A luta pelo direito – Ihering
Guilherme Ricken *
O livro A luta pelo direito, de autoria do eminente jurista alemão Rudolf Von Ihering, não busca apresentar um conhecimento técnico-científico do direito, mas sim explicitar a origem de sua energia vital. Tal energia surge da luta, seja ela protagonizada por governos, indivíduos ou classes sociais. Ela não se faz necessária a todo o momento, mas apenas quando a violação de um direito representa uma agressão à pessoa humana.
A luta é essencial para a defesa do direito, já que o fim último deste é a paz. Para que esta se concretize, o aparato judicial deve saber equilibrar a justiça e o uso da violência legítima. A paz desfrutada por qualquer pessoa não surge espontaneamente: ela é o resultado do trabalho e da luta de outro indivíduo. É também por meio da luta que o Estado mantém sua ordem jurídica, pois ela é baseada em uma briga permanente contra as transgressões legais.
Ihering critica Savigny e os demais membros da Escola Histórica do direito, pois eles afirmam que o direito – como sendo o espírito do povo – vai se desenvolvendo sem obstáculos, enquanto o autor afirma que os novos direitos travam lutas para impor-se, pois o direito pré-existente sempre será defendido por quem nele manifestar interesse. Assim, é preciso de esforço para a construção de um novo ordenamento jurídico, e tal esforço será diretamente proporcional à energia futuramente utilizada para defendê-lo contra possíveis injúrias.
Quanto à luta pelo direito concreto, ela ocorre quando ele é violado ou negado. Essa luta não visa o objeto de um litígio, mas a afirmação de um sentimento de justiça. Muitos processos, mesmo sendo demasiadamente dispendiosos, são levados adiante não em função de um valor pecuniário, mas em nome da personalidade, da honra e do combate à injustiça. Além disso, a luta torna-se ainda mais ferrenha quando o ataque ao direito representa um ataque às condições típicas de vida de alguém, como o camponês que vê um vizinho tomar parte de suas terras. As pessoas que agem de forma oposta, preferindo a passividade aos sacrifícios da luta pelo direito, negam a essência deste, capitulando covardemente e renunciando à própria moral. Ao fazer isso, o indivíduo regride a uma condição subumana. A exceção a esta regra é o imperativo da defesa da vida, que pode ser invocado para renunciar à defesa da propriedade.
Além da luta pelo direito ser um dever do indivíduo para consigo mesmo, ela é uma obrigação para com a sociedade. Aqueles que renunciarem a essa prerrogativa estarão traindo o restante da comunidade, pois o inimigo tornar-se-á cada vez mais ousado na busca pela subtração dos direitos alheios. Por isso, não basta que os juízes e os policiais cumpram com suas obrigações, mas cada membro da sociedade deve contribuir para a defesa dos direitos.
Sobre o direito vigente em seu tempo, Ihering afirma não ser ele capaz de realizar o verdadeiro sentimento de justiça. Tal assertiva deve-se ao fato de que aquele ordenamento apregoava valores essencialmente materialistas e beneficiava enormemente os réus, enquanto tolhia dos ofendidos a possibilidade de luta por seus direitos. A jurisprudência da época também resumiu as ofensas ao direito a meros valores pecuniários, em detrimento da reparação às injustiças cometidas. Outro desvio deplorável era a teoria probatória então em vigor, que penalizava os autores de um processo, dificultando a luta pelo direito. Some-se a isso o fato das normas da época negarem a efetivação do instituto da legítima defesa, resultando na fuga como a única resposta a uma ofensa a um direito.
* Acadêmico de Direito na UFSC e colunista do Portal Jurídico Investidura
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