1. Utilizando como referência a obra de Milton Santos A formação sócio espacial como teoria e método, discorra sobre como o autor trabalha a
relação da formação social e econômica com a organização da sociedade e do espaço.
Modo de produção, espaço físico e formação social são unidos intimamente. Um influencia e modela o outro. O próprio Milton Santos ressalta que o espaço
é primo pobre dos três, pois quase sempre passa despercebido nas análises socioeconômicas.
Nada se consolida, cresce ou vive sem espaço. Estudar um grupo determinado exige que seu espaço torne-se objeto de estudo. Nenhuma geografia se faz sem
um pilar básico entre o antropológico, o sociológico, o econômico e o espacial.
“Se a geografia deseja interpretar o espaço humano como fato histórico que ele é, somente a história da sociedade mundial, aliada a sociedade local,
pode servir como fundamento à compreensão da realidade espacial e permitir a sua transformação a serviço do homem.” (p. 81). “O espaço é matéria
trabalhado por excelência. Nenhum dos objetos sociais tem uma tamanha imposição sobre o homem, nenhum está tão presente no cotidiano dos indivíduos.”
(p. 92).
Ter a prepotência de querer olhar de fora uma coisa que só consegue ser plenamente analisada de dentro do ventre da realidade não atinge a plenitude
que a análise pede. Milton Santos coloca que o modo de produção se expressa de maneira que o novo domina o anterior, o velho; age dessa maneira em um
espaço geral. No entanto as relações espaço-sociais são reflexo de um espaço local, que dependendo também do tempo vão formar uma realidade particular
na organização daquela sociedade.
Refletir a nossa vida cotidiana deve florescer da nossa vida cotidiana. Mas isso deve ater-se no local, no espaço e no tempo que se propõe, para
refletir com mais propriedade sobre nossas atitudes, nossa vida, nossas relações e nossos conceitos e preconceitos.
2. David Harvey em Espaços de Esperança discute sobre o processo de globalização no capitalismo contemporâneo tendo como observado algumas
alterações importantes na dinâmica da globalização, como a desregulamentação financeira, as inovações tecnológicas e de informações, além das
alterações no custo e tempo de locomoção de mercadorias e pessoas. Construa argumentação sobre esse processo de globalização descrito pelo autor.
Globalização e capitalismo são amantes. E daqueles amantes de longa data; ninguém sabe quem originou o outro. Mas não são fixos, imutáveis. São levados
pela geografia, pela história, intensificam –se, expandem-se, mudam pela e para a cultura, redes imateriais, materiais, pelo espaço, pelo tempo.
Vale ressaltar que o próprio termo “globalização” é tomado como inadequado pro Harvey.
Inevitável foi mesmo, principalmente com a cristalização fenômeno global, a difusão e diluição da luta de classes (propostas principalmente por Marx no
século XIX e aplicadas, em termos, por Lênin no início do seguinte século). Isso tudo se deveu por um alinhamento entre o proletariado internacional.
Tudo isso tornou possível o então poderoso capitalismo integrado e alinhado em desvanecer os grupos socialistas, seja por meio de uma incitação à
desagregação (“o capitalismo pode muitas vezes conter a luta de classes por meio de uma estratégia de dividir para governar aplicada a essa luta”) (p.
85), bem como a natural dessemelhança entre o caráter da luta em cada região.
Laboratório de estudo da globalização é, logo, o território. Entrelaçando-se transformações entre retransformações acontecem manipulações, ebulições,
fusões, precipitados e mudanças de cor através de um catalisador grande conhecido nosso: o capitalismo.
É visível e cada vez mais comprovável a cumplicidade desses dois, globalização e capitalismo.
A velocidade em que o capital gira (transações rápidas e demoradas a exemplo das obras públicas), a produtividade, a reprodução sócio ecológico são
exemplos que mostram como nem sempre há um alinhamento, e uma possível aceleração em qualquer das áreas pode acarretar em um sobre carregamento da
outra, surgindo as crises, seja financeira como ambiental (a exemplo de hoje).
2008 foi o ano ao que tange a grande instabilidade financeira que presenciamos. O neoliberalismo, filho bastardo do liberalismo, viu sua educação
titubear quando a bolha financeira norte-americana estourar. A esta desregulamentação o Estado, que ainda é uma importante ferramenta na luta social,
parece ter perdido o posto soberano, sendo reduzido a pequenas funções e, principalmente, servo do grande capital.
Emergindo esse assunto, os produtos dessa citada reação química foram a aceleração tecnológica, melhoria nos eletrônicos, na informática, na mecânica,
nas articulações maquinarias e orgânicas da sociedade, difícil até de serem lubrificadas para quem não está acostumado a essas bruscas mudanças.
Tem como passar despercebida a evolução nas telecomunicações? Creio que a resposta da quase totalidade dos nossos contemporâneos será não. Juntamente
com a inserção da mídia nessa receita, assou um bolo de massificação, manipulação e marketing. O espaço e o tempo foram reduzidos (em custo também)
tornando possível uma nova forma de realizar estratégias e produções mais efetivas, até uma movimentação humana maior.
Conclusão que precisa ser aqui posta é que o termo globalização deveria ser mudado para “desenvolvimento geográfico desigual”.
“Condições desiguais oferecem abundantes oportunidades de organização e ação políticas” (p. 98).
Ainda insistindo na metáfora íntima entre capitalismo e globalização, se ambos são os amantes, os Estados Unidos da América são a cama. Os EUA atuam
hoje como desinência dos dois fenômenos, desinências essas que ditam de modo notável a busca por uma cultura homogênea que não acaba com as
desigualdades sociais.
A globalização nasceu com o dom de depredar culturas, meio ambientes, relações sociais, paisagens históricas, tempo, espaço e tudo aquilo que
caracterizava a singularidade ao redor do globo. O que sobre é cinza, frio, monótono e cristalizado.
3. Desenvolva argumentação crítica sobre a temática da pobreza a partir do confronto de ideias de Milton Santos em A Pobreza Urbana e Amartya
Sem em Desenvolvimento como liberdade.
Pobreza é o imperativo de lei das duas obras. Tanto Milton Santos quanto Amartya Sem criticam a pobreza, cutucam a pobreza, escorraçam a pobreza,
dissecam-na e apontam (pelo menos tentam) saídas desse mal da sociedade atual.
Ela é a doença que abaixa a imunidade da sociedade; ela reduz direitos, priva de capacidades básicas e torna incapaz a satisfação das necessidades
humanas.
Não podemos deixar de ressaltar um fator intrínseco e importante da pobreza, a relativização. Isso significa que a pobreza de ontem não é a mesma
pobreza de hoje, ela muda conforme o tempo, o espaço, a ideologia em voga. O indivíduo é pobre porque é incapaz de realizar e tomar decisões, não é
competitivo e não consegue inserir-se no mercado de trabalho (que vai gerar assim um desemprego estrutural).
Amartya Sem cita dezenas de vezes em seu texto os termos “saúde” e “educação”. Ele é o idealizador do famoso IDH – índice de desenvolvimento humano.
Para ele, sem essa pobreza, fome ou marginalização representam formas de privação de liberdade.
O conceito de liberdade já foi exaustivamente debatido pela história do mundo ao longo dos séculos (vide contratualistas, constitucionalistas,
liberalistas, marxistas, etc.). Entender, pois, a pobreza é tomar consciência de tudo que ela come do direito de liberdade de cada um. Nesse ponto,
Milton Santos e Amartya Sem convergem em opinião (causas da pobreza).
Atraso teórico, insuficiência da produção agrícola, exploração demográfica, êxodo rural, desemprego conjuntural, desemprego estrutural, falta de
capital doméstico para a indústria, subemprego, marginalização, baixa taxa de investimentos, bloqueio do crescimento – são, todas esses nomes, facetas
de um produto extremamente nocivo e venenoso da pobreza, a cultura da pobreza. Essa última diz que uma pessoa nascida pobre assim deve morrer quase
como numa predestinação de castas.
Ou seja, tanto para Milton quanto para Amartya a pobreza é fruto de um sistema capitalista. Ela gera uma desigualdade estrutural explicada quando
olhamos para quem produz e com quem fica a riqueza: o proletário produz, mas não é com ele que fica o grosso da sua produção, é com o capitalista. É a
acumulação de riquezas de um lado e a miséria de outro.
Quem sabe um dia nós possamos olhar para o artigo 3º da Constituição, ler seu inciso III e ver que mesmo que não plenamente, mas já tenham acontecido
vistas mudanças. Para concluir esse texto com palavras bonitas, deixamos com você o próprio artigo, representando aqui nossas palavras de esperança:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
II – garantir o desenvolvimento nacional;
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
* Gisele Witte, Acadêmica de Direito da UFSC, Estagiária no Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Gabinete Des. João Batista Góes Ulysséa, Segunda
Câmara de Direito Comercial, Organizadora do VI Congresso de Direito da UFSC