Trânsito: Alcoolemia; Condução sob efeito de Álcool; Fiscalização; Prevenção e Medidas Sócio-Educativas.
Fabio Antinoro *
A presente análise, pretende consubstanciar as formulações e motivações dos usuários e agentes integrantes do Sistema Nacional de Trânsito – SNT, de forma articulada, ao fim de demonstrar os dispositivos constantes do Código de Trânsito Brasileiro, entre outras legislações esparsas, que tratam sobre a alcoolemia e seus efeitos (embriaguez), traduzindo o presente material, em estudo, cujo objetivo visa conhecer de todas as questões ao longo do tempo suscitadas, com escopo de discernir quais as medidas, no âmbito da matéria relativa ao trânsito, poderá vir a ser implementada, na forma da Política Nacional de Trânsito, pelos Órgãos Máximo Executivo e Normativo da União – Departamento Nacional de Trânsito e Conselho Nacional de Trânsito.
A Convenção Americana Sobre Direitos Humanos “Pacto de São José, da Costa Rica”, Promulgado em nosso ordenamento pelo Decreto 678, de 1992, estabelece que ninguém será obrigado a produzir provas contra si mesmo, expressada na forma da alínea “g” do Item “
Por decorrência da adesão do Governo Brasileiro ao referido pacto, sob a égide das garantias e dos direitos humanos, necessário conferir as previsões constitucionais previstas na Carta Política de 1988 em seu Art. 5º, §§ 2º e 3º, que não excluindo outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, terão equivalência às emendas constitucionais (Emenda 45, de 2004), desde que aprovados em cada Casa Congressual, em dois turnos, por três quintos dos votos de seus respectivos membros.
Pari passu, com a edição da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que instituiu o novel Código de Trânsito Brasileiro, naquela norma de hierarquia ordinária, previu o legislador Brasileiro, em seu Art. 165, regulamentado pela Resolução 81/98-CONTRAN, o dirigir sob influência do álcool, como infração ao código de conduta social, permeando, inclusive, a natureza penal estatuída no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro: “Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influencia de álcool ou substancia de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem: Pena – detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.”
Por complementação a normalização do próprio Código de Trânsito Brasileiro, o CONTRAN baixou a Resolução nº 81, de 19 de novembro de 1998, que disciplina o uso de medidores da alcoolemia e a pesquisa de substâncias entorpecentes no organismo humano, estabelecendo os procedimentos a serem adotados pelas autoridades de trânsito e seus agentes, dando eficácia, como sói acontecer em casos que tais, a dispositivo literal da norma de Regência.
A abrangência da complementaridade da Resolução nº 81, de 1998, do CONTRAN, também encontra guarida no comando do Art. 276 do Código de Trânsito Brasileiro, assim dispondo: “Art.
Por sua vez, ao descrever o Art. 277 do Código de Trânsito Brasileiro, regulamentado pela Resolução nº 109, de 21 de dezembro de 1999, do CONTRAN, verificamos que: “Art. 277. Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de haver excedido os limites previstos no artigo anterior, será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia, ou outro exame que por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado.”.
A regulamentação da Resolução nº 109, de 1999, do CONTRAN, estabeleceu as condições para a homologação dos equipamentos, aparelhos ou dispositivos para exames de alcoolemia (etilômetros, etilotestes ou bafômetros), concorrendo
A consubstanciar a ação normalizadora complementar do CONTRAN, por previsão legal, diz seu Art. 269, inciso IX, do Código de Trânsito Brasileiro, in verbis: “A autoridade de trânsito ou seus agentes, na esfera das competências estabelecidas neste Código e dentro de sua circunscrição, deverá adotar as seguintes medidas administrativas: … IX – realização de teste de dosagem de alcoolemia ou perícia de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica.”, somadas ao que dispõe seu Art. 280, § 2º, do Código de Trânsito Brasileiro: “ A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN.”
A matéria, na forma disciplinada, em razão de adesão do Governo Brasileiro ao Pacto de São José, sobre Direitos Humanos, contrastado com as questões constitucionais e demais doutrinas e jurisprudência de nosso Poder Judiciário, levam, a exaustão, todas as formas e maneiras de aplicabilidade dos dispositivos elencados no Código de Trânsito Brasileiro, razão de tramitar no Congresso Nacional, o Projeto de Lei nº 735/2003, já aprovado pela Câmara, que alterando a redação dos arts. 165, 276, 277 e 302 da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro, em síntese, visa dar legalidade a executoriedade da prestação de serviços públicos, decorrentes da fiscalização efetiva de Trânsito.
Referido Projeto de Lei, encaminhado à Casa Civil pela Mensagem 001/06, se sancionado in limine pelo Senhor Presidente da República, permitirá que haja caracterização de infração ou crime de trânsito por condução de veículo sob influência do álcool ou substância entorpecente, ainda que o condutor se recuse a fazer os testes de alcoolemia, mediante prova testemunhal, cujo meio de prova, terá a natureza indiciária ao fato tipificado.
De fácil conclusão, o consenso em face das discussões ora levantada, passa, inevitavelmente sob o crivo dos aspectos jurídicos a dirimirem as dúvidas, que no geral, permitem a todos os integrantes do Sistema Nacional de Trânsito, a perfeita inação ante as correntes dominantes, podendo gerar no futuro a omissão do Estado, justamente, quando este último pretende evitar incorrer em arbitrariedades por inexistência de pacificidade da matéria.
DEBATES TÉCNICOS E DA EXEGESE DA DOUTRINA
Em face do disposto nos §§ 2º e 3º, do art. 5º da C.R.F.B., os tratados internacionais entram em nosso ordenamento
Aplica-se ao referido no parágrafo anterior, a corrente e pensamento dominante quanto à validade, ratificação e da construção jurídica que pretende suportar a aplicação, de imediato, das cláusulas previstas no Pacto de São José, como recepcionado pela Constituição da República, por força de seu § 3º do Art.5º.
Logo, admitindo-se a prevalência dessa corrente doutrinária, teríamos com a Convenção Americana de Direitos Humanos (1969), o Pacto de São José da Costa Rica c/c os §§ 2º e 3º do art. 5º da Constituição Federal, consagrado o princípio constitucional de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Razão pela qual, não pode a lei infraconstitucional impor
Assim, de acordo com o disposto no art. 276 do Código de Trânsito Brasileiro, para que haja ocorrência da infração administrativa, necessário se verifica o conhecimento do índice de alcoolemia, ou seja, a concentração de seis decigramas de álcool por litro de sangue, pois sem a comprovação desse limite, mesmo que o condutor esteja com todos os indicativos de embriaguez, não haveria como enquadrá-lo na conduta infracional tipificada no art.165 do CTB.
Apesar do art. 277 do CTB estabelecer que a Autoridade de Trânsito ou seus Agentes devem submeter o condutor com suspeita de ter excedido o limite fixado para ingestão de álcool, ao uso de bafômetro, o próprio texto legal inserido pelo Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992 c/c os §§ 2º e 3º da Constituição Federal, não encontra amparo para a aplicação da medida administrativa prevista no art. 269, inciso IX, do Código de Trânsito Brasileiro.
DA RECUSA DO USO DO BAFÔMETRO OU OUTRO MEIO DE PROVA
Há entendimentos de que a recusa do uso do bafômetro ou outros meios que possam detectar o índice de alcoolemia caracteriza crime de desobediência. A contrário sensu, existem outras correntes que divergem sobre a questão com base em jurisprudências que concluem que quando há infração administrativa ou civil de desobediência,
Neste raciocínio a considerar o acima exposto – se inconstitucional tal ato da Autoridade -, não se caracteriza nem mesmo a infração administrativa de desobediência, vez que não se pode obrigar ao cidadão ordem ilegal.
A corrente defendida pelo Professor Damásio de Jesus, ainda que o condutor exerça o direito à não-auto-incriminação, é possível, diante dos indícios configuradores de crime de trânsito (art. 306 do CTB), encaminhá-lo à autoridade polícia judiciária a qual, de imediato, expedirá a requisição para o exame clínico. Em razão da pesquisa do médico oficial, será possível aferir se o condutor dirigia, de forma anormal, sob o efeito de álcool ou substância análoga, o que se mostrará suficiente para a configuração do art. 306 do CTB, haja visto ser desnecessário estabelecer, para efeitos penais, a dosagem de concentração do álcool no organismo do condutor.
Ressalta que, no exame clínico, serão observados: hálito, motricidade (marcha, escrita, elocução), psiquismo e funções vitais, entre outras pesquisas médicas, cuja realização, em vários casos, independerá da colaboração do condutor do veículo automotor.
DA RECEPÇÂO DA ADESÃO AO PACTO DE SÃO JOSÉ DA
A doutrina divergente entende que os condutores estão obrigados a submeter às disposições estabelecida no CTB, com fundamento da própria Constituição da República que estabelece que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei.
Ora, se a obrigação em questão decorre de lei em sentido formal, não há que se falar em violação de direito do cidadão. De sorte que, a corroborar com o presente entendimento, temos ainda, com fundamento na jurisprudência Pretório Excelso que o tratado ora em comento ingressou no ordenamento jurídico
Frise-se, pois, que o seu ingresso no ordenamento jurídico se fez por força de decreto do Poder Executivo de 1992, anterior a Emenda Constitucional de nº 45, não sendo recepcionado assim como norma constitucional.
Ato contínuo, somente os tratados e convenções aprovados na forma do § 3º do art. 5º da Carta Magna têm o status de norma constitucional, depreendendo-se
Tais correntes jurídicas expostas, dentre outras de íntima correlação, merecem a acuidade na verificação de suas motivações e fundamentações a permitir uma construção sistêmica das normas trazidas à colação, para fins de dar eficácia à vigência da lei, Norma de Regência – Código de Trânsito Brasileiro, em face, prioritariamente aos significativos índices de acidentes de trânsitos e de acidentados, com perda irreparável da capacidade produtiva do acidentado; do custo social para executoriedade das políticas de amparo as vítimas e da prestação de serviços médicos, dentre outros prejuízos concorrentes que sobejam ante a precariedade de atendimento e reparação, quer pelo Estado, quer pela sociedade civil.
CONCLUSÃO
Pelo que se pretende como indicativo para adoção de ações necessárias ao enfrentamento da questão, com o cumprimento da Lei n° 9.503/97 e considerando o alto índice estatístico de acidente de trânsito em conseqüência da ingestão de álcool e as dificuldades de efetiva ação por parte dos agentes de trânsito face às dúvidas quanto ao cumprimento ou não da evocação do princípio da não produção de prova contra si, formulam-se as seguintes sugestões para a ação efetiva do Departamento Nacional de Trânsito:
· medir esforços junto ao Congresso Nacional com vistas a alterar os dispositivo da Lei 9.503/97, que exigem para imposição de penalidade ou de adoção de medida administrativa a comprovação de álcool em nível superior a seis decigramas por litro de sangue, sendo conveniente que a simples constatação de conduta irregular do veículo (ziguezague), hálito alcoólico, desequilíbrio etc, pudessem ser suficientes para que o agente de trânsito adotasse medidas de segurança para o próprio condutor como para terceiros, que muitas vezes perdem sua vida por falta de uma simples medida acautelatória.
· Em decorrência da morosidade para esse tipo de processo de alteração de lei, paralelamente, o Departamento Nacional de Trânsito, em parceria com os órgãos ou entidades executivos e rodoviários de trânsito estaduais, municipais e federais, deveriam desenvolver campanhas/projetos educativas voltados à alcoolemia/embriaguez, de forma a conscientizar a população sobre os perigos e as conseqüências advindas do álcool quando na condução de veículo.
· Incentivar maior número de palestras discorrendo o tema nas escolas de 1º, 2º e 3º Grau, objetivando que aqueles que já dirigem se conscientizem, se não no todo, pelo menos em parte do perigo de ingestão de álcool ao volante e daqueles que ainda não se encontram aptos a conduzirem veículos, exerçam algum tipo de cobrança junto aos seus familiares ou amigos.
· Por fim, em razão da controvérsia do tema na doutrina e na jurisprudência, melhor seria que o CONTRAN deliberasse no sentido de solicitar ao Advogado-Geral da União que ingressasse junto ao Supremo com uma Ação Direta de Constitucionalidade tendo como objeto os dispositivos que disciplinam a matéria no CTB.
* Advogado, especialista em arbitragem e Direito Econômico (Concorrência e Consumidor), Consultor para Trânsito da SELOS – Consultoria, Consultor Legislativo na Câmara Federal, Gabinete 728; ex-assessor técnico jurídico da Procuradoria Especializada da Agência Nacional de Aviação Civil; foi Coordenador-Geral Jurídico do Departamento Proteção e Defesa Econômica e Inspetor-Geral da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça; Coordenador-Geral Jurídico e de Fiscalização e Diretor Substituto do DENATRAN – Departamento Nacional de Trânsito, Membro da Câmara Temática de Esforço Legal: Infrações, Penalidades, Crimes, Policiamento e Fiscalização de Trânsito e Chefe da Assessoria Jurídica do CONTRAN – Conselho Nacional de Trânsito e Docente para cursos de Pós-Graduação. E-mail: antinoro@hotmail.com