Direito Ambiental

O caso do esgoto de Blumenau

Esgoto é um problema nacional!! E parece que ninguém está preocupado em encontrar a solução; embora todos saibam que o dinheiro destinado ao tratamento
de esgoto reflete – direta e positivamente – nas políticas públicas de saúde. Cada dólar investido nisso, gera uma economia de 5 dólares na área da
saúde.

A universalização do acesso aos sistemas de tratamento de água e esgoto ainda é uma falácia no Brasil. Inexiste qualquer planejamento para o setor.
Recentemente, o tema ingressou nas promessas de campanhas político-partidárias. A obrigação imposta pela Lei do Saneamento (11.445/2007) para que os
municípios criassem seus planos de saneamento até 2010 foi prorrogada. Agora, a apresentação dos planos (e não a efetiva prestação de serviços) pode
acontecer até o final de 2013.

A situação de Santa Catarina é vergonhosa. Só perde pro Piauí. Estamos em meados de 2011 e somente 12% da população urbana possuem saneamento adequado.

Por isso, cresce o número de cidades que romperam seus contratos com a CASAN – a empresa estatal que – por força politiqueira – detém os serviços de
tratamento de água e de esgoto em SC.  Mas sua atuação é deplorável:

– age de forma predatória e não é punida;

– relegou o saneamento básico;

– e não cuida dos mananciais de água.

O Instituto Eco&Ação soube que Blumenau rompeu seu contrato com a CASAN e foi até lá inteirar-se do assunto.

O que disse a Prefeitura

A cidade da famosa ‘Oktoberfest’, até o ano passado, contava com apenas 2% de captação de esgoto. Com verba do FUNASA, chegou a 5%.

Em 2008, mudaram as regras para que a autarquia municipal – SAMAE – ficasse somente com a distribuição da água. Iniciativa boa para o bolso do usuário:
os valores ficaram inferiores aos da tarifa CASAN.

Quanto ao problema do esgoto, contrataram uma consultoria de São Paulo para apurar os custos do tratamento desse. E comprovou o que já sabiam: o
investimento era inviável para os cofres da Prefeitura.

O que fazer?

Promoveram um processo licitatório pra concessão de serviço de esgoto. Surgiram várias empresas interessadas; até uma de Portugal. Segundo Cassio de
Quadros, Chefe de Gabinete do Prefeito, no Brasil há, atualmente, 10 empresas querendo este filão de mercado.

O vencedor foi o Consórcio Saneblu (formado pelas empresas Foz do Brasil S/A, Odebrecht Engenharia e Engeform). As obras iniciaram em julho de 2010,
com previsão de 100% de esgoto tratado em 2017. Mas, no final de 2012, poderá chegar a 65% de tratamento.

E a comunidade?

Ainda não há 100% de satisfação. Brigas judiciais, manifestações públicas, reclamações de usuários… alguns acham que é impossível ‘rasgar’ a cidade
para passar a tubulação.

A primeira batalha judicial para a conclusão das obras do esgoto foi vencida. O Tribunal de Justiça de SC decidiu que a lei municipal que tratou da
privatização desse serviço é boa.

Não obstante, a Foz do Brasil ainda é ré em 03 ações judiciais que questionam o assunto.

Em audiência pública, realizada na Câmara Municipal, alguns vereadores, que votaram a favor da “privatização”,  admitiram seu erro e pretendem reverter
o processo.

O PROCON de Blumenau alega que as reclamações contra a Foz do Brasil aumentaram muito. Em 2010, foram 66; de janeiro a março de 2011, 40. A maior parte
refere-se a cobranças exageradas de tarifa de água. Contas que eram de R$50,00 passaram para R$1.000,00, por exemplo.

Parece que, hoje, a empresa envolveu-se também no sistema de tratamento da água no município, efetuando troca de hidrômetros, corte d’água e emissão de
conta. Extraí do website*: “A Foz do Brasil realiza também o atendimento dos serviços de água e esgoto em Blumenau (…) Este serviço é feito em
conjunto com o SAMAE, que alocou funcionários (…) para este fim”.

E que a Agência Reguladora (criada para fiscalizar os trabalhos da Foz) é uma instituição fantasma.

Ouvimos também a Foz do Brasil

Segundo o Diretor de Operações da Foz do Brasil – Francisco Jucá Soares – “Blumenau sai na frente dessa nova fase da Lei 11.445/2007. E será um cartão
de visita de Santa Catarina. Terá redução significativa nas doenças de veiculação hídrica. Quem quiser, poderá pescar futuramente. Uma coisa é certa:
os ribeirões de Blumenau serão salvos. É um processo de conscientização que já mostrou seus primeiros aspectos positivos”.

Consta no website* da empresa: “A Foz do Brasil é a empresa responsável pelos serviços de esgotamento sanitário do município de Blumenau até 2045. Nos
três primeiros anos de concessão o município irá saltar de 6% para 60% no volume de esgoto coletado tratado”.

Os investimentos previstos são de 322 milhões de reais. 250 milhões serão aplicados nos primeiros 5 anos. O projeto contempla 4 estações de tratamento.

Quanto ao cumprimento dos prazos assumidos, ele se mostrou tranqüilo, devido à velocidade de decisão e a capacidade de fazer da Foz do Brasil: “O que a
gente assume, a gente vai cumprir e, se possível, antecipar. Nosso planejamento envolve o planejamento do município. No nosso DNA, o objetivo é lucro.
Mas como se obtém o resultado lucro? Através de uma boa prestação de serviço. A população é nossa verdadeira cliente, clientes de sempre… temos 35
anos de concessão”.

A participação do processo licitatório de Blumenau somente para tratamento de esgoto, “passou fundamentalmente por uma leitura de mercado.  Blumenau é
a terceira cidade do estado, é formadora de opinião, é balão de ensaio… queríamos vencer a licitação mesmo que não trouxesse lucro nos primeiros
momentos…”.

Jucá elogiou a iniciativa do Ministério Público Estadual em colocar em sua pauta o saneamento básico. E entende que a CASAN tem que ser regulada: “Ela
não está acima da lei. Um dos aspectos a serem analisados é a modicidade… e a qualidade do serviço prestado. Mas, os antagonismos políticos
atrapalham a solução. Ou seja, o bem político está acima do bem comum”.

Citou a concessão na cidade de Limeira-SP – onde a Foz atua – com um case positivo: “as pessoas constroem suas casas sem caixa d’água com a certeza de
que a água não vai faltar”.

Com a palavra, o MPE

Conversamos também com o doutor Luciano Naschenweng, que assumiu, em agosto de 2010, a Promotoria Regional Ambiental da Bacia Hidrogrâfica do Rio
Itajaí. O Ministério Público Estadual tem um programa institucional do saneamento básico no qual a “CASAN não ajudou em nada, não acreditou no nosso
trabalho”. Por isso, ele arregaçou as mangas e concentrou suas ações no saneamento básico da região. Avocou o inquérito civil do saneamento para si e
conversou com os 21 prefeitos da Bacia. Foi um trabalho de formiguinha no qual 20 assinaram TACs. Com exceção do de Blumenau. Por quê?

– o Município é réu em uma ação na Justiça Federal, que trata deste assunto;

– há um processo que pede a anulação do contrato assinado pelo SAMAE com a Foz do Brasil devido a supostas irregularidades apuradas pelo promotor de
justiça Gustavo Diaz.

Na época, a principal preocupação de doutor Naschenweng era evitar que a Foz do Brasil começasse a cobrança do tratamento de esgoto antes de ser
efetivada a prestação desse serviço.

Atualmente, ele está atuando em Florianópolis, na equipe da Procuradoria-Geral de Justiça.

Conclusão

Blumenau está tentando fazer a coisa certa. Afinal, o Município é responsável pela prestação dos serviços de água e esgoto. E pelos danos ambientais
oriundos da falta destes. A responsabilidade é  objetiva e pode até implicar cadeia pro prefeito.

Coletar e tratar esgoto são serviços contratados, como outros quaisquer. Regiamente pagos pelo munícipe. Se aquele que assume este encargo não o
cumpre, ta na hora de rescindir o contrato. E exigir que sejam contratadas empresas capacitadas para executar os serviços pelos quais pagamos. O
tratamento de esgoto é um destes.

Embora Santa Catarina careça de uma proposta política de saneamento básico, não podemos continuar apostando na máxima: “ruim com a CASAN, pior sem
ela”.

* – http://www.fozdobrasil.com.br/web/blumenau/o-que-fazemos

Ana Echevenguá, advogada ambientalista, vice-presidente do Instituto Eco&Ação e da Academia Livre das Águas, e-mail: ana@ecoeacao.com.br, website:
http://www.ecoeacao.com.br.

Como citar e referenciar este artigo:
ECHEVENGUÁ, Ana. O caso do esgoto de Blumenau. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2011. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-ambiental-artigos/o-caso-do-esgoto-de-blumenau/ Acesso em: 22 nov. 2024