Luma Damasceno Góes
Walter Marquezan Augusto
Por ser a licitação um procedimento jurídico cujo produto final é a celebração de um contrato entre a Administração Pública e um particular, é de se esperar a possibilidade de as partes transacionarem seus interesses em prol de um acordo mutuamente vantajoso. No entanto, tal expectativa não pode estar dissociada da noção de que processos licitatórios possuem seu procedimento previsto em lei, estando igualmente prevista a forma pela qual o ato de negociar ocorrerá nas licitações.
Neste texto explicaremos, de forma simples e objetiva, qual o papel da negociação em um processo licitatório e como este ato se dá na prática, especialmente à luz do que prevê a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
Se levarmos em consideração o texto da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, é possível verificar que não há propriamente uma fase de negociação. O art. 17 desta lei determina que o processo licitatório será dividido em sete fases, a saber: i) preparatória; ii) de divulgação do edital de licitação; iii) de apresentação de propostas e lances, quando for o caso; iv) de julgamento; v) de habilitação; vi) recursal; e vii) de homologação.
A negociação não é, portanto, uma fase em si, mas a última das subfases da fase de julgamento, uma vez que esta se subdivide em: a) classificação inicial das propostas; b) desclassificação das propostas nas hipóteses previstas na lei; c) desempate; e d) negociação. [1]
Como a negociação em um processo licitatório se diferencia da noção de negociação do senso comum?
Tendo em vista o inerente formalismo dos contratos administrativos, o grau de flexibilidade das concessões a serem feitas no âmbito de um processo licitatório muito difere daquele presente nas negociações entre particulares.
Em licitações, a negociação objetiva viabilizar que a Administração Pública, após uma pré-seleção das propostas, possa negociar com a licitante melhor classificada, buscando condições ainda mais vantajosas para a subsequente contratação. Tal subfase encontra previsão legal no artigo 61 da Nova Lei de Licitações, e, via de regra, terá concessões unilaterais por parte do licitante.
Isto é, embora seja nomeada como negociação, a rigor, a Administração, muito dificilmente fará concessões em razão de estar limitada às diretrizes constantes do instrumento convocatório, restando ao licitante vencedor, para, efetivamente, garantir sua vitória, aceitar ou não as condições propostas pela Administração quando da negociação.
É dizer, na subfase de negociação busca-se condições mais vantajosas, única e exclusivamente, para a Administração Pública. Para ilustrar, bastaria pensar no exemplo hipotético de um licitante que, classificado em primeiro lugar pela excelência técnica de sua proposta, é questionado sobre a possibilidade de redução do preço, sem que isso implique a concessão de benefícios adicionais em seu favor.
Ou seja, enquanto em contratações privadas as partes transacionam com “paridade de armas”, na subfase de negociação de um processo licitatório, o poder de barganha da Administração Pública é muito maior que àquele conferido ao particular, o qual, diga-se de passagem, tende à zero.
Com quais licitantes a Administração poderá negociar?
Feitas estas considerações iniciais é oportuno lembrar o que diz o artigo 61 da Nova Lei de Licitações:
Art. 61. Definido o resultado do julgamento, a Administração poderá negociar condições mais vantajosas com o primeiro colocado.
§ 1º A negociação poderá ser feita com os demais licitantes, segundo a ordem de classificação inicialmente estabelecida, quando o primeiro colocado, mesmo após a negociação, for desclassificado em razão de sua proposta permanecer acima do preço máximo definido pela Administração.
§ 2º A negociação será conduzida por agente de contratação ou comissão de contratação, na forma de regulamento, e, depois de concluída, terá seu resultado divulgado a todos os licitantes e anexado aos autos do processo licitatório.
Observados os elementos da definição acima, percebe-se que o caput do artigo 61 indica expressamente que a Administração poderá negociar por condições mais vantajosas com o primeiro colocado. Ou seja, há para a negociação uma ordem de precedência, pois trata do primeiro colocado, após definido o resultado do julgamento; é dizer, ainda que o resultado final da licitação não esteja definido, já existe uma primeira classificação das propostas, e a negociação está restrita ao licitante melhor classificado.
Infrutífera a tentativa de negociação com o licitante mais bem classificado, a negociação poderá ser feita com os demais participantes do certame, respeitando-se sempre a ordem de classificação. Tal hipótese somente ocorre quando o primeiro colocado, mesmo após a negociação, mantém a sua proposta acima do preço máximo definido pela Administração, hipótese em que o licitante originalmente classificado em primeiro lugar é desclassificado.
Note-se que a hipótese de desclassificação é específica para a manutenção do preço acima do preço máximo definido pela Administração, momento a partir do qual abre-se a possibilidade de negociação com os demais licitantes. Não aceitar a integralidade das proposições feitas pela Administração não implica, por si só, desclassificação, pois é plenamente possível que a administração busque condições mais vantajosas que não estejam diretamente relacionadas ao fato de o preço proposto estar acima do máximo previsto para a contratação em questão.
Sendo este o caso, mesmo que o licitante classificado em primeiro lugar não faça concessões, se o preço originalmente proposto não ultrapassar o valor máximo da contratação, o licitante não poderá ser desclassificado e não haverá negociação com o segundo colocado.
Este artigo foi originalmente publicado em: https://schiefler.adv.br/recomendacoes-para-a-fase-de-negociacao-na-licitacao-o-que-e-a-subfase-de-negociacao-em-uma-licitacao/
[1] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 33. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.