EXMO. SR. DR. JUIZ FEDERAL DA ….ª VARA – SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO ….
…., pessoa jurídica de direito privado, com sede em …., na Rua
…., inscrita no CGC/MF sob n.º…., por seus procuradores que adiante assinam, advogados inscritos na OAB/…, com escritório profissional na Rua …. n.º …., vem, respeitosamente à presença de V. Exa. com o fim de interpor:
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA
C/C DECLARATÓRIA DE DIREITO À COMPENSAÇÃO
contra a UNIÃO FEDERAL, o que faz com fundamento no disposto pelo art. 282 e seguintes do CPC e pelas razões a seguir expostas:
1.0 – DA MEDIDA CAUTELAR INTERPOSTA
1.1 – Tratando-se de ato ilegal praticado pela Requerida contra a Requerente, do qual resultaria dano iminente, esta interpôs medida acautelada dos direitos ameaçados – auto
s n.º …., em trâmite perante a …. Vara desta Seção judiciária, na qual foi indeferida a medida liminar autorizadora da compensação dos valores comprovadamente recolhidos a maior a título de Contribuição ao FINSOCIAL.
2.0 – DOS FATOS
2.1 – A Requerente, na qualidade de empresa industrial sujeitava-se, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, ao recolhimento da Contribuição ao FINSOCIAL instituída pelo decreto-lei n.º 1940/82 a qual, segundo o entendimento jurisprudência dominante, foi recepcionada através do art. 56 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, à alíquota vigente àquela época, qual seja: 0,5% (meio por cento) incidente sobre o seu faturamento.
2.2 – A Requerente recolhia a contribuição ao FINSOCIAL à base de 0.5% sobre o faturamento mensal de suas atividades, percentual este que foi elevado, após a promulgação da Constituição Federal de 1.988, para 1,0% pelo art. 7º, da Lei nº7787/89; para 1,2% pelo art. 1º, da Lei n.º 7894/89; e, finalmente, para 2,0% pelo art. 1º, da Lei n.º 8.147/90.
2.3 – Tais aumentos de alíquota do FINSOCIAL foram alvo de milhares de mandados de Segurança, pelos quais inúmeros contribuintes se rebelaram contra tais elevações tidas como inconstitucionais.
2.4 – Em razão disso, em data de 16.12.92 o Plenário do Supremo Tribunal Federal, julgando Recurso Extraordinário interposto pela União Federal, sendo Recorrida a empresa …., negou, por maioria de votos, provimento àquele recurso, declarando a inconstitucionalidade do art. 9º, da Lei n.º 7689, de 15.12.88, do art. 7º, da Lei n.º 7787, de 30.06.89, do art. 1º, da Lei n.º 8147, de 28.12.90. (in DJU de 02.04.93, pág. 5623/5624)
2.5 – Da decisão supra decorre que todos os recolhimentos feitos pela Requerente desde a edição da Lei n.º 7787/89 a título de contribuição ao FINSOCIAL, até abril/92, data de sua extinção (Lei Complementar n.º 70/91), foram excessivos, o que monta em significativo valor conforme demonstrativo em anexo.
3.0 – DO DIREITO
3.1 – Os créditos de contribuintes contra a União Federal oriundos de pagamentos indevidos ou feitos a maior de tributos e contribuições federais, segundo dispõe o artigo 66 da Lei n.º 8383/91, poderão ser compensados no recolhimento de importância correspondente a períodos subseqüentes. Senão vejamos:
“Art. 66 – Nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos e contribuições federais, inclusive previdenciárias, mesmo quando resultante de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, o contribuinte poderá efetuar a compensação desse valor no recolhimento de importância correspondente a períodos subseqüentes.
Parág. 1º – A compensação só poderá ser efetuada entre tributos e contribuições da mesma espécie.
Parág. 2º – (omissis)
Parág. 3º – A compensação ou restituição será efetuada pelo valor do imposto ou contribuição corrigido monetariamente com base na variação do valor da UFIR.
Parág. 4º – (omissis)” (grifo nosso)
3.2 – Portanto Excelência, resta claro e evidente o direito da Requerente em proceder à compensação de quaisquer valores referentes a tributos e contribuições federais, que porventura tenha pago indevidamente, desde que essa compensação se dê entre tributos e contribuições da mesma espécie.
3.3 – Temos, entretanto, que em data de 27.05.92 foi publicada no Diário Oficial da União a Instrução Normativa n.º 67/92, a qual dispõe sobre a compensação em comento, trazendo ao ordenamento jurídico tributário restrições e condições que não foram mencionadas pelo art. 66 da Lei n.º 8383/91. É manso e pacífico o entendimento de que as instruções normativas não podem extrapolar as letras da Lei. Em o fazendo, tornam-se violadoras de princípios do direito não tendo condições de sobrevivência harmônica no sistema jurídico. Vejamos, então, o que dispõe o art. 3º, da IN 67/92:
“Art. 3º – Dependerá de solicitação à unidade da Receita Federal jurisdicionante do domicílio fiscal do contribuinte, cabendo à projeção local do Sistema de Arrecadação analisar a procedência do pedido e realizar os procedimentos necessários, quando a compensação se referir aos seguintes casos:
I – se o vencimento do débito objeto da compensação ocorreu antes de 1º de janeiro de 1992;
II – (omissis)
III – (omissis)
Parágrafo Único – O pedido de compensação previsto neste artigo deverá descrever os fatos que lhe deram origem e será instruído com os elementos que comprovem o crédito e identifiquem o débito a ser compensado.”
3.4 – Da simples análise dos dispositivos legais supra citados, conclui-se, sem maior esforço científico, que a Instrução Normativa n.º 67/92 contrariou dispositivos da lei, extrapolou sua função eminentemente orientadora tomando para si as vestes de veículo
primário introdutório de normas no ordenamento jurídico, o que é inconcebível.
3.5 – Inconteste, portanto, a ilegalidade do art. 3º da IN n.º 67/92, sendo providencial para a sua comprovação a lição do Ilustre doutrinador Dr. Hugo de Brito Machado, Juiz do Tribunal Regional Federal da 5ª Região e Professor Titular de Direito Tributário da Universidade Federal do Ceará, que segue:
(…)
“Agora, em se tratando de tributos federais, a compensação em foco não é mais apenas uma faculdade para o Fisco. É um direito subjetivo do contribuinte, a cujo exercício não se pode opor a Fazenda Pública.”
(…)
“Não obstante faculte a lei ao contribuinte a opção pelo pedido de restituição do que pagou indevidamente (art. 66, parág. 2º), faculdade que por certo existiria, ainda que a lei não tivesse dito, é induvidoso que, se ocorre a situação na qual pode ser feita a compensação, ninguém optará pelo pedido de restituição. A compensação, na hipótese legalmente autorizada, faz-se automaticamente, sem demora alguma. E será feita pelo valor do imposto, ou contribuição, corrigido monetariamente com base na variação da UFIR. É evidente, pois, sua vantagem, relativamente ao pedido de restituição.”
(…)
“É certo que a Lei n. 8.383/91, autoriza a expedição de instruções necessárias ao exercício do direito à compensação em tela (art. 66, parág. 4º).
Isto, porém, não significa possam tais instruções restringir o direito que decorre da lei. Elas devem estabelecer apenas as normas necessárias ao exercício do direito à compensação. Se a pretexto de fazê-lo estabelecem, como fez a IN 67/92, prescrições restritivas ao direito à compensação, tais prescrições são induvidosamente desprovidas de validade jurídica, pois ninguém é obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (Constituição Federal, art. 5º, item II).
Ao prescrever o direito à compensação, a lei não distinguiu os créditos tributários apurados em períodos anteriores a 1º de janeiro de 1992, daqueles apurados em períodos subseqüentes. Não podia, pois, o art. 1º da Instrução Normativa em comento, estabelecer tal distinção. Nem condicionou, em qualquer hipótese, o exercício do direito em tela à autorização da autoridade administrativa. Não podia, pois, o art. 3º da citada norma infra legal, impor tal condicionamento.
O direito à compensação em tela está legalmente estabelecido, sem condicionamento nenhum. Pode, pois, o contribuinte exercitá-lo, sejam quais forem as datas de apuração dos créditos e independentemente de pedido à autoridade administrativa …” (in Repertório IOB de Jurisprudência, n.º 1/93, págs. 16/17, grifos do autor)
3.6 – Da argumentação supra depreende-se que a Requerente tem o direito de realizar as compensações de valores de tributos e contribuições pagos indevidamente ou a maior, independentemente da autorização da autoridade administrativa, pois a necessidade dessa autorização não foi veiculada pelo art. 66, da Lei nº 8383/91. A única condição estabelecida pela Lei para a compensação em comento é que esta se dê entre tributos da mesma espécie, ou seja, os valores pagos indevidamente a título de tributos não-vinculados (Impostos) deverão ser compensadas com tributos não-vinculados e os que forem pagos a título de tributos vinculados (taxas e contribuições) deverão ser compensados com tributos vinculados. Esta é a classificação das espécies tributárias no entender dos mais renomados tributaristas pátrios, dentre eles GERALDO ATALIBA, in “Hipótese de Incidência Tributária”, 4º. ed., Revista dos Tribunais. Senão vejamos:
“52.1 Por isso, na própria lei tributária – situado em posição essencial e nuclear – haverá de ser encontrado o elemento decisivo de classificação. Efetivamente, este está na h. i., mais precisamente no seu aspecto material.
52.2 É a materialidade do conceito do fato, descrito hipoteticamente pela h. i. que fornece o critério para classificação das espécies tributárias.
52.3 O principal e decisivo caráter diferencial entre as espécies tributárias está na conformação ou configuração e consistência do aspecto material da hipótese de incidência.
52.4 Conforme, pois, a consistência do aspecto material da h. i. será possível reconhecer as espécies de tributos.”
(…)
“52.8 Examinando-se e comparando-se todas as legislações existentes – quanto à hipótese de incidência , verificamos que, em todos os casos, o seu aspecto material, de duas, uma: a) ou consiste numa atividade do poder público (ou numa repercussão desta)_ ou, pelo contrário; b) consiste num fato ou acontecimento inteiramente indiferente a qualquer atividade estatal.
Esta verificação permite classificar todos os tributos, pois – segundo o aspecto material de sua hipótese de incidência consista ou não no desempenho de uma atividade estatal – em tributos vinculados e tributos não vinculados.
52.8.1 É que esta averiguação enseja afirmar que – no primeiro caso – o legislador vincula o nascimento da obrigação tributária ao desempenho de uma atividade estatal e – no segundo – não. No Brasil, tal critério é constitucionalmente consagrado de modo expresso, impedindo postura diversa do legislador ordinário.
52.8.2 A Constituição obriga o legislador a pôr no cerne (aspecto material da h. i. ou (a) o conceito de um fato consistente numa ação estatal ou (b) um fato desta independente, remoto.
52.9 Pode-se dizer, portanto que são tributos (1) vinculados aqueles cuja hipótese de incidência consiste na descrição de uma atuação estatal (ou uma conseqüência desta). Neste caso, a lei põe uma atuação estatal no aspecto material da h. i.
São tributos (2) não vinculados aqueles cuja hipótese de incidência consiste na descrição de um fato qualquer que não seja atuação estatal. Isto é, a lei põe, como aspecto material da h. i., um fato qualquer não consistente em atividade estatal”
(…)
“52.14 Tributos vinculados são as taxas e contribuições (especiais) e tributos não vinculados são os impostos.
52.15 Definem-se, portanto, os tributos vinculados como aqueles cuja hipótese de incidência consiste numa atividade estatal; e imposto como aqueles cuja hipótese de incidência é um fato ou acontecimento qualquer, não consiste numa atividade estatal.”
“87.1 Dificilmente surgem contribuições cuja hipótese de incidência corresponde ao exato conceito técnico-jurídico da espécie. Salvo a ‘de melhoria’, no Brasil, todas as contribuições têm tido hipótese de incidência de imposto na configuração que o imaginoso – Mas sem técnica – legislador lhes tem dado.”
“87.4 Assim, se a lei adotar, para a mesma contribuição a hipótese de incidência do IPI (art. 153, IV, o tributo será ‘não cumulativo e seletivo’ (art. 153, parág. 3º; se adotar a hipótese de incidência do imposto de renda, aplicam-se as deduções e abatimentos gerais (art. 150, II), etc.” (grifos nossos)
3.7 Este entendimento é compartilhado, também, pelo Jurista ROQUE ANTÔNIO CARRAZA, que em sua obra “Curso de Direito Constitucional Tributário”, 2º ed., Revista dos Tribunais, págs. 272/273, assim se manifesta:
(…)
“Com a só leitura deste dispositivo constitucional, já percebemos que as ‘contribuições sociais’ são, sem sombra de dúvidas, tributos, uma vez que devem necessariamente obedecer ao regime jurídico tributário, isto é, aos princípios que informam a tributação, no Brasil.
Estamos, portanto, que estas contribuições sociais são verdadeiros tributos (embora qualificados pela finalidade que devem alcançar). Podem, pois, revestir a natureza jurídica de imposto, de taxa ou de contribuição de melhoria, conforme as hipóteses de incidência e bases de cálculo que tiverem.” (grifos nossos)
3.8 – Isto posto, temos como incontroverso o direito da Requerente em proceder a compensação dos valores pagos a maior a título de contribuição ao FINSOCIAL com tributos da mesma espécie, conforme demonstrativos anexos, haja vista a decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal supra transcrita, que julgou inconstitucionais todos os aumentos de alíquota dessa contribuição levados a efeito após a promulgação da Carta de 1.988.
4.0 – DO RESUMO E DO PEDIDO
4.1 – De tudo o que foi examinado, pode-se inferir o seguinte:
a) O direito à compensação dos valores recolhidos a maior a título de contribuição ao FINSOCIAL, em razão da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal supra comentada, está consubstanciado no disposto pelo artigo 66, da Lei n.º 8383/91.
b) As limitações estabelecidas pela Instrução Normativa n.º 67/92 à compensação dos valores pagos indevidamente são totalmente inconstitucionais, pois a Lei que a originou não estabelece qualquer espécie de limitação e,
c) por último, deixando de utilizar a compensação ora pleiteada, sofrerá dano de difícil reparação, pois pagará tributos sendo detentora de créditos junto ou Fisco Federal cuja compensação está prevista em lei (art. 66, da Lei n.º 8383/91).
4.2 Isto posto, é a presente AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C DECLARATÓRIA DE DIREITO À COMPENSAÇÃO para requerer a citação do Digníssimo Representante da União Federal no Estado do Paraná para, no prazo legal, contestar, querendo, a presente ação.
4.3 – Requer, outrossim, digne-se V. Exa. em julgar procedente o pedido para declarar a inexistência de relação jurídica que autorizasse a Requerida a exigir o recolhimento das alíquotas majoradas da Contribuição ao FINSOCIAL e o direito da Requerente à compensação dos créditos que possui frente a Requerida relativos aos recolhimentos indevidos realizados a título daquele tributo com qualquer débito fiscal que possua, ou que venha a possuir, frente a União Federal relativamente a tributos da mesma a espécie, tudo em razão daqueles aumentos de alíquotas, levados a efeito após a promulgação da Constituição Federal de 1988, terem sido considerados inconstitucionais pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal.
4.4 – Requer, ainda, a condenação da União Federal a todos os ônus da sucumbência, inclusive honorários advocatícios, a serem arbitrados segundo o disposto no artigo 20 do Código de Processo Civil.
4.5 – Requer, finalmente, a produção de todas as provas em direito admitidas, bem como, a distribuição da presente ação, por dependência aos autos de Medida Cautelar nº 94.2992-6, à 7º Vara – desta Seção Judiciária.
4.6 – Dá-se à presente o valor de R$ ….
PEDE DEFERIMENTO
…., …. de …. de ….
………………
Advogado