Prinícipios do Estado de Direito Ambiental *
Princípios estruturantes do Estado de Direito Ambiental
Com esses princípios, visa-se ilustrar um perfil embrionário indispensável para um Estado de justiça ambiental e de caráter relevante, para alicerçar uma política ambiental. Pretende-se fazer um delineamento desses princípios com o intuito de constatar como eles vêm se revelando perante as necessidades de novos modelos dos quais se devem valer os Estados para enfrentar a crise ambiental.
A utilização da expressão estruturantes é no sentido de identificá-los como princípios constitutivos do núcleo essencial do direito do ambiente (constituem uma compreensão global e são superconceitos).
Os princípios se destacam por ser, principalmente: (a) um padrão que permite aferir a validade das leis, (b) uma potencial de interpretação de outras normas e (c) sua capacidade de integração de lacunas.
Neste exame serão abordadas as declarações internacionais de Estolcomo de 1972, sobre meio Ambiente e Desenvolvimento, que têm enorme relevância jurídica em matéria ambiental.
Princípio da precaução e da atuação preventiva
Com base neste princípio da precaução, sempre que houver perigo da ocorrência de um dano grave ou irreversível, a ausência de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de medidas eficazes, a fim de impedir a degradação ambiental.
Este princípio reforça a regra de que as agressões ao ambiente, uma vez consumadas, são de reparação difícil, incerta e custosa, e pressupõem uma conduta genérica in dúbio pro ambiente. Isso significa que o ambiente prevalece sobre uma atividade de perigo ou risco e as emissões poluentes devem ser reduzidas, mesmo que não haja uma certeza da prova científica sobre liame de causalidade e os seus efeitos. Assim, devem-se considerar não só os riscos iminentes, mas também os perigos futuros.
Princípio da precaução x Princípio da atuação preventiva: este exige que os perigos comprovados sejam eliminados; aquele determina que a ação para eliminar possíveis impactos danosos ao ambiente seja tomada antes de um nexo causal ter sido estabelecido com evidência absoluta (alto risco). Necessariamente associada ao princípio da precaução apresenta-se a atuação preventiva.
As ações incidentes sobre o meio ambiente devem evitar a criação de poluições e perturbações na origem e não apenas combater depois os seus efeitos, sendo melhor prevenir a degradação ambiental do que remediá-la posteriormente.
Tarefas preventivas do Estado, quanto à política ambiental: deve ser exercida no sentido de obrigar o poluidor a corrigir e recuperar ambiente e conformada de modo a evitar agressões ambientais, impondo-se:
(a) a adoção de medidas preventivo-antecipatórias em vez de medidas repressivo-mediadoras;
(b) o controle da poluição na fonte, ou seja, na origem.
Talvez, a maior crítica à esse princípio seja a dificuldade em precisar o seu exato conteúdo, tendo, na verdade, sido mais invocado do que realmente colocado em prática. Além do mais, esta atuação preventiva deve ser vista como uma responsabilidade compartilhada, exigindo uma atuação de todos os setores da sociedade.
Princípio da cooperação
Tal princípio, claramente vinculado ao princípio da participação, necessita, para a sua consecução, o exercício da cidadania participativa e, mais que isso, da co-gestão dos diversos Estados na preservação do meio ambiente.
Sabe-se que os problemas de degradações ambientais não se circunscrevem ao âmbito local, mas exigem uma cooperação de Estados de forma intercomunitária, visando uma gestão do patrimônio ambiental comum.
Hoje ninguém mais ignora a existência das dimensões transfronteiriças das atividades degradadoras exercidas no âmbito das jurisdições nacionais.
Fazem parte integrante do ideal de efetivação da cooperação internacional, elementos como:
a) o dever de informação de um Estado aos outros nas situações capazes de causar danos transfronteiriços;
b) o dever de informação e consultas prévias dos Estados a respeito de projetos que possam trazer prejuízos;
c) o dever de dar assistência entre os países, nas hipóteses de degradação importantes e catástrofes ecológicas;
d) o dever de impedir a transferência para outros Estados de atividades que causem degradação ambiental.
A cooperação deve ser entendida como política solidária dos Estados, tendo em mente a necessidade intergeracional de proteção ambiental. A cooperação pressupõe ajuda, acordo, troca de informações e transigência no que toca a um objetivo macro de toda coletividade. Mais do que isto, aponta para uma atmosfera política democrática entre os Estados, visando a um combate eficaz à crise ambiental global.
Princípio da responsabilização Pelo Princípio da Responsabilidade o poluidor, pessoa física ou jurídica, responde por suas ações ou omissões em prejuízo do meio ambiente, ficando sujeito a sanções cíveis, penais ou administrativas. Logo, a responsabilidade por danos ambientais é objetiva, conforme prevê o § 3º do Art. 225 CF/88.
Não há Estado Democrático de Direito se não é oferecida a possibilidade de aplicar toda espécie de sanção àquele que ameace ou lese o meio ambiente. De nada adiantariam ações preventivas, se eventuais responsáveis por dano não fossem compelidos a executar seus deveres ou responder por suas ações. Assim, sob a pena de falta de responsabilização, há necessidade de o Estado articular um sistema que traga segurança à coletividade. A sociedade atual exige, portanto, que o poluidor seja responsável pelos seus atos.
Hoje também muito se discute, em associação, o princípio da responsabilização em uma dimensão mais econômica, através do princípio poluidor pagador, ou seja, a inserção de imputação de custos ambientais relacionadas às atividades dos produtores. Tal princípio tem ligações como auxiliar ao instituto da responsabilidade, pois é um princípio multifuncional.
O princípio do poluidor pagador visa à internacionalização dos custos externos de deteriorização ambiental. Tal situação resultaria numa maior prevenção e precaução, em virtude de um conseqüente maior cuidado com situações de potencial poluição. É evidente que a existência de recursos naturais gratuito leva à degradação.
Assim, então, o causador da poluição arca com os custos necessários á diminuição, eliminação ou neutralização deste dano. Mas não se resume na fórmula poluiu pagou. Seu alcance é maior, incluindo ainda os custos de prevenção, de reparação e de repressão ao dano ambiental.
Na verdade, o princípio do poluidor pagador é uma solução parcial aos problemas econômicos ambientais, pois existem sérios obstáculos em avaliar os custos da externalidade, que devem ser internalizados pelos poluidores, e não existe implementação generalizada deste modelo.
Apesar de o princípio ser amplamente aceito, as aplicações práticas dele têm sido vagas, incoerentes e frequentemente contraditórias. Assim, o princípio do poluidor pagador deve ser articulado com outros princípios, bem como o instituto de responsabilização ambiental.
Na verdade, existe um déficit na execução no sistema de controle e comando público ambiental. Este pode ser vislumbrado, visto que, mesmo quando são atendidas todas as disposições relativas à preservação ambiental, ainda ocorrem acidentes e danos de grande dimensões. Apesar de os Estados disporem de um aparato normativo ambiental viável, não implementam suas tarefas de proteção ambiental.
Postula-se pela readaptação de alguns mecanismos de combate à degradação ambiental, como o reaparecimento do instituto da responsabilidade civil, através de uma configuração mais apta e remodelada, visando, de forma auxiliar, a ajudar a preservação ambiental. Cabe, então, fazer uma releitura do CC e incluir no instituto da responsabilidade, a proteção ao direito ou interesse coletivo e difuso do ambiente, ecologicamente equilibrado, e a qualidade de vida. Com isso, eventuais poluidores, cientes de que serão responsabilizados economicamente pelos danos ambientais, têm forte motivo para evitar e prevenir o dano.
O instituto da responsabilidade civil por danos ao meio ambiente, associado aos instrumentos jurídico-administrativos e à responsabilidade penal ambiental, assim, têm importante missão no cenário do princípio da responsabilização.
Demonstra-se que se tem verificado uma crescente implementação em vários dos sistemas normativos dos Estados, mais voltados à especificidade do dano ambiental. E, de fato, esta é a única tendência mais plausível à responsabilização do dano ambiental. Esta prática efetiva da responsabilização pelo dano ambiental é premente e, assim, necessário passar-se da lei escrita para lei em ação.
Princípios do Usuário Pagador e do Poluidor Pagador
Consubstanciados no Art. 4º, VIII da Lei 6.938/81, levam em conta que os recursos ambientais são escassos, portanto, sua produção e consumo geram reflexos ora resultando sua degradação, ora resultando sua escassez. Além do mais, ao utilizar gratuitamente um recurso ambiental está se gerando um enriquecimento ilícito, pois como o meio ambiente é um bem que pertence a todos, boa parte da comunidade nem utiliza um determinado recurso ou se utiliza, o faz em menor escala.
O Princípio do Usuário Pagador estabelece que quem utiliza o recurso ambiental deve suportar seus custos, sem que essa cobrança resulte na imposição taxas abusivas. Então, não há que se falar em Poder Público ou terceiros suportando esses custos, mas somente naqueles que dele se beneficiaram.
O Princípio do Poluidor Pagador obriga quem poluiu a pagar pela poluição causada ou que pode ser causada.
A sociedade de risco representa a tomada de consciência do esgotamento do modelo de produção, sendo marcada pelo risco permanente de catástrofes e desastres. É a sociedade caracterizada pelos agravamentos dos problemas ambientais decorrentes da evolução industrial e econômica. Há consciência dos riscos e, portanto deve ser discutido a distribuição dos malefícios. Trata-se de uma “irresponsabilidade organizada”.
É um assunto complexo pertencente ao estudo dos direitos do meio ambiente, do estado de ficção, da chamada 3ª. Geração de direitos.
“Com o advento do Estado de Bem-Estar social houve o redimensionamento da importância dos direitos fundamentais” (p.613) a partir de então passou-se a defender os interesses não só individuais (estado liberal) mas também os da comunidade.
A partir da década de 70 do século passado, começou a conscientização do esgotamento dos recursos naturais. A proteção do ambiente tem um caráter autônomo é um direito subjetivo do indivíduo.
O artigo 225 da Constituição do Brasil destaca que: “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preserva-lo para as presentes e futuras gerações”. O texto constitucional é resultado de uma evolução do reconhecimento dos direitos fundamentais, assim cabe ao Estado prestar alguns direitos aos cidadãos. Com a crise ecológica incluiu-se o bem meio ambiente no âmbito de proteção constitucional. Trata-se da ética antropocêntrica alargada.
3. Estado de Direito Ambiental na Constituição Brasileira de 1988
3.1 Meio Ambiente: tarefa do Estado ou direito subjetivo?
O Estado de Direito Ambiental é um conceito teórico que foi abarcado pela Constituição, trazendo valores e postulados básicos da sociedade.
São vislumbrados quatros postulados jurídico-ambientais:
– globalista: atenta para o fato de ser uma questão supranacional;
– publicista: centra o problema no Estado;
-individualista: os instrumentos jurídicos seriam os mesmos utilizados na proteção dos direitos subjetivos;
-associativista: substitui a visão publicista (Estado) por uma visão democrática.
O artigo 225 perpassa a visão individualista. O bem ambiental apresenta proteção jurídica. O texto constitucional impõe ao Estado e à coletividade o dever de preservá-lo. Não se admite o postulado publicista, aproxima-se do associativista.
3.2. Dilemas: o antropocentrismo alargado, o economicocentrismo e a ecologia profunda.
O destino do Planeta está nas decisões humanas. A partir da década de 70 o modo de vida humano passou a ser discutido, em relação aos seus efeitos sobre o Planeta. Existem duas temáticas discutidas sobre o ambiente: o antropocentrismo e a ecologia profunda. O antropocentrismo pode ser desmembrado em economicocentrismo e em antropocentrismo alargado.
O economicocentrismo reduz o bem ambiental a valores econômicos, fazendo com que qualquer consideração ambiental se reduza a proveito econômico. Já, o antropocentrismo alargado, mesmo centrando as decisões do ambiente com o ser humano, propõe novas visões do bem ambiental. O “alargamento” reside em idéias que preponderam a autonomia do ambiente como requisito para a sobrevivência da espécie humana.
A ecologia profunda visa à idéia que o ser humano precisa se integrar ao ser humano. Tal concepção rompe com a idéia que a decisão do homem pode subjugar a natureza. Capra vê o mundo como uma rede. Seres humanos mais o ecossistema. De fato, o ser humano incorporou a idéia de uma natureza servil a seus prazeres.
A Constituição Brasileira não contemplou a visão antropocêntrica de matiz economicocêntrica. Não visa ao ambiente como mero instrumento para proveito de riquezas. Assim o artigo 170, assegura a livre iniciativa ressalvada a defesa do meio ambiente. O art. 186 explana a função social da propriedade. Mas é o art. 225 que contempla essa ultrapassagem.
A carta brasileira de 1988 adotou o “antropocentrismo alargado”. O ambiente é tratado como interesse comum da coletividade e do Estado. Outro ponto referido na carta é o caráter preventivo e precaucional adotado.
3.3. Estado de Direito do Ambiente: ficção?
O Estado de Direito do Ambiente é fictício, marcado por grande abstratividade. Nota-se a complexidade da questão ambiental quando se constata que o ambiente é uno, mostrando diversas realidades.
O postulado globalista atenta para duas situações: a discrepância entre as Constituições no que tange à configuração jurídica do meio ambiente. É difícil tratar o ambiente de forma uniforme no plano teórico, porque há princípios consagrados anteriormente como a soberania dos Estados. É difícil então tomar medidas conjuntas. Mas como isso é um processo recente, espera-se uma evolução.
A abstratividade do Estado de Direito do Ambiente não pode induzir a não discussão do tema. São formadas cinco funções:
1. moldar formas mais adequadas para a gestão de riscos e evitar a irresponsabilidade organizada. O risco existe para tudo. Cabe ao Estado gestionar os riscos.
2.juridicizar instrumentos contemporâneos, preventivos e precaucionais, típicos do Estado pós-social. Principio da precaução e prevenção estão inscritos no art. 225. O Direito não deve atender só os danos pós-factum.
3. trazer ao campo do direito ambiental noção de direito integrado. Proteger o meio ambiente (macrobem) é uma tarefa interdisciplinar.
4. buscar a formação da consciência ambiental.
5. propiciar maior compreensão do objeto estudado.
4. Direito integrativo e transdisciplinariedade
A interdisciplinariedade é um método de integração de disciplinas, para a resolução de problemas complexos, resultantes do desenvolvimento tecnológico e econômico. Definida como processo de intercâmbio. Para que tenha eficácia o direito ambiental precisa ser interdisciplinar. Faz parte de um direito integrativo.
* Texto enviado de forma anônima
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