Direito Constitucional

LGPD: o fim da saga da ANPD?

A Lei 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados ou LGPD) surge num contexto global em que se faz necessário estabelecer regras claras e bem definidas para que seja possível lidar com dados de pessoas físicas com segurança jurídica. A história nos ensinou que, na ausência de alguém que fiscalize a aplicação de uma lei, há duas situações que possivelmente ocorrem: ou a lei é fiscalizada por “todo mundo” que se entende como legítimo para fazê-lo (Ministério Público, PROCON, associações de defesa do consumidor, como é o caso do Marco Civil da Internet) – o que traz insegurança principalmente para os agentes que se valem economicamente dessas atividades; ou a lei simplesmente não tem a eficácia pretendida (vide também o próprio Marco Civil da Internet, que traz severas punições a quem descumpri-lo, como multas de 10% do faturamento do grupo. 

Quantas vezes noticiou-se uma aplicação de sanção nessa proporção desde a sua criação em 2014?) – o que traz o sentimento de impunidade. Cientes desse cenário, o Congresso Nacional estabeleceu a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ou ANPD) no texto original da LGPD – um órgão de caráter técnico, com (então) independência técnica e orçamentária. 

Em 14 de a agosto de 2018, o Presidente da República sancionou a LGPD, porém vetou a criação da ANPD nos moldes delineados pelos legisladores sob o argumento de uma falha formal (o Poder Legislativo estaria criando despesas ao Poder Executivo, o que seria inconstitucional por violar a independência dos Poderes). Com isso, começou a “saga” da ANPD e a preocupação de todo o mercado que trata dados pessoais. Teremos uma lei fiscalizada por todos – o que poderia quase que inviabilizar atividades de tratamento de dados pessoas – ou uma lei “para inglês ver”? Em dezembro de 2018, o Presidente Michel Temer editou uma Medida Provisória criando a ANPD, porém com diferenças significativas da proposta original. 

A principal: a autoridade estaria subordinada diretamente à Presidência da República e sem autonomia financeira. Conforme determina a legislação, a MP foi submetida ao Poder Legislativo, que discordou da forma como a ANPD havia sido estruturada pelo Executivo. Surge, então, uma nova proposta em que, por ora, a ANPD ficará subordinada à Presidência da República, mas o Poder Executivo federal deverá, em até dois anos, avaliar a possibilidade de transformá-la em entidade da administração pública federal indireta, submetida a regime autárquico especial (trata-se apenas de uma possibilidade, mas a Presidência teria se comprometido com essa disposição), mas garantida a autonomia técnica e decisória à autoridade. 

Assim, ainda que a conjectura política e econômica nacional tenha impedido que se chegasse a um modelo que possa ser considerado perfeito quanto à criação da autoridade nacional, a sistemática aprovada pelos parlamentares foi aceita pelo Poder Executivo e, finalmente, na data de 09/07/2019, foi sancionada a criação de uma autoridade brasileira específica para a do tratamento de dados pessoais. 

O Brasil passa, oficialmente, a contar com um órgão técnico especializado e que será o único autorizado a aplicar as pesadas sanções previstas na LGPD. Outros pontos do Projeto de Lei de Conversão que criou a ANPD foram vetados, mas itens de extrema importância se mantiveram, dentre eles prorrogação do início da vigência da nova lei para agosto de 2020. Continuamos acompanhando os desdobramentos do assunto.

Por Danilo Roque, Maria Fernanda, Ramirez Assad Girard, do FAS Advogados

Como citar e referenciar este artigo:
ROQUE, Danilo; FERNANDA, Maria; GIRARD, Ramirez Assad. LGPD: o fim da saga da ANPD?. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2019. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/lgpd-o-fim-da-saga-da-anpd/ Acesso em: 12 nov. 2024