EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA …. VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE …………..
DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA
APENSADA AOS AUTOS DE Nº ….
….., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ….., com sede na Rua ….., n.º ….., Bairro ……, Cidade ….., Estado ….., CEP ….., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). ….., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ….., portador (a) do CIRG nº ….. e do CPF n.º ….., por intermédio de seu advogado (a) e bastante procurador (a) (procuração em anexo – doc. 01), com escritório profissional sito à Rua ….., nº ….., Bairro ….., Cidade ….., Estado ….., onde recebe notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor
MEDIDA CAUTELAR INOMINADA INCIDENTAL, COM PEDIDO LIMINAR PARA DEPÓSITO JUDICIAL
em face do Estado de …., pessoa jurídica de direito público interno com sede na Rua ….., n.º ….., Bairro ……, Cidade ….., Estado ….., pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
A autora é sociedade comercial com seus atos constitutivos devidamente arquivados no registro do comércio (doc. ….).
Na execução de seu objeto social, a Autora é contribuinte do ICMS, mantendo escrita fiscal regular e promovendo o recolhimento do ICMS, quando devido, na forma e procedimentos fixados pelo Regulamento do ICMS.
Para determinação do quantum do ICMS a ser recolhido, quando da compra de bens para uso e consumo ou ativo fixo de outros estados, a Autora atendia as disposições da Lei nº 8.933/89, que em seu artigo 8º dispunha:
“Art. 8º – Nas hipóteses dos incisos II e III do artigo 3º, a base de cálculo é o valor da operação ou prestação sobre o qual foi cobrado no Estado de origem, e o imposto a recolher será correspondente à diferença entre as alíquotas interna e interestadual.”
Referido dispositivo foi alterado pela Lei nº 9.884/91, verbis, que atualmente dispõe:
“Art. 8º – Nas hipóteses dos incisos II e III do artigo 3º, a base de cálculo é o valor da operação ou prestação sobre o qual foi cobrado no Estado de origem e o imposto a recolher, observado que este integra sua própria base, conforme disposto no artigo 17, será correspondente a diferença entre alíquotas interna e interestadual.”
“Art. 17 – O montante do imposto integra sua própria base de cálculo, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle.”
Verifica-se, assim, que a sistemática de apuração do ICMS, adotada pela Fazenda Estadual, estabelece que o imposto devido, quando da compra de bens para uso e consumo ou ativo fixo de outros estados, deve ser calculado por dentro, ou seja, o índice a ser aplicado não é a simples diferença entre a alíquota interna e interestadual, por força do contido no artigo 17 da Lei nº 8.933/89. Traduzindo, aritmeticamente, os índices correspondem a ….% e ….% mediante a utilização do denominado método por dentro. Tal método foi demonstrado na resposta da Consulta nº 55/94 de 28 de abril de 1994, conforme cópia anexa (doc. ….).
Todavia, entende a Autora que tal determinação é ilegal e inconstitucional, pois a própria Lei Ápice exige que a Lei Complementar detalhe e desenho o imposto, a fim de que o legislador ordinário, com competência limitada, possa instituir a espécie tributária dentro dos ditames constitucionais. Diante de tal entendimento, a Autora distribuiu Ação Declaratória, processo nº …., objetivando garantir o direito de não se sujeitar às disposições do art. 8º e art. 17 da Lei nº 8.933/89, quando da apuração do ICMS devido na aquisição de bens para o ativo fixo de outros estados.
DO DIREITO
Falta de Lei Complementar – Nenhuma análise do ICMS ou da aplicação de suas normas pode prescindir de sua adequação às normas constitucionais. No caso dos autos, verifica-se que a quantificação (material) do imposto devido, encontra-se definida, delimitada, pelas disposições do inciso VIII, do artigo 155 da Constituição da República, in fine, não podendo, qualquer norma inferior, principalmente um Convênio, uma Lei do Executivo Estadual ou o Regulamento, dispor de forma diferente, ampliando o permissivo constitucional.
“VIII – Na hipótese da alínea “a” do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;”
É evidente o alargamento das disposições do Convênio ICM 66/88, da Lei nº 8.933/89 e do RICMS, ao disciplinar o recolhimento do ICMS devido nas aquisições de bens para ativo fixo, uso e consumo, diferentemente das disposições constitucionais retro citadas.
Conforme se pode verificar das disposições do inciso VII, do artigo 155 da Constituição, a forma de cálculo do imposto devido ao Estado da localização do destinatário está especificada como aquela verificada entre alíquotas, não se verificando nenhum fundamento legal para imposição de quaisquer outros procedimentos, além daqueles indicados no dispositivo constitucional.
Assim sendo, a exação ora atacada, exigida na forma das normas expedidas pela Fazenda Estadual, prescinde, necessariamente, de Lei Complementar para sua adoção, a qual não se encontra editada, haja vista que a atual Carta Magna, ao tratar do Sistema Tributário Nacional, em seu artigo 146, I, II e III, atribui à mesma a tríplice função de:
a) eliminar conflitos de competência, em matéria tributária, entre os entes políticos;
b) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
c) estabelecer normas gerais de legislação tributária.
À vista das competências atribuídas à Lei Complementar, tem-se que a sua exigência não é apenas de cunho formal, mas principalmente, material. E de outra forma não poderia ser, melhor explicando, não pode um tributo ter os elementos da hipótese de incidência definidos por outra norma que não a Lei Complementar, na medida em que ela, na função de aplicar as limitações constitucionais ao poder de tributar, torna-se instrumento essencial de defesa e garantia ao contribuinte.
Ofensa aos princípios da segurança jurídica e da legalidade tributária – Nesse tema, considerando que todos os tributos decorrem de uma relação jurídica, estabelecida e definida pela Carta Magna, e considerando que o novel Carta estabeleceu o regime definido como Estado Democrático de Direito, nenhuma imposição fiscal pode ser estabelecida sem o respeito ao princípio da legalidade tributária.
Tal princípio, fundamentado na Lex Legum, estabelece os limites do legislador para regrar as disposições voltadas à incidência e exigência do Tributo.
Dessa vinculação constitucional, que tem como elemento maior a fundamentação da norma, no caso em concreto temos que o artigo 155, incisos VII, alínea “a” c.c. o inciso VIII, estabelece a obrigatoriedade do adquirente de mercadorias, na qualidade de usuário final ou para consumo próprio, recolher ao Estado, a diferença de alíquota adotada nas operações de compra de outro Estado da Federação.
Tal obrigatoriedade, de caráter extra fiscal, decorre da Política de Administração Tributária, independente da ocorrência do fato gerador do ICMS (operações de circulação de mercadorias), mas vinculada à mesma, tendo em conta a repartição tributária entre os entes da Federação, de tal forma a evitar a chamada “guerra fiscal” entre os Estados.
Diante do exposto, verificamos, que o ICMS também é informado por objetivos extra fiscais, permitindo aos Estados, ex vi do artigo 155, inciso VII, alínea “a” e inciso VIII, cobrar dos adquirentes de bens para consumo próprio, a diferença de alíquota do ICMS utilizada nas aquisições de outros Estados da Federação.
Note-se que a sujeição passiva explicitada pela norma constitucional não está vinculada à destinação da mercadoria pelo adquirente da mesma, mas à natureza de sua aquisição – para uso próprio ou para consumo. Temos, portanto, que a sujeição passiva se materializa pela interrupção do ciclo de comercialização das mercadorias, pois não haverá nova etapa de circulação dos bens, dentro do Estado onde se encontra domiciliado o adquirente, razão pela qual o Constituinte, dentro do caráter extra fiscal do ICMS, e visando impedir a transferência de rendas dos Estados menos desenvolvidos, para os Estados mais ricos da Federação, estabeleceu a obrigatoriedade daqueles (adquirentes de mercadorias) em recolher ao Estado a diferença de alíquota.
Nesse sentido, a exigência fiscal, na forma veiculada pelo ato administrativo, e pela Lei nº 8.933/89 e RICMS, ofendem os princípios da segurança jurídica e da reserva legal, ex vi do disposto no inciso II do artigo 5º, da Constituição da República:
“II – Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”
Em matéria tributária, referido princípio é reforçado pelas Disposições do artigo 150, inciso I, verbis:
P2.”Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;”
Segundo Alberto Xavier (Os Princípios da Legalidade e da Tipicidade da Tributação – Ed. Revista dos Tribunais – 1978 – pg. 37):
“No Direito Tributário, o princípio da legalidade revestiu sempre um conteúdo bem mais restrito. Com vista a proteger a esfera de direitos subjetivos dos particulares do arbítrio e do subjetivismo do órgão de aplicação do direito – juiz ou administrador – e, portanto, a prevenir a aplicação de ‘tributos arbitrários’, optou-se neste ramo do Direito por uma formulação mais restritiva do princípio da legalidade, convertendo-o numa reserva absoluta de lei, no sentido de que a lei, mesmo em sentido material, deve conter não só o fundamento da conduta da Administração, mas também o próprio critério da decisão no caso concreto.”
Amílcar de Araújo Falcão (Fato Gerador da Obrigação Tributária – 4ª Ed. 1977 – Revista dos Tribunais – pg. 43) em sua clássica obra ao discorrer sobre a necessidade de previsão em lei, que legitime a tributação, assim, escreveu:
“O requisito da legalidade é, pois, um requisito existencial, essencial ou constitutivo para a própria formação do fato gerador e não apenas um simples requisito de validade.”
Temos, portanto, que o princípio da reserva legal, funda-se na lex scripta, onde nullum tributum sine lege, o que vale dizer, sem definição em lei não há fato gerador. Não obstante, o que se verifica, in casu, é a criação de determinada exação, através, única e exclusivamente, de uma norma regulamentar, que como se não bastasse, defronta-se com dispositivo Constitucional que define e delimita o alcance da norma fiscal.
Yonne Dolácio de Oliveira (A Tipicidade no Direito Tributário Brasileiro – Ed. Saraiva – 1980 – pg. 36), ao discorrer sobre a necessidade de previsão em lei, que legitime a tributação, assim escreveu:
“No Direito Tributário sempre foi reclamada a reserva de lei formal em consideração à intensidade da intervenção do poder na propriedade dos particulares, decorrente dos tributos. E, mesmo quando se supera a idéia de auto-tributação com a necessária votação dos tributos pelas assembléias legislativas, no âmbito do Direito Tributário, ainda assim, o princípio da reserva formal abrange dupla função de garantia: exclusão do direito consuetudinário como fonte de produção legal, o que redunda na exigência de ‘lex scripta’, e a exclusão de regulamentos como fontes de criação dos tributos, impondo a vinculação estrita do Poder Executivo ao Poder Legislativo.”
Temos, portanto, que a exigência fiscal relacionada com a diferença de alíquota tem como fundamentação principal evitar a transferência de renda entre os Estados, relação fática totalmente distinta do fato gerador do ICMS, o qual, conforme doutrina e jurisprudência vastas, sem discrepância, decorre de uma obrigação ex lege, cuja incidência fiscal decorre de uma causa jurídica, que constitui o fato gerador da respectiva obrigação. Incidência é fenômeno que ocorre antes da apuração do imposto; em primeiro lugar nasce a obrigação tributária, em razão da ocorrência do fato gerador da respectiva obrigação; após mensura-se o valor do imposto devido.
Da ofensa ao princípio da hierarquia das normas – Nenhuma Lei ou Decreto pode contrariar um dispositivo da Constituição da República. Nessa medida, havendo expressa disposição constitucional sobre a forma de apuração do imposto, em que pese a falta de Lei Complementar disciplinando a matéria objeto dos autos, data máxima venia, reputa-se uma aberração jurídica a criação, através de uma Lei do Executivo, de nova exação, tanto mais quando a forma confronta, expressamente, contra o que está definido na lei maior, não cabendo aos decretos regulamentá-la de forma diversa.
A propósito, o artigo 59 da Constituição Federal elenca de forma hierárquica as espécies normativas, quais sejam:
I. Emendas à Constituição;
II. Leis Complementares à Constituição;
III. Leis Ordinárias;
IV. Leis Delegadas;
V. Medidas Provisórias;
VI. Decretos Legislativos, e
VII. Resoluções
Sob este aspecto, cumpre esclarecer o que seja hierarquia de normas. Conforme definido pelo Professor Michel Temer (Elementos de Direito Constitucional – Ed. Revista dos Tribunais – pg. 148), verbis:
“Hierarquia, para o direito, é a circunstância de uma norma encontrar sua nascente, sua fonte geradora, seu ser, seu engate lógico, seu fundamento de validade numa norma superior.”
À evidência, se uma norma inferior encontra seu fundamento de validade numa norma superior, uma lei que contrariar formal ou materialmente um dispositivo constitucional, será inconstitucional. Da mesma forma, também devido ao instituto da hierarquia das normas, inerente ao sistema jurídico nacional, é ilegal uma norma ou ato de hierarquia inferior à lei, que disponha de modo contrário a esta.
Assim, uma lei ou um decreto que, ao regulamentar um dispositivo constitucional, dispõe de modo a contrariá-lo, seja por interpretá-lo, ampliá-lo ou restringi-lo, ou qualquer outra forma de desvio, é ilegal, da mesma maneira que poderá ser declarado inconstitucional.
No tocante ao relacionamento hierárquico das fontes formais do direito tributário, cumpre esclarecer quais sejam essas fontes e sua ordem hierárquica, bem como no que consiste o ato de contrariar uma norma hierarquicamente superior.
As fontes formais do direito tributário são divididas em principais e secundárias, dependendo se relacionadas à lei ou à executoriedade da lei. Estando as fontes formais principais já neste texto elencadas (art. 59 da CF), as fontes formais secundárias, que resumem-se basicamente nos Decretos, Instruções Ministeriais e Normas Complementares (elencadas no art. 100 do CTN), são aquelas que asseguram a executoriedade das fontes principais e possuem, ainda, um reduzido campo institucional, como, por exemplo, no estabelecimento de obrigações acessórias, quando estas são previstas apenas genericamente pela lei.
Enfim, cumpre-nos derradeiramente observar que:
a) o decreto regulamentar é norma formal secundária, enquanto a Lei Complementar é norma formal principal, portanto, esta norma é, de forma incontestável, hierarquicamente superior àquela, que lhe é subordinada;
b) nessa medida, ao decreto cumpre exclusivamente regulamentar a lei, sendo-lhe vedado dispor sobre elementos essenciais do tributo, tal como a hipótese de incidência, forma de apuração do quantum debeatur, interpretar a lei ou ainda determinar normas que contrariem, restrinjam, ampliem, ou modifiquem disposições contidas na Lei Complementar;
c) verificado, ipso facto, que a norma de hierarquia inferior, disciplinou de forma diferente aquela constante da Constituição, totalmente inconstitucional aquela.
Violação do inciso IV do artigo 150 da Constituição da República – do Confisco – Não terminam neste ponto as considerações; mister se faz, ainda, esclarecer que a indigitada exação, implica em confisco do patrimônio da Autora, afetando sua capacidade contributiva, uma vez que, sem fundamento legal, a exação em questão incide sobre uma situação que se reputa perfeita e acabada, nos termos da Lei. A tributação pura do patrimônio ou do capital, ocasionada pela restrição citada, representa uma utilização do “tributo cm efeito de confisco”, o que é vedada pelo Estatuto Supremo (art. 150, IV). O confisco é repudiado pela Norma Ápice.
Isto porque, a prevalecer a exação fiscal, verificamos o verdadeiro locupletamento que se quer perpetuar, evidenciando o enriquecimento sem causa da Fazenda Estadual, pois a Recorrente já providenciou o recolhimento do imposto devido, caracterizando-se, a multa mantida, em verdadeiro confisco, por agir de forma a cumprir o que da Constituição da República consta.
Note-se que a Autora, assim como qualquer contribuinte, deve dispor de parte de seu patrimônio, sem ter realizado qualquer operação que lhe gere renda suficiente para pagar o ICMS, simplesmente por uma interpretação fiscalista, e não legal, como se exigiria.
Hugo de Brito Machado (Obra Capacidade Contributiva – Caderno de Pesquisas Tributárias – Vol. 14 de 1989), definiu com clareza o confisco em tela:
“Em se tratando de imposto sobre o patrimônio, poder-se-ia considerar confiscatório aquele imposto que os doutrinadores classificam como real sobre o patrimônio, isto é, aquele para cujo pagamento a renda produzida pelo patrimônio tributado não é suficiente, vendo-se o contribuinte obrigado a desfazer-se de parte de seu patrimônio para poder pagar o imposto.”
José Eduardo Soares de Melo (Obra Capacidade Contributiva – Caderno de Pesquisas Tributárias – Vol. 14 de 1989), aponta:
“O confisco, que se atrela inexoravelmente à capacidade contributiva, existirá sempre que o tributo absorva parcela expressiva da renda ou da propriedade dos contribuintes, sendo aferido, principalmente, pelo exame da alíquota (no caso do imposto), ou da base cálculo (no caso da taxa).”
Resta, finalmente, ressaltar que não só é ilegal e inconstitucional, a indigitada exação, como também injusta a tributação na forma sustentada pela Fazenda Estadual, impondo aos contribuintes a proteção no Poder Judiciário, ex vi do artigo 5º, XXXV da Carta Magna, e da inafastabilidade do controle jurisdicional.
Na presente Medida Cautelar, a Autora pretende depositar judicialmente o diferencial do ICMS, a fim de evitar grave lesão de difícil reparação.
O art. 5º, inciso XXXV da CF/88, dispõe:
“A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”
Referido inciso, deixou claro que a tutela jurisdicional é invocável, não só para reparar dano sofrido, como também para evitar que a lesão se consume.
Trata-se de norma contemplada no art. 804 do Código de Processo Civil, recebido pela Constituição Federal de 1988, e que estabelece:
“Art. 804 – É lícito ao juiz conceder liminarmente ou após justificação prévia a medida cautelar sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz, caso em que poderá determinar que o requerente preste caução real ou fidejussória de ressarcir os danos que o requerido possa vir a sofrer.”
Referida regra complementa o dispositivo do art. 797 do Código de Processo Civil, no sentido de que os casos excepcionais a que se refere são exatamente as hipóteses elencadas no art. 804, ou seja, quando houver a possibilidade de citado, o réu tornar a medida ineficaz pela consumação de lesão que a Autora visa evitar, deve ser concedido o provimento jurisdicional, suspendendo o ato gravoso.
O Periculum in Mora se configura, na medida que a Autora sofrerá grave lesão patrimonial com a inscrição do débito na dívida ativa da Fazenda Estadual, possibilitando ainda execução judicial, com a penhora de bens, etc., e ainda impedindo-a, inclusive de obter certidões negativas e desenvolver normalmente suas atividades, inclusive em licitações.
A irreparabilidade do dano sobre o patrimônio da Autora, é patente, sendo indispensável para tanto a tutela jurisdicional, pois se constitui séria ameaça ao direito da Autora de continuar a exercer suas atividades necessárias à consecução de seus objetivos sociais, além de estar a Autora, desde logo, sujeita a Execução Fiscal.
Nas precisas lições do Prof. Humberto Theodoro Junior (Processo Cautelar – Ed. EUD – 1986 – pg. 77), presença do Periculum in Mora, como um dos requisitos indispensáveis para o deferimento da medida initio litis, está assim expresso:
“Para obtenção da tutela cautelar; a parte deverá demonstrar fundado temor de que enquanto aguarda a tutela definitiva, venha a faltar as circunstâncias de fato favoráveis à própria tutela. E isto pode ocorrer gerando hoje o risco de perecimento, destruição, desvio, deterioração, ou de qualquer mutação das pessoas, bens, ou provas necessárias para a perfeita e eficaz atuação do provimento final do processo principal. Ao tratar do poder geral de cautela (art. 798) nosso Código fala em Fundado Receio de Dano ao Direito de uma das partes. Há entretanto, evidente improbidade terminológica do legislador. Se não houve o julgamento da ação principal, que visa solucionar a lide, não se pode ainda, falar em direito da parte, pois nem sequer se sabe ao certo se ele existe ou não. O perigo de dano refere-se, portanto, ao interesse processual em obter uma justa composição do litígio, seja em favor de uma ou outra parte, o que não poderá ser alcançado o dano temido.
Esse dano corresponde, assim, a uma alteração na situação de fato existente ao tempo do estabelecimento da controvérsia – ou seja, do surgimento da lide – que é ocorrência anterior ao processo.”
Ademais o Periculum in Mora também se configura, pois, como se verifica, a Autora sofrerá grave lesão patrimonial e poderá ser autuada pelo exercício de seu direito, com imposição de penalidades, o que, na realidade, implicará em verdadeiro atentado, conforme estabelece o art. 879, III do CPC, tendo em vista que a parte contrária, não aceita ou concorda com os procedimentos da Autora, à face do ato administrativo acima identificado, todo ilegal. Ademais fica caracterizada a hipótese do solve et repete pois trata-se de tributo a ser recolhido, sendo que, sob tal circunstância, evidencia-se a possibilidade de lesão de difícil reparação, o que exige a concessão da Medida Liminar.
O outro requisito, o Fumus Boni Iuris, também está patente na fundamentação do direito esboçado na inicial, invocando pois, as lições de Humberto Theodoro Junior (ob. cit. pg. 76):
“Em suma, o requisito da ação cautelar, tradicionalmente apontado como o fumus boni iuris deve, na verdade corresponder, não propriamente à probalidade de existência do direito material – pois qualquer exame a respeito só é próprio da ação principal -, mas sim à verificação efetiva de que, realmente, a parte dispõe do direito de ação, direito ao processo principal a ser tutelado.”
Nestes termos vem decidindo iterativamente os nossos Eg. Tribunais Superiores (Código de Processo Civil – 21ª Ed. – Ed. Revista dos Tribunais – pg. 796), conforme se verifica da ementa abaixo, verbis:
“A finalidade da medida cautelar é garantir a utilidade e eficácia da futura prestação jurisdicional. No particular, o juiz deve atuar com parcela de discricionareidade, cujo limite é o requisito da necessidade … omissis … (TFR 5ª T. Ag. 59.748/CE – Rel. Min. José Delgado, j. 13/03/89, negaram provimento ao agravo, v.u., DJU 26.06.89, p. 11.158 – 1a. col. em.)
Assim sendo, o Eg. Tribunal Regional Federal proferiu a Súmula nº 1, solidificando o cabimento de Ação Cautelar de depósito, estando assim redigida:
“Em matéria fiscal é cabível medida cautelar de depósito, inclusive a quando a ação principal for declaratória de inexistência de obrigação tributária.”
Presentes os requisitos legais para o seu deferimento, o fumus boni iuris, e o periculum in mora, é a presente para requerer seja deferida Medida Liminar, inaudita altera pars, nos termos do art. 804, do CPC, nos seguintes termos:
a) para conceder o direito da Autora de efetuar o depósito judicial da diferença do ICMS apurado “por dentro”, pelo regime do art. 8º e art. 17 da Lei nº 8.933/89, quando da aquisição de bens para o ativo fixo ou de consumo quando adquirido de outros estados, e a simples diferenciação de alíquotas interestaduais. Feito o depósito, este produz os efeitos previstos no art. 151, II do CTN, que determina a suspensão da exigibilidade do crédito tributário.
“Art. 151 – Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
II – o depósito do seu montante integral.”
b) para que a autoridade coatora se abstenha de agir contra a Autora, por qualquer modo ou forma, tendente a exigir o recolhimento do ICMS “por dentro” na aquisição de bens para o ativo fixo ou consumo, de outros estados conforme determina as disposições do art. 8º e art. 17 da Lei nº 8.933/89, tendo em vista que a exigibilidade deste encontra-se suspensa nos termos do disposto no art. 151, inciso II do CTN, em razão de que a referida norma, qualquer que seja o litígio, admite o direito do contribuinte de, para afastar a correção monetária e demais acréscimos legais, depositar a quantia litigiosa, enquanto pendente a ação principal a ser proposta, de cunho ordinário declaratório.
c) para que a autoridade coatora se abstenha, por qualquer forma ou procedimento, inscrever o suposto crédito tributário como dívida ativa da Fazenda Estadual, promovendo, em conseqüência, sua execução fiscal.
Deferida a Medida Liminar, requer a expedição de ofício ao Sr. Delegado Regional Tributário, na comarca de …., para a ciência da presente ação.
DOS PEDIDOS
À face da juridicidade dos fundamentos apresentados a ação deverá ser julgada inteiramente procedente, para o fim de ser tornada definitiva a cautela requerida de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, enquanto pendente de julgamento final, o processo principal.
Processado o feito requer a Autora, ainda, se digne Vossa Excelência, determinar a citação da Fazenda Estadual, na pessoa de seus representantes legais, para responder aos termos da presente Medida Cautelar sob pena de revelia, com a condenação da Ré em honorários, custas e demais cominações legais. Protestando, outrossim, provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, sem exceção.
Enfim, pende neste mesmo juízo ação declaratória de inexigibilidade de débito fiscal. Ajuíza-se a presente para evitar execução fiscal.
Dá-se à causa o valor de R$ …..
Nesses Termos,
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
[Assinatura do Advogado]
[Número de Inscrição na OAB]