—————————————————————-
RECURSO ESPECIAL Nº 1.006.409 – RS (2007/0269492-7)
R E L ATO R : MINISTRO JOSÉ DELGADO
RECORRENTE : BRASIL TELECOM S/A
ADVOGADO : ANDERSSON VIRGINIO DALL AGNOL E
OUTRO(S)
RECORRIDO : NERI JOSE ELY
ADVOGADO : ADRIANO JOSÉ OST E OUTRO(S)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIÇO DE TELEFONIA.
COBRANÇA DE “ASSINATURA BÁSICA RESIDENCIAL”.
NATUREZA JURÍDICA: TARIFA. PRESTAÇÃO
DO SERVIÇO. EXIGÊNCIA DE LICITAÇÃO. EDITAL DE DESESTATIZAÇÃO
DAS EMPRESAS FEDERAIS DE TELECOMUNICAÇÕES
MC/BNDES N. 01/98 CONTEMPLANDO A
PERMISSÃO DA COBRANÇA DA TARIFA DE ASSINATURA
BÁSICA. CONTRATO DE CONCESSÃO QUE AUTORIZA A
MESMA EXIGÊNCIA. RESOLUÇÕES N. 42/04 E 85/98, DA
ANATEL, ADMITINDO A COBRANÇA. DISPOSIÇÃO NA LEI
N. 8.987/95. POLÍTICA TARIFÁRIA. LEI 9.472/97. AUSÊNCIA
DE OFENSA A NORMAS E PRINCÍPIOS DO CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES DA CORTE
ADMITINDO O PAGAMENTO DE TARIFA MÍNIMA EM CASOS
DE FORNECIMENTO DE ÁGUA. INEXISTÊNCIA DE
VÍCIOS NO ARESTO A QUO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO
DE PRECEITOS TIDOS POR VULNERADOS. SÚ-
MULA 282/STF. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC REPELIDA.
MULTA EM SEDE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
QUE SE AFASTA. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 98/STJ. LEGALIDADE
DA COBRANÇA DA ASSINATURA BÁSICA DE
TELEFONIA.
1. Matéria jurídica abordada no acórdão, cobrança de “assinatura
mensal básica” para prestação de serviços telefônicos, amplamente
debatida.
2. Os artigos 165 e 458 do CPC, 876 e 877 do Código Civil não
foram objeto de debate e nem de deliberação na Corte de origem,
padecendo o apelo especial neste aspecto do requisito de prequestionamento,
o que atrai a incidência da Súmula 282/STF.
3. O Julgador não tem o dever de discorrer eustivamente sobre os
regramentos legais existentes e nem está obrigado a responder a todos
os questionamentos apontados pelas partes se já encontrou motivo
suficiente para fundamentar a sua decisão. Verifica-se que a matéria
atinente à assinatura mensal foi amplamente e explicitamente enfrentada
na Corte de origem, porém, com conclusão em sentido oposto
ao almejado pela recorrente, o que não conduz à hipótese de
omissão. Violação do art. 535, II, do CPC, que se afasta.4. Merece prosperar o apelo em relação ao afastamento da multa por
litigância de má-fé imposta pelo Tribunal a quo em sede de embargos
de declaração. Inteligência da Súmula 98/STJ.
5. A tarifa, valor pago pelo consumidor por serviço público voluntário
que lhe é prestado, deve ser fia por autorização legal.
6. A remuneração tarifária tem seu fundamento jurídico no art. 175,
parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal, pelo que a política
adotada para a sua cobrança depende de lei.
7. O art. 2º, II, da Lei n. 8.987/95, que regulamenta o art. 175 da CF,
ao disciplinar o regime de concessão e permissão da prestação de
serviços públicos, exige que o negócio jurídico bilateral (contrato) a
ser firmado entre o poder concedente e a pessoa jurídica concessionária
seja, obrigatoriamente, precedido de licitação, na modalidade
de concorrência.
8. Os participantes do procedimento licitatório, por ocasião da apresentação
de suas propostas, devem indicar o valor e os tipos das
tarifas que irão cobrar dos usuários pelos serviços prestados.
9. As tarifas fias pelos proponentes servem como um dos critérios
para a escolha da empresa vencedora do certame, sendo elemento
contributivo para se determinar a viabilidade da concessão e estabelecer
o que é necessário ao equilíbrio econômico-financeiro do
empreendimento.
10. O artigo 9º da Lei n. 8.987, de 1995, determina que “a tarifa do
serviço público concedido será fia pelo preço da proposta vencedora
da licitação …”.
11. No contrato de concessão firmado entre a recorrente e o poder
concedente, há cláusula expressa refletindo o constante no Edital de
Licitação, contemplando o direito de a concessionária exigir do usuário
o pagamento mensal da tarifa de assinatura básica.
12. A permissão da cobrança da tarifa mencionada constou nas condições
expressas no Edital de Desestatização das Empresas Federais
de Telecomunicações (Edital MC/BNDES n. 01/98) para que as empresas
interessadas, com base nessa autorização, efetuassem as suas
propostas.
13. As disposições do Edital de Licitação foram, portanto, necessariamente
consideradas pelas empresas licitantes na elaboração de
suas propostas.
14. No contrato de concessão firmado entre a recorrente e o poder
concedente, há cláusula expressa afirmando que, “para manutenção
do direito de uso, as prestadoras estão autorizadas a cobrar tarifa de
assinatura”, segundo tabela fia pelo órgão competente. Estabelece,
ainda, que a tarifa de assinatura inclui uma franquia de 90 pulsos.
15. Em face do panorama supradescrito, a cobrança da tarifa de
assinatura mensal é legal e contratualmente prevista.
16. A tarifa mensal de assinatura básica, incluindo o direito do consumidor
a uma franquia de 90 pulsos, além de ser legal e contratual,
justifica-se pela necessidade da concessionária manter disponibilizado
o serviço de telefonia ao assinante, de modo contínuo e ininterrupto,
o que lhe exige dispêndios financeiros para garantir a sua eficiência.
17. Não há ilegalidade na Resolução n. 85, de 30.12.1998, da Anatel,
ao definir: “XXI – Tarifa ou Preço de Assinatura – valor de trato
sucessivo pago pelo assinante à prestadora, durante toda a prestação
do serviço, nos termos do contrato de prestação de serviço, dando-lhe
direito à fruição contínua do serviço”.
18. A Resolução n. 42/05 da Anatel estabelece, ainda, que “para
manutenção do direito de uso, caso aplicável, as Concessionárias
estão autorizadas a cobrar tarifa de assinatura mensal”, segundo tabela
fia.
19. A cobrança mensal de assinatura básica está amparada pelo art.
93, VII, da Lei n. 9.472, de 16.07.1997, que a autoriza, desde que
prevista no Edital e no contrato de concessão, como é o caso dos
autos.
20. A obrigação do usuário pagar tarifa mensal pela assinatura do
serviço decorre da política tarifária instituída por lei, sendo que a
Anatel pode fixá-la, por ser a reguladora do setor, tudo amparado no
que consta expressamente no contrato de concessão, com respaldo no
art. 103, §§ 3º e 4º, da Lei n. 9.472, de 16.07.1997.
21. O fato de existir cobrança mensal de assinatura, no serviço de
telefonia, sem que chamadas sejam feitas, não constitui abuso proibido
pelo Código de Defesa do Consumidor, por, primeiramente,
haver amparo legal e, em segundo lugar, tratar-se de serviço que,
necessariamente, é disponibilizado, de modo contínuo e ininterrupto,
aos usuários.
22. O conceito de abusividade no Código de Defesa do Consumidor
envolve cobrança ilícita, essiva, possibilitadora de vantagem desproporcional
e incompatível com os princípios da boa-fé e da eqüidade,
valores negativos não presentes na situação em eme.
23. O STJ tem permitido, com relação ao serviço de consumo de
água, a cobrança mensal de tarifa mínima, cuja natureza jurídica é a
mesma da ora discutida, a qual garante ao assinante o uso de, no
máximo, 90 pulsos, sem nenhum acréscimo ao valor mensal. O consumidor
só pagará pelos serviços utilizados que ultrapassarem essa
quantificação.
24. Precedentes do STJ garantindo o pagamento de tarifa mínima:
REsp 759.362/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 29/06/2006; REsp
416.383/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 23/09/2002; REsp 209.067/RJ,
Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 08/05/2000; REsp
214.758/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 02/05/2000;
REsp 150.137/MG, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ 27/04/1998, entre
outros. Idem do STF: RE 207.609/DF, decisão da relatoria do Ministro
Néri da Silveira, DJ 19/05/1999.
25. Precedentes do STJ sobre tarifa de assinatura básica em serviço
de telefonia: MC 10235/PR, Rel. Min. Teori Zavascki, Primeira Turma,
DJ 01.08.2005; REsp 911.802/PR, Rel. Min. José Delgado, Primeira
Seção.
26. Recurso especial provido para afastar a aplicação da multa imputada
pela litigância de má-fé e permitir a cobrança mensal da tarifa
acima identificada.ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial,
nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros
Luiz Fux, Teori Albino Zavascki (Presidente) e Denise Arruda votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.
Brasília (DF), 18 de dezembro de 2007 (Data do Julgamento)