Atos administrativos na mídia e sua interpretação pela população
Anderson José Adão*
atualmente é possível ter acesso diariamente a diversas notícias sobre contratações irregulares, fraudes em licitações e pagamentos ilegais.
A população em diversas situações se vê perdida diante das diversas terminologias utilizadas pelos meios de comunicação para poder explicar os acontecimentos, as razões e soluções de cada caso.
Os espectadores são pessoas comuns, na maioria sem conhecimento e formação técnica específica para identificar as diferentes figuras de todas estas tramas que estão sendo diariamente denunciadas.
É difícil, em algumas situações, até mesmo para o profissional de comunicação, que escreve uma matéria ou prepara uma reportagem, identificar todas as figuras, as fases e os trâmites, sem um conhecimento técnico, principalmente de conceitos básicos de direito administrativo que podem influenciar totalmente no efeito que a informação a ser fornecida pode ter perante a opinião pública.
Tal desconhecimento do profissional de comunicação no momento de preparar a notícia pode causar uma insatisfação injusta do espectador quanto ao resultado da solução do caso noticiado.
Em diversas situações em que a população ficou eufórica com notícias de fraudes, a solução para o caso não foi a punição que se esperava e tal fato sempre acaba causando um descontentamento.
Há casos que são noticiados como fraudes, quando o que ocorre é a constatação de irregularidades ou ilegalidades que não podem ser consideradas como fraudulentas, mas sim como resultado de ineficiência, inépcia e muitas vezes incompetência.
Nesses casos inexiste a má-fé de quem pratica tais atos, mas sim o desconhecimento ou ignorância da forma legal de os praticar.
Comum é também a qualificação de um ato como ilegal ou criminoso sem que tenha transcorrido o trânsito em julgado do processo, que em parte das situações, quando este se dá, é comprovado apenas irregularidades formais, passíveis até mesmo de convalidação.i
Antes de qualificar um ato como fraudulento é necessário sempre realizar uma análise jurídica apurada quanto ao atendimento dos requisitos legais que promoveram tal qualificação.
Na Administração Pública os atos praticados pelos agentes públicos são chamados atos administrativos, que possuem diferentes interpretações entre os juristas brasileiros.
Para José dos Santos Carvalho Filho o ato administrativo é a exteriorização da vontade de agentes da Administração Pública ou de seus delegatários, nessa condição, que, sob regime de direito público, vise à produção de efeitos jurídicos, com o fim de atender ao interesse público.ii
Já para Diógenes Gasparini, o ato administrativo é toda prescrição, juízo ou conhecimento, predisposta à produção de efeitos jurídicos, expedida pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, no exercício de suas prerrogativas e como parte interessada numa relação, estabelecida na conformidade ou compatibilidade da lei, sob o fundamento de cumprir finalidades assinaladas no sistema normativo, sindicável pelo Judiciário.iii
Estes são dois dentre os vários conceitos de ato administrativo extraídos do entendimento dos nossos juristas e profissionais da área.
Mas destes dois conceitos que possuem, apesar de complexidade diferenciada, pontos em comum, extraímos que é pacífica a idéia de que os atos administrativos praticados pelos agentes públicos devem produzir efeitos jurídicos.
Todo ato administrativo deve atender requisitos legais próprios, inerentes a seu objetivo e função, para que possa produzir os efeitos jurídicos capazes de dar validade ou não ao seu resultado.
Os atos administrativos possuem como requisitos a competência do agente que os pratica, seu objeto, sua forma, a sua legalidade, o motivo de sua realização e sua finalidade.
Tais requisitos são extraídos da Lei Federal nº 4.717/65, que regula a Ação Popular, que trás em seu artigo segundo os requisitos que invalidam um ato administrativo quando não presentes.
Art. 2º. São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de:
a) incompetência;
b) vício de forma;
c) ilegalidade do objeto;
d) inexistência dos motivos;
e) desvio de finalidade.
Estabelecidos os requisitos de um ato administrativo, é mais fácil identificar quando um fato noticiado na mídia é fruto de fraude e má-fé, ou quando é fruto de inobservância de requisitos legais que o tornam ilegal, mas não imoral.
Um exemplo claro notícias que podem gerar uma interpretação errônea dos espectadores é a de reprovação de contas de Prefeitos, por exemplo, visto que algumas contratações por ele realizadas não foram precedidas de licitação conforme determina a legislação vigente.
Notícias como esta são constantemente expostas em jornais locais, causando grande constrangimento ao agente público e indignação dos munícipes que o elegeram.
Os leitores destes jornais, que em grande maioria não possuem conhecimento técnico, pode ser influenciado por grupos opositores, passando a acreditar que o fato de o Prefeito não ter realizado licitação para a citada contratação é ato de corrupção do mesmo.
No entanto, o que em alguns casos ocorre é a constatação de que inexistiu qualquer desvio de valores ou má-fé por parte do Prefeito, agente público ou parte da relação contratual em questão.
Tal constatação de inexistência de corrupção não torna por si só a contração uma contratação legal.
Diante desta situação há diversos casos que podem ser facilmente identificados com uma simples pesquisa nos sites do Tribunal de Contas da união, por exemplo, em que o Prefeito Municipal é obrigado a realizar a devolução de valores gastos de forma errada.
Um ato administrativo, que é a contratação ordenada pelo Prefeito, que não atendeu um dispositivo legal que prevê a realização prévia de licitação para tal, apesar de ilegal e passível de anulação, conforme disposto no art. 2º da lei Federal nº 4.717/65, não é um ato fraudulento, com o intuito de corrupção.
A reprovação das contas municipais não decorreram de atos criminosos, mas sim ilegais.
Portanto, antes da formação de qualquer juízo de reprovação quanto á moral dos administradores públicos que são penalizados por realizarem atos administrativos ilegais, é necessário analisar o verdadeiro teor das informações que são transmitidas pelos meios de comunicação, que apesar da boa intenção, nem sempre são justos com os Administradores Públicos, alvo de suas notícias.
i Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo, 18ª ed. São Paulo: Atlas, 2005;
ii José dos Santos Carvalho Filho, Manual de Direito Administrativo, 12ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004;
iii Diógenes Gasparini, Direito Administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995;
Obras de Apoio:
1.
Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo, 1999;
2.
Diogo Figueiredo Moreira Neto, Curso de Direito Administrativo, Rio, 1999.
* Advogado
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