Direito Administrativo

Contrair obrigações de despesas no âmbito municipal frente à lei de responsabilidade fiscal em períodos eleitorais

Contrair obrigações de despesas no âmbito municipal frente à lei de responsabilidade fiscal em períodos eleitorais

 

 

Diego Cheniski *

Sidnei Ramos**

 

 

A necessidade permanente por parte da Administração Pública em contratar fez com que evoluíssem os mecanismos reguladores de tais necessidades, e também se buscasse formas de coibir abusos e restringir o poder discricionário do administrador no trato com a coisa pública. A licitação que hoje conhecemos, foi introduzida no direito público brasileiro há mais de cento e quarenta anos, pelo Decreto nº. 2.926/1862, que regulamentava as arrematações dos serviços a cargo do então Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Após o advento de diversas outras leis que trataram, de forma singela, do assunto, o procedimento licitatório veio, a final, a ser consolidado no âmbito federal pelo Decreto nº. 4.536/1922, que organizou o Código de Contabilidade da União.

 

Desde então, o procedimento licitatório veio evoluindo, com o objetivo de conferir maior eficiência às contratações públicas, sendo por fim sistematizado através do Decreto-Lei nº. 200/1967, que estabeleceu a reforma administrativa Federal, e posteriormente foi estendido às administrações dos Estados e Municípios, com a edição da Lei nº. 5.456/1968.

 

Com o advento da CF/88, a licitação recebeu status de princípio constitucional, de observância obrigatória pela Administração Pública direta e indireta de todos os poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

 

Assim, quando a Administração Pública contrai obrigações de despesas obedece às determinações legais contidas na Lei nº. 8.666/1993, a chamada lei de licitações. Essa determinação assegura a contratação mais vantajosa à Administração Pública; no entanto, em alguns casos, essa obrigatoriedade de licitar é flexibilizada permitindo à Administração Pública contratar por dispensa ou inexigibilidade. (Saliento também, a Lei nº. 10.520/2002 que trata do Pregão, da qual falaremos em outra oportunidade).

 

Faz-se necessário, um breve discorrer sobre o que venha ser dispensa e inexigibilidade, situações que a primeira vista podem parecer desobrigar a Administração Pública em seguir os ditames contidos na Lei de Licitações, porém, vincula o gestor público em iguais medidas à norma legal.

 

O artigo 24 da referida Lei trata da dispensa como forma de contratação direta. Nos casos de dispensa – muito embora seja possível a competição entre fornecedores – a Administração, por razões de conveniência, opta por dispensá-la. Tal artigo elenca um rol taxativo de situações onde a opção pela dispensa fica inserida na competência discricionária da Administração.

 

Já o artigo 25 dispõe sobre a inexigibilidade de licitação. Segundo a fórmula geral, essa contratação deriva da inviabilidade de competição. A própria lei fornece alguns exemplos do que caracterizaria tal inviabilidade, que não pode ser entendida como uma definição simples, pois se afigura como uma conseqüência, podendo ser produzida por diversas causas, sempre que houver a ausência de pressupostos necessários à realização da licitação.

 

Como mencionado anteriormente, pode parecer à primeira vista que a inexigibilidade proporciona ao administrador a possibilidade de descumprir um princípio constitucional, no entanto, isso não ocorre. Para aclarar um pouco mais essa definição do artigo 25, colacionamos os ensinamentos de Hely Lopes Meirelles: “A inexigibilidade de licitação ocorre, pois, em todos os casos em que se verifique impossibilidade jurídica de competição entre contratantes, quer pela natureza específica do negócio, quer pelos objetivos sociais visados pela Administração”. Lembre-se que tal artigo nos traz um rol exemplificativo de situações de inexigibilidade, porém, mesmo assim, não exime de forma alguma o administrador público no que tange a obedecer aos requisitos legais para contratação e conseqüentemente, o cumprimento da Lei.

 

Aspectos diferenciados como estes, podem causar aos administradores públicos mais desavisados surpresas desagradáveis no que diz respeito à Lei Complementar nº. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), pois esta veda à Administração Pública contratar de forma desmedida em períodos eleitorais, mesmo que por licitação, dispensa ou inexigibilidade. Com isto, evita-se relegar ao sucessor uma administração ruinosa.

 

 Não abordaremos aqui, evidentemente, as distorções praticadas por gestores e ordenadores de despesas que se utilizam da máquina pública em períodos de maior destaque, a exemplo do eleitoral, para contratações que visem maquiar uma administração mal gerida durante todo um mandato. A Lei de Responsabilidade Fiscal vem garantir a transição segura e saudável das contas públicas, pelo menos aparentemente.

 

A LRF trouxe uma mudança institucional e cultural no trato com o dinheiro público. O cidadão de um modo geral está mais intolerante aos administradores que, devido ao mau uso do dinheiro público, deixam para a sociedade menos investimentos, mais impostos e mais inflação.

 

Esta Lei tem por objetivo aprimorar a responsabilidade na gestão fiscal dos recursos públicos, por meio de ação planejada e transparente; busca o máximo de controle da gestão pública, prevenindo riscos e corrigindo desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas.

 

Um aspecto importantíssimo diz respeito às contratações em final de mandato. Este ponto crucial para a saúde financeira do Município está amparado no artigo 42 da LRF, que veda aos governantes nos últimos oito meses de mandato contrair obrigações de despesas que não possam ser cumpridas integralmente nesse período ou que tenham parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para esse fim. A decorrência é que não poderão ser feitos contratos de última hora que onerem o próximo mandato, nem deixar restos a pagar que não possam ser pagos com recursos do mandato.

 

Finalizando, a restrição de empenho imposta aos prefeitos no último ano de mandato permitirá, à nova administração, iniciar uma gestão implantando os novos planos de governo, sem ter que administrar uma “herança” financeira deixada pelo seu antecessor. Ao restringir a expansão das despesas, ela induz os governos a direcionar e controlar melhor seus recursos, racionalizando custos e dando melhor eficiência à máquina pública.

 

 

* MBA Executivo em Gestão Comercial com Ênfase no Poder Público – Universidade Positivo (em andamento); pós Graduando em Direito Administrativo – Institudo de Direito Romeu Felipe Bacellar; graduação em Direito – PUC PR.

 

** Advogado OAB/SC 23777 – Pós-Graduando – MBA em Gestão Comercial Pública

 

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Como citar e referenciar este artigo:
CHENISKI, Diego; RAMOS, Sidnei. Contrair obrigações de despesas no âmbito municipal frente à lei de responsabilidade fiscal em períodos eleitorais. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-administrativo/contrair-obrigacoes-de-despesas-no-ambito-municipal-frente-a-lei-de-responsabilidade-fiscal-em-periodos-eleitorais/ Acesso em: 06 out. 2024