsabilidades familiares, condições de trabalho (horários flexíveis, licenças para o pai ou para a mãe) e formação profissional, entre outros.

 

A Lei n. 9.799/99, ao rever a redação do art. 373 da CLT, admite, no parágrafo único, a adoção de medidas temporárias que visem ao estabelecimento das políticas de igualdade entre homens e mulheres, em particular às que se destinam a corrigir as distorções que afetam a formação profissional, o acesso ao emprego e as condições gerais de trabalho da mulher. Ora, essas medidas temporárias nada mais são do que ações afirmativas. Trataremos dessa lei mais detalhadamente em outro tópico.

 

Ao Direito compete, sem dúvida, ampliar os horizontes das oportunidades e contribuir para conscientizar a opinião pública, favorecendo a igualdade, mas torná-la efetiva depende não só dos interessados, como também da vontade política dos países, que, de início, devem remover os obstáculos traduzidos pelas práticas sociais que impedem a concretização desse princípio. Vale ressaltar, ainda, que os tribunais não estão em condições de assegurar à vítima do tratamento desigual o exercício efetivo de seu direito. É que as sanções previstas para as transgressões não constituem um remédio satisfatório, pois sujeitam-se aos mecanismos jurídicos tradicionais (multas de valor ínfimo e compensações pecuniárias de valor insignificante), ao invés de sanções reais e apropriadas, como o direito à reintegração no emprego ou a uma compensação pecuniária equivalente, com “autêntica força dissuasiva”.

 

 

5. Acesso ao Mercado de Trabalho da mulher

 

A Lei n. 9.799/99, acrescentou à CLT o art. 373-A, visando corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho. Por meio desta norma vedou-se:

 

a) anúncio de emprego em que se faça discriminação quanto ao sexo, idade, cor ou situação financeira (inciso I, art. 373-A). Ressalva aos casos em que a atividade a ser exercida, pública e notoriamente, exigir a diferenciação;

 

b) recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho pelas mesmas razões retro (sexo, idade, cor ou situação financeira), salvo quando a natureza da atividade for pública e notoriamente incompatível (inciso II);

 

c) para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional, considerar o sexo, a idade, a cor ou a situação familiar como variável determinante (inciso III). É de se notar que o dispositivo fala em remuneração, de modo que estão compreendidos na vedação tanto o salário quanto as gorjetas, na forma do art. 457 da CLT;

 

d) exigir atestado ou exame para comprovação de esterilidade ou gravidez, seja para admissão seja para permanência no emprego (inciso IV). O inciso I do art. 2° da Lei 9.029/1995, é mais abrangente que o dispositivo da CLT, já que além de atestado e exame, fala em qualquer procedimento relativo a esterilização ou estado de gravidez. Além do mais, ao contrário da CLT, a lei em comento estabelece pena aos transgressores, que vai desde detenção de 1 ano a 2 e multa, passando por multa administrativa até proibição de obter empréstimo ou financiamento junto a instituições financeiras oficiais. Sem falar na obrigatoriedade de readmissão ou pagamento de indenização dobrada, a critério do empregado (art. 4°);

 

e) impedir o acesso, inscrição ou aprovação em concurso para ingresso em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez (inciso V). Referido dispositivo não se aplica, como se vê de sua literalidade, a concursos públicos, uma vez que  poucas empresas privadas usam concurso para a admissão de empregados;

 

f)realização de revistas íntimas em empregadas ou funcionárias, pelo próprio empregador ou prepostos (inciso VI).

 

 

6. Conclusão

 

Fazer parte de um grande contingente de trabalhadoras, com escolaridade crescente e experiência de trabalho, não garantiu, até este momento, tratamento igualitário para as mulheres no mercado de trabalho, embora essas condições venham lentamente se modificando. As mulheres ganham menos e estão desempregadas em maior proporção do que os homens. Além disso, continuam sendo majoritárias nas atividades classicamente consideradas femininas nos setores ligados às atividades sociais e esmagadoramente presentes no emprego doméstico. No que se refere às condições em que exercem seu trabalho, as mulheres são também aquelas que apresentam maior vulnerabilidade na sua inserção no mercado de trabalho, ocupando os postos mais precários em maior proporção.

 

 

7. Bibliografia:

 

BARROS, Alice Monteiro de. A mulher e o direito do trabalho.  São Paulo: LTr, 1995.

 

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2007.

 

CALIL, Léa Elisa Silingowschi. História do direito do trabalho da mulher: aspectos histórico-sociológicos do início da República ao final deste século. São Paulo: LTr, 2000.

 

LUZ, France. O trabalho da mulher no direito brasileiro. São Paulo: LTr, 1984.

 

NEGRI, Antonio. A feminização do trabalho. Folha de São Paulo (Seção: Autores). São Paulo, 1999, p. 1.3.

 

PIMENTEL, Sílvia. A Mulher e a Constituinte: uma Contribuição ao debate. 2ª Ed. São Paulo: Cortez-EDUC, 1987.

 

PROBST, Elisiana Renata. A evolução da mulher no mercado de trabalho. In: http://www.icpg.com.br/artigos/rev02-05.pdf. Acesso em 09/09/2008.

 

ROCHA, Sílvia Regina da. O trabalho da mulher à luz da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Forense, 1991.

 

SANDEN, Ana Francisca Moreira de Souza. A mulher e o mercado de trabalho no Brasil globalizado. In: http://www.universia.com.br/materia/materia.jsp?id=8458. Acesso em 09/09/2008.

 

SOUZA CRUZ, Álvaro Ricardo de. O direito à diferença: as ações afirmativas como mecanismo de inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e pessoas portadoras de deficiência, 2005

 

 

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[1] Mestranda em Direito do Trabalho na PUC/MG.

[2] PROBST, Elisiana Renata. A evolução da mulher no mercado de trabalho. In: http://www.icpg.com.br/artigos/rev02-05.pdf. Acesso em 09/09/2008.

 

[3] SÃO PAULO. Departamento Intersindical de estatísticas e estudos socioeconômicos. As mulheres e o salário mínimo nos mercados de trabalho metropolitanos. Disponível em: HTTP://www.dieese.org.br. Acesso em 20 ago. 2008.

[4] SÃO PAULO. Departamento Intersindical de estatísticas e estudos socioeconômicos. As mulheres e o salário mínimo nos mercados de trabalho metropolitanos. Disponível em: HTTP://www.dieese.org.br. Acesso em 20 ago. 2008.

[5] SANDEN, Ana Francisca Moreira de Souza. A mulher e o mercado de trabalho no Brasil globalizado. In: http://www.universia.com.br/materia/materia.jsp?id=8458. Acesso em 09/09/2008.

 

[6] SOUZA CRUZ, Álvaro Ricardo de. O direito à diferença: as ações afirmativas como mecanismo de

inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e pessoas portadoras de deficiência, 2005, p.143.

 

[7] SOUZA CRUZ, Álvaro Ricardo de. O direito à diferença: as ações afirmativas como mecanismo de

inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e pessoas portadoras de deficiência, 2005.

Como citar e referenciar este artigo:
MUNIZ, Mirella Karen de Carvalho Bifano. O mercado de trabalho da mulher e as ações afirmativas atribuindo-lhes tratamento especial. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-do-trabalho/o-mercado-de-trabalho-da-mulher-e-as-acoes-afirmativas-atribuindo-lhes-tratamento-especial/ Acesso em: 06 out. 2024