Os Radicais Livres da Inovação
Tom Coelho *
“Não dá para resolver um problema
com o mesmo raciocínio que o causou.”
(Albert Einstein)
A economia globalizada comprimiu distâncias geográficas, cindiu barreiras culturais e proporcionou um admirável mundo novo de oportunidades. Mas também comoditizou tudo: produtos, serviços e até pessoas.
Por isso, a competitividade está lastreada num processo de diferenciação. Praticar o que chamamos de concorrência monopolística, ou seja, atuar num ambiente altamente concorrencial, porém com características tão peculiares que geram encantamento e fidelização.
O caminho para a diferenciação é dado pela criatividade, o ato de dar existência a algo novo, único e original. Também podemos definir criatividade como uma técnica de resolver problemas.
A criatividade se manifesta de duas formas básicas. Como bem pontuaram Duailibi e Simonsen, em Criatividade & Marketing, a primeira é a descoberta, a qual ocorre quando se percebe algo já existente e se verbaliza esta constatação, seja através de uma definição, uma equação ou uma fórmula matemática.
A segunda é a inovação. Através da associação de dois ou mais fatores aparentemente díspares, chega-se a um terceiro fator que tem parte dos anteriores, mas que, em relação a eles, é novo.
É sobre inovação que vamos tratar neste ensaio baseado no filme “Os Radicais Livres da Inovação”, produzido pelo Centro de Inovação de Oregon e distribuído com exclusividade no Brasil pela Siamar.
A metáfora dos radicais livres advém da Biologia. Assim como nosso organismo registra a existência de muitos radicais livres essenciais ao metabolismo, mas que também provocam câncer e outras doenças, nosso futuro depende da inovação, que freqüentemente é negligenciada devido aos seus riscos inerentes que asfixiam a criatividade.
Faremos a seguir um passeio por um conjunto de conceitos com um objetivo bem definido: sensibilizar você e sua empresa sobre a importância da inovação, apresentando instrumental suficiente para entendê-la, cultivá-la e promovê-la em sua organização e em sua vida.
1. Inovar ou morrer
“Não é a mais forte das espécies a que sobrevive, nem a mais inteligente,
mas aquela que melhor responde às mudanças.”
(Charles Darwin)
A inovação se posiciona ao lado do empreendedorismo como o grande motor para o desenvolvimento econômico sustentável de empresas e nações.
A máxima darwinista serve-nos para rememorar o pensamento de Heráclito de Éfeso que dizia: “A única coisa permanente é a mudança”.
O cemitério do mundo corporativo está repleto de companhias que, encasteladas em seus dogmas, acomodadas pelos ganhos de participação no mercado e aumento dos lucros, não perceberam que se tornavam obsoletas.
Assim foi com fabricantes de chicotes para charretes, que poderiam ter se convertido em empresas de controle veicular, e fabricantes de máquinas de escrever, que poderiam ter desenvolvido os primeiros processadores de texto.
Não foi assim com a Sony, que após lançar seu rádio transistorizado de bolso em 1957, definiu-se como uma empresa capaz de desenvolver equipamentos portáteis individuais de música, atingindo seu auge com o walkman que a permitiu reinar soberana por quatro décadas. Mas no meio do caminho tinha uma Apple, e esta tinha um novo dispositivo: o iPod.
2. Reinventar o Marketing tradicional
“Inventar um avião não é nada.
Construir um é alguma coisa. Voar é tudo.”
(Otto Lilienthal)
O famoso composto mercadológico formado por 4P’s também evoluiu. Aos convencionais produto, preço, praça e promoção, outros P’s foram adicionados. A Madia Marketing Matrix, desenvolvido pela Madia Marketing School, trabalha com um conjunto de 11 P’s. Neste ensaio, com foco em inovação, abordaremos os seguintes:
Produto
Sim, começamos por ele, até por conta do paradigma de que a inovação está relacionada à tecnologia. O objetivo aqui é criar produtos mais funcionais e surpreendentes. Foi assim que os televisores abandonaram o tubo, migrando para a tecnologia plasma e LCD. Os tênis ganharam amortecedores de impacto. As geladeiras passaram a fornecer cubos de gelo na porta sem a necessidade de abri-la. E os celulares tornaram-se aparelhos multimídia.
Curiosamente, e até por conta da velocidade das inovações, a expressão “bens duráveis” está com os dias contados. Os equipamentos de hoje não são definitivamente construídos para durar. Nossos avós entendem bem o que isso significa.
Preço
Produtos reinventados para atender consumidores solteiros, com embalagens menores e preços mais acessíveis. Condições de pagamento elásticas, ofertadas em parceria com instituições financeiras, aproximando desejo e realização aos olhos e bolso do consumidor, como fazem as Casas Bahia. Ganhar pouco sobre grandes volumes, como um Wal-Mart, ou muito sobre quantidades reduzidas, tal qual Louis Vuitton e todo o ascendente mercado do luxo.
Promoção
Adeus aos testemunhais e às ações de merchandising. A inovação da promoção se traduz por ações com impacto cultural, permeando o estilo de vida das pessoas. Estar onde o público quer e na hora em que ele precisa. E utilizar uma comunicação clara, facilitando a compreensão; convincente, digna de credibilidade; e sedutora, alinhada com as experiências de vida dos clientes potenciais.
Praça
Não é mais sobre onde está armazenado o produto e onde será entregue. Trata-se dos canais para encontrá-lo, como personalizá-lo e, eventualmente, consertá-lo. Trata-se de comodidade e velocidade. Acessar o Submarino no final da noite e receber um livro ou CD no dia seguinte. E toda a logística existente por trás disso.
Pessoas
Estamos falando dos consumidores, certo?
Pós-Venda
O difícil não é a primeira venda, mas a segunda. Fazer o cliente voltar – e não para apresentar reclamações. Estabelecer um vínculo emocional capaz de torná-lo seu embaixador itinerante, propagandista dos benefícios de sua empresa. Alcançar fidelização, lealdade e perenidade.
Processo
A eficiência da produção seriada cedeu espaço para a eficácia da produção personalizada engendrada pela Dell. Já a Federal Express transmutou-se de uma empresa de encomendas para uma companhia de logística. E a Starbucks foi além de bons grãos e variedades de cafés, bem preparados por exímios baristas. Converteu seu espaço num ambiente de convívio social, praticando o inovador marketing de experiência.
“Houve momentos em que pensei que poderíamos falhar.
Houve momentos em que até pensei que deveríamos falhar.
Mas, por alguma razão, nunca pensei que falharíamos.”
(Phil Knight, Nike)
O maior medo a confrontar os inovadores não é o medo de errar, mas o de não tentar ou, ainda, ser suplantado por outrem.
O mundo está repleto de idéias. E a grande maioria das pessoas vai levá-las consigo após o suspiro final devido à incapacidade de torná-las tangíveis, colocando-as em prática.
Temos o hábito de ficar esperando pelo mundo perfeito. Queremos controlar o ambiente e as circunstâncias, adotamos a hesitação como parceira e vemos o tempo escorrer pelas mãos e a frustração nos visitar.
O ótimo é inimigo do bom. Por isso, aja! Esteja preparado para errar e acostume-se com o erro. Corra riscos. Se você não o fizer, alguém o fará em seu lugar. Se você tiver medo de falhar, você vai falhar. É como um velho lema dos lutadores de artes marciais: se você teme perder, já está vencido.
Encare o risco, o perigo e o fracasso como adrenalina que acelera o pulso, dilata as pupilas, impulsiona as sinapses proporcionando-lhe uma explosão de prazer por fazer diferente no intuito de fazer a diferença. Como dizem na Intel Capital: “Ser o primeiro entre os piores é melhor do que ser o segundo entre os melhores”. Arrisque. E acredite.
4. Preparar a mente
“A oportunidade favorece a mente preparada.”
(Louis Pasteur)
Os inovadores são pessoas que fazem sua própria sorte. Não acreditam no acaso, mas no trabalho árduo para estarem no lugar certo e na hora certa quando uma oportunidade surgir.
A Roda do Aprendizado, formulada por Peter Senge, é exemplar para ilustrar este conceito. A primeira fase reside no plano da consciência, o que envolve percepção e observação. Consiste em ter a mente aberta, estar atento ao mundo, ao ambiente que nos cerca, captando inclusive intuitivamente informações que ganharão significação, recebendo status de conhecimento.
A segunda fase é representada pelo plano da competência. Após o reconhecimento, sucede a ação, enérgica e flexível, levando à experimentação, habilitação e, por fim, à incorporação – in corpore, ou seja, tornar parte de si.
Na verdade, a célebre frase de Pasteur foi assertivamente reescrita por Michael Schrage: “A mente preparada favorece a oportunidade”.
5. O funil da inovação
“O melhor modo de ter uma boa idéia é ter muitas.”
(Linus Pauling)
Divergência e convergência. Estas são as palavras-chaves no processo criativo.
Começamos pela divergência. É fácil compreendê-la a partir da aplicação da tão conhecida técnica de brainstorming. Neste estágio, buscamos a quantidade. Uma profusão de idéias, muitas delas desconexas. O julgamento deve ser suspenso, tudo deve ser permitido. Regra básica: é proibido proibir. A participação de todos deve ser estimulada e o humor deve permear as relações.
A cada uma das idéias lançadas, podemos aplicar outra ferramenta, o SCAMPER, um acrônimo para ilustrar um conjunto de ações para ampliar ou gerar novas idéias:
– Substituir: regras, materiais, processos, abordagens;
– Combinar: idéias, soluções, variações, realizar misturas;
– Adaptar: copiar, reproduzir, agrupar, incorporar;
– Maximizar: ampliar, expandir, agregar, adicionar, exagerar;
– Pode usar: novos usos, aplicações;
– Eliminar: simplificar, condensar, subtrair, apagar;
– Rearranjar: novas distribuições, componentes, cronogramas, procedimentos.
Depois passamos à avaliação, etapa na qual as idéias são classificadas e organizadas. Sistemas de banco de dados são particularmente úteis neste momento.
A partir desta fase, tem início o processo de convergência. Pesquisas são realizadas para avaliar a viabilidade das principais idéias selecionadas. Protótipos são construídos e testados. Até chegarmos, finalmente, ao lançamento, a realidade da inovação.
Da criação ao lançamento, o processo da inovação assemelha-se a um grande funil. Partimos de um grande número de idéias, que demandam poucos recursos, para chegarmos a uma única idéia exeqüível, a qual demanda grande volume de recursos de toda ordem.
6. Inventar o futuro
“Você precisa ser a mudança que deseja ver.”
(Mahatma Gandhi)
O desafio agora é explorar o futuro. Pensar, repensar, reinventar. Não apenas objetos e processos, mas a si mesmo. Dar asas à imaginação. Fechar os olhos e vislumbrar cenários e tendências.
Leia livros e revistas que normalmente não circulariam em suas mãos. Assista a programas diversos, sejam desenhos animados ou documentários. Leia o jornal de trás para diante, passeie seus olhos pelos classificados, detenha-se nas notícias de menor destaque – tudo o que se encontra nas manchetes e nas primeiras páginas fazem parte do universo do conhecimento comum.
Veja filmes de ficção e faça perguntas. Muitas perguntas. Visualize o mundo em cinco, dez, vinte anos. Busque o inusitado. Assuma desafios não razoáveis, que pareçam mesmo impossíveis. E descubra com rapidez que eram perfeitamente plausíveis.
7. Criar uma cultura de inovação
“Se quiser colaboração, remova as paredes.”
(Sohrab Vossoughi)
A cultura da inovação deve permear todos os matizes de sua companhia. Para tanto, crie um ambiente propício para encorajar novas idéias. Facilite e propicie a comunicação em sua equipe. Promova eventos, organize almoços, leve-os para fora da empresa, saindo do lugar convencional de trabalho. Reduza as hierarquias, não apenas por decreto, mas de fato.
Além disso, estimule o humor e as brincadeiras. Assim estará contribuindo para o aprendizado e a qualidade de sua retenção. Divertir-se é um ótimo recurso para manter a auto-estima e motivação elevada.
E lembre-se de agir em consonância com suas palavras. Alinhar comportamento e discurso. A isso chamamos coerência.
8. O poder da diversidade
“Nem todas as conversas irão mudar sua vida,
mas qualquer uma delas poderá fazê-lo.”
(Liz Dolan)
Colaboração e diversidade são essenciais para a inovação.
A colaboração traz consigo o respeito, a assertividade, a certeza de que nenhum de nós é tão bom quanto todos nós. Da colaboração surge o conceito de comunidade, o lugar onde as idéias recebem apoio e incentivo – porque são comuns aos propósitos de todos.
A diversidade transcende à imagem de multiplicidade racial, religiosa ou social. Reduz-se simplesmente à diversidade e pensamento. Pontos de vista diferentes que conduzem a novas idéias, ou as idéias existentes a novos caminhos.
O florescer desta diversidade demanda diálogo. Mais do que ouvir, escutar. Colocar o ego do lado de fora da arena. Nada de posições, cargos, títulos. A conversação entre iguais, marcada pela honestidade, confiança, independência, intuição e emoção.
Aproveite pequenos encontros sociais para debater idéias. Converse mais com as pessoas, inclusive estranhos. É uma grande oportunidade para conhecer outras perspectivas.
9. Qual é o seu problema?
“Eu quero tornar a eletricidade tão barata
que somente os ricos possam dar-se ao luxo de queimar velas.”
(Thomas Edison)
Buscamos a inovação não de forma despretensiosa, mas para atingir determinados objetivos. Pode ser reduzir custos, aumentar a durabilidade, ganhar mais intensidade, proporcionar mais beleza, conquistar maior funcionalidade. Enfim, mudar positivamente o resultado atual a partir dos recursos existentes.
Por isso, após a pergunta fundamental “Qual é o seu problema?” sucede uma ainda mais relevante: “O que você vai fazer a respeito?”
* Com formação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP, especialização em Marketing pela Madia Marketing School e em Qualidade de Vida no Trabalho pela USP, é consultor, professor universitário, escritor e palestrante. Diretor da Infinity Consulting, Diretor Estadual do NJE/Ciesp e VP de Negócios da AAPSA. Contatos através do e-mail tomcoelho@tomcoelho.com.br. Website: www.tomcoelho.com.br
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